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Ano IV – Nº 4 – Dezembro de 2007

Conselho EditorialAdriana Albuquerque Cabral de Castro Pereira, M.Sc. FFB

Andréia Maria de Senna Marques, M.Sc. FFBClaudia Buhamra Abreu Romero, Dra. UFC

Danielle Miranda de Oliveira Arruda, Dra. UniforFrancisco Correia de Oliveira, Dr. Unifor

José Maria Porto Magalhães Sobrinho, M.Sc. FFBMárcio de Oliveira Mota, M.Sc. FFB

Olga Melissa Moreira Prado, M.Sc. FFBSamuel Façanha Câmara, Dr. UECE

Sérgio Barbosa Elias, M.Sc. FFBSérgio Carvalho, PhD, University of Manitoba, Canadá

Supervisão Editorial:Márcio de Oliveira Mota

Assistente Editorial:Cinthia Venâncio

Projeto Gráfico:Daniel de Paiva Silva

Impressão:Gráfica FB

Revisão:Fernando Filgueiras

Os textos são de inteira responsabilidade de seus autores.

A Revista FFBusiness comunica aos seus colaboradoresque os artigos a serem submetidos à seleção deverão ser somente emmeio eletrônico, enviando através do e-mail: [email protected]

que possui fluxo contínuo de recebimento de artigos.

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© Faculdade Farias Brito Distribuição: Coordenação do Curso de Administração e Marketing Rua: Castro Monte, 1364 – 2º andar Fortaleza: CE Cep: 60175-230 Fones: (85) 3486.9090 e 3486.9003 Fax: (85) 3267.5169 e-mail: [email protected]

Organização Editorial: Márcio de Oliveira Mota Capa: Gráfica FB Tiragem Mínima: 500 exemplares

ISSN 1679-723X

Ficha Catalográfica

FFBusiness: revista do curso de administração / Faculdade Farias Brito. v. 4, n.4 (jan. a dez.) – Fortaleza: Faculdade Farias Brito, 2007 –

Anual

ISSN 1679-723X

1. Administração de Empresas. 2. Periódico. I. Faculdade Farias Brito

CDD-658.05

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EDITORIAL

Caro Leitor,

A Revista FFBusiness assume uma identidade como revista de circulação nacional dedicada com ênfase exclusiva nas Ciências Administrativas e suas linhas de pesquisa, cujos artigos são submetidos a um sistema de avaliação blind review por pareceristas externos. A revista tem como missão publicar artigos científicos que contribuam para a expansão do conhecimento em Administração.

Esta edição da Revista FFBusiness, número 4, apresenta cinco artigos, todos com importantes temáticas sobre administração: ensino e pesquisa em administração, marketing, logística e administração da produção.

Esse número da revista é aberto com o artigo “Gargalos Logísticos e Gestão da Cadeia de Suprimento na Indústria de Calçados de Couro da Região Nordeste” de Fernando Luiz Emerenciano Viana e Roberto Ednísio Vasconcelos Rocha que avaliam os gargalos logísticos e a gestão da cadeia de suprimentos do calçado de couro na Região Nordeste e apontam relação de cenários e desafios a serem suplantados, como as questões logísticas ligadas a gerenciamento, integração e adensamento da cadeia produtiva e infraestrutura de transportes e a necessidade de atração de elos faltantes da cadeia para o Nordeste, tais como fornecedores de matérias-primas, componentes e acessórios, notadamente as empresas acabadoras de couro para desenvolvimento de novos produtos.

Em seguida, o artigo intitulado “Aspectos Ergonômicos na Utilização das Técnicas de Produção Enxuta: uma Contribuição para a Melhoria do Desempenho Global do Sistema Produtivo” de autoria de Sérgio José Barbosa Elias e Eugenio Andrés Días Merino faz uma análise e propõe uma reflexão acerca dos aspectos ergonômicos envolvidos na aplicação das técnicas de produção enxuta. O estudo analisa como diversas técnicas de produção enxuta podem ser potencializadas a partir dos conhecimentos advindos da ergonomia. Ademais, busca-se que sejam evitados danos à saúde, levando, consequentemente, à segurança dos empregados, contribuindo assim com a melhoria do desempenho do processo de uma forma global.

O terceiro artigo traz uma pesquisa documental e bibliográfica realizada pelos autores Humberto Ferreira Oriá Filho e Teresinha de Jesus Pinheiro Maciel sobre os aspectos de ensino-aprendizagem em cursos das Ciências Administrativas sob o título “Metodologia para o Ensino Universitário: um estudo à luz da andragogia”. Esses autores levaram à reflexão de que muitos programas de disciplinas dos cursos de graduação, particularmente

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das Ciências Administrativas Aplicadas, não descobriram que devem utilizar metodologias para alunos já adultos. Os resultados desse estudo indicam que a grande maioria dos programas examinados utiliza a metodologia de ensino baseada, quase que exclusivamente, em aulas expositivas teóricas, demonstra provavelmente também um apego dos professores a uma metodologia tradicionalista, centrada na figura do mestre, com poucas opções de questionamento e de construção do conhecimento pelos próprios alunos (atitude ativa) e preocupada apenas no repasse de conhecimentos e técnicas descritas de forma rígida nos programas das disciplinas. Os autores sugerem que essas deficiências metodológicas sejam identificadas no intuito de que possam adequá-las aos princípios da Andragogia, para favorecer uma melhor aprendizagem dos alunos, respeitando sua experiência de vida e cultura.

Essa edição finaliza com um bloco com ênfase em marketing, tendo como primeiro artigo o estudo “Razões de Preferência de Compra por supermercados na Cidade de Fortaleza” de autoria de Danielle Miranda de Oliveira Arruda Gomes, Joanna Oliveira de Melo e Luciana de Castro e Silva Menezes. Este artigo de natureza quantitativa enfocou o comportamento do consumidor de supermercados em bairros de classe média alta da capital cearense e objetivou identificar o perfil desses consumidores e as variáveis determinantes na decisão de compra nesse segmento de varejo. Os resultados indicam que as razões de preferência por supermercados são, em ordem de importância: preço, localização, condições de pagamento, qualidade dos produtos e rapidez no atendimento.

O segundo e último estudo desse bloco de autoria de Ana Augusta Ferreira de Freitas, Renata Furtado Gradvohl e Marília Pinheiro Falcioni sob o título “Um Confronto de Ideias sobre Scripts e Interações Comerciais: Uma Visão Baseada na Teoria da Análise Transacional”. Esta pesquisa de natureza exploratória e documental enfoca a questão do comportamento humano durante situações de interação comercial. A análise documental realizada baseou-se em materiais utilizados por duas empresas que realizam treinamento da força de vendas no Ceará e os resultados indicam que os scripts contidos nos documentos analisados são considerados estímulos que podem provocar respostas variadas dependendo da personalidade do cliente que estiver inserido na interação comercial, caracterizando flexibilidades e variações nos scripts. Constatou-se também que a simples existência de scripts não é suficiente para que haja uma relação harmônica entre funcionário/vendedor e cliente durante essas interações.

Editoria

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Sumário

Gargalos Logísticos e Gestão da Cadeia de Suprimento na Indústria de Calçados de Couro da Região Nordeste ........................................11

Logistics Impediments and Supply Chain Management in the Northeast Region Industry of Leather FootwearFernando Luiz Emerenciano Viana e Roberto Ednísio Vasconcelos Rocha

Aspectos Ergonômicos na Utilização das Técnicas de Produção Enxuta: uma Contribuição para a Melhoria do Desempenho Global do Sistema Produtivo .............................................................................25

Ergonomic Aspects in the Use of Techniques of Lean Production: A Contribution to the Performance Improvement of the Global Production SystemSérgio José Barbosa Elias e Eugenio Merino

Metodologia para o Ensino Universitário: um Estudo à Luz da Andragogia ...............................................................................................43

Methodology for University Education: A Study Under the Conception of AndragogyHumberto Oriá Filho e Terezinha de Jesus Pinheiro Maciel

Razões de Preferência de Compra por Supermercados na Cidade de Fortaleza.....................................................................................................59

Reasons for Choosing the Purchase by Supermarkets in the City of FortalezaDanielle Miranda de Oliveira Arruda Gomes, Joanna Oliveira de Melo e Luciana de Castro e Silva Menezes

Um Confronto de Ideias sobre Scripts e Interações Comerciais:Uma Visão Baseada na Teoria da Análise Transacional ...................73

A Confrontation of Ideas about Scripts and Commercial Interactions: An Analisys Transactional Theory – Based ViewAna Augusta Ferreira de Freitas, Renata Furtado Gradvohl e Marília Pinheiro Falcioni

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Artigos

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GARGALOS LOGÍSTICOS E GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTO NA INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE COURO

DA REGIÃO NORDESTE

Logistics Impediments and Supply Chain Management in the Northeast Region Industry of Leather Footwear

Fernando Luiz Emerenciano VianaUniversidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

Roberto Ednísio Vasconcelos RochaFaculdade Farias Brito – FFB

RESUMO O presente trabalho apresenta uma avaliação dos gargalos logísticos e da gestão da cadeia de suprimentos na indústria de calçados de couro da Região Nordeste, bem como uma relação de cenários e desafios a serem suplantados. As observações foram feitas a partir da visão de empresas dos maiores estados produtores, empregadores e exportadores da Região, no caso Ceará, Paraíba e Bahia. Foram realizadas análises na indústria calçadista no âmbito brasileiro e mais detalhadamente no campo de atuação nordestino. As questões logísticas ligadas a gerenciamento, integração e adensamento da cadeia produtiva e infraestrutura de transportes são apontadas como temas recorrentes ao alavancamento da indústria na Região.Palavras-chave: Calçados, Logística, Região Nordeste.

ABSTRACT This work presents an evaluation of the logistics difficulties and the administration of supply chain in the Northeast Region industry of shoes made of leather, with the relation of sceneries and challenges to be supplanted. The observations were made starting from the point of view of companies at the largest producing states, employers and exporters of the Region, in this case, Ceará, Paraíba and Bahia. The analyses were accomplished in the industry of shoes in the Brazilian extent and more detailed in the field of Northeast Region. The logistics points linked to management, integration and regionalization of the productive chain and infrastructure of transports are pointed as themes to the progress of this industry at the Region.KEYWORDS: Footwear, Logistics, Northeast Region.

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INTRODUÇÃOA cadeia coureiro-calçadista (CCC) é formada por quatro segmentos principais: o das

indústrias de calçados (de couro ou de materiais sintéticos); de artefatos de couro (bolsas, pastas etc.); das indústrias de curtume e de componentes para couros e calçados. Além desses, há outros três segmentos: a indústria de máquinas para o complexo, frigoríficos e o setor pecuarista.

A indústria de calçados brasileira possui papel relevante em termos de produção mundial, ocupando atualmente o terceiro lugar no ranking dos países produtores, totalizando 725 milhões de pares em 2005, estando atrás apenas da China e da Índia em termos de quantidade produzida. No mesmo ano, o total exportado pelas empresas brasileiras foi de 189 milhões de pares, o equivalente a 26,0% da produção total. Estima-se que a produção mundial de calçados supere o patamar de 12 bilhões de pares/ano (VIANA; ROCHA, 2007).

Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados - ABICALÇADOS (2006), a produção brasileira de calçados, apesar da forte concentração de empresas de grande porte no Rio Grande do Sul, vem gradativamente sendo distribuída em outros polos, localizados nas regiões Sudeste e Nordeste do País, com destaque para o interior de São Paulo (Birigui, Franca e Jaú) e estados emergentes, como Ceará e Bahia. Verifica-se, também, crescimento na produção de calçados nos estados de Santa Catarina (São João Batista) e Minas Gerais (Nova Serrana).

A indústria brasileira tinha significativa inserção internacional, ancorada principalmente na mão de obra, até 1994, quando houve a paridade cambial do real em relação ao dólar (Plano Real), fazendo com que as empresas mudassem sua estratégia de exportação para um redirecionamento das vendas ao mercado interno, ocasionando a insolvência de muitas empresas, especialmente as de pequeno e médio porte, enquanto as maiores conseguiram voltar parte da produção destinada às exportações para o mercado interno, auferindo maiores margens de rentabilidade a partir da elevação dos preços, sustentada, também, pela expansão da demanda doméstica. A exportação foi mantida, basicamente, apoiada pelo aumento de produtividade e redução de custos, em economia de escala, com recorrente achatamento de salários (GARCIA, 2003).

A indústria calçadista brasileira tem como concorrentes principais, em segmentação de mercado, no high end, a indústria italiana, que ocupa faixas superiores de mercado e tem obtido redução de custos a partir da terceirização da produção em países que apresentam menor custo de mão de obra, tendo como produto principal sua marca e design, especialidade dos distritos da Terceira Itália, que são divulgados em eventos internacionais, além da maioria de suas exportações serem obtidas sob encomenda. A indústria chinesa tem se destacado no segmento de mercado de calçados inferiores, isto é, de preços mais baixos e grandes volumes de produção (GORINI, 1998 apud FRANCISCHINI; AZEVEDO, 2003).

O parque calçadista brasileiro contempla hoje mais de 8.400 indústrias. O setor possui bastante relevância na geração de empregos, já que, em 2004, de acordo com dados da Relação Anual de Informações Sociais - RAIS, que contempla apenas empresas formais,

FERNANDO LUIZ EMERENCIANO VIANA E ROBERTO EDNÍSIO VASCONCELOS ROCHA

Revista FFBusiness • Fortaleza • v. 4 • n. 4 • p. 11-24 • dez. 2007

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cerca de 310 mil trabalhadores atuavam diretamente nessa indústria. Destacam-se como maiores empregadores os estados do Rio Grande do Sul (143 mil empregos), São Paulo (57 mil empregos), Ceará (46 mil empregos), Minas Gerais (23 mil empregos) e Bahia (20 mil empregos). No Nordeste, há de se ressaltar ainda a importância da Paraíba, que, em 2004, possuía cerca de 7 mil empregos formais no setor de calçados (VIANA; ROCHA, 2007).

O objetivo deste trabalho é avaliar os gargalos logísticos e a gestão da cadeia de suprimentos do calçado de couro na Região Nordeste, destacando-se as tendências e cenários vislumbrados com seus consequentes desafios a serem superados.

1. A INDÚSTRIA DE CALÇADOS DO NORDESTEObserva-se que, historicamente, até o início da década de noventa, a indústria nordestina

de calçados era predominantemente artesanal ou firmada em pequenas unidades industriais, aproveitando-se do couro produzido na região. O Estado nordestino que apresenta um maior enraizamento histórico do setor é a Paraíba, onde a grande comercialização de couros no interior do Estado, especialmente em Campina Grande, contribui para o surgimento da indústria de processamento de couros, já no início dos anos vinte do século passado, bem como o surgimento de uma indústria calçadista com predominância de pequenas empresas, mas com fortes raízes locais.

De acordo com Diniz e Basques (2004), a indústria de calçados nordestina se mostrava pouco competitiva. No ano de 1986, por exemplo, apenas 3% da produção brasileira de calçados era proveniente do Nordeste. Até então, a produção brasileira era fortemente concentrada nas regiões Sudeste (Franca e Birigui, ambas em São Paulo - SP) e Sul (Vale dos Sinos no Rio Grande do Sul - RS). As grandes regiões produtoras se consolidaram nas décadas de sessenta e setenta, em função da expansão do mercado nacional e do crescimento das exportações. O Brasil se tornou um grande produtor, atrás apenas da China e da Índia, bem como um grande exportador para o mercado americano. Nesse mesmo período, surgiu e se expandiu a produção de calçados de plástico e de matérias-primas sintéticas, o que permitiu reduzir o preço dos calçados e generalizar o consumo.

Observa-se que, no final da década de oitenta, ocorreu uma mudança importante no cenário internacional de calçados com a grande expansão das importações chinesas para o mercado americano. Enquanto as exportações brasileiras de calçados para os Estados Unidos - EUA, em volume, apresentaram queda no período de 1983 a 2004, reduzindo de 130 milhões de pares para 99 milhões de pares, as exportações chinesas apresentaram um crescimento vertiginoso, pois era praticamente inexistente no início da década de oitenta, atingindo 1.772 bilhões de pares em 2004. Segundo Santos et al. (2002), constituíram-se fatores primordiais para o abalo da competitividade da produção nacional de calçados no início da década de noventa:

• Política econômica adotada, especialmente de câmbio e de juros;• Crescimento mais lento das importações americanas de calçados;• Aumento da concorrência externa, com a entrada de novos países ofertantes

no mercado internacional, dispondo de vantagens competitivas superiores às brasileiras.

GARGALOS LOGÍSTICOS E GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTO NA INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE COURO DA REGIÃO NORDESTE

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Na visão de Diniz e Basques (2004), em função desse quadro estrutural e do grande potencial de expansão do mercado interno de calçados populares (plástico), iniciou-se o processo de transferência ou construção de novas unidades produtoras no Nordeste por grandes grupos calçadistas de São Paulo e do Rio Grande do Sul, estimulado e determinado pela existência de incentivos fiscais e do menor custo do trabalho na Região. Entre 1986 e 2000, a participação do Nordeste na produção brasileira de calçados subiu de 3% para 20%, enquanto que a paulista caiu de 41% para 27%, e a gaúcha, de 55% para 52%.

Percebe-se a maior relevância dos Estados do Ceará, Bahia e Paraíba no Nordeste, em relação aos empregos na indústria de calçados da Região. Diferentemente do que acontece nos maiores polos brasileiros produtores de calçados (Vale dos Sinos – RS, Franca – SP e Birigui - SP), onde há uma certa especialização ou mesmo um segmento em destaque (calçados masculinos, calçados femininos e calçados infantis, nessa ordem), o perfil da produção nos principais estados produtores do Nordeste é heterogêneo, o que é normal em regiões que se encontram em fase inicial de formação, especialmente devido às políticas traçadas objetivarem o desenvolvimento regional, e não a especialização.

Os principais polos produtores de calçados do Nordeste são os polos de Itapetinga e Jequié, na Bahia, Região Metropolitana de Fortaleza, Sobral e Cariri, no Ceará, e Grande João Pessoa, Patos e Campina Grande, na Paraíba.

Para ratificar a maior importância relativa dos estados supracitados, torna-se interessante a análise da tabela 1, que apresenta a evolução do Valor da Transformação Industrial (VTI) nos estados nordestinos, em relação à preparação do couro e fabricação de artefatos de couro, artigos de viagem e calçados.

TAbELA 1VTI para os estados nordestinos no período 1999-2003 por R$ 1 mil

Estado 1999 2000 2001 2002 2003Ceará 345.537 497.079 670.181 879.100 1.172.579Bahia 84.189 154.801 216.249 257.097 338.212Paraíba 168.259 188.746 200.052 257.944 279.522Pernambuco 39.084 33.459 26.313 41.660 46.284Rio Grande do Norte 13.552 19.983 26.848 31.097 38.057Sergipe 5.633 3.610 4.524 11.008 27.099Piauí 8.750 13.521 13441 15.460 13.016Maranhão 3.098 2.158 2.280 5.759 4.820Alagoas 636 323 574 893 551

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2005)

Pelos dados da tabela, observa-se que, juntos, os Estados do Ceará, Bahia e Paraíba, responderam, em 2003, por cerca de 90% do VTI da CCC na Região.

Uma outra análise que contribui para ressaltar a maior relevância dos três estados para a indústria de calçados nordestina está relacionada com as exportações. Conforme os números apresentados pela ABICALÇADOS (2006), os Estados do Ceará, Bahia e Paraíba foram, juntos, responsáveis por 16% das exportações brasileiras de calçados em 2005, em valor, bem como por 98,0% das exportações nordestinas.

FERNANDO LUIZ EMERENCIANO VIANA E ROBERTO EDNÍSIO VASCONCELOS ROCHA

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2. GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTOO conceito e o papel da logística para a competitividade empresarial têm evoluído,

passando de uma visão isolada dos diversos componentes do sistema logístico (compras, gestão de estoques, distribuição física e transportes) para uma visão integrada, culminando com uma extrapolação dessa visão integrada para além das fronteiras da empresa.

Na análise de Ballou (2007), apesar das definições mais tradicionais (décadas de 1960 e 1970) sugerirem um amplo escopo para a distribuição física e a logística, o foco era na coordenação entre as atividades dentro de cada função, com pouca ênfase na coordenação com outras funções dentro da firma ou entre membros de um canal de distribuição. A limitada aplicação de um amplo escopo provavelmente ocorria devido às limitações tecnológicas dos sistemas de informação disponíveis à época e à dificuldade de gerenciamento integrado de diferentes áreas de responsabilidade.

Nos dias atuais, predomina o conceito de Gestão da Cadeia de Suprimento ou Supply Chain Management (SCM). De acordo com Lambert, Cooper e Pagh (1998), um conceito adequado de gestão da cadeia de suprimento é aquele desenvolvido em 1994 e modificado em 1998 pelos participantes do Fórum Global de Cadeia de Suprimento: SCM é a integração de processos chaves de negócios do usuário final até os fornecedores originais, que proveem produtos, serviços e informações que adicionam valor para os consumidores e outros stakeholders.

De acordo com Fleury; Wanke e Figueiredo (2000), o conceito de gerenciamento da cadeia de suprimento não é uma simples extensão da logística estratégica, pois inclui processos de negócios que extrapolam seus limites de atuação e a necessidade de integração de processos na cadeia de suprimentos, como o desenvolvimento de novos produtos, compras e desenvolvimento de fornecedores. O SCM excede as fronteiras organizacionais, levando em consideração tanto os trade-offs internos quanto os interorganizacionais para estruturar o canal de distribuição mais adequado. Lambert, Stock e Vantine (1998) ressaltam que o SCM pode ser caracterizado a partir da análise de algumas etapas, internas ou entre empresas, tais como a administração de fornecedores e transportes.

A cadeia de suprimentos como um todo adiciona valor ao produto ou serviço que será disponibilizado para o cliente final, ainda que cada empresa pertencente à cadeia tenha seus clientes diretos. Assim, o objetivo do SCM é maximizar a interação entre todas as etapas ou elos da cadeia, a fim de responder ao cliente final da maneira mais eficiente possível, bem como minimizar os recursos necessários que proporcionem o nível exigido de serviço ao cliente em um determinado segmento de mercado, tornando os processos de negócio mais eficientes e eficazes, a partir de: redução de custos, de níveis de estoque, melhoria da qualidade e criação de vantagem competitiva e valor para a cadeia de suprimento (MAIA; CERRA; ALVES FILHO, 2005).

Lambert e Cooper (2000) apontam que o SCM bem-sucedido requer um inter-relacionamento entre cadeias de fornecimento e não simplesmente entre empresas (B2B ou B2C), daí a integração do marketing e a logística deve ser realizada em todos os estágios do produto/serviço conforme as atribuições de cada departamento compartilhando e retornando informações, possibilitando a melhoria da adequação dos produtos e a redução dos custos de manufatura.

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GARGALOS LOGÍSTICOS E GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTO NA INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE COURO DA REGIÃO NORDESTE

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Na visão de Cigolini; Cozzi e Perona (2004), o SCM leva as empresas a cooperar com o objetivo comum de aumentar as vendas e a lucratividade de toda a cadeia, mais do que competir por uma maior fatia do mercado ou por um lucro específico. Uma maior aceitação desse conceito tem levado a mudanças significativas nas maneiras de se fazer negócio.

O SCM é visto como o gerenciamento do fluxo de produtos entre múltiplas empresas, enquanto a logística é vista como o gerenciamento das atividades ligadas ao fluxo de produtos dentro da firma. Uma visão contemporânea do SCM é pensada como a gestão de um conjunto de processos, sendo que um processo representa um conjunto de atividades relevantes para o atendimento de um objetivo específico, como o atendimento de um pedido (BALLOU, 2007).

Segundo Lambert, Cooper e Pagh (1998), existem oito subprocessos chaves para o SCM, os quais tomados em conjunto representam inteiramente o SCM:

• Gestão do relacionamento com o cliente;• Gestão de serviço ao cliente;• Gestão da demanda;• Cumprimento de ordens;• Gestão do fluxo de manufatura;• Gestão do relacionamento com fornecedores;• Desenvolvimento e comercialização de produtos;• Gestão de retornos.Com relação ao uso atual do conceito de gestão da cadeia de suprimento, Ballou

(2007) apresenta algumas conclusões importantes que servem para se ter uma ideia mais geral sobre o tema: (i) o SCM está interessado no aproveitamento das oportunidades relacionadas com a gestão do fluxo de produtos e de processos funcionais e entre membros da cadeia de suprimento; (ii) a logística é agora vista como um subconjunto do SCM; (iii) compras e gestão da produção estão agora incluídas dentro do escopo do SCM; (iv) muitas áreas funcionais da firma estão abrangidas pelo SCM, o que pode ser perigoso, pois uma visão muito ampla pode fazer com que o SCM perca sua identidade e seu foco; (v) apesar do SCM promover a coordenação, a integração, a formação de relacionamentos e a colaboração através de toda a cadeia de suprimento, isso atualmente tem ocorrido em grau limitado, geralmente entre as firmas e seus fornecedores de 1° nível.

As considerações supracitadas levam a crer que, apesar dos vários benefícios que podem ser alcançados pela implementação do SCM, a sua implementação efetiva não é algo trivial. Na visão de Fleury (1999), a complexidade da implantação do conceito de SCM é um dos fatores que explica esse fato; não são poucos os desafios associados à implementação do SCM, envolvendo questões internas da empresa, assim como o gerenciamento de atividades relacionadas à cadeia como um todo, que vão além das fronteiras da empresa.

A implementação do gerenciamento da cadeia de suprimento apresenta alguns fatores críticos de sucesso, destacados por vários autores (FLEURY, 1999; COOPER; LAMBERT e PAGH, 1997; LAMBERT, COOPER e PAGH, 1998). Entre esses fatores, pode-se destacar:

FERNANDO LUIZ EMERENCIANO VIANA E ROBERTO EDNÍSIO VASCONCELOS ROCHA

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• Complexidade do conceito e visão estratégica integrada → Os desafios que se apresentam são tanto internos como externos. Os resultados buscados pelo SCM não serão completamente alcançados se cada empresa pretende otimizar seus próprios resultados, em detrimento da integração de seus objetivos e atividades com os das organizações parceiras.

• Planejamento e reengenharia da cadeia de suprimentos → Deve-se identificar o tipo de parceiro que é crítico nas atividades que adicionam valor à cadeia e determinar um número gerenciável de parceiros para os recursos disponíveis; entender a dimensão estrutural da rede para analisar e modelar as ligações da cadeia de suprimento; entender as características das ligações entre processos na cadeia de suprimento.

• Fatores gerenciais e comportamentais → Nove componentes gerenciais devem receber atenção especial por parte das empresas que enfrentam o desafio de implementar o SCM: planejamento e controle de operações, estrutura de trabalho e de atividades, estrutura organizacional, estrutura do fluxo do produto, estrutura do fluxo de comunicação e informação, métodos de gerenciamento, estrutura de poder e liderança, estrutura de riscos e recuperação e cultura e atitudes.

Percebe-se que a integração entre os diversos parceiros de negócios da cadeia de suprimento, bem como o fluxo efetivo de informações entre esses componentes são elementos-chaves para o sucesso da implementação do SCM.

Acerca da integração na cadeia de suprimento, Machado e Barroso (2004) mostram as características da integração de acordo com os níveis de interação entre os atores, deixando claro que o crescimento do foco direcionado ao cliente é proporcional ao crescimento da integração na cadeia (ver quadro 1).

Níveis de integração Características da cadeia de suprimento

Independência funcional Planejamento reativo a curto prazo; individualismo; estoques elevados; vulnerabilidade a mudanças no mercado.

Integração funcional Ênfase no custo e não no desempenho; foco nos produtos internos; reatividade ao cliente; alguns balanços internos.

Integração internaTodos os processos de trabalho são integrados; planejamento do fornecimento de cotas voltadas para o cliente; EDI muito utilizado; ainda não há reatividade ao cliente.

Integração externa Integração com todos os fornecedores; foco no cliente; fluxos de materiais sincronizados.

Quadro 1 – Integração da cadeia de suprimento. Fonte: Machado e Barroso (2004).

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A colaboração e a coordenação serão os elementos-chave para que sejam alcançados os benefícios do SCM. Quando ambos os parceiros que se relacionam numa cadeia de suprimento obtêm ganhos semelhantes devido a suas ações de cooperação, os benefícios ficam mais próximos de serem conseguidos e o relacionamento permanece intacto. A colaboração entre os membros da cadeia é o coração do SCM e a chave de seu sucesso futuro (BALLOU, 2007). Isso requer:

• Compartilhamento de informações e espírito de cooperação;• Sistemas de informação com fronteiras estendidas;• Métricas interorganizacionais;• Métodos para identificação dos benefícios;• Maneiras de compartilhar os possíveis danos da cooperação.Percebe-se que a gestão da cadeia de suprimento constitui um tema de grande

relevância, cuja discussão tem permeado fortemente os ambientes acadêmico e empresarial. Entretanto, a implementação do SCM apresenta algumas barreiras e dificuldades, o que tem gerado novas discussões acerca das tendências existentes para que a gestão da cadeia de suprimento possa se constituir efetivamente para a competitividade empresarial.

Consoante Ballou (2007), a visão contemporânea é que o SCM é uma nova fronteira para a geração de demanda, constituindo uma verdadeira arma competitiva. A nova ênfase deverá ser no projeto e na operação da cadeia de suprimento para elevar as receitas da empresa de modo a maximizar a contribuição para o lucro. Essa visão substitui o frequentemente utilizado objetivo de minimização dos custos da cadeia de suprimento.

Ademais, as maiores mudanças relacionadas ao SCM no futuro próximo são enumeradas por Ballou (2007):

• Uma estratégia de geração de receita para a cadeia de suprimento será tão importante quanto uma estratégia para redução de custos;

• Os benefícios da expansão das fronteiras organizacionais do SCM podem ser fáceis para identificar, mas serão difíceis de realizar;

• A coordenação e a colaboração, em conjunto com a confiança, serão os elementos mais importantes para a realização das oportunidades de expansão das fronteiras organizacionais;

• O compartilhamento de informações entre os membros da cadeia deve continuar com o avanço das tecnologias, podendo ser chamado coordenação, compromisso e cooperação;

• A necessidade de utilização de métricas para identificar os benefícios da cadeia de suprimento;

• Os métodos para o compartilhamento dos benefícios necessitam de melhor definição e refinamento.

Aumentando o escopo de impacto das tendências, Bowersox, Closs e Cooper (2000) relacionam as chamadas megatendências que mudarão as bases dos relacionamentos de negócios, bem como promoverão a gestão do valor adicionado, com grande relevância

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para o SCM, quais sejam: (a) a colaboração será a mais estratégica habilidade nas cadeias de suprimento estendidas; (b) serviço e suporte irão se tornar mais importantes do que o próprio produto fornecido; (c) as empresas proverão suas capacidades de prestação de serviços para uma melhor adaptação a ambientes turbulentos e; (d) ativos e funções que não fazem parte do centro do valor de entrega serão abstraídos.

Se as promessas do SCM forem realizadas, um sistema contábil interorganizacional será necessário, assim como métricas apropriadas para o monitoramento dos benefícios compartilhados. Da mesma forma, os gestores da cadeia de suprimento necessitarão de treinamento em técnicas colaborativas, relacionamento, construção de confiança e ferramentas para formar compromissos, o que requererá maiores esforços dos acadêmicos, pesquisadores e comunidades de negócios, podendo trazer recompensas substanciais.

3. METODOLOGIAConsiderando as definições de Vergara (2004), a presente pesquisa pode ser

classificada, quanto aos fins, como exploratória, já que há pouco conhecimento acumulado e sistematizado sobre a gestão de cadeia de suprimentos na indústria de calçados nordestina e, ao mesmo tempo, como descritiva, já que expõe características de um pequeno grupo de empresas da Região. Quanto aos meios, o trabalho pode ser definido como pesquisa de campo, já que houve aplicação de questionário nas empresas, e pesquisa bibliográfica, onde foram abordadas as principais características da indústria de calçados, bem como se abordou a gestão da cadeia de suprimentos.

O universo da pesquisa foi composto pelas empresas de calçados dos Estados do Ceará, Bahia e Paraíba, que se apresentam como os principais estados produtores de calçados do Nordeste. A amostra é não probabilística, definida por acessibilidade, tendo sido delimitada de forma intencional, selecionando-se empresas do universo predefinido. Além do critério estadual, foram utilizados os seguintes critérios para a seleção das empresas:

→Sejam fabricantes de calçados de couro natural;→Tenham papel de destaque setorial, reconhecido por formadores de opinião do

setor nos diversos estados produtores.Como instrumento de coleta de dados, foi utilizado um roteiro de entrevista, elaborado

a partir da fundamentação teórica, no sentido de identificar, do ponto de vista das empresas, quais seriam os gargalos do setor com relação à logística e ao gerenciamento da cadeia de suprimentos. Além disso, questões relativas às perspectivas e tendências do setor, suficiência e adequação de crédito, tecnologia utilizada e qualificação de mão de obra foram incluídas de modo a propiciar uma análise mais bem fundamentada. Os sujeitos da pesquisa foram diretores ou gerentes das empresas diretamente ligados à função produção, aos quais foram encaminhados os questionários.

Os questionários foram enviados, por correio eletrônico, para um total de doze empresas que compunham a amostra, sendo quatro empresas de cada estado. Do total enviado, apenas seis questionários retornaram, sendo quatro de empresas do Ceará, uma da Paraíba e uma da Bahia.

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Para avaliação dos questionários foram utilizados dois tipos de análises: A análise léxica em que se passou da análise da literatura e da realidade de atuação

das empresas calçadistas para as respostas do questionário; eA análise de conteúdo em que foram avaliadas todas as respostas para se ter uma ideia

sobre a realidade de todas as empresas pesquisadas. Os dados coletados subsidiaram a elaboração dos tópicos seguintes.

4. RESULTADOS

Considerando as respostas dadas pelos sujeitos, observou-se certa convergência de opiniões das empresas no que diz respeito aos diversos aspectos abordados, inerentes à logística e à gestão da cadeia de suprimento da indústria de calçados do Nordeste.

Os principais problemas identificados pelas empresas se dão no âmbito do adensamento da cadeia produtiva de calçados na Região e na infraestrutura de transportes. Foram citados aspectos relacionados com a qualificação e capacitação de mão de obra, tecnologia e mercado internacional.

A ausência de fornecedores dos principais insumos, especialmente o couro, na Região, contribui para o aumento do custo final e sua consequente perda de competitividade. Foi verificada a necessidade de atração de elos faltantes da cadeia para o Nordeste, tais como fornecedores de matérias-primas, componentes e acessórios, notadamente as empresas acabadoras de couro para desenvolvimento de novos produtos, já que o Brasil possui o maior rebanho comercial do mundo.

Aliado a esse movimento existe um consenso entre os entrevistados que há a necessidade de taxação do couro tipo wet blue¸ aquele que se encontra no primeiro estágio de processamento, para evitar o grande fluxo de exportação desse produto e, consequentemente, o abastecimento dos mercados concorrentes, cujos mais significativos são a Itália e Hong Kong.

Observou-se que existe uma disputa de preços entre a indústria de couro e a de calçados, que nem sempre entram em acordo para viabilizar o melhor negócio entre ambas, daí surge o estímulo para a exportação desse tipo de couro. Percebeu-se um isolamento por partes das empresas, não existindo associações que criem uma maior integração entre produtores e mercado. Esses aspectos mostram a total ausência de integração e dos conceitos básicos do gerenciamento da cadeia de suprimentos na indústria nordestina de calçados.

Devido à falta de empresas desenvolvedoras de novos tipos de couros no Nordeste, a maioria das empresas que têm origem nas regiões Sudeste e Sul mantém suas áreas de desenvolvimento de produtos (design) na origem, concentrando nas filiais do Nordeste apenas a produção. Além da presença de fornecedores e empresas desenvolvedoras de couros, necessita-se de um maior apoio das universidades e centros tecnológicos na inserção em suas grades curriculares, ou mesmo a criação de cursos de extensão na área de design para indústrias de moda, como calçados, móveis e confecções. Cita-se o modelo

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made in Italy, que sobrevive apenas pelo design, já que boa parte da produção daquele país foi deslocada para outros países, como a Romênia.

A predominância do design em indústrias italianas, a exemplo dos óculos, é proporcionada pela dimensão ótima de escala de produção, pelas vantagens da especialização de pequenas empresas e custos locais de transação, além da possibilidade de terceirização de fornecedores locais (NASSIMBENI, 2003).

Em detrimento do pequeno número de profissionais em design, estes acabam por se tornarem generalistas, trabalhando com diferentes produtos como chuteiras, tênis e sapatos, perdendo a capacidade de aprofundamento e de inovação em produtos e mercados específicos.

A proximidade entre a indústria de bens de capital (matrizarias, máquinas e equipamentos) e a indústria calçadista possibilitaria um desenvolvimento simultâneo desta com os modelos dos calçados, podendo, inclusive, haver uma maior interação de empresas da Região com a cidade de Vigevanno, distrito industrial da Terceira Itália que é o maior produtor de máquinas para calçados na Europa, tendo também destaque na produção de calçados femininos, o que facilitaria o acesso às tecnologias de ponta. A situação atual do parque fabril de pequenas empresas formadas por capital tipicamente nordestino, apresenta empresas que, geralmente, adquirem máquinas usadas, defeituosas e de vida útil comprometida.

A infraestrutura de transportes tem se tornado um grande obstáculo para o desenvolvimento da cadeia, tanto na logística de suprimentos, como na logística de distribuição das empresas calçadistas. Como destaques negativos ressaltam-se as condições precárias das rodovias, bem como a necessidade de duplicação de algumas rodovias federais (BRs). Outro problema destacado foi a baixa frequência e regularidade dos navios partindo dos principais portos do Nordeste (foram citados, especificamente, os portos de Suape - PE e Pecém - CE) para os EUA, ou mesmo a concentração em apenas um porto, gerando um aumento nos custos dos contratos de câmbio. Para exemplificar o problema, cita-se o caso de uma empresa da Paraíba, cuja melhor opção para exportação é utilizar o Porto de Suape, distante cerca de 120 km da sua unidade industrial. Entretanto, já houve necessidade de, em alguns casos, utilizar o Porto de Pecém, distante cerca de 800 km, devido à impossibilidade de esperar pelo próximo navio que sairia de Suape.

Outro problema iminente é a possível finalização das operações em Pecém de uma grande companhia marítima que possui linhas regulares para os EUA, o que prejudicaria as empresas do Ceará, que teriam de arcar com os custos de transporte terrestre até o Porto de Suape.

Para as empresas que necessitam do envio de cargas exportadas através de transporte aéreo, a única opção de embarque é o Aeroporto de Viracopos, em Campinas-SP, gerando custos desnecessários e perda de tempo.

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CONSIDEraÇõES FINAIS

Percebe-se que a tendência é a continuidade da migração da indústria de calçados para a Região Nordeste, em virtude de sua proximidade com os principais mercados consumidores (Leste dos EUA e Europa), do baixo custo de produção e da facilidade de aprendizagem de sua mão de obra, mesmo com o possível fim das políticas de incentivos fiscais dos estados.

Tendo em vista as diversas considerações supracitadas, percebe-se a necessidade de se suplantar alguns desafios inerentes à indústria de calçados nordestina destacando-se os seguintes:

Buscar maior integração ao longo da cadeia produtiva, principalmente nas relações entre os produtores de couros e de calçados;

Aumentar investimentos em desenvolvimento tecnológico, design e marca própria no mercado internacional;

Prover um maior adensamento da cadeia produtiva nos estados nordestinos;A partir da presença de todos os elos da cadeia produtiva na Região, aplicar os conceitos

do gerenciamento da cadeia de suprimentos (VIANA; ROCHA, 2006);Resolver os problemas de infraestrutura de transportes, se possível através de parcerias

público-privadas (PPP’s).A superação dos desafios torna-se fundamental para que a indústria de calçados

nordestina, cada vez mais sujeita à concorrência internacional acirrada, possa consolidar sua competitividade e sua sobrevivência no cenário que se configura, tendo em vista a importância que essa indústria assume para a economia regional (VIANA; ROCHA, 2006).

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ASPECTOS ERGONÔMICOS NA UTILIZAÇÃO DAS TÉCNICAS DE PRODUÇÃO ENXUTA: UMA CONTRIbUIÇÃO

PAra A MELHORIA DO DESEMPENHO GLObAL DO SISTEMA PRODUTIVO

Ergonomic Aspects in the Use of Techniques of Lean Production: A Contribution to the Performance Improvement of the

Global Production System

Sérgio José barbosa EliasFaculdade Farias Brito – FFB / Universidade Federal do Ceará – UFC

Eugenio MerinoUniversidade Federal de Santa Catarina - UFSC

REsumOEste artigo faz uma análise e propõe uma reflexão acerca dos aspectos ergonômicos

envolvidos na aplicação das técnicas de produção enxuta. A produção enxuta é considerada um modelo de produção que possibilita elevados níveis de produtividade e qualidade, por meio da eliminação dos desperdícios do processo produtivo. A ergonomia objetiva melhorar o bem-estar humano e o desempenho global do sistema, fazendo uso para isso de teorias, princípios e métodos. A produção enxuta representa uma mudança do sistema tradicional de produção, que é baseado no taylorismo/fordismo, para o toyotismo, numa referência ao Sistema Toyota de Produção. Para que esse sistema seja efetivado são utilizadas técnicas, tais como kanban, layout celular e setup rápido. Este trabalho analisa como essas técnicas podem ser potencializadas a partir dos conhecimentos advindos da ergonomia. Além disso, busca-se que sejam evitados danos à saúde e segurança dos operadores, contribuindo assim com a melhoria do desempenho do processo de uma forma global. Inicialmente é feita uma revisão bibliográfica sobre produção enxuta e ergonomia, e na sequência, são apresentadas as técnicas de produção enxuta e os aspectos ergonômicos envolvidos.PALAVraS-CHAVE: Ergonomia, Produção Enxuta, Produtividade.

ABSTRACTThis paper proposes a reflection about the ergonomic aspects involved in the application of

lean production techniques. Lean production is considered a production model that makes possible high quality and productivity level, by the elimination of production process losses. Ergonomics has the objective of human welfare and the system global performance by the use of theories, principles and methods. Lean production represents a change in traditional production system, which is

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based in Taylor and Ford concepts, toward the Toyota Production System. Toyota System uses techniques such as kanban, cell layout and fast setup. This paper analyses how these techniques can be improved by using ergonomic knowledge. Moreover, the target is to avoid damages to the operators’ health and safety, contributing this way to have a better performance of the process. At the beginning there is a bibliographic revision of lean production and ergonomics followed by a presentation of the lean production techniques and ergonomic aspects involved.

KEYWORDS: Ergonomics, Lean Production, Productivity.

INTRODUÇÃOA produção enxuta, ou lean production, representa um novo paradigma em termos de

sistema produtivo capaz de proporcionar elevados níveis de produtividade e qualidade. Ela está baseada na eliminação dos desperdícios que ocorrem no processo produtivo: superprodução, espera, transporte, processamento incorreto, excesso de estoque, movimento desnecessário, defeitos e desperdícios da criatividade dos funcionários (LIKER, 2005).

A ergonomia é uma disciplina científica que estuda as interações dos homens com outros elementos do sistema, fazendo aplicações de teoria, princípios e métodos de projeto, com o objetivo de melhorar o bem-estar humano e o desempenho global do sistema (IEA, 2007). De uma forma mais livre, pode-se dizer que ergonomia é a adequação do ambiente de trabalho ao homem. Nesse sentido, possui um campo de abrangência bastante amplo, que inclui diversas situações da atividade humana, tais como: posturas, movimentos, fluxo de informações, postos de trabalho, cognição, controles, formas de organização do trabalho, fatores humanos, entre outros (IIDA, 2005).

Para que a produção enxuta possa ser efetivada é necessário que sejam utilizadas técnicas, ou ferramentas, tais como kanban (cartão que indica a necessidade de produção ou movimentação de peças), célula de manufatura (arranjo físico que possibilita a produção de peças ou produtos completos em uma área focalizada), dispositivos a prova de erros (poka-yoke), setup rápido (troca de ferramentas de forma rápida para possibilitar a produção de uma maior variedade de produtos de uma forma econômica), entre outras (CORRÊA e CORRÊA, 2004).

A utilização das técnicas e ferramentas da produção enxuta envolve aspectos ergonômicos que devem ser observados para uma maior possibilidade de êxito da implantação. Por exemplo, o kanban é uma ferramenta que transfere para o executor da tarefa no piso de fábrica a decisão sobre o que produzir, em que quantidade e em qual momento. Para isso, o sistema faz uso de quadros ou algo semelhante para informar as necessidades aos que executam a produção (operadores). Cabe ao operador identificar a demanda just in time e tomar a ação correspondente. Nesse sentido, pode-se verificar que questões ergonômicas estão presentes nesse exemplo: informação visual e fatores cognitivos ligados à decisão. Na célula de produção, em comparação com o arranjo físico funcional, o operador frequentemente assume a operação de mais de uma máquina e trabalha muitas vezes de pé para que possa se deslocar de uma máquina à outra, além de se responsabilizar pela qualidade de peças e atendimento de prazos, constituindo-se assim

SéRGIO JOSé BARBOSA ELIAS E EUGENIO MERINO

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um enriquecimento do cargo. Nesse caso, estão presentes aspectos ergonômicos ligados à maior carga mental, diminuição da monotonia, possibilidade do aumento do estresse pelo maior nível de responsabilidade que fica com o operário. Considerações semelhantes podem ser feitas em relação às outras ferramentas da produção enxuta.

Em virtude dos resultados que pode proporcionar, a produção enxuta tem sido largamente utilizada como um modelo de produção, e os aspectos ergonômicos envolvidos na aplicação desse modelo investigados por parte de alguns autores, tal como Kmita et. al. (2003) que abordaram por meio de um estudo de caso em uma fundição o relacionamento entre as sete perdas que embasam a filosofia do Sistema Toyota de Produção e a ergonomia, identificando que essas perdas significam também perdas ergonômicas. Essa contextualização motivou a realização desta pesquisa, que procura agregar essas abordagens em um mesmo artigo. Esta pesquisa busca responder à seguinte questão: quais aspectos ergonômicos estão envolvidos na aplicação das técnicas da produção enxuta e como a ergonomia pode potencializar a aplicação bem-sucedida dessas técnicas? O pressuposto da pesquisa é que a ergonomia auxilia na obtenção de melhores resultados para o desempenho global do sistema produtivo, em especial no que se refere aos aspectos humanos do trabalho.

Este artigo tem como objetivo geral apresentar as preocupações ergonômicas que podem estar presentes na utilização das técnicas de produção de enxuta, e propor uma discussão sobre as ações ergonômicas que podem ser realizadas para que as aplicações dessas técnicas obtenham melhores resultados e não tragam danos à saúde dos trabalhadores.

Sob o aspecto de seus objetivos, este artigo se caracteriza como uma pesquisa descritiva, e sob o ponto de vista dos critérios técnicos, como uma pesquisa bibliográfica (GIL, 1991). A pesquisa bibliográfica foi feita a partir de publicações nas áreas de ergonomia e produção enxuta. Foram consideradas como variáveis independentes da pesquisa as técnicas de produção enxuta e os aspectos ergonômicos envolvidos que conduzem a um melhor desempenho do sistema produtivo, que é a variável dependente. Foram exploradas as relações entre essas variáveis por meio da identificação e explicação das ferramentas de produção enxuta e, para cada uma delas, destacados os aspectos ergonômicos mais relevantes pertinentes, além de como o aprimoramento ergonômico poderá contribuir para a implantação bem-sucedida da lean manufacturing.

1. REVISÃO TEóRICA1.1. PRODUÇÃO ENXUTAO berço da produção enxuta no mundo foi, nos anos 50, a fábrica de automóveis da

Toyota, no Japão. Seu principal idealizador foi o engenheiro dessa mesma fábrica, Taiichi Onho. A Toyota veio a chamar essa forma de abordar a produção de Sistema Toyota de Produção.

A Produção Enxuta objetiva combater os desperdícios (ou muda, em japonês) que, segundo Ohno, caracterizavam o sistema de produção preconizado por Henry Ford.

ASPECTOS ERGONÔMICOS NA UTILIZAÇÃO DAS TéCNICAS DE PRODUÇÃO ENXUTA: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A MELHORIA DO DESEMPENHO GLOBAL DO SISTEMA PRODUTIVO

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Ford foi o criador, em 1914, da linha de montagem móvel e mecanizada, que passou a ser o modelo de produção de referência até então, em razão da drástica melhoria de produtividade que proporcionava. Estava então instituído o modelo Fordista de produção, que passou a se chamar de produção em massa. O Ford modelo T foi o primeiro automóvel produzido com esse conceito produtivo.

Ohno (1997) estabelece como passo preliminar para a aplicação do Sistema Toyota de Produção a identificação e eliminação dos desperdícios (ou perdas): de superprodução de mercadorias desnecessárias; de espera, dos funcionários pelo equipamento de processamento para finalizar o trabalho ou por uma atividade anterior; em transporte desnecessário de mercadorias; do processamento desnecessário, devido ao projeto inadequado de ferramentas e produtos; de estoque à espera de processamento ou consumo; de movimento desnecessário de pessoas; de produzir produtos defeituosos. Hoje em dia fala-se também que um dos maiores desperdícios é não utilizar a criatividade das pessoas que trabalham na organização (LIKER, 2005).

Desperdício significa qualquer atividade que absorve recursos mas que não cria valor. Valor significa a capacidade de oferecer um produto/serviço no momento certo a um preço adequado, conforme definido pelo cliente. A base da produção enxuta é, uma vez eliminados os desperdícios, reduzir os custos de produção e maximizar a satisfação do cliente, ou seja, do valor agregado (WOMACK e JONES, 2004).

Para a eliminação dos desperdícios o Just In Time ( JIT) exerce papel fundamental.O JIT significa produzir o produto certo, no tempo certo e na quantidade correta. Uma vez implementado o JIT integralmente, a empresa pode chegar ao estoque zero, eliminando-se assim uma atividade que não agrega valor (estoque). Para Ohno, os métodos tradicionais de produção não possibilitam uma produção JIT, sendo necessária assim a mudança do paradigma de produção, ou seja, será preciso migrar para a produção enxuta.

Womack e Jones (2004) ampliaram o conceito de produção enxuta para empresa enxuta, onde apresentam os princípios do pensamento enxuto (lean thinking) e relatam casos de sucesso das empresas que o adotaram. A mentalidade enxuta pode ser definida como uma filosofia que requer menores tempos de processamento para entregar produtos ou serviços com qualidade elevada e baixos custos, através da melhoria do fluxo produtivo via eliminação dos desperdícios no fluxo de valor. Essa definição encontra forte semelhança com o pensamento original de OHNO (1997, p.xi) quando se referiu ao que estava sendo feito na Toyota: “Tudo que estamos fazendo agora é olhar a linha do tempo... do momento que o freguês nos entrega um pedido até o ponto em que recebemos o dinheiro. E estamos reduzindo essa linha do tempo removendo os desperdícios que não agregam valor”.

O pensamento enxuto se baseia em cinco princípios: valor; cadeia de valor; fluxo; puxar; perfeição. O valor deve ser especificado a partir do ponto de vista do consumidor final. A cadeia de valor representa as atividades específicas necessárias para projetar, pedir e oferecer um produto específico, da concepção ao lançamento, do pedido à entrega, e da matéria-prima às mãos do cliente. O fluxo significa a realização progressiva de tarefas ao longo da cadeia de valor, que deverá ser sem refugos ou retrofluxos. Puxar a produção significa o oposto da produção tradicional, que é empurrada, ou seja, com a produção

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puxada, nada deve ser produzido pelo fornecedor a montante, sem que o cliente a jusante solicite. A perfeição refere-se à necessidade de se criar um círculo virtuoso permanente de criação de valor e eliminação de desperdício. Essa perfeição pode ser por meio de melhorias contínuas (kaizen) ou de melhorias radicais (kaikaku) (WOMACK E JONES, 2004).

Spear e Bowen (1999) relatam que o desempenho industrial observado com a utilização do Sistema Toyota de Produção tem merecido o esforço de grandes empresas do mundo, no sentido de alcançar resultados semelhantes. Segundo esses autores, o Sistema Toyota de Produção se baseia em quatro regras: 1 – todo o trabalho deve ser altamente especificado em relação ao conteúdo, sequência, tempo e resultado desejado; 2 – toda relação cliente-fornecedor deve ser direta, inequívoca no envio de solicitações e recebimento de respostas; 3 – o caminho percorrido por cada produto deve ser simples e direto; 4 – qualquer melhoria deve ser realizada pelos envolvidos na atividade que está sendo melhorada, de acordo com uma metodologia “científica” e com orientação de um especialista na metodologia.

Para que a produção enxuta possa ser implantada, a fábrica deve adotar algumas técnicas, que juntas, a tornem possível. Essas técnicas são: kanban, manufatura celular, 5 Ss, setup rápido, inspeção autônoma, manutenção produtiva total, dispositivos à prova de erros (poka-yoke), entre outras. Essas técnicas buscam eliminar atividades que não agregam valor. é necessário também o envolvimento total das pessoas, uma vez que os empregados são treinados e motivados para assumir total responsabilidade pelo trabalho que realizam. (SLACK et. al., 2002).

Para que essas técnicas tenham êxito, prega-se o envolvimento total das pessoas, uma vez que os empregados são treinados e motivados para assumir total responsabilidade pelo trabalho que realizam (ibidem).

Os tópicos a seguir trazem uma explicação sucinta de algumas dessas técnicas:Kanban - O kanban é uma palavra japonesa que significa “anotação visível”, mas que

vem sendo traduzida comumente como cartão. O kanban é uma maneira de informar às pessoas envolvidas diretamente com o processo de produção o que deve ser produzido internamente ou fornecido (no caso do relacionamento cliente-fornecedor externo), operacionalizando a produção puxada.

Manufatura celular - A manufatura celular consiste em configurar a fábrica, do ponto de vista do arranjo físico, em um conjunto de postos de trabalho que processam famílias definidas de produtos, através de operações diferentes e sequenciais, a fim de permitir o fluxo contínuo e o emprego flexível da mão de obra, através de operários polivalentes. Tem como uma de suas principais características a flexibilidade.

5S - Os 5 Ss são cinco palavras japonesas: seiri –senso de seleção e de utilidade; seiton – senso de organização; seiso –senso de limpeza; seiketsu – senso de saúde ou zelo; shitsuke – senso de autodisciplina. é uma técnica utilizada para criar um local de trabalho adequado ao controle visual e à produção enxuta.

Setup Rápido - Setup rápido significa a necessidade da troca de ferramentas ser realizada de forma rápida, a fim de que os produtos possam ser produzidos em pequenos lotes, de maneira econômica, e de acordo com as necessidades dos clientes, no momento certo. Shingo (2000) estabeleceu os pressupostos para que o setup rápido seja possível.

Inspeção Autônoma - A inspeção autônoma tem por princípio fundamental que qualidade não se controla, qualidade se faz, ou seja, as inspeções devem ser realizadas pelos próprios operadores, eliminando a dependência de inspeções externas realizadas pelo departamento de controle de qualidade, agilizando assim a produção (SHINGO, 1996).

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Poka-Yoke - Os dispositivos à prova de erro (poka-yoke) são destinados a impedir a ocorrência de defeitos na produção. Há duas maneiras nas quais o poka-yoke pode ser usado para corrigir erros: método de controle - quando o poka-yoke é ativado, a máquina ou a linha de processamento para, de forma que o problema pode ser corrigido; método de advertência – quando o poka-yoke é ativado, um alarme soa, ou uma luz sinaliza, visando alertar o trabalhador (SHINGO, 1996).

Manutenção Produtiva Total - A Manutenção Produtiva Total (MPT) ou TPM (Total Productive Maintenance) implica que os próprios operários tenham responsabilidade por parte da manutenção das máquinas que operam, reduzindo assim a dependência do departamento de manutenção e minimizando a possibilidade do fluxo produtivo ser interrompido, o que é crítico com a produção enxuta, uma vez que ela trabalha com estoques que buscam tender a zero, possuindo desta forma poucas possibilidades de manter a produção em andamento em caso de pane (SLACK et. al. 2002).

Padronização - A padronização é utilizada e forma disciplinada como base para obtenção da qualidade e melhoria contínua do sistema. Busca-se encontrar o equilíbrio entre indicar procedimentos para que os operadores sigam fielmente e ao mesmo tempo dar-lhes liberdade para promover as melhorias para que se atinjam metas desafiadoras (LIKER, 2005).

A produção enxuta tem sua aplicabilidade mais evidente nas indústrias que produzem de acordo com processos repetitivos em lote, onde há uma produção de produtos variados em lotes, que se repetem. São exemplos clássicos as metalúrgicas, fábricas de eletrodomésticos e confecções, entre outros.

1.2 ERGONOMIA1.2.A CONSIDEraÇõES GEraISOs domínios de especialização da ergonomia são assim classificados (IEA, 2007):• Ergonomia física: se refere às características da anatomia humana, antropometria,

fisiologia e biomecânica e sua relação com a atividade física. Envolve aspectos tais como a postura no trabalho, manuseio de materiais, movimentos repetitivos, DORT etc;

• Ergonomia cognitiva: se refere aos processos mentais, tais como percepção, memória, raciocínio e resposta motora. Envolve aspectos tais como carga mental de trabalho, tomada de decisão, performance especializada, interação homem-computador, estresse, entre outros;

Ergonomia organizacional: se refere à otimização de sistemas sociotécnicos, incluindo suas estruturas organizacionais, políticas e processos. Envolve aspectos como comunicações, projetos de trabalho, trabalho em grupo, gestão participativa, entre outros.

Sob o aspecto da contribuição ergonômica, de acordo com a ocasião em que ela é feita, a ergonomia é classificada em ergonomia de concepção, de correção e de conscientização (WISNER, 1987 apud IIDA, 2005). A de concepção ocorre na fase inicial de projeto do produto, da máquina ou ambiente. Esta é a melhor situação para a busca de produtos ou sistemas mais adequados ergonomicamente. A de correção é aplicada em situações já existentes, e atua para resolver problemas que se refletem na segurança, na fadiga

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excessiva, em doenças ou na quantidade e qualidade da produção. A de conscientização busca fazer com que as pessoas que atuam na situação de trabalho, ou seja, os operadores, conheçam, apliquem e atendam às recomendações ergonômicas, até porque elas são as maiores beneficiadas com seu uso.

A ergonomia abrange vários aspectos do trabalho. Assim sendo, há elementos importantes que merecem ser analisados para a melhoria das condições de trabalho (IIDA, 2005):

O homem: características físicas, fisiológicas, psicológicas e sociais; aspectos ligados ao sexo, idade, motivação e treinamento;

A máquina: equipamentos, ferramentas, mobiliário e instalações;O ambiente físico: temperatura, ruído, vibrações, luz, cores, gases etc;Informação: comunicação entre os elementos do sistema;Organização: horários, turnos, formação de equipes;Consequências do trabalho: erros, acidentes, gastos energéticos, fadiga, estresse,

entre outros.A ergonomia tem como foco de estudo o sistema homem – máquina. O homem

interage com o sistema de trabalho, uma máquina, por exemplo, e a partir das informações recebidas toma as decisões para que a máquina obtenha o resultado desejado (DUL e WEERDMEESTER, 2004). A partir dos anos 80, entretanto, passou-se a utilizar uma nova tecnologia da ergonomia – a macroergonomia, que se refere à pesquisa, desenvolvimento e aplicação de uma tecnologia da interface humano-organização. Aspectos como a abordagem sociotécnica da organização e a participação dos trabalhadores fazem parte da abordagem macroergonômica (HENDRICK e KLEINER, 2001 apud GUIMARÃES, 2004 - a).

1.2.b ALGUMAS ÁREAS DE ESTUDO DA ERGONOMIAObjetivando atingir seus objetivos, a ergonomia tem uma ampla área de atuação

que envolve várias áreas do conhecimento e que passam a fazer parte das preocupações da ergonomia, tais como: biomecânica, antropometria, posto de trabalho, manejos e controles, dispositivos de informação (percepção da informação), mostradores, memória humana, ambiente (temperatura, ruídos, vibrações, iluminação, cores), fatores humanos (monotonia, fadiga, motivação), organização do trabalho (humanização, estresse, seleção e treinamento, alocação das equipes, trabalho noturno), segurança do trabalho (incluindo o erro humano) (IIDA, 2005).

Para que se possa ter uma visão das áreas do conhecimento que a ergonomia utiliza para desempenhar o seu papel, nos tópicos seguintes será abordada cada uma das principais áreas de interesse e os aspectos relevantes de cada uma delas.

• Biomecânica OcupacionalA biomecânica estuda as interações entre o trabalho e o homem, sob o ponto de vista dos movimentos músculo-esqueletais envolvidos e suas consequências. Analisa basicamente a questão das posturas corporais e a aplicação de forças. Uma das

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considerações importantes nesse sentido refere-se ao trabalho estático ou dinâmico. O trabalho estático é aquele que exige uma contração contínua dos músculos para manter determinada posição. é o caso dos dentistas, por exemplo. Já o trabalho dinâmico possibilita contrações e relaxamentos alternados dos músculos, sendo bem menos fatigante em relação ao estático. Isso se explica porque no trabalho estático o corpo opera em condições desfavoráveis de irrigação sanguínea, com a demanda superando o suprimento, enquanto há equilíbrio entre demanda e suprimento durante o repouso e o trabalho dinâmico (GRANDJEAN, 1998).Um trabalhador pode executar as tarefas com uma postura deitada, em pé ou sentada.

Não será abordada aqui a postura deitada, pois, embora possível, ela é pouco frequente em situações de trabalho. O trabalho na postura sentada exige atividade muscular do dorso e do ventre para manter a posição, e tem um consumo de energia de 3 a 10% maior em relação à posição horizontal. Já a postura de pé, parada, é altamente fatigante porque exige muito trabalho estático da musculatura envolvida para manter essa posição. Com o indivíduo de pé o coração encontra maiores resistências para bombear o sangue para os extremos do corpo. Geralmente há menos fadiga em trabalhos dinâmicos de pé em relação aos parados ou com poucos movimentos (IIDA, 2005).

A postura tem um papel importante para a saúde do trabalhador, uma vez que posturas inadequadas podem provocar dores nos pés, pernas, músculos extensores do dorso, pescoço, ombros, entre outras partes.

O levantamento adequado da carga é um dos importantes aspectos para preservar a saúde do trabalhador. A recomendação básica é que o esforço para levantar a carga seja concentrado nas pernas e não nas costas (que deve ficar reta quando do levantamento da carga), a fim de não causar males à coluna (DUL e WEERDMEESTER, 2004).

• AntropometriaA antropometria trata das medidas físicas do ser humano. Um problema enfrentado pelos projetistas de máquinas e mobiliário é possibilitar o seu uso de forma confortável por uma ampla faixa da população. Para isso, é necessário que se conheçam as dimensões físicas da população usuária, o que é obtido por meio das tabelas antropométricas. Essas dimensões são fundamentais para o dimensionamento dos postos de trabalho (GRANDJEAN, 1998). • Ergonomia do produtoConforme Sell (2004), produtos ergonomicamente projetados têm certas características que são desejadas por seus usuários, tais como facilidade de uso, e não têm características indesejáveis pelos mesmos, tais como propensão a erros, geração de ruído e exigência de posturas inadequadas para sua operação, entre outras. No caso específico de ferramentas, elas devem ter um peso adequado e um desenho que facilite seu manuseio (pega apropriada) , devendo as mais pesadas ficarem suspensas por contrapeso ou mola (GUIMARÃES, 2004 - b)

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• Posto de TrabalhoA fim de que o trabalho possa ser realizado de forma a não causar prejuízos à saúde do trabalhador, bem como ser executado de acordo com as melhores condições operacionais, o posto de trabalho deve ser projetado ergonomicamente. Nesse sentido, as posturas, alcances e movimentos devem ser concebidos de acordo com as dimensões antropométricas dos trabalhadores, e não apenas levando em conta a “velocidade dos movimentos”. O posto deve ser organizado de tal forma a facilitar a operação. Um dos importantes princípios relacionados ao projeto dos postos de trabalho é a compatibilidade espacial, que sugere a correspondência entre a posição relativa dos controladores e mostradores no espaço. Com isso, são evitados erros nas operações e a carga cognitiva fica reduzida (VIDAL, 2002).• ControlesO acionamento de máquinas e equipamentos é realizado por meio de controles. Uma das preocupações da ergonomia é fazer com que não haja erro no acionamento desses controles, o que pode ocasionar acidentes e prejuízos operacionais (peças defeituosas, por exemplo). Para isso, são recomendados que sejam utilizados dispositivos para facilitar a discriminação dos controles por meio de cores, forma, tamanho, letreiros, textura, localização e modo operacional (IIDA, 2005). • MostradoresOs mostradores constituem as partes da máquina que fornecem informações ao operador sobre sua situação. O tipo de código usado e a forma como a informação é apresentada podem influir na precisão e rapidez da leitura. Incluem-se nessa abordagem o tipo de mostrador mais adequado para a situação em função do tipo de informação envolvido. Fazem parte dessa análise a decisão sobre mostradores analógicos ou digitais, tipo e forma da escala de medição, preocupações com o mascaramento da informação por conta de iluminação artificial, entre outros aspectos (IIDA, 2005).

• Organização da informaçãoA informação deve ser passada para o trabalhador de tal forma que ele a perceba sem dificuldade e no tempo necessário para a correta tomada de decisão, o que pode envolver a memória de curta e/ou longa duração. Isso tem especial importância nas situações que envolvem a tomada de decisão relativa à segurança, mas possui também forte influência na qualidade e produtividade das operações, uma vez que uma decisão errada, tomada a partir de uma informação imprecisa ou inadequada, poderá gerar peças defeituosas ou outros problemas de produção. Nesse sentido, devem ser evitados sinais concorrentes, que são aqueles que fazem com que o operador divida sua atenção entre dois ou mais estímulos relevantes, apresentados ao mesmo tempo. Recomenda-se que, quando a situação merecer, sejam utilizados sinais redundantes, apresentando estímulos diferentes, por exemplo, visual e auditivo, por dois ou mais

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canais diferentes para o mesmo objetivo. é o caso, por exemplo, de máquinas que além do mostrador indicando a temperatura, quando essa atinge um limite perigoso, soam um alarme.Outro aspecto se refere à clareza das informações que são passadas para os operadores,

de tal forma a facilitar a compreensão e evitar erros. Nesse sentido, deve ser dada preferência à informação escrita no lugar da falada, entretanto elas devem estar claras para o nível de compreensão de quem for realizar as operações. O formato e as dimensões das letras e números devem ser estabelecidos de tal forma a facilitar a visibilidade.

As áreas da visão podem ser divididas em três níveis: (1) visão estática, quando os objetos podem ser vistos sem, praticamente, nenhum movimento dos olhos, sendo considerada uma área ótima; (2) movimento dos olhos, quando a visão é conseguida com os movimentos dos olhos para os lados ou para cima e para baixo, sendo considerada a área máxima; (3) movimento da cabeça, quando a visão é obtida por meio do movimento da cabeça. O objeto que se deseja que seja visualizado com prioridade, deve, preferencialmente, atender ao nível 1, depois ao nível 2, pois em caso de fadiga, o nível 3 é o primeiro que deixa de ser observado (IIDA, 2005).

• Fatores Humanos no TrabalhoUm dos aspectos relevantes em relação aos fatores humanos relacionados ao trabalho é o ritmo circadiano, que funciona como um relógio interno do ser humano, regulando todas as suas atividades durante o dia. Um dos parâmetros que varia ao longo do dia é a temperatura do corpo humano, que influencia na maior ou menor disposição para o trabalho em determinados horários. O pior horário para a realização de qualquer tipo de atividade é entre 2 e 4 horas da madrugada, sendo assim os horários onde se tem o menor nível de alerta e de desempenho (IIDA, 2005).A monotonia no trabalho é também objeto de preocupação da ergonomia.

A monotonia é uma reação do organismo a um ambiente com poucos estímulos e variações, o que resulta em sensação de fadiga, morosidade e diminuição da atenção, entre outros sintomas. São possíveis causadores da monotonia, entre outros, tarefas de ciclo curto, repetitivas e de pouca dificuldade, e que são realizadas durante muito tempo. As tarefas repetitivas tendem a diminuir o nível de excitação do cérebro, afetando negativamente a capacidade de reação do organismo humano. Sob o aspecto psicológico, uma tarefa com poucos estímulos e desafios leva à falta de motivação para sua realização, o que contribui para uma menor produtividade (BELMONTE e GUIMARÃES, 2004). Deve-se, assim, buscar um equilíbrio que proporcione a sintonia entre o nível de complexidade e exigência da tarefa com a competência de quem a realiza, pois isso conduzirá ao rendimento máximo no trabalho, tendo em vista que uma exigência da tarefa acima da capacidade do indivíduo também leva ao estresse e à consequente perda de produtividade (IIDA, 2005).

O ser humano tem limitações para processar um elevado número de informações. Caso elas se excedam há uma grande probabilidade de ocorrer uma sobrecarga mental acarretando em erros e queda de desempenho (GUIMARÃES, 2004 - c).

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• Organização do TrabalhoA forma como o trabalho está organizado tem forte influência na saúde do trabalhador e no seu desempenho. Os métodos de trabalho repetitivos e de ciclo curto, se realizados de forma intensiva, aceleram a fadiga, pois exigem sempre os mesmos músculos, além de causar desinteresse pela falta de desafios. Uma imposição por parte da empresa de um ritmo que vai além do que o ser humano pode executar dentro das condições de trabalho oferecidas, pode colocar o trabalhador mais propenso a doenças, tais como a LER/DORT (FISCHER e GUIMARÃES, 2004)Guimarães (2004 - d) cita as alternativas para se contrapor ao trabalho repetitivo. São

elas: rotação do trabalho, na qual os trabalhadores operam diferentes tipos de máquinas ou realizam diferentes operações; alargamento do trabalho, onde novas tarefas são colocadas para o trabalhador, dentro do mesmo nível de responsabilidade que ele já possui, por exemplo, possibilitando que o trabalhador possa agregar mais trabalho por meio de uma tarefa que produza o produto ou uma peça mais completa, realizando um maior número de movimentos e deixando de ser uma tarefa fracionada; enriquecimento do trabalho, quando o trabalhador passa a ter um nível de responsabilidade que ele não tinha antes, como por exemplo, fazendo com ele seja responsável pela qualidade ou quantidade daquilo que está produzindo, ou por parte da manutenção da máquina que está operando; trabalho em equipes, onde as tarefas são colocadas para serem executadas pelos trabalhadores que constituem a equipe.

Um dos males que pode afetar o trabalhador é o estresse, que pode ser causado por uma série de fatores, tais como: o conteúdo do trabalho (ritmo, conflitos, responsabilidades); sentimentos de incapacidade para realizar a missão que lhe foi atribuída; condições de trabalho em termos de iluminação, ruído, temperatura, vibrações etc; fatores organizacionais (estilo gerencial, salários, horários etc) e pressões econômico-sociais (pressão da sociedade de consumo, conflitos com colegas e familiares). Cabe à organização utilizar mecanismos para reduzir o nível de estresse na organização (IIDA, 2005).,

• Psicodinâmica das coresAs cores utilizadas no ambiente de trabalho têm influência nas emoções dos indivíduos que estão no ambiente de trabalho, podendo gerar sentimentos de calma ou excitação, “aumentar” ou “diminuir” as dimensões de um ambiente. Cuidado especial deve ser dado com relação à iluminação, pois ela pode mascarar as cores reais. Além disso, a combinação de cores afeta o nível de fadiga visual em função dos contrastes utilizados (IIDA, 2005).As cores utilizadas no ambiente de trabalho são capazes de criar situações que podem

causar fadiga, aumentar o estresse, diminuir a percepção visual e influir na quantidade de erros dos operadores, causando impactos visuais negativos e acarretando acidentes (BATSITELLA, 2003)

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2. ASPECTOS ERGONÔMICOS NA UTILIZAÇÃO DAS TÉCNICAS DE PRODUÇÃO ENXUTA

Considerando que a ergonomia tem uma vasta aplicabilidade nas diversas atividades realizadas pelo ser humano para a realização do seu trabalho, a aplicação das técnicas de produção enxuta deve ser utilizada levando-se em consideração os aspectos ergonômicos, a fim de que seus resultados possam ser potencializados e, ao mesmo tempo, não causem problemas para os seres humanos, o que acabará por comprometer o nível de qualidade e produtividade que essas técnicas buscam alcançar.

Sob o ponto de vista conceitual, a produção enxuta prevê, além das técnicas, uma série de iniciativas voltadas à qualidade de vida do trabalhador, tais como diversão e instalações adequadas da área de trabalho (SLACK et. al. 2002), o que significa que as organizações não devem cometer o equívoco de se concentrar apenas nas técnicas se desejarem obter melhores resultados. Nesse sentido, Liker (2005) considera que são princípios necessários para o êxito do Sistema Toyota de Produção a valorização da organização por meio do desenvolvimento de seus funcionários.

Cabe à gerência das organizações considerar o trabalho exercido pelos indivíduos não só no seu aspecto econômico, mas também, e no mesmo nível, no conceito integral de ser humano, incluindo sua natureza psicofisiológica e social (SOUZA, 2005).

São relacionadas a seguir as técnicas de produção enxuta e feitas reflexões sobre as preocupações ergonômicas que estão presentes em cada caso.

2.1- KanBAnO sistema kanban envolve algumas práticas para o seu funcionamento. Uma delas,

quando empregado o tipo padrão, é a utilização do painel porta kanbans. Esses painéis utilizam cores, normalmente o vermelho, amarelo e verde, para indicar aos operadores o que deve ser produzido no momento (just in time), sendo o vermelho a prioridade 1, o amarelo a 2 e o verde a 3. Caso não seja produzido o item que está na situação vermelha pode haver falta de peças e todo o fluxo poderá parar, não só a célula que a produz. O kanban dá aos operadores a autonomia necessária para a tomada de decisão, o que tradicionalmente estaria nas mãos da gerência ou de um órgão de PCP (Planejamento e Controle da Produção). Essa situação caracteriza um enriquecimento do trabalho, o que influi na motivação dos funcionários pela maior sensação de importância que eles têm da tarefa que realizam, contribuindo também para a redução da monotonia (BELMONTE & GUIMARÃES, 2004). Como é uma técnica que utiliza cores, pessoas que têm problemas com sua identificação (daltônicos, por exemplo) terão dificuldades em realizar a tarefa (BATISTELA, 2003). Além disso, há que se refletir se a carga de responsabilidade que pesa nesse sistema sobre os operadores, embora positiva sob o ponto de vista do desafio, não poderá se tornar um componente que poderá contribuir com o estresse dos mesmos. Até que ponto esse nível de responsabilidade é suportável?

2.2- MANUFATUra CELULARO layout em célula possibilita a delegação da responsabilidade pelo resultado da

produção para seus operadores, tanto em termos de qualidade como produtividade. Os operadores devem atuar como um time que produz um produto ou uma peça completa,

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diferente das operações tradicionais nas quais os operadores fazem tarefas fragmentadas. Como as operações passam a ser não repetitivas, haverá uma diminuição na incidência de LER/DORT.

Com a célula, o grupo produz uma família de peças completa e, normalmente, a célula está em formato de U, para facilitar a integração entre as pessoas do grupo, aproximando-as, além da visualização por todos seus membros da forma como a matéria-prima ingressa na célula e como ela sai processada, dando mais significado ao trabalho que eles realizam. Isso caracteriza um enriquecimento do cargo, pois a responsabilidade pela qualidade e produtividade cabe ao grupo e cada operador deve possuir a competência para realizar operações diferentes e/ou operar mais de uma máquina ao mesmo tempo, racionalizando a mão de obra. Esse aspecto contribui para a motivação da equipe, uma vez que torna a tarefa desafiante. Além disso, os operadores discutem e procuram resolver por conta própria os problemas que acontecem no chão de fábrica de sua célula. O envolvimento das pessoas é fundamental com essa configuração.

Entretanto, como a estrutura da célula possibilita a operação das máquinas por mais de um operador, este precisa se deslocar de forma ágil entre postos para realizar as operações polivalentes, o que muitas vezes não permite que ele fique sentado, contrariando o que determina a NR 17 em seu item 17.3.1 – sempre que o trabalho puder ser executado na posição sentada, o posto de trabalho deve ser planejado ou adaptado para essa posição (Ministério do Trabalho e Emprego, 2002). Embora essa situação não configure um esforço estático de pé, o que seria prejudicial, já que ele se movimenta entre os postos, nesse caso, uma possível recomendação é a utilização de um selim que possibilite a posição semissentada. Outra providência para atenuar o esforço do trabalho de pé é a utilização de tapetes “amortecedores”. Por outro lado, uma possível alternância de posturas, semissentado, de pé estático e de pé caminhando, que a célula possibilita pode ser vantajosa para o operador.

Como vigora a polivalência e a flexibilidade da produção, uma máquina (ou outro posto de trabalho) pode estar sendo operada durante a produção de um produto por um operador e no ciclo seguinte por outro, há que se ter uma atenção com relação ao dimensionamento da altura do plano de trabalho, prevendo rápidas adequações ergonômicas que atendam operadores com medidas antropométricas diferentes (GRANDJEAN, 1998). Há que se questionar também com a célula, até que ponto o nível de alargamento e enriquecimento do trabalho trará benefícios ótimos e qual seu limite, para o caso de ser ultrapassado e gerar uma situação de estresse que comprometa a saúde do operador e o desempenho do trabalho. Fischer e Guimarães (2004) consideram como uma questão central a definição de quantas operações o ser humano tem condições de memorizar, automatizar e desempenhar no trabalho sem que haja uma subcarga, que levará à monotonia, ou sobrecarga, que conduzirá ao estresse.

Olorunniwo e Udo (2002) consideram que há mudanças fundamentais quando é feita a mudança do arranjo físico funcional para o celular e que essas mudanças necessitam de atenção pois, entre outros aspectos, mudam as relações entre supervisores e funcionários. Na célula clássica, com a maior autonomia dos funcionários, há perda de poder por parte da supervisão, e isso poderá ser uma fonte de conflitos.

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ASPECTOS ERGONÔMICOS NA UTILIZAÇÃO DAS TéCNICAS DE PRODUÇÃO ENXUTA: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A MELHORIA DO DESEMPENHO GLOBAL DO SISTEMA PRODUTIVO

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A mudança de um layout por processo para um celular reduz as distâncias percorridas, que é uma atividade que não agrega valor, e que também traz efeitos positivos no aspecto biomecânico das atividades realizadas, pois menos esforços serão realizados para a movimentação de carga entre postos de trabalho.

Guimarães et. al. (2005) abordaram em seu artigo a integração dos princípios da macroergonomia com o Sistema Toyota de Produção por meio da utilização do layout celular em uma organização e obteve resultados positivos tanto no subsistema técnico como humano, o que evidencia os aspectos positivos dessa configuração produtiva.

2.3- SETup RÁPIDO

Para que seja feita a mudança da produção de uma peça para outra em determinada máquina, de uma forma econômica, deve-se fazer com que essa mudança seja realizada em um menor tempo possível. Isso envolve o atendimento a procedimentos estabelecidos pela organização, onde estão descritos o passo a passo e o tempo esperado para isso (SHINGO, 2000). Há que se saber se os procedimentos foram estabelecidos de tal forma a facilitar a compreensão dos encarregados pela troca e se a tarefa prescrita está sendo de fato utilizada ou se está sendo atualizada para abreviar o tempo, com possíveis riscos para a segurança. O desenho das ferramentas e os mecanismos de movimentação das cargas utilizados para o setup estão compatíveis com a necessidade de troca rápida com segurança?

2.4- INSPEÇÃO AUTÔNOMA E DISPOSITIVOS à PROVA DE ERRO (pOKa-YOKE)

Com a transferência da responsabilidade pela qualidade para os operadores, esses precisam de instrumentos que facilitem seu trabalho. Uma dessas alternativas é o poka-yoke. A ergonomia pode interagir nesse aspecto por meio do desenho ergonômico dos dispositivos, tais como gabaritos ou outros dispositivos que impeçam ou restrinjam a ocorrência de erros, por meio do princípio da compatibilidade espacial, por exemplo, ou por meio da utilização de cores, forma, textura, entre outras opções (SELL, 2004).

A autonomia concedida aos operadores dá a eles a autoridade para parar a linha de produção caso ocorra algum problema de qualidade. A tomada de decisão é o aspecto mais importante do conteúdo cognitivo de uma tarefa. é importante para ergonomia conhecer quem pode desempenhar determinada tarefa e se poderá desempenhar outras adicionais com conforto e segurança, pois está envolvido nessa questão o aspecto da sobrecarga mental (GUIMARÃES, 2004c).

A inspeção autônoma compreende também um enriquecimento do trabalho, o que favorece a motivação dos trabalhadores, entretanto, até que ponto esse enriquecimento pode gerar estresse em função das responsabilidades assumidas pelos trabalhadores?

2.5- MANUTENÇÃO PRODUTIVA TOTAL (MPT)O aspecto ergonômico mais relevante ao se utilizar a MPT é o enriquecimento do

cargo, pois os trabalhadores, além da operação, da responsabilidade pela qualidade e pelo controle da produção, realizam também parte da manutenção da máquina. O treinamento deverá possibilitar a competência necessária aos operadores para que o trabalho não seja afetado pelo estresse em virtude de um possível sentimento de impotência em relação às exigências da tarefa.

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2.6- VISIbILIDADE E PADRONIZAÇÃOAs técnicas de produção enxuta utilizam bastante a informação visual, como é o caso

do kanban. Além dele, outras informações devem estar sempre disponíveis pela fábrica para informar o andamento da produção, tais como indicadores de desempenho, luzes indicando problema em postos, gráficos, locais delimitados para colocação de produtos, dentro da técnica do 5S entre outras informações. Assim sendo, a maneira como essas informações são passadas implica em uma preocupação ergonômica relativa à facilidade de compreensão e rápida detecção das informações que se deseja perceber. Um código de cores, por exemplo, pode ser usado para indicar o tipo de problema que o posto está sofrendo (máquina quebrada, matéria-prima defeituosa etc). Embora essa informação agilize a tomada de decisão, a situação pode expor o trabalhador a uma situação de constrangimento, uma vez que todos ficam sabendo rapidamente que há um problema ali, por isso é muito importante uma preparação cultural para seu êxito.

A padronização dos procedimentos significa uma rigorosa prescrição da tarefa, as quais devem refletir o trabalho real e ser de fácil entendimento por parte de quem os executa. Os padrões devem ser específicos o suficiente para serem guias úteis, mas também gerais para possibilitar alguma flexibilidade. Além disso, é importante que os próprios operadores colaborem com suas idéias na elaboração dos padrões (LIKER, 2005).

O quadro 1 (página seguinte) sumariza as técnicas e abordagens da produção enxuta e os principais aspectos ergonômicos envolvidos.

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Técnica da Produção Enxuta Aspecto Ergonômico Envolvido

Kanban

Uso de cores no ambiente de trabalho; enriquecimento do trabalho; pressão no trabalho decorrente dos reflexos do desabastecimento poder parar o fluxo de toda fábrica; perda de poder por parte da supervisão com possibilidade de conflitos; propensão ao estresse por sobrecarga mental?

Célula de Produção

Enriquecimento do trabalho; gestão participativa nas melhorias e soluções de problemas; perda de poder por parte da supervisão com possibilidade de conflitos; tendência de o operador passar a trabalhar de pé, movimentando-se entre os postos; possível alternância de postura poderá ser vantajosa; adequação da altura dos postos de trabalho para operadores multifuncionais com diferenças antropométricas; tendência a menor esforço biomecânico para movimentação de cargas em virtude das menores distâncias; qual o limite do enriquecimento do cargo para não causar sobrecarga mental?

Setup Rápido

Atendimento às tarefas prescritas referentes aos procedimentos para troca rápida, sob pressão do tempo; adequação dos procedimentos escritos para facilitar o entendimento dos operadores; desenho ergonômico das ferramentas e dos meios de movimentação de peças para possibilitar troca rápida sem comprometer a segurança.

Inspeção autônoma e poka-yoke

Enriquecimento do trabalho; autonomia dos operadores para parar a linha em caso de problemas; aumento do nível de responsabilidade (elevação do nível de estresse?); design ergonômico dos dispositivos para não ocorrência de erros (poka-yoke).

Manutenção Produtiva Total

Necessidade de treinamento para que a exigência de atuar na manutenção da máquina não se constitua em fator de estresse por sobrecarga mental.

Visibilidade dos Processos

Tamanho adequado de letras e números e combinação de cores para facilitar a compreensão dos avisos (gestão à vista); possibilidade de constrangimento dos operadores em virtude da identificação imediata da fonte do problema identificado.

Padronização dos Procedimentos

Adequação das Instruções de Trabalho documentadas para facilitar a compreensão das tarefas prescritas; aderência da tarefa prescrita à real.

Quadro 1. Alguns Aspectos Ergonômicos Envolvidos nas Técnicas de Produção Enxuta

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CONSIDEraÇõES FINAISEste artigo propôs uma reflexão acerca dos aspectos ergonômicos envolvidos na

aplicação das técnicas de produção enxuta, que é considerado um modelo de produção que proporciona elevados índices de produtividade e qualidade. Essa reflexão buscou identificar como a ergonomia pode contribuir para o uso mais efetivo dessas técnicas, como forma de potencializar seus resultados, ou minorar os possíveis efeitos maléficos para a qualidade de vida do trabalhador, tendo em vista que isso poderá contribuir com a elevação global do desempenho do sistema produtivo.

As técnicas de produção enxuta foram descritas e, para cada uma delas, relacionados os aspectos ergonômicos que podem contribuir com a melhoria global do sistema produtivo, com ênfase nos aspectos humanos envolvidos. As evidências apresentadas por meio da pesquisa bibliográfica conduzem a uma confirmação do pressuposto deste trabalho, ou seja, que a ergonomia possibilitará um maior ganho global em termos de produtividade e qualidade ao se implantar a produção enxuta.

Embora algumas pesquisas já tenham sido realizadas dentro do enfoque proposto por este artigo, algumas outras poderão aprofundar os temas discutidos, concentrando-se em algumas técnicas específicas e buscando evidências em situações reais de trabalho.

REFERÊNCIASBATISTELA, M. R.. A Importância da Cor em Ambientes de Trabalho: Um Estudo de Caso. Florianópolis, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina. BELMONTE, F. A. F.; GUIMARÃES, L. B. de M. Fatores Humanos na Organização do Trabalho. In: GUIMARÃES, Lia B. de M. Ergonomia de processo. Vol. 2. Porto Alegre, 2004.CORRÊA, H. L.; CORRÊA, C. A. Administração de Produção e Operações. São Paulo: Atlas, 2004.DUL, J.; WEERDMEESTER, B.. Ergonomia Prática. São Paulo: Edgard Blücher, 2004FISCHER, D.; GUIMARÃES, L. B. de M. . Intervenção macroergonômica: um caso prático de modificação da organização do trabalho. In: GUIMARÃES, Lia B. de M. Ergonomia do processo. Vol.2. Porto Alegre, 2004.GIL, A. C. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 1991.GRANDJEAN, E. Manual de Ergonomia. Porto Alegre: Bookman, 1998. GUIMARÃES, L. B. de M. et. al. Contribuição da Ergonomia na Implantação da Manufatura Celular . In: XXV Encontro Nacional de Engenharia de Produção – ENEGEP. Anais...Porto Alegre, out/2005.GUIMARÃES, L. B. de M. Introdução à 4ª Fase da Ergonomia. In: GUIMARÃES, Lia B. de M. Ergonomia de processo. Porto Alegre, 2004a.

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METODOLOGIA PAra O ENSINO UNIVERSITÁRIO:

UM ESTUDO à LUZ DA ANDraGOGIA

METHODOLOGY FOR UNIVERSITY EDUCATION: A STUDY UNDER THE CONCEPTION OF ANDRAGOGY

Humberto Oriá FilhoFaculdade Farias Brito – FFB

Terezinha de Jesus Pinheiro MacielUniversidade Federal do Ceará – UFC

RESUMOObser va-se que muitos programas de disciplinas dos cursos de graduação, particularmente das Ciências Administrativas Aplicadas, não descobriram que devem utilizar metodologias para alunos já adultos. A finalidade deste estudo é responder à seguinte questão: as metodologias de ensino-aprendizagem, registradas nos programas das disciplinas obrigatórias do curso de graduação em Ciências Contábeis da UFC, estão adequadas considerando a ótica da Andragogia? Como objetivos, buscou-se: descrever os aspectos conceituais da Andragogia, examinar os programas das disciplinas, analisar todas as suas metodologias registradas com base na Andragogia, teoria que foi selecionada como referencial teórico. A metodologia escolhida para o estudo foi a pesquisa documental e bibliográfica. Como resultado, descobriu-se que a grande maioria dos programas examinados utiliza a metodologia de ensino baseada essencialmente em aulas teóricas expositivas e que há pouca variação de metodologias em uma mesma disciplina. Percebe-se ainda que se faz necessário uma reflexão maior sobre se realmente a utilização, quase que exclusiva, de aulas expositivas teóricas, como metodologia de ensino-aprendizagem, pelos professores dos cursos de graduação, atende realmente as exigências de aprendizado dos alunos adultos.Palavras-Chave: Andragogia; Metodologias de Ensino; Ensino na Graduação.

ABSTRACTLooking at sillabuses of disciplines of undergraduate programs in Accountability at the UFC, it is possible to perceive that teaching methodology is not adequated to adult students. The goal of this study is to answer the following question: are methods of teaching-learning described on the plan of disciplines part of the curriculum of Accountability offered by the UFC is adequated to teach according to Andragogy theory? As objectives it was able to explain Andragogy concepts; to examine and analise methodology described in the discipline plans in order to verify if it is related to Andragogy theorethical assumptions. Research proceedings were a review of

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bibliography and documental analysis. As results it was discovered that the great majority of professors use traditional proceedings, based on explanations and theorethical classes. It was also perceived that it is necessary more studies and analysis of the methodology used in undergraduate programs in order to attend real necessities of the adult students.KEYWORDS: Andragogy; Teaching Methodology; Undergraduate Programs Teaching.

INTRODUÇÃOAtualmente percebe-se que muitos programas de disciplinas dos diversos cursos de

graduação, particularmente na área de Ciências Administrativas Aplicadas, no que diz respeito ao registro de suas metodologias de ensino não observam que deveriam utilizar procedimentos adequados para discentes, com faixa etária superior a 18 anos, ou seja, que já são adultos e necessitam de uma abordagem mais específica e apropriada para este tipo de público universitário.

Com base na nossa experiência e observação nota-se que a abordagem tradicionalista de ensino-aprendizagem ainda permanece muito enraizada em nossas Universidades e Faculdades sejam elas públicas ou privadas. Nestas instituições, o professor é o mestre, o orientador e o repassador do conteúdo programático e o aluno, um simples e passivo aprendiz ou receptor. A preocupação geralmente do professor está só em repassar conhecimentos e técnicas, descritos de forma rígida no programa da disciplina, não se levando em conta, muitas vezes, a experiência e a realidade dos alunos.

Este trabalho justifica-se pela oportunidade de se contribuir no nível acadêmico sobre um tema possivelmente ainda não muito explorado pelos profissionais da área de Educação e de Contabilidade, bem como ajudar em uma futura atualização mais adequada dos programas.

Dessa forma, a finalidade do objeto de estudo é responder ao seguinte problema: As metodologias de ensino-aprendizagem, registradas nos programas das disciplinas obrigatórias do curso de graduação em Ciências Contábeis da Universidade Federal do Ceará (UFC), estão adequadas aos requisitos da Andragogia?

é nesse contexto e em resposta a este questionamento que se objetiva, principalmente, verificar se as metodologias de ensino descritas nos programas das disciplinas obrigatórias do Curso de Ciências Contábeis da UFC são as mais adequadas para o ensino de adultos (universitários), sob o enfoque do conhecimento andragógico.

Como objetivos específicos, dado o tema e o objetivo geral do trabalho, são definidos os seguintes:

1. Relatar sinteticamente os aspectos históricos envolvendo o curso de graduação em Ciências Contábeis da UFC e suas grades curriculares;

2. Descrever os principais aspectos conceituais da Andragogia (ensino de adultos); 3. Examinar os programas das disciplinas;4. Analisar todas as metodologias de ensino, informadas nos programas das disciplinas

obrigatórias do curso de graduação em Ciências Contábeis da UFC, realizando as inferências necessárias sobre este resultado, com base na Andragogia.

HUMBERTO ORIá FILHO E TEREZINHA DE JESUS PINHEIRO MACIEL

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O referencial teórico deste trabalho está centrado na teoria da Andragogia, que tem como alguns dos principais expoentes: Lindeman (1926), Knowles (1950, 1975, 1980, 1989, 1990) e Cros (1976, 1981).

As suposições, em relação ao principal questionamento proposto, seriam as seguintes:

1. Muitas das metodologias de ensino descritas nos programas das disciplinas a serem analisadas serão semelhantes (padrões) e sem muitas variações;

2. Nos programas, optar-se-á muito por aulas teóricas expositivas, com o uso de quadro branco e transparências/retroprojetor, ou seja, uma metodologia tradicional e pouco interativa com os alunos;

3. Poucos serão os programas de disciplinas examinados, que farão opção por outros tipos de metodologias de ensino-aprendizagem mais interativas com os alunos, através da aplicação de seminários, estudo de casos, dinâmicas e/ou de aulas práticas.

1. REFERENCIAL TEóRICONesta seção registram-se os dados que contextualizam o curso de Ciências Contábeis,

informações sobre metodologia de ensino e sobre a Andragogia como disciplina que orienta a educação do adulto. A seguir, será descrito de forma mais detalhada cada um dos tópicos acima mencionados.

1.1. CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁbEIS DA UFCO curso de Ciências Contábeis da Universidade Federal do Ceará (UFC) foi reconhecido pelo

Decreto n° 29.142, de 04.01.1949, estando funcionando normalmente no prédio da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade (FEAAC), situado na Avenida da Universidade n° 2431, Bairro Benfica, Fortaleza-CE. O referido curso de graduação contava, em 2000, com novecentos e vinte e nove alunos ativos, oferecendo anualmente oitenta vagas por turno, no vestibular. Em relação ao aspecto curricular, no curso de Ciências Contábeis da UFC estão em vigor três matrizes curriculares: a de número 001, a mais antiga; a de 94.1 (diurno) e a de 94.2 (noturno), sendo estas duas últimas resultantes da reforma curricular em 1994, baseada nas diretrizes e exigências da Resolução n° 03 do Conselho Federal de Educação, datada de 05.10.1992 (PINHO; ARAÚJO, 2000). O foco deste estudo é a matriz de 1994.2, a última que se teve acesso.

O perfil do profissional, a ser formado pelo currículo de Ciências Contábeis da UFC, considera principalmente os aspectos indispensáveis para que se possa exercer adequadamente, com competência e com responsabilidade, a função que corresponda ao que o mercado, as empresas e a comunidade almejam. Para tanto, o futuro profissional de Ciências Contábeis deverá desenvolver atributos de natureza humana, social e profissional. Os atributos de natureza humana e social dizem respeito à formação do profissional como ser humano e como ser social (comunitário), devendo o currículo pleno incluir disciplinas de caráter humanístico. Já os atributos de natureza profissional dizem respeito à aquisição de competência no exercício profissional, obtida pelo conhecimento geral e amplo da Contabilidade, entre outros conhecimentos e capacidades (PINHO; ARAÚJO, 2000).

METODOLOGIA PARA O ENSINO UNIVERSITáRIO: UM ESTUDO À LUZ DA ANDRAGOGIA

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1.2. METODOLOGIA DE ENSINOInicialmente, é importante compreender o que significam os termos “disciplina” e

“método”. A palavra “disciplina”, em relação ao ensino, significa em resumo “um conjunto ou corpo específico de conhecimentos com suas características próprias e métodos particulares de trabalho. Neste sentido, corresponde à matéria de ensino, conteúdo ou componente curricular” (HAYDT, 1995, p. 64). Já o conceito mais simples de “método” (originado do grego méthodos) é: caminho para chegar a um fim ou caminho para atingir um determinado objetivo. Logo, método de ensino “é um procedimento didático caracterizado por certas fases e operações para alcançar um objetivo preciso” (HAYDT, 1995, p. 144). Ainda, no âmbito do ensino, pode-se dizer também que os métodos são determinados pela relação objetivo-conteúdo, e se referem aos meios para atingir objetivos (gerais e específicos) do ensino, isto é, ao “como” do processo de ensino, englobando as atividades a serem realizadas pelo professor e pelos alunos para alcançar os objetivos e conteúdos estipulados (LIBÂNEO, 1992).

O citado autor sintetiza muito bem esta questão, dizendo:

Em resumo, podemos dizer que os métodos de ensino são as ações do professor pelas quais se organizam as atividades de ensino e dos alunos para atingir objetivos do trabalho docente em relação a um conteúdo específico. Eles regulam as formas de interação entre ensino e aprendizagem, entre o professor e os alunos, cujo resultado é a assimilação consciente dos conhecimentos e o desenvolvimento das capacidades cognoscitivas e operativas dos alunos. A escolha e organização dos métodos de ensino devem corresponder à necessária unidade objetivos-conteúdos-métodos e formas de organização do ensino e às condições concretas das situações didáticas. (LIBÂNEO, 1992, p. 152). (grifo dos autores)

Com esta afirmação de Libâneo (1992), fica claro o significado e a função do método no processo de ensino. Mas, qual é a importância do método em relação aos objetivos e conteúdos? Em outras palavras, como usar o método como um elemento sistêmico no processo? é o próprio autor quem responde:

Em primeiro lugar, os métodos de ensino dependem dos objetivos imediatos da aula: introdução de matéria nova, explicação de conteúdos, desenvolvimento de habilidades, consolidação de conhecimentos etc. Ao mesmo tempo, dependem de objetivos gerais da educação previstos nos planos de ensino pela escola ou pelos professores.

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Em segundo lugar, a escolha e organização dos métodos dependem dos conteúdos específicos, dos métodos peculiares de cada disciplina e dos métodos da sua assimilação. Há uma relação mútua entre os métodos gerais de ensino – comuns e fundamentais a todas as disciplinas – e os métodos específicos de cada uma. [...]

Em terceiro lugar, em estreita relação com as condições anteriores, a escolha dos métodos implica o conhecimento das características dos alunos quanto à capacidade de assimilação conforme idade e nível de desenvolvimento mental e físico e quanto às suas características socioculturais e individuais (LIBÂNEO, 1992, p. 152-153). (grifo dos autores)

Complementando, com uma linguagem mais simples, Vasconcellos (1999) esclarece que a proposta geral metodológica de uma disciplina é a explicitação do roteiro geral (como), que o professor pretende seguir no desenvolvimento da disciplina. Neste tópico, o professor deve apresentar os princípios metodológicos que sustentam sua prática, ou ainda indicar a metodologia que geralmente utiliza em sala de aula; não significa automaticamente que seja a única, mas que traduza um pouco da característica própria do professor de ministrar suas aulas.

Vale a pena citar a explicação de Vasconcellos (1999, p. 147 e 150) sobre a metodologia relacionada a um roteiro de elaboração do projeto de ensino-aprendizagem:

PROJETO DE CURSO - [...] A metodologia refere-se à condução do processo didático, às experiências de ensino-aprendizagem, a como será trabalhado cada item do programa. O aspecto metodológico é muito importante, pois é a criação das condições adequadas para o trabalho educativo, superando a improvisação empírica. [...]

PLANO DE AULA - [...] Metodologia – Explicitação dos procedimentos de ensino, técnicas, estratégias, a serem utilizadas no desenvolvimento deste assunto; é o caminho concreto a ser trilhado. Pode indicar tanto as atividades previstas para o professor, quanto as esperadas dos alunos. Deve-se considerar a especificidade do objeto de conhecimento em questão; dependendo do objeto, pode-se demandar um tipo de ação que seja mais apropriada para o estabelecimento de relações entre o sujeito e ele. Os tipos de atividades que podem ser desenvolvidas dependem, por exemplo, se a aula é de Física, Português, Matemática ou História; mesmo na própria disciplina, em função do tema específico, pode caber melhor uma ou outra atividade (uma ida ao laboratório, uma pesquisa teórica, um debate, uma observação direta da realidade, a projeção de um filme etc.). (grifo dos autores)

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METODOLOGIA PARA O ENSINO UNIVERSITáRIO: UM ESTUDO À LUZ DA ANDRAGOGIA

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A partir da elaboração do projeto do curso o professor já deve estar focado no “como” atuar para proporcionar oportunidade de aprendizagem aos alunos. Pelo que foi dito anteriormente, o professor deve ser mais específico e detalhado na escolha e no uso dos procedimentos para a realização de uma aula.

1.3- ANDraGOGIAA palavra “Andragogia” origina-se do grego: andros (adulto) e gogos (educar), que

pode ser entendida como um caminho educacional que busca ajudar o adulto a aprender. A Andragogia significa “ensino para adultos”, ou seja, é a arte de ensinar aos adultos, que não são aprendizes sem experiência, pois o conhecimento vem da realidade (escola da vida).

é importante, falando-se sobre Andragogia, conceituar ou entender melhor o que significa o termo “adulto” ou “pessoa adulta”. Segundo Oliveira (2005), adulto “é aquele indivíduo que ocupa o status definido pela sociedade, por ser maduro o suficiente para a continuidade da espécie e autoadministração cognitiva, sendo capaz de responder pelos seus atos diante dela”.

Em relação aos aspectos históricos da Andragogia, Oliveira (2005) oferece uma síntese elucidativa quando afirma:

A educação de adultos é uma prática tão antiga quanto à história da raça humana, ainda que só recentemente ela tem sido objeto de pesquisa científica. A nossa herança cristã, por exemplo, com cerca de dois mil anos, apresenta no Livro Sagrado, fartos exemplos de relacionamento educacional adulto através dos patriarcas, sacerdotes e o próprio Jesus Cristo que foi, por excelência, o maior educador de adultos de todos os tempos. [...] (grifo dos autores)

Eduard C. Lindeman (USA) foi um dos maiores contribuidores para a pesquisa da educação de adultos através do seu trabalho “The Meaning of Adult Education” publicado em 1926. Suas ideias eram fortemente influenciadas pela filosofia educacional deJohn Dewey: “...a educação de adultos será através de situações e não de disciplinas. Nosso sistema acadêmico cresce em ordem inversa: disciplinas e professores constituem o centro educacional. Na educação convencional é exigido do estudante ajustar-se ao currículo estabelecido; na educação de adulto o currículo é construído em função da necessidade do estudante. Todo adulto se vê envolvido com situações específicas de trabalho, de lazer, de família, da comunidade etc. - situações essas que exigem ajustamentos. O adulto começa nesse ponto. As matérias (disciplinas) só devem ser introduzidas quando necessárias. Textos e professores têm um papel secundário nesse tipo de educação; eles devem dar a máxima importância ao aprendiz”. (LINDEMAN, 1926, pp. 8-9). (grifo dos autores)

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Há a necessidade de se registrar aqui a importância da aplicação das diretrizes da Andragogia no ensino das Ciências Contábeis. Hoje, mais do que antes, o mercado de trabalho requer profissionais competentes, que tenham desenvolvido em seus cursos de graduação não só conhecimentos, mas, sobretudo, habilidades e atitudes. Uma metodologia baseada na Andragogia tem mais potencial para desenvolver o profissional requerido pelo mercado.

Ratificando esta questão, Hamze (2006) explica que:

Nesse processo os alunos adultos aprendem compartilhando conceitos, e não somente recebendo informações a respeito. Desta coexistência e participação nos processos de decisão e de compreensão podem derivar contornos originais de resolução de problemas, de liderança, identidades e mudanças de atitudes em um espaço mais significativo. Em classes de adultos é arriscado assinalar quem aprende mais: se o professor ou o estudante. Na educação convencional o aluno se adapta ao currículo, mas na educação de adulto, o aluno colabora na organização do currículo. A atividade educacional do adulto é centrada na aprendizagem e não no ensino, sendo o aprendiz adulto agente de seu próprio saber e deve decidir sobre o que aprender. Os adultos aprendem de modo diferente de como as crianças aprendem. Portanto é essencial que os métodos aplicados também sejam distintos. A finalidade é a de propor como o adulto aprende não avaliar sua capacidade de aprendizagem. A aprendizagem procede mais da participação em tarefas, do estudo em grupo e da experiência. O papel do educador é facilitar a aprendizagem, enfatizando, nesse procedimento, a bagagem de informação trazida por seus educandos. (grifo dos autores)

No aspecto da orientação da aprendizagem, vale, contudo, destacar a diferença mais explícita entre a posição da Pedagogia e da Andragogia. A Pedagogia busca a aprendizagem por assunto ou matéria, onde o ensino é didático, padronizado e a experiência do aluno tem pouco valor. A educação é focada na criança. Já na Andragogia, a aprendizagem é geralmente baseada em problemas, que exigem amplo conhecimento dos participantes para se chegar à solução. A experiência é uma rica fonte de aprendizagem e a solução de problemas é construída em grupo. A educação é focada no adulto (CAVALCANTI, 2006).

Em relação especificamente à Andragogia, é importante ainda citar as características apresentadas por Pires e Marciano (2006, p. 135):

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METODOLOGIA PARA O ENSINO UNIVERSITáRIO: UM ESTUDO À LUZ DA ANDRAGOGIA

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A Andragogia pauta-se na mudança de técnicas de transmissão para técnicas baseadas na experiência, ocasionando dessa forma uma aprendizagem de ação e de participação, colocando o adulto sempre como o centro do aprendizado e extraindo de suas experiências o fundamento necessário a sua aprendizagem.

Os interesses envolvidos na relação de aprendizagem se direcionam para o desenvolvimento de habilidades a serem utilizados nos seus papéis pessoais e profissionais. A partir desta premissa, estabelecem-se relações de interesse pelo aprendizado, pela necessidade de ampliação de habilidades e atitudes do aprendiz.

O desejo de uma aplicação prática do conteúdo aprendido reduz o interesse por conhecimentos de aplicação futura. A Andragogia, então, focaliza a aprendizagem de conteúdos que possibilitem uma prática imediata. O aprendiz busca aplicação em seu cotidiano do conteúdo aprendido. (grifo dos autores)

Para Cros (1981 apud PLANETA EDUCAÇÃO, 2006), em síntese, os princípios do

aprendizado adulto devem ter as seguintes características: a) tirar partido da experiência dos participantes; b) adaptar-se às limitações de idade dos participantes; c) adultos devem ser desafiados a se mover cada vez mais para estágios avançados de desenvolvimento pessoal; d) adultos devem ter tantas escolhas quanto possível em relação à disponibilidade e organização de programas de aprendizado.

Considerando o aspecto mais específico deste trabalho, que seria o ensino universitário, não se poderia deixar de realçar a contribuição de Cavalcanti (2006):

Os estudantes universitários não são exatamente adultos, mas estão próximos desta fase de suas vidas. O ensino clássico pode resultar, para muitos deles, num retardamento da maturidade, já que exige dos alunos uma total dependência dos professores e currículos estabelecidos. As iniciativas não encontram apoio, nem são estimuladas. A instituição e o professor decidem o que, quando e como os alunos devem aprender cada assunto ou habilidade. E estudantes deverão se adaptar a estas regras fixas. [...]

Para evitar este lado negativo do ensino universitário, é necessário que sejam introduzidos conceitos andragógicos nos currículos e abordagens didáticas dos cursos superiores. Por estar a maioria dos universitários na fase de transição mencionada anteriormente, não pode haver um abandono definitivo dos

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métodos clássicos. Eles precisarão ainda de que lhes seja dito o que aprender e lhes seja indicado o melhor caminho a ser seguido. Mas devem ser estimulados a trabalhar em grupos, a desenvolver ideias próprias, a desenvolver um método pessoal para estudar, a aprender como utilizar de modo crítico e eficiente os meios de informação disponíveis para seu aprendizado. [...]

Como finalização, o autor afirma que:

[...] Precisamos estimular o autodidatismo, a capacidade de autoavaliação e autocrítica, as habilidades profissionais, a capacidade de trabalhar em equipes. Precisamos enfatizar a responsabilidade pessoal pelo próprio aprendizado e a necessidade e capacitação para a aprendizagem continuada ao longo da vida. Precisamos estimular a responsabilidade social, formando profissionais competentes, com autoestima, seguros de suas habilidades profissionais e comprometidos com a sociedade à qual deverão servir. Sem dúvida, a Andragogia será uma ótima ferramenta para nos ajudar a atingir estes objetivos. (CAVALCANTI, 2006). (grifo dos autores)

2. PROCEDIMENTO METODOLóGICOPara se poder chegar à ciência, deve-se fazer pesquisa. Para se fazer pesquisa,

deve-se estabelecer uma conexão entre os aspectos teóricos e os aspectos metodológicos, percebendo assim as trilhas pelas quais a ciência passa (COCURULLO, 2004). A metodologia é este conjunto de regras de como proceder ou de como conseguir esta conexão no curso da investigação (CASTRO, 1977), capaz assim de influenciar fortemente a pesquisa (KERLINGER, 1980).

Escolheu-se como metodologia uma pesquisa documental (levantamento e estudo dos programas das disciplinas obrigatórias do curso de Contabilidade da UFC), bem como uma pesquisa bibliográfica (revisão de literatura sobre o tema proposto).

A pesquisa bibliográfica, por ser de natureza teórica, já é uma parte integrante e obrigatória de qualquer trabalho científico, particularmente por se haver reservado um capítulo para reunir a teoria pertinente com o estudo proposto (referencial teórico), normalmente denominado de revisão de literatura ou fundamentação teórica. é por meio dela que se toma conhecimento sobre a produção científica pertinente, em especial, livros e artigos científicos (BEUREN, 2003).

Por sua vez, a pesquisa documental baseia-se em dados que ainda não receberam um tratamento analítico ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da

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pesquisa proposta. Sua importância é justificada no momento em que se podem organizar dados, que se encontram dispersos, conferindo-lhes uma nova notoriedade como fonte de consulta (BEUREN, 2003); ou seja, servem para corroborar e valorizar as evidências oriundas de outras fontes (YIN, 2005).

Utilizou-se nesta pesquisa, como forma de abordagem, principalmente o método racional indutivo, cujo procedimento do raciocínio parte de uma análise de dados ou observações particulares constatadas para proposições ou noções gerais. Neste caso, apresenta-se como uma forma ordenada do raciocínio dos dados singulares para uma verdade geral ou mais ampla, indo assim das constatações mais particulares às leis e teorias, dentro do que se poderia denominar de uma conexão ascendente (FACHIN, 2001; LAKATOS; MARCONI, 1992; RICHARDSON, 1999).

Em síntese, trata-se de estudo exploratório-descritivo, cuja abordagem técnica de coleta de dados utilizada foi a análise documental e cujos resultados foram tratados a partir da utilização da estatística descritiva.

Entende-se que o presente trabalho, elaborado conforme a metodologia apresentada, não tem a pretensão de esgotar o tema, mas procura ser, como comentado, mais uma contribuição para o meio acadêmico.

3. RESULTADOS E ANÁLISEForam escolhidos os programas das disciplinas obrigatórias da última matriz curricular

do curso de Ciências Contábeis disponível, ou seja, a de 1994.2, período noturno, por ser a mais recente, atualizada e por possuir provavelmente alunos de faixa etária mais alta.

Examinaram-se ao todo 36 programas de disciplinas obrigatórias do curso de Ciências Contábeis, já excluindo as duas disciplinas (Monografia em Ciências Contábeis e Estágio Supervisionado), que não apresentam programas. Duas (Teoria da Contabilidade e Métodos Quantitativos aplicados à Contabilidade) das 36 disciplinas não apresentaram metodologia nos programas examinados, apenas conteúdo programático e outras informações.

Os resultados encontrados foram os seguintes:

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TAbELA 1: PROCEDIMENTOS METODOLóGICOS INDICADOS NOS PROGraMAS DE DISCIPLINAS

Programas das Disciplinas Obrigatórias – Ciências Contábeis uFCDescrição Percentual (%)

metodologias de Ensino Informadas nos Programas Qtde. (1) (2)

Aulas expositivas (teóricas) 32 35,17 % 94,12 %Exercícios em sala de aula 07 7,70 % 20,59 %Trabalho em grupo 06 6,59 % 17,65 %Trabalhos individuais 06 6,59 % 17,65 %Debates / discussões 06 6,59 % 17,65 %Estudo dirigido 06 6,59 % 17,65 %Estudo de casos 06 6,59 % 17,65 %Seminários 05 5,49 % 14,71 %Leitura e interpretação de textos 05 5,49 % 14,71 %Aulas em laboratório 03 3,30% 8,82 %Simulação de casos 02 2,20 % 5,88 %Estudo em grupo 01 1,10 % 2,94 %Pesquisa científica 01 1,10 % 2,94 %Visita a empresas 01 1,10 % 2,94 %Pesquisa de campo 01 1,10 % 2,94 %Palestras de profissionais convidados 01 1,10 % 2,94 %Aulas práticas 01 1,10 % 2,94 %Dinâmicas de grupo 01 1,10 % 2,94 %

Total Geral 91 100,0 % 100,0 %Fonte: Pesquisa dos autores.

(1) Percentual calculado considerando a quantidade dos tipos de metodologias citadas nos programas examinados em relação ao total destas mesmas quantidades apuradas no aspecto global (91).

(2) Percentual calculado considerando a quantidade dos tipos de metodologias citadas nos programas examinados em relação ao total da quantidade de disciplinas examinadas (34 ao total, desconsiderando 2 que não apresentavam metodologias).

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TAbELA 2 – QUANTIDADE DE MÉTODOS REGISTraDOS POR DISCIPLINAS

Disciplinas Obrigatórias do Curso Ciências Contábeis da uFCDisciplinas Qtde. métodos Informados

1. Administração Financeira 012. Análise das Demonstrações Contábeis 013. Análise de Custos 034. Auditoria 015. Computação Aplicada 016. Contabilidade Aplic. Empresas Comerciais 037. Contabilidade Aplic. Empresas Industriais 018. Contabilidade Aplic. Inst. Financeiras 069. Contabilidade de Custos 0610. Contabilidade e Legislação Societária 0111. Contabilidade e Legislação Tributária 0312. Contabilidade Geral 0113. Contabilidade Gerencial 0414. Contabilidade Governamental I 0415. Contabilidade Governamental II 0416. Direito do Trabalho 0117. Fundamentos de Cálculo 0218. Fundamentos de Direito 0119. Fundamentos de Estatística 0220. Introdução à Administração 0121. Introdução à Contabilidade 0122. Introdução à Sociologia 0423. Legislação Comercial 0124. Legislação e Ética Profissional 0425. Matemática Financeira 0326. Métodos Quant. Aplic. à Contabilidade 0027. Orçamento Empresarial 0228. Perícia Contábil 0329. Prática Contábil e Fiscal 0430. Português Instrumental 0531. Sistemas Contábeis Informatizados 0532. Técnicas de Pesquisa em Contabilidade 0133. Teoria da Contabilidade 0034. Teoria Econômica I 0235. Teoria Econômica II 0636. Tópicos Avançados de Contabilidade 03

Total Geral 91Fonte: Pesquisa dos autores

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Pelos resultados descritos nas tabelas citadas, pode-se inferir o seguinte: a) Quase todos os programas das disciplinas optam por aulas teórico-expositivas

(32 das 34 disciplinas examinadas, ou seja, 94%);b) Treze (13) programas de disciplinas só apresentam uma única metodologia

de ensino (38% do total de disciplinas examinadas), sendo que 12 delas (92% das disciplinas com uma única metodologia), a única metodologia de ensino foram as aulas teórico-expositivas;

c) Vinte e três (23) disciplinas listam até 3 tipos diferentes de metodologias de ensino nos seus programas (68%), sendo que 11 disciplinas listam acima de 3 tipos de metodologias (32%);

d) O maior número de quantidade de tipos de métodos diferentes informados nos programas das disciplinas foi de 6, que constou em apenas 3 disciplinas (9% do total de disciplinas examinadas).

Como já foi exposto anteriormente, as metodologias de ensino voltadas para o ensino-aprendizagem de adultos (Andragogia) são as que levam a uma interação maior entre o professor e o aluno, tornando o aluno um ser ativo no processo de construção da própria aprendizagem. Como exemplo de metodologias de ensino voltadas à Andragogia, poderíamos citar: a aplicação de dinâmicas, vivências de grupo, exposição/estudo de casos e temas relacionados, seminários, palestras e visitas empresariais com recursos visuais e sonoros e aplicação de casos práticos (aprender fazendo).

Confirmam-se pelos resultados expostos, praticamente os pressupostos elaborados anteriormente: que muitos dos tipos de metodologias de ensino descritos nos programas das disciplinas são relativamente semelhantes (não no sentido do texto escrito, mas no aspecto da pouca variação de metodologias); que os professores optam geralmente por aulas expositivas (metodologia tradicional e pouco interativa com os alunos) e que os programas de disciplinas examinados oferecem pouca opção de outros tipos de metodologias de ensino-aprendizagem mais interativas com os alunos.

4. CONSIDEraÇõES FINAISAs metodologias descritas nos programas das disciplinas obrigatórias do curso

de graduação em Ciências Contábeis da UFC, e que possivelmente são empregadas pelos respectivos professores em sala de aula, estão basicamente centralizadas em aulas expositivas teóricas, num modelo de ensino-aprendizado associado muito mais à Pedagogia do que à Andragogia.

Este tipo de metodologia baseada, quase que exclusivamente, em aulas expositivas teóricas, demonstra provavelmente também um apego dos professores a uma metodologia tradicionalista, centrada na figura do mestre, com poucas opções de questionamento e de construção do conhecimento pelos próprios alunos (atitude ativa) e preocupada apenas no repasse de conhecimentos e técnicas descritas de forma rígida nos programas das disciplinas.

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Um ponto a questionar é se a ausência de formação na área de teorias do ensino, por parte do professor, não o leva a ensinar como aprendeu, por imitação, sem dar valor à utilização de uma metodologia mais adequada e atualizada. Em outros termos, ensinar como um leigo em educação, sem ter a devida formação profissional para ser professor.

Os objetivos estipulados foram alcançados e as suposições propostas neste estudo foram confirmadas, demonstrando que muitas das metodologias de ensino descritas nos programas das disciplinas analisados eram semelhantes e sem muitas variações entre si; que nos programas destas disciplinas se optou basicamente por aulas teórico-expositivas (metodologia tradicional); e, que poucos foram os programas de disciplinas examinados que fazem opção por outros tipos de metodologias de ensino-aprendizagem mais interativas com os alunos.

Considera-se como limitação da pesquisa, a questão da não comprovação do que está descrito nas metodologias de ensino-aprendizagem dos programas das disciplinas, do que é realmente praticado pelos respectivos professores na sala de aula, além disso, só foram analisados os programas de ensino de um único curso acadêmico da UFC.

Os resultados apresentados devem contribuir para uma maior reflexão e questionamento sobre se realmente a utilização, quase que exclusiva, de aulas expositivas teóricas, como metodologia de ensino-aprendizagem, pelos professores do curso de graduação em Ciências Contábeis da UFC, bem como provavelmente nos demais cursos acadêmicos da citada universidade e de outras instituições de ensino superior, atendem realmente às exigências de aprendizado dos alunos universitários (adultos). Será que esta metodologia ajuda a alcançar particularmente o objetivo geral traçado para o curso de graduação em Ciências Contábeis da UFC? Será que está condizente com as necessidades do mercado de trabalho e propicia a melhor e mais adequada formação para os novos cidadãos brasileiros?

Recomenda-se, a título de estudos futuros, principalmente para Coordenadores de Curso e Diretores Pedagógicos, a análise das metodologias de ensino propostas nas disciplinas de seus cursos superiores, a fim de que os mesmos identifiquem deficiências metodológicas e possam adequá-las aos princípios da Andragogia, para favorecer uma melhor aprendizagem dos alunos, respeitando sua experiência de vida e cultura.

Enfim, a Andragogia, neste processo, pode dar muitas contribuições, principalmente quando da atualização destes citados programas, para a adoção de uma metodologia mais focada no público universitário adulto, com aumento na qualidade do ensino e da aprendizagem destes alunos.

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raZõES DE PREFERÊNCIA DE COMPra POR SUPERMERCADOS NA CIDADE DE FORTALEZA

REASONS FOR CHOOSING THE PURCHASE BY SUPERMARKETS IN THE CITY OF FORTALEZA

Danielle Miranda de Oliveira Arruda GomesUniversidade de Fortaleza – Unifor

Joanna Oliveira de Melo

Universidade Estadual do Ceará – UECE

Luciana de Castro e Silva MenezesUniversidade Estadual do Ceará – UECE

Resumo Este estudo enfocou o comportamento do consumidor de supermercados em bairros

de classe média alta na cidade de Fortaleza. Especificamente, buscou-se: (1) identificar o perfil; (2) levantar as variáveis determinantes na decisão de compra em varejo de alimentos. O desenho mercadológico consistiu de estudo exploratório e descritivo, de natureza quantitativa e qualitativa. Realizou-se uma survey em amostra probabilística estratificada proporcional de 385 consumidores de supermercados, calculada com nível de confiança de 95% e erro de 5%. A abordagem qualitativa deu-se por meio de dois grupos focais, um feminino e outro masculino. Os resultados indicam que as razões de preferência por supermercados são, em ordem de importância: preço, localização, condições de pagamento, qualidade dos produtos e rapidez no atendimento. palavras-chave: Razões de Preferência, Varejo, Comportamento do Consumidor.

ABSTRACT This study focused on the consumer behavior of supermarkets in neighborhoods of upper

middle class in the city of Fortaleza. Specifically, this research aims to: (1) identify the profile of consumers and (2) find the variable factors in the decision to purchase in retail food chains. The design consisted in exploratory and descriptive, quantitative and qualitative researches. A proportional stratified random sample of 385 consumers in supermarkets was calculated with a confidence level of 95% and an error of 5%. A qualitative approach was made by means of two focus groups, consisted of male and female. The results indicate that the reasons for preference for supermarkets are, in order of importance: price, location, payment terms, product quality and fast service.

KEYWORDS: Reasons of Preference, Retail, Consumer Behavior.

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INTRODUÇÃOA gestão dos negócios dos supermercados sofreu forte impacto após o ingresso

das multinacionais que instabilizaram o mercado brasileiro. Essa instabilidade elevou a competitividade do ramo, trazendo maior necessidade de estudos que possam embasar a formulação de estratégias por parte dos profissionais. Ademais, o perfil do consumidor brasileiro sofreu grandes mudanças, passando a ser mais exigente, questionador e nada fiel, independentemente do segmento do mercado em que atua. (NAKAMURA, 1997; ROSSONI, 2002).

Este artigo enfocou o comportamento do consumidor de supermercados de classe média alta na cidade de Fortaleza, com o propósito de estudar o motivo de compra da classe média alta, pois fazem com cautela e gostam de produtos com qualidade melhor até mesmo para mostrar seu poder aquisitivo, segundo Las Casas (2004), e assim contribuindo para a discussão do tema e alargando o conhecimento dos motivos de compra em varejo de alimentos. Assim, buscou-se resposta para o seguinte problema: quais as principais razões de preferência dos consumidores por supermercados nos bairros de classe média alta em Fortaleza? Especificamente, pretendeu-se: (1) identificar o perfil destes consumidores; (2) levantar as variáveis determinantes na decisão de compra em varejo de alimentos.

O desenho metodológico do estudo constou de duas fases. A primeira consistiu em abordagem quantitativa, com aplicação de survey. A amostra probabilística e estratificada foi composta de 385 pessoas, concentradas em quatro estratos correspondendo aos bairros Meireles, Papicu, Edson Queiroz e Aldeota, calculada conforme Rea e Parker (2000), com nível de confiança 95% (2 Z ou sigma) e margem de erro de 5%. Na segunda fase, realizou-se uma abordagem qualitativa, com aplicação de dois grupos focais de dez participantes masculinos e dez femininos, além de mediador e conforme os postulados de Malhotra (2005).

O artigo está estruturado em duas seções, além desta introdução, metodologia, considerações finais e referências bibliográficas: a primeira aborda a dimensão teórica do comportamento do consumidor, o modo da realização da pesquisa, bem como resultados de estudos realizados em nível nacional; na segunda apresentam-se os resultados da pesquisa de campo.

1 . O C O M P O RTA M E N TO D O C O N S U M I D O R b R A S I L E I R O D E SUPERMERCADOS

O comportamento do consumidor corresponde às atividades físicas, mentais e emocionais realizadas pelos clientes de bens de consumo e industriais que resultam em decisões e ações (comprar e utilizar produtos e serviços e pagar por eles) nas quais esses clientes se engajam quando selecionam, compram, usam e disponibilizam um produto ou serviço para satisfazer a uma necessidade ou a um desejo (SHETH ET AL, 2001; TONI E SCHULER, 2003). O processo de decisão de compras é constituído de cinco etapas, assim enumeradas por Kotler (2000): (1) o reconhecimento do problema, (2) a busca de informações, (3) a avaliação das alternativas, (4) a decisão de compra e (5) o comportamento pós-compra, cujos detalhes são explicitados a seguir.

DANIELLE MIRANDA DE OLIVEIRA ARRUDA GOMES, JOANNA OLIVEIRA DE MELO E LUCIANA DE CASTRO E SILVA MENEZES

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O reconhecimento do problema corresponde à fase onde o comprador percebe um problema ou uma necessidade, que podem ser fruto de estímulos internos, como sede, fome ou sexo ou externos, que são causados por estímulos como anúncios, propagandas ou imagens. A busca de informações diz respeito à etapa em que, estando interessado, o consumidor procura informações antes de realizar a compra. A etapa da avaliação das alternativas se refere à fase em que o consumidor avalia as diferenças entre os produtos concorrentes, de acordo com a necessidade a que busca satisfazer, os benefícios da escolha de cada uma das opções e o conjunto de atributos que cada produto representa. A decisão de compra é a penúltima das etapas e pode ser influenciada por fatores situacionais não previstos, bem como pela disposição do consumidor em acolher desejos de outra pessoa e da atitude negativa dessa pessoa em relação à preferência do consumidor. Tal influência pode provocar interferências entre a intenção de compra, que se dá a partir das preferências desenvolvidas junto ao conjunto de escolha, e a decisão de compra. Na última fase ocorre a satisfação, que diz respeito à consonância entre as expectativas do consumidor e o desempenho percebido do produto, em que as ações pós-compra, ligadas à satisfação, podem traduzir-se na compra ou não do produto em uma situação futura e na divulgação positiva ou negativa do produto pelo cliente ou, ainda, em devoluções, ações públicas contra a empresa etc. A cada necessidade de compra, o consumidor é influenciado tanto por fatores individuais como psicossociológicos. Pesquisar esses fatores pode ajudar os profissionais de marketing a atingir os consumidores de maneira mais eficaz. No próximo tópico, abordamos estes fatores.

Rossoni (2002) identificou fatores de preferência dos consumidores brasileiros por supermercados: preço, atendimento, qualidade, higiene/limpeza, variedade, rapidez no caixa, atmosfera da loja e conveniência. Essas pesquisas também mostram que a disponibilização e manutenção de serviços diversificados, rapidez no atendimento, localização, facilidade de acesso, estacionamento e condições de pagamento, aumentam a conveniência do comprador e se tornam cada vez mais relevantes para a escolha da loja. O atendimento, apesar do pouco contato dos clientes com os empregados durante a compra, pode representar um diferencial para a empresa, contribuindo para conferir-lhe uma imagem positiva e compreende aspectos como esclarecimento, ajuda, atenção e eficiência na hora da compra.

A atmosfera da loja, para Kotler (2000), é relevante e tem relação com o espaço para circulação, a iluminação e com o ambiente como um todo. Assim, o espaço físico em que uma loja opera com produtos e serviços torna-se um poderoso fator de distinção, criando e reforçando as inclinações do comprador em relação à loja e a seus produtos e serviços, incentivando os consumidores a permanecer por mais tempo comprando e sentindo prazer durante esse período dentro da loja.

Por ser um fator importante, os administradores estão tendo um cuidado especial com a atmosfera da loja. De acordo com Lipman (1990 apud SPANGENBERG et al., 1996) bons aromas estimulam os consumidores a estarem nas lojas, pois sabemos que é um diferencial e motiva os consumidores para entrar nas lojas e consequentemente consumir.

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2. METODOLOGIA A metodologia foi realizada em dois períodos. O primeiro foi uma pesquisa

quantitativa, utilizando o survey. Com uma amostra probabilística e estratificada realizada com 385 pessoas, em quatro bairros de Fortaleza: Meireles, Papicu, Edson Queiroz e Aldeota, calculada conforme Rea e Parker (2000), com nível de confiança 95% (2 Z ou sigma) e margem de erro de 5%. A segunda, foi uma pesquisa qualitativa com o grupo focal de dez participantes masculinos e dez femininos, de classe média alta, além de mediador e conforme os postulados de Malhotra (2005).

Foi utilizado o estudo exploratório descritivo quantitativo, em fontes variadas e por meio de pesquisa de campo através de questionário. O estudo exploratório constou de pesquisa em fontes diversas para se inteirar dos conceitos de varejo, supermercado e razões e processo de compra.

Usou-se estudo exploratório porque, segundo Gil (1995), Lakatos e Marconi (1999), esse tipo de estudo procura obter maior aproximação do fenômeno estudado, gerando esclarecimentos sobre o problema pesquisado e possibilitando novas hipóteses para estudos futuros. Andrade (1999), por sua vez, diz que o estudo exploratório tem como características (1) dar maiores informações ao pesquisador sobre o assunto que se quer investigar; (2) facilitar a delimitação de tema da pesquisa; (3) orientar a fixação dos objetivos e (4) formular hipóteses ou descobrir um novo assunto.

Utilizou-se estudo descritivo porque, segundo Gil (1995; 1999), ele descreve e analisa aspectos de populações específicas e ainda infere conexões entre variáveis, cujo objetivo é descrever completamente determinado fenômeno, como, por exemplo, a situação para a qual são realizadas análises empíricas e teóricas. O estudo descritivo consistiu na realização de uma pesquisa de campo junto aos consumidores de supermercados de Fortaleza.

Mattar (2001) aponta as seguintes características do estudo descritivo: (1) descrever as características de grupos em relação a fatores específicos; (2) estimar a proporção de elementos numa população que tenha determinadas características ou comportamentos e (3) descobrir ou verificar a existência de relações entre variáveis.

Neves (2004, p.24), afirma que a pesquisa quantitativa é usada quando “se deseja conhecer as características da maioria da população, tendo como base uma amostra selecionada por critérios estatísticos (amostragem probabilística e aleatória)”.

A técnica de amostragem probabilística pode ser definida quando todo objeto/indivíduo tem igual chance de ser escolhido ou igual probabilidade de aparecer na amostra (TAGLIACARNE, 1991).

A determinação do universo ou da população que foi amostrado(a), tendo em vista os objetivos e a definição do problema de pesquisa propostos por esse estudo, consistiu no total da população ou do universo de todos os consumidores de supermercados de Fortaleza.

Para os fins deste estudo foi utilizada a técnica de amostragem probabilística e estratificada, por bairro de maior concentração de lojas das principais cadeias de supermercado, proporcional ao número dessas lojas em cada bairro, onde foram

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escolhidos aleatoriamente clientes dos 4 bairros onde concentram-se o maior número de supermercados.

De acordo com Rea e Parker (2000) o tamanho da amostra com nível de confiança de 95% (2 Z ou sigma) e margem de erro de erro de 5%, é de 385, para o caso do universo total de clientes de supermercado, pois trata-se de uma população infinita, já que a população de Fortaleza é de mais de dois milhões de habitantes.

Abaixo é apresentada uma tabela (Tabela1) onde constam os 4 bairros de maior concentração de lojas, onde foram feitas as entrevistas.

TAbELA 1bAIRROS ONDE FOraM FEITAS AS ENTREVISTAS, COM O RESPECTIVO

NÚMERO DE LOJAS E DE ENTREVISTAS APLICADAS.

BAIRRO NÚmERO DE LOJAs

NÚmERO DE ENTREVIsTAs A sEREm REALIZADAs

Meireles 5 107Papicu 5 107

Edson Queiroz 4 86Aldeota 4 85Total 18 385

Fonte: Adaptado pelo autor com base em dados da ACESU (2006).

A pesquisa qualitativa foi realizada com um grupo focal de dez participantes masculinos e dez femininos de classe média alta. O grupo focal foi escolhido porque permite uma maior interação com as pessoas que estão sendo entrevistadas.

Segundo Rossi e Slongo (1997), no grupo focal as pessoas podem falar a vontade, ser livres para dar sua opinião sobre o assunto comentado, e precisa de habilidade do entrevistador para fazer com que todos participem.

3. RESULTADOS Os resultados deste estudo foram organizados em dois tópicos. O primeiro apresenta

os dados levantados pela pesquisa do tipo survey e o segundo os dados coletados por meio de grupos focais.

3.1 SurveyNo que tange ao perfil do consumidor, há predominância do gênero feminino, com

faixa etária entre 32 e 40 anos, escolaridade concentrada no Ensino Médio e renda mensal entre 4 e 6 salários mínimos, conforme as tabelas 2, 3, 4 e 5.

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TAbELA 2 - GÊNERO

N %MASCULINO 150 39,00

FEMININO 235 61,00Total 385 100,00

Fonte: Pesquisa direta.

TAbELA 3 – FAIXA ETÁRIA

N %De 18 A 24 ANOS 25 6,50De 25 A 31 ANOS 95 25,00De 32 A 40 ANOS 150 39,00De 41 A 47 ANOS 78 20,00

Acima de 47 ANOS 37 9,50Total 385 100,00

Fonte: Pesquisa direta.

TAbELA 4 – ESCOLARIDADE

N %ENSINO FUNDAMENTAL 0 0,00

ENSINO MéDIO INCOMPLETO 6 1,50ENSINO MéDIO 144 37,50

ENSINO SUPERIOR INCOMPLETO 127 33,00ENSINO SUPERIOR 72 18,50PÓS- GRADUAÇÃO 36 9,50

Total 385 100,00Fonte: Pesquisa direta.

TAbELA 5 – RENDA MENSAL

N %ATé 2 SM 30 8,002 A 3 SM 90 23,004 A 6 SM 177 46,00

MAIS DE 6 SM 88 23,00Total 385 100,00

Fonte: Pesquisa direta.

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No que se refere às variáveis determinantes, os preços afetam em 89% a escolha por supermercados. TAbELA 6 – PREÇOS QUE AFETAM NA ESCOLHA POR SUPERMERCADO

N %NÃO 33 8,50SIM 342 89,00

NÃO SEI 10 2,50Total 385 100,00

Fonte: Pesquisa direta.

Quando comparada com outras e excluindo-se o preço, a variável que mais afeta na escolha por um supermercado é a localização com 32%, seguida por condições de pagamento (22%) e rapidez no caixa (19%), enfatizando a dimensão conveniência do consumidor, conforme tabela 7.

TAbELA 7 – VARIÁVEIS QUE AFETAM NA ESCOLHA POR SUPERMERCADO

N %SERVIÇOS DIVERSIFICADOS 80 10,50

LOCALIZAÇÃO 248 32,00RAPIDEZ NO CAIXA 147 19,00ESTACIONAMENTO 126 16,50

CONDIÇÕES DE PAGAMENTO 169 22,00OUTROS 0 0,00

Total 770 100,00Fonte: Pesquisa direta.

Higiene, limpeza e qualidade dos produtos influenciam na escolha por supermercado em 99,50% dos casos, enquanto a variedade dos produtos ofertados é importante para 69% dos entrevistados, a atmosfera da loja influi 67% dos pesquisados e o atendimento é relevante para 62% dos consumidores consultados, como se verifica nas tabelas 8, 9, 10, 11.

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TAbELA 8 – HIGIENE, LIMPEZA DA LOJA E QUALIDADE DOS PRODUTOS

N %NÃO 1 0,25SIM 383 99,50

NÃO SEI 1 0,25Total 385 100,00

Fonte: Pesquisa direta.

TAbELA 9 – VARIEDADE DOS PRODUTOS

N %NÃO IMPORTA 7 2,00

POUCO IMPORTANTE 15 4,00IMPORTANTE 265 69,00

MUITO IMPORTANTE 86 22,00NÃO SEI 12 3,00

Total 385 100,00Fonte: Pesquisa direta.

TAbELA 10 – ATENDIMENTO DA LOJA

N %NÃO IMPORTA 0 0,00

POUCO IMPORTANTE 5 1,50IMPORTANTE 239 62,00

MUITO IMPORTANTE 139 36,00NÃO SEI 2 0,50

Total 385 100,00Fonte: Pesquisa direta.

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TAbELA 11 – ATMOSFEra DA LOJA

N %NÃO IMPORTA 8 2,00POUCO IMPORTANTE 6 1,50IMPORTANTE 258 67,00MUITO IMPORTANTE 111 29,00NÃO SEI 2 0,50Total 385 100,00Fonte: Pesquisa direta.

Quando solicitados a eleger o aspecto preponderante na escolha por supermercados, o preço destacou-se, constituindo-se na variável de maior influência quando comparada com as demais, conforme a tabela 12.

TAbELA 12 – ASPECTOS IMPORTANTES SObRE SUPERMERCADOS

N %PREÇOS 476 41,00

SERVIÇOS DIVERSIFICADOS 28 2,50LOCALIZAÇÃO 277 24,00

RAPIDEZ NO CAIXA 62 5,50ESTACIONAMENTO 19 1,50

CONDIÇÕES DE PAGAMENTO 86 7,50LIMPEZA E HIGIENE DA LOJA 62 5,50

QUALIDADE DOS PRODUTOS PERECÍVEIS 74 6,50VARIEDADE DOS PRODUTOS 56 5,00

ATENDIMENTO 5 0,50ATMOSFERA DA LOJA 7 0,50

Total 1152 100,00Fonte: Pesquisa direta.

Excluindo-se a variável preço, a escolha por um dado supermercado é determinada pela localização, representada por 33% dos casos.

A rapidez no caixa foi opção de 25% dos consumidores entrevistados, conforme a tabela 13.

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TAbELA 13 – ESCOLHA POR SUPERMERCADO, O PREÇO SENDO O MESMO

N %SERVIÇOS DIVERSIFICADOS 36 4,50

LOCALIZAÇÃO 255 33,00RAPIDEZ NO CAIXA 192 25,00ESTACIONAMENTO 10 1,00

CONDIÇÕES DE PAGAMENTO 116 16,00LIMPEZA E HIGIENE DA LOJA 6 0,50

QUALIDADE DOS PRODUTOS PERECÍVEIS 19 2,50VARIEDADE DOS PRODUTOS 67 8,50

ATENDIMENTO 41 5,50ATMOSFERA DA LOJA 28 3,50

Total 770 100,00Fonte: Pesquisa direta.

3.2- GRUPO FOCALEmbora os preços sejam relevantes na escolha de supermercados, a pesquisa qualitativa

revelou que os entrevistados têm consciência de que os preços da maioria dos produtos são similares nas diversas lojas. Consideraram que deslocar-se para locais mais distantes no intuito de usufruir de promoções não compensa, tendo em vista a perda de tempo no trânsito e os gastos com combustível. Além disso, os entrevistados observaram que quando um produto está mais barato em um supermercado, muitas vezes os preços de outros produtos são mais altos. Portanto, a variável preço foi fortemente vinculada à localização. Assim, a proximidade do trabalho e da residência foi indicada pelos entrevistados como forte influenciadora na escolha de varejo de alimentos.

A rapidez no caixa foi relatada como fator importante, apesar de inferior à localização no que se refere à escolha do local de compra. A existência de filas com mais de três pessoas no caixa mostrou-se como fator de inviabilidade, causando muitas vezes aversão em relação à loja. Outro fator importante é a limpeza e higiene do ponto de venda, que foram identificados pelos entrevistados como requisito básico e fundamental para motivar a frequência a um supermercado. A ausência de higiene e limpeza foi considerada inaceitável, provocando repulsa em relação ao ambiente da loja. A variedade de produtos foi considerada um fator fundamental para evitar o deslocamento de um local de compra para outro para finalização das compras, repercutindo em perda de tempo.

As variáveis estacionamento e ambiente da loja foram consideradas pouco relevantes, já que todos os supermercados possuem características semelhantes. Especificamente sobre a atmosfera da loja, foi declarada a preferência por músicas em volume baixo e quanto ao estilo, preferencialmente músicas populares.

Algumas distinções relativas a gênero merecem destaque: um fator muito valorizado pelas mulheres foi a existência de bônus dado por alguns supermercados, o que acabou

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por interferir na preferência por lojas que trabalham com cartões de fidelidade. A maioria das entrevistadas declarou que as bonificações acabam por fazer com que as compras fiquem mais atrativas, visto que a diluição do valor do bônus no valor da compra resulta em produtos mais baratos.

CONSIDEraÇõES FINAISEste artigo teve como objetivo principal analisar as razões de preferência por

supermercados na cidade de Fortaleza, analisando aspectos do comportamento do consumidor como perfil, preferências, atitudes e hábitos. Conforme o referencial teórico estudado, as empresas varejistas conseguem definir e redefinir sua estratégia e sustentar uma vantagem competitiva frente às demais.

Os dados coletados indicaram o preço como a principal variável influenciadora na escolha de supermercados. Porém, a pesquisa revelou que a variável localização apareceu fortemente vinculada ao preço, que apesar de determinante, foi percebido pelos entrevistados como pouco diferenciado entre a concorrência. A dimensão conveniência foi reforçada pela ênfase dada pelos resultados às variáveis condições de pagamento e rapidez no caixa. Alguns fatores foram apontados como condição sine qua non para frequentar um supermercado, embora individualmente não tenham peso na decisão do local de compras: condições de higiene e limpeza da loja e variedade de produtos. A principal distinção observada no que tange ao gênero concerne à valorização dos cartões de fidelidade por parte das mulheres, que avaliaram as bonificações como atrativas.

A principal limitação da pesquisa foi o enfoque em um grupo, no caso classe média alta, por causa dos custos com as pesquisas e o tempo com a entrega dos resultados. Contudo, recomenda-se ainda a realização de novos estudos, para detectar outros fatores não contemplados com a realização dessa pesquisa, com o intuito de aprofundar o conhecimento sobre as razões de preferência de compra por supermercado na cidade de Fortaleza.

Assim, este trabalho traz relevantes implicações gerenciais, à medida que permitem aos gestores acesso aos dados sobre os consumidores de supermercados que podem ser usados com o objetivo de atingir e manter clientes. Os gerentes podem usar o preço como um importante aliado no aumento de compras dos clientes, fazendo promoções em alguns dias da semana, ou promoções relâmpago, diminuindo alguns custos, e consequentemente, diminuindo o preço para os consumidores. Em relação à localização, deve-se pesquisar qual o local de mais fácil acesso para as pessoas e se possível aumentar a rede de supermercados. Outro ponto importante é a condição de pagamento que pode ocorrer com os cartões dos supermercados no recebimento da maior quantidade de cartões de crédito por meio de convênio com as suas respectivas administradoras. Por último, a rapidez no caixa pode ser aperfeiçoada com o aumento de caixas, assim como de caixas rápidos para quem compra menos volume de produtos, ampliando o atendimento do maior número de clientes.

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UM CONFRONTO DE IDEIAS SObRE SCRipTS E INTEraÇõES COMERCIAIS: UMA VISÃO bASEADA NA

TEORIA DA ANÁLISE TraNSACIONAL

A CONFRONTATION OF IDEAS ABOUT SCRIPTS AND COMMERCIAL INTERACTIONS: AN ANALYSIS TRANSACTIONAL

THEORY – BASED VIEW

Ana Augusta Ferreira de FreitasUniversidade Estadual do Ceará

Renata Furtado GradvohlUniversidade Estadual do Ceará

Marília Pinheiro FalcioniUniversidade Estadual do Ceará

ResumoPartindo-se da necessidade de maiores reflexões acerca do comportamento humano

em situações de troca, este trabalho tem por objetivo compreender, à luz da Análise Transacional, as possibilidades de transação que podem ocorrer em uma interação comercial quando o estímulo gerado pelo vendedor é baseado em um script. Através de uma pesquisa exploratória e documental, é realizada uma análise em materiais de empresas de treinamento, possibilitando uma categorização das orientações contidas nestes conteúdos de acordo com a teoria dos Scripts e a da Análise Transacional.Os seguintes resultados foram constatados no estudo: os scripts contidos nos documentos analisados são considerados estímulos que podem provocar respostas variadas dependendo da personalidade do cliente que estiver inserido na interação comercial; indicações de flexibilidade foram evidenciadas, notando-se, então, a caracterização de uma natureza mais variável de scripts. Outros resultados encontrados e sugestões para futuras pesquisas são discutidos nas considerações finais. palavras-chave: Scripts, Análise Transacional, Interações Comerciais.

ABSTRACTBased on the need of further thinking about human behavior in trade situations, this

paper aims to understand, according to Transactional Analysis, the potential transactions that may occur in a commercial interaction when the stimulus generated by the seller

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is based on a script. Through a documentary and exploratory research, an analysis in training companies` documents is performed, enabling a categorization of the orientations contained in these documents according to the Scripts theory and Transactional Analysis theory. The following results were observed in this study: the scripts found in the analyzed documents were considered stimuli that can cause different responses depending on the personality of the client that is inserted in the commercial interaction; indications of flexibilities were highlighted and it was observed a more variable type of scripts. Future research directions are discussed in the final considerations.KEYWORDS: Scripts, Transactional Analysis, Commercial Interactions.

IntroduçãoDebates acadêmicos atuais na área de marketing evidenciam a importância da

construção de relacionamentos comerciais duradouros, tema de pesquisa que se tornou recorrente nos últimos anos (e.g. GRÖNROOS, 1994; BERRY, 2000). Ao estudar o relacionamento estabelecido em ambientes comerciais, os pesquisadores buscam nas ciências sociais a explicação para o seu desenvolvimento, o que na maior parte das vezes leva a explicações complexas das relações entre clientes e vendedores, que são assemelhadas, mas não semelhantes às relações interpessoais (GUTEK, 1999). No entanto, na prática dos negócios, a interação entre vendedor e cliente nas empresas ainda é muito baseada na linearidade e previsibilidade, características estas de modelos que, aparentemente, estariam ultrapassados (Cf. BRANCO, 1995). Carvalho e Vergara (2002) confirmam esta realidade ao afirmarem que uma das abordagens mais utilizadas pelas empresas se baseia em uma teoria que propõe que o comportamento dos vendedores seja guiado por uma sequência de ações padronizadas e previamente estabelecidas, os chamados scripts cognitivos.

Diante deste contexto, acredita-se que há a necessidade de reflexões que propiciem um maior entendimento sobre como se dá esta relação diádica que ocorre nas trocas comerciais quando o estímulo gerado pelo vendedor é guiado por padrões preestabelecidos. Assim, o presente estudo retoma o ensaio teórico realizado por Carvalho e Vergara (2002), que questiona a eficácia dos scripts nos encontros de vendas, tomando para si a sugestão desses autores de que, por ser este um tema bastante complexo, outras pesquisas que auxiliem em uma melhor compreensão da essência na natureza humana são necessárias. Baseado nesta recomendação, pretende-se que esta retomada do estudo seja enriquecida por uma pesquisa empírica aliada a uma teoria comportamental, a teoria da Análise Transacional, a fim de que esta confluência propicie novos conhecimentos acerca dos momentos de interação comercial.

A escolha da Análise Transacional como uma das bases teóricas deste estudo se justifica pelo fato de que esta teoria foi elaborada a partir da observação do comportamento humano em situações de transações (Cf. KRACK; NASIELSKU; GRAAF, 1984). Neste campo de estudo, uma transação é entendida como qualquer movimento ou ação que uma pessoa provoca em um relacionamento com outra, resultando assim, em outro movimento ou ação de volta (OLIVEIRA, 1976). De uma forma simplificada, Berne (1985) relata que qualquer interação entre pessoas é considerada uma transação. Percebe-se, portanto, que

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a Análise Transacional torna-se interessante neste estudo no sentido de possibilitar um método de compreensão e análise do comportamento das pessoas envolvidas em um processo de relação comercial, sendo este método dirigido essencialmente aos estados de ego propostos por esta teoria e tendo como resultado final a compreensão sobre a influência desses estados nas transações.

Na verdade, na falta de uma estrutura teórica bem desenvolvida dentro do marketing, alguns autores (e.g. JANCIC; ZABKAR , 2002; ANDERSON; HAKANSSON; JOHANSON, 1994; DWYER; SCHUR; OH, 1987) entendem que a compreensão dos relacionamentos em contexto de negócios deve ser feita tomando por base o conhecimento gerado fora das ciências sociais aplicadas. Assim, acredita-se que a triangulação destes temas pode contribuir teoricamente com uma melhor compreensão dos relacionamentos que acontecem em ambientes comerciais, seja identificando suas características ou evidenciando contextos que contribuam para o seu desenvolvimento.

Partindo-se desta premissa, questiona-se se a utilização de scripts nas interações entre vendedor e cliente pode influenciar o resultado das transações comerciais. Em resposta a este questionamento, o objetivo deste trabalho é compreender, à luz da Análise Transacional, as possibilidades de transação que podem ocorrer em uma interação comercial quando o estímulo gerado pelo vendedor é baseado em um script.

Para a abordagem destes aspectos, o trabalho é estruturado da seguinte maneira: inicialmente, desenvolve-se um estudo sobre scripts, buscando-se conhecer os pensamentos dos principais autores que escreveram sobre o tema. Posteriormente, faz-se um recorte do amplo tema da teoria da Análise Transacional, salientando a sua importância no contexto organizacional, através da compreensão de cada um dos três estados de ego (Pai, Adulto e Criança) e de como acontece o relacionamento entre eles. Um estudo de cada tipo de transação proposta pela Análise Transacional (Paralela, Cruzada e Ulterior) é realizado, e servirá de base para um melhor entendimento sobre a dinâmica dos relacionamentos comerciais. Os procedimentos metodológicos são expostos na seção seguinte, seguidos dos resultados, considerações finais, limitações do estudo e direcionamentos futuros.

REFERENCIAL TEóRICO

Grande parte dos estudos sobre a teoria dos scripts foi publicada no meio científico nas décadas de 70 e 80 (e.g. LEIGH, 1987; SCHANK; ABELSON, 1977); entretanto, apesar desta abordagem já ter, teoricamente, sido superada por outros modelos organizacionais mais complexos, na prática, os scripts continuam sendo utilizados como base de interação entre o vendedor e o cliente em diversas empresas. Mesmo diante deste contexto, poucos estudos no Brasil e no mundo têm se voltado a reflexões específicas sobre este tema, que apesar de parecer ultrapassado, ainda é uma realidade no processo de transações comerciais. Desta forma, neste trabalho se mostra a evolução e as divergências dos principais autores que escreveram sobre o tema na área de marketing.

Schank e Abelson (1977) definem scripts como sendo uma sequência padronizada de ações que retratam uma determinada situação. Schank (1997) posteriormente reafirma que as pessoas possuem scripts (roteiros) em suas mentes para várias situações, que refletem as

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suas próprias expectativas de como certo evento irá acontecer. Leigh (1987) complementa este pensamento afirmando que os scripts definem os procedimentos de como vender, baseando-se em um esquema que descreve a sequência apropriada de eventos ou atividades que se enquadram num determinado contexto. Neste mesmo estudo, o autor relata que os scripts cognitivos representam a base de aprendizagem e por isto são importantes ferramentas que auxiliam os vendedores a entenderem uma interação de vendas, ajudando-os a guiarem os seus comportamentos no decorrer de uma transação.

Contrapondo-se à ideia destes autores que acreditam que, essencialmente, os scripts são representações de uma abordagem de vendas consideradas adequadas para uma situação específica de negócios, Carvalho e Vergara (2002) questionam como situações tão importantes para as empresas podem estar recebendo um treinamento baseado em uma abordagem que propõe que os vendedores aprendam sequências de comportamentos previamente estabelecidos, a fim de que as interações com os consumidores sejam controladas de uma forma padronizada. Motta (2000) comunga deste mesmo pensamento, quando defende que uma interação que segue um script predeterminado impede que as percepções, os sentimentos, a criatividade, dentre vários outros fatores inerentes à personalidade, sejam enriquecedores de um relacionamento.

Carvalho e Vergara (2002) sintetizam a preocupação dos autores que se posicionam contrários ao uso de scripts, ao afirmarem que as relações humanas são demasiadamente complexas para serem guiadas pelo uso de padrões preestabelecidos, sendo estes considerados como insuficientes, inadequados e incongruentes. De outra maneira, Leigh e McGraw (1989) também resumem a opinião daqueles que acreditam que existem vantagens no uso de padrões, ao afirmarem que as simplificações acarretadas pelo uso de scripts ajudam a lidar com o complicado processo das relações humanas de uma forma facilitada.

Estes padrões são também considerados estruturas organizadas que representam um método ideal para aprender e lembrar processos específicos de venda, permitindo que o vendedor compreenda uma evolução de situações para responder de forma adequada aos clientes. Esta evolução se dá através de uma elaborada base de conhecimento, que é armazenada na memória do vendedor, propiciando com que este conheça um número cada vez maior de situações que o ajudem a selecionar estratégias adequadas de vendas (scripts) para outras situações semelhantes que possam ocorrer posteriormente (LEONG; BUSCH; JOHN, 1989; LEIGH; RETHANS, 1984).

A respeito desta questão, Carvalho e Vergara (2002) rebatem o pensamento destes autores afirmando que somente vendedores com capacidade de memorizar perfeitamente centenas de roteiros teriam condição de manter relacionamentos fundamentados somente em interações por scripts. Eles argumentam, inclusive, que se os vendedores forem capazes de manter uma interação com os clientes através do uso destas sequências padronizadas, adaptando-as às variações que forem ocorrendo, a interação não deverá apresentar maiores dificuldades, entretanto, se qualquer uma destas variações não for suprida pelo uso destes scripts, o que acontece com muito mais frequência, surgem os diversos problemas. Este pensamento torna-se contrário também ao de Leigh e McGraw (1989), que acreditam que a interação flui com maior facilidade quando se pode esperar certo tipo de conduta de uma das pessoas envolvidas na interação e o comportamento do outro pode ser previsto.

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Stoltman, Tapp e Lapidus (1989) compartilham da mesma ideia geral acerca da função dos scripts, tal como estruturas cognitivas que contêm informações sobre a natureza de vários eventos e atividades em um processo de vendas. Entretanto, estes autores focam seu estudo em uma natureza mais variável dos scripts, afirmando que se deve reconhecer que eles também podem conter elementos flexíveis, e que estes podem constituir uma forma mais genérica e abstrata de scripts. No entanto, embora possam existir abstrações gerais, as subcategorias dos scripts, ou variantes deles, segundo os autores, são também contextualmente definidas e possuem propriedades determinadas. Desta forma, Stoltman, Tapp e Lapidus (1989) sugerem a necessidade de investigar a natureza dos scripts mediante a passagem para um nível mais alto de abstração. Eles relatam que a dificuldade disto acontecer está ligada à incapacidade coletiva de pensar em termos de variabilidade e diferenças de contexto, e também devido à orientação estereotipada ser universalmente compartilhada.

Nesse mesmo estudo de Stoltman, Tapp e Lapidus (1989), percebe-se que apesar destes autores sugerirem o uso de scripts como uma forma de condução do comportamento em uma interação comercial, eles admitem uma limitação desta abordagem no que se refere à padronização das ações. Contudo, a necessidade de flexibilidade e variabilidade dos scripts que é relatada por eles é inserida, ainda, em um contexto preestabelecido e consequentemente, controlado. Neste mesmo sentido, o estudo de Leong, Busch e John (1989) documenta que o sucesso na utilização dos scripts está relacionado à habilidade do vendedor de adaptá-los a diferentes situações de vendas. Estes autores salientam também, que as estruturas de scripts mais articuladas devem conter uma grande variedade de características, incluindo aquelas que representam situações menos típicas de vendas, menos frequentemente encontradas.

O trabalho de Leong, Busch e John (1989) baseia-se na ideia de dois tipos de estruturas de conhecimento que facilitam o processo de vendas: as estruturas de categorias e as estruturas de scripts. Esta primeira contém, segundo os autores, informações necessárias para descrever e classificar os diferentes tipos de clientes, incluindo as suas características, motivações e formas de comportamento. A estrutura do script, ao contrário, inclui informações sobre a sequência de ações e eventos que comumente são encontradas em situações de vendas e que podem ser usadas para guiar o comportamento do vendedor em situações similares.

Percebe-se que, tanto Stoltman, Tapp e Lapidus (1989) quanto Leong, Busch e John (1989) inserem ao contexto de scripts a ideia de flexibilidade. Nos dois estudos, os scripts são vistos também como importantes para determinar a forma como os vendedores se adaptam a novas ou modificadas situações de vendas. Contudo, Leong, Busch e John (1989) vão além; ao inserirem a importância dos vendedores e não somente considerarem a estrutura do script como fundamental em um processo de vendas, mas também a necessidade deles terem em mente a estrutura de categorias dos diversos tipos de clientes que podem estar inseridos neste processo de interação. Grönroos (1995) vai de encontro com esta ideia ao afirmar que a falta de adaptação dos scripts às diferenças individuais de cada cliente poderá provocar uma não aceitação por parte deste último em se inserir no processo, ou seja, na transação.

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Mesmo diante da inserção deste fator de variabilidade aos scripts, Carvalho e Vergara (2002) indicam que os vendedores devem ser treinados a fim de saberem selecionar, na prática, respostas adequadas para as diversas situações possíveis em uma interação comercial, não ignorando a sua dimensão intuitiva, a fim de não se deixarem guiar pelos padrões preestabelecidos. A partir destas propostas atuais mais flexíveis, Carvalho e Vergara (2002) sugerem que, no lugar de scripts, uma conduta mais criativa propiciaria uma melhor condição de gerar resultados mais efetivos para as empresas. Este pensamento vai de encontro com o de Morgan (1996), que afirma que a utilização de scripts como forma de interação com o cliente pode estar acarretando um afastamento dos modelos organizacionais mais modernos, que valorizam a criatividade que surge nas empresas, e está acabando por retroceder para aqueles antigos modelos burocráticos.

De acordo com o entendimento de script e de sua função nas interações comerciais, este trabalho pretende prosseguir com o estudo tendo por base a Análise Transacional, que é uma teoria comportamental pensada pelo psiquiatra Eric Berne, em 1958, e que tem hoje suas aplicações dirigidas a diversas áreas de estudo, dentre elas, a área organizacional (OLIVEIRA, 1976). Esta teoria foi escolhida diante da percepção dos autores de que progressos neste tema deveriam ser respaldados por uma maior compreensão da natureza humana e das suas variadas dimensões em interações interpessoais, podendo esta compreensão ser alcançada através dos estudos dos princípios da Análise Transacional.

A Análise Transacional (AT) é baseada na ideia de que existem três tipos de estados de ego que são formados através de experiências vividas e através de modelos incorporados de outras pessoas, principalmente parentes. Esses estados de ego que compõem a estrutura da personalidade são conhecidos como Pai, Adulto e Criança (GRAAF, 1984; KRACK; NASIELSKU; OLIVEIRA, 1976; BERNE, 1958). Em outras palavras, a Análise Transacional, através de um modelo descritivo do funcionamento da personalidade humana, permite a compreensão simples e objetiva do estado de ego das pessoas, dando a partir disto, ferramentas que permitem identificar o que está acontecendo em suas relações, possibilitando assim, um aprimoramento do desempenho na interação com os outros (OLIVEIRA, 1976).

Berne (1958) relata que o estado de ego é um sistema coerente de sentimentos ou um conjunto de padrões coerentes de comportamento que se restringe a três categorias: o que se assemelha às figuras paternas; o que depreende uma avaliação e análise da realidade e o que representa as experiências da primeira infância. A partir disso, todo indivíduo, em qualquer natureza de relacionamento, estará se comportando de acordo com um estado de ego, que não sendo imutável, pode mudar com variados graus de rapidez dependendo da situação que esteja sendo vivenciada.

No ego de Pai, Berne (1985) defende que estão registrados os conceitos, os valores e as normas que foram aprendidos através da relação com pais e adultos, ou seja, é a sedimentação dos conceitos de vida que foram ensinados na infância. Segundo Oliveira (1976), este é um estado que projeta a imagem que se tem dos próprios pais. Alguns termos são bem típicos deste estado, como expressões em tom de aconselhamentos ou em tom de críticas.

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O estado de ego de Adulto, que também é denominado por Krack, Nasielsku e Graaf (1984) como refletido e pensado, é um estado mais racional e lógico, que busca o autocontrole e a melhor utilização da linguagem. Berne (1958) relata que a função primordial deste estado não é registrar informações, como é característico dos outros dois egos, mas sim, processar e analisar, de modo não preconceituoso, a fim de que seja dada uma resposta adequada ao exterior. O estado Adulto apresenta um comportamento mais analítico e as suas expressões típicas denotam a ideia de investigação e de conhecimento dos fatos, como complementa Oliveira (1976).

Por último, o estado de ego de Criança, conforme Krack, Nasielsku e Graaf (1984), possui um apelo criativo e inventivo. Também Oliveira (1976) confirma isto ao afirmar que na criança estão mais presentes os conceitos criados a partir do que foi sentido. As expressões típicas deste estado, muitas vezes, denotam uma preocupação exclusiva com a própria pessoa, dando a ideia de súplica ou de exibicionismo, ou com uma vasta demonstração de emoções.

Enfim, a partir do entendimento do que se passa em cada estado de ego, torna-se mais fácil a compreensão das possíveis formas de transações que ocorrem quando alguém se relaciona com uma outra pessoa. Cada transação é formada de um estímulo e de uma resposta, podendo elas procederem do Pai, Adulto ou Criança de uma pessoa, para o Pai, Adulto ou Criança de uma outra pessoa. Entretanto, é preciso que exista uma resposta ao estímulo, para que ocorra uma transação. A finalidade do estudo de transações é entender qual o estado do ego que implementa o estímulo e qual o que emite a resposta, podendo assim compreender a dinâmica do relacionamento do sistema Pai, Adulto e Criança em diversos ambientes, inclusive em um ambiente organizacional.

A transação, segundo Berne (1995), é a unidade básica do relacionamento e toda troca ou interação entre pessoas é, na verdade, um encadeamento de transações, daí o termo Análise Transacional. A manifestação, verbal ou não verbal, é chamada de estímulo transacional e dá início à transação. Resposta transacional é a reação da outra parte inserida no relacionamento. Nota-se que dentro da abordagem em que este estudo está inserido, o estímulo surge de um script cognitivo utilizado por um vendedor e a resposta parte do cliente. Neste processo de estímulo-resposta, nesta relação dicotômica, as diversas transações vão ser determinadas pelos estados de ego de ambos envolvidos nesta interação.

Partindo-se do entendimento de Oliveira (1976), as transações podem ser de três tipos: Paralelas, também conhecidas como Complementares; Cruzadas e por fim, Ulteriores, chamadas também de Ocultas. Berne (1995) explica que uma transação Paralela ocorre quando o estímulo transacional e a resposta se encontram em harmonia. Este tipo de transação ocorre quando uma mensagem é dirigida a um estado de ego em sintonia com o estado de ego do emissor, proporcionando que o receptor tenha condição de enviar uma mensagem ou resposta adequada e fazendo com que a comunicação flua abertamente. Ou seja, os estímulos partem de um estado de ego similar àquele de destino, possibilitando assim, uma comunicação fácil e sem problemas e consequentemente, com qualidade nas transações. Ainda segundo Berne (1995), uma transação também é considerada Paralela quando o estímulo vai de um Pai para uma Criança, que recebe como retorno, uma resposta de uma Criança para um Pai.

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Quando estímulo e resposta transacional não estão em sintonia, pode-se dizer que há uma transação Cruzada. Berne (1985) indica que, neste caso, um estímulo é dirigido a um ego, onde a pessoa receptora da mensagem não se encontra no estado de ego esperado pelo emissor. Isto faz com que a resposta parta de um estado diferente do previsto e consequentemente também se dirija de volta a um estado de ego, em que o emissor não se encontra. Através do cruzamento das informações, há uma interrupção no fluxo de comunicação. Assim, conforme Oliveira (1976, p.71), “na Transação Cruzada, o estímulo transacional ativa um estado de ego inapropriado do receptor. A resposta transacional que parte deste para o emissor do estímulo é uma resposta inesperada”.

Como exemplo, é possível apresentar uma transação onde o estímulo surgiu de uma pessoa com um estado de ego de Adulto e que tinha a intenção de receber uma resposta de outra pessoa que também estivesse em seu mesmo estado de ego. Entretanto, esta comunicação foi interrompida, pois o receptor da mensagem não se encontrava neste estado, mas sim no de Pai, enviando uma resposta não para um Adulto, mas para uma Criança. Ou ainda, um estímulo enviado de um Pai que esperava receber uma resposta de volta de uma Criança, teve como retorno, uma mensagem também de Pai para Criança.

O terceiro tipo de transação, a Ulterior, envolve mais de um estado de ego, acontecendo segundo Oliveira (1976), porque além das mensagens socialmente aceitas, existem também as ocultas. Krack, Nasielsku e Graaf (1984) acrescentam que para haver a identificação da mensagem oculta deve-se observar o tom de voz e a atitude corporal das pessoas. Os autores chamam a atenção para esse tipo de transação que é muito usado por vendedores, com a intenção de manipular clientes. As transações Ulteriores são mais complexas, pois envolvem tanto mensagens aparentes (tais quais nas transações Paralelas e Cruzadas), quanto mensagens subjacentes. Estas mensagens subjacentes são aquelas que não são verbalmente expressadas, e sim, censuradas pelo próprio indivíduo. Como exemplo, é possível imaginar um estímulo que partiu de um estado de ego de Adulto em direção a outro Adulto, entretanto, o que realmente a pessoa da qual partiu o estímulo queria era enviar uma mensagem de um Pai para uma Criança.

PROCEDIMENTO METODOLóGICOA abordagem da pesquisa é qualitativa, por proporcionar a compreensão fundamental

da linguagem, das percepções e dos valores das pessoas. Seguindo os seis passos propostos por Morse (1994) para o design da pesquisa qualitativa - reflexão, planejamento, entrada, coleta de dados, saída e redação -, a primeira etapa se caracterizou por um processo de reflexão, de onde se identificou que o tópico de interesse seria a forma como as relações interpessoais entre cliente e provedores de serviços são condicionadas à existência de padrões de interação, os chamados scripts cognitivos, e as consequências deste entendimento.

No segundo estágio, o de planejamento, definiu-se que a estratégia de abordagem seria a pesquisa documental, que se constitui do exame de materiais que não receberam tratamento analítico ou que podem ser interpretados sob diversos pontos de vista (GODOY, 1995). Ainda nesta fase, a preparação das pesquisadoras teve suporte na

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pesquisa bibliográfica, onde se buscou as relações do problema com as teorias que lhe dão sustentação, que no caso específico deste estudo são a teoria dos scripts e a da Análise Transacional. No decorrer do processo a leitura reflexiva concorreu para desenvolver a compreensão inicial do problema e, ao final, para ampliar o entendimento do estudo para situação em outros contextos. Ainda no estágio de planejamento, a questão de pesquisa foi refinada e por diversas vezes revista, mesmo ainda durante a leitura dos documentos, outros elementos foram ainda definidos, tais como: objetivos, limitações, procedimentos de coleta e de análise dos dados.

Na etapa seguinte, nomeada de estágio de entrada, foram selecionadas duas empresas de treinamento que utilizam materiais descritos para formação de força de vendas. A escolha destas empresas, embora feita por acessibilidade, seguiu uma orientação de representatividade e abrangência de atuação. A primeira delas foi criada em 1946 e possui, atualmente, programas de treinamento com área de atuação em todo o país. A outra empresa de treinamento atua especificamente no Ceará, sendo seu consultor responsável por conduzir formações em empresas de todo o porte neste Estado.

Ainda nesta etapa de entrada, iniciou-se a coleta e exame dos dados, que na pesquisa qualitativa sabe-se ocorrer praticamente de forma simultânea. Dois documentos (DOC A e DOC B), o primeiro contendo 16 páginas e o segundo 17 páginas, foram utilizados como fonte de dados. Neles foi possível avaliar a sequência de treinamento oferecida pelas duas empresas, inclusive em termos de orientação de posturas gerais e específicas dadas aos vendedores. Na escolha das duas empresas e de seus materiais, procurou-se observar as sugestões de Morse (1994), para quem os critérios de adequação e propriedade dos dados, explicitação do caminho e verificação são requisitos básicos. Em relação ao primeiro, o material coletado destas duas empresas exprime diferentes situações e variabilidade que contribuem para o entendimento do fenômeno. A propriedade se refere à pertinência dos dados, que neste caso foi garantida por entender-se que estes treinamentos são bases para posturas que serão apreendidas e reproduzidas em situações reais. Ademais, estas informações são estáveis, subsistem ao longo do tempo e representam, substancialmente, o conteúdo ministrado oralmente nos treinamentos de capacitação de vendedores.

A explicitação do caminho, outro requisito identificado por Morse (1994), é aqui apresentada como forma de oferecer a outros pesquisadores a possibilidade de reconstruir o caminho. Com isto não se pretende alcançar generalizações, já que a pesquisa tem também um caráter exploratório, mas apenas garantir a lógica e pertinência dos achados. Desta forma, identifica-se que os documentos escritos foram submetidos a uma análise do conteúdo, que se diferencia de uma análise documental. A análise de conteúdo vai além da busca de informações explicitadas no texto, à medida que busca entender a mensagem, os seus significados e aquilo que pode estar implícito (RICHARDSON et al., 1999). A análise de conteúdo seguiu as etapas propostas por Trivinõs (1987). O primeiro foi a pré-análise, com a organização do material. O segundo foi a descrição analítica, onde o corpus foi submetido a um estudo aprofundado, orientado em princípio, pela revisão da literatura. O terceiro referiu-se aos procedimentos, como a codificação, a classificação e a categorização, que são básicos nesta instância do trabalho.

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Assim, como sugerido por Vergara (2005), realizou-se nessa última etapa, uma categorização a priori fundamentada na revisão da literatura e orientada pelo objetivo deste trabalho, no entanto, cientes de que categorias a posteriori poderiam emergir do campo. No primeiro momento, buscou-se a presença de scripts cognitivos nos treinamentos dirigidos aos profissionais de vendas; no segundo momento, identificou-se a existência de uma visão estereotipada dos clientes ou uma visão que fizesse a distinção dos traços de personalidade de cada um; finalmente, em um terceiro momento verificou-se, com base na Análise Transacional, o tipo de transação que pode ocorrer, a partir dos estímulos surgidos das orientações contidas nos documentos. Nos dois primeiros momentos, a análise baseou-se em especial, nas duas estruturas de conhecimento propostas por Leong, Busch e John (1989), as estruturas de categorias e as estruturas de scripts. Esta categorização foi escolhida a priori por conter indicações de flexibilidade e complexidade embutidas no conceito de scripts, possibilitando, assim, que a análise do material fosse fundamentada na busca destes aspectos. O terceiro momento baseou-se em toda a teoria apontada no referencial sobre Análise Transacional, dando ênfase à influência dos estados de ego na geração da transação.

O último critério estabelecido por Morse (1994), o de verificação, foi garantido pela exposição dos achados de dois pesquisadores da área de vendas. A seção seguinte segue as orientações da última fase do design da pesquisa qualitativa proposta pelo mesmo autor, qual seja, a redação do texto. Nessa seção procurou-se retratar com justiça as perspectivas subjetivas encontradas e o impacto da pesquisa sobre o fenômeno que se deseja compreender.

RESULTADOS E ANÁLISESA presente pesquisa, caracterizada como documental, tem como objeto de estudo os

materiais utilizados por empresas de treinamento na capacitação de funcionários, no que tange ao relacionamento com o cliente. As análises recaíram sobre os referidos conteúdos e scripts, a fim de investigar e determinar os estímulos que estes produzem nos clientes.

Na primeira etapa, é notório, especialmente no documento A, o fato de que o conteúdo analisado orienta os vendedores através de scripts, tal como se percebe na seguinte citação: “sua atividade [a do profissional de venda] é como a de um ator de sucesso que estuda o script” (Doc A). E ainda: “utilizar o script de atendimento de maneira natural, espontânea e objetiva” (Doc A).

No documento B, onde o processo de vendas é orientado através de oito etapas, é apresentada uma visão de script que se assemelha à ideia de Leigh (1987), que propõe que os scripts têm a função de definir procedimentos adequados para uma situação de venda através de esquemas que retratam uma sequência de ações dentro de um determinado contexto. Esta sequência de ações é verificada também no documento A, tal como se ilustra a seguir. Tal informação sustenta a necessidade de se entender os relacionamentos além das palavras que são ditas.

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[...] ao finalizar cada atendimento, despeça-se do cliente quando for possível, evidenciando sua satisfação em atendê-lo; chame-o pelo nome; demonstre em palavras e em expressões ao cliente como foi importante tê-lo servido; convide o cliente a voltar e a conhecer outras áreas ou outros serviços (Doc A).

Ao mesmo tempo, apesar de verificada a utilização de scripts, no conteúdo de ambos os documentos também se defende a ideia de que o vendedor deve admitir uma postura mais flexível. O documento A possui, inclusive, orientações que sugerem que os vendedores tenham abertura para mudanças e sensibilidade na interação com o cliente. Esta indicação de flexibilidade encontrada nos documentos vai de encontro à formação da estrutura dos scripts proposta por Leong, Busch e John (1989), que relatam como fundamental a necessidade dos scripts se adaptarem a novas ou modificadas situações de vendas. Segundo estes autores, esta função de adaptação dos scripts de uma forma coerente propicia aos vendedores a formação de uma base de conhecimento, que os tornam capazes de selecionar estratégias adequadas para todos os tipos de situação de vendas, das mais às menos típicas. Esta base de conhecimento é alimentada pela categorização dos scripts, podendo ter eles níveis diferentes de complexidade, dependendo do seu grau de adaptação às diversas situações.

Constata-se nesta primeira etapa que, apesar de ter sido identificada a utilização de scripts nos documentos analisados, os dois buscam orientar os vendedores a serem flexíveis às possíveis variações que forem ocorrendo no decorrer do processo de interação, o que se concatena com as orientações de Motta (2000) que defende que uma interação que segue um script predeterminado deve dar margem à utilização das percepções, dos sentimentos e da criatividade, se o intuito é a formação de um relacionamento.

Na segunda etapa do processo de análise documental, verifica-se a princípio que os vendedores são orientados a desenvolverem um relacionamento com base em atitudes de reciprocidade. Note-se o seguinte enunciado: “buscar entrar em sintonia com o cliente, em gestos, postura e voz e procurar usar as mesmas palavras que ele, na mesma tonalidade de voz” (Doc A). Da mesma forma, no documento B, recomenda-se que os vendedores mantenham um posicionamento denominado de Rapport, que é uma forma neurolínguistica de conquistar a confiança mútua através do espelhamento com a outra pessoa. Este mesmo documento enfatiza ainda ao vendedor a importância de que “é preciso aprender a lidar com o desconforto inicial de falar com todo tipo de cliente” (Doc B).

Este tipo de conduta gera o que a Análise Transacional chama de transação Paralela, considerada por esta teoria como sendo a forma de transação que acarreta uma comunicação mais fácil e sem problemas. A partir disso, percebe-se então, que neste aspecto específico, os materiais examinados estão de acordo com o que a AT acredita como sendo facilitadores de uma transação efetiva. Ou seja, de uma forma geral, ambos os documentos demonstram o cuidado de indicar os vendedores a possuírem uma visão diferenciada de cada pessoa, orientando inclusive, que estes tenham uma postura similar à do cliente no momento de uma interação entre eles. De acordo com isto, percebe-se nestes

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achados uma similaridade com as indicações de Leong, Busch e John (1989) no que se refere à estrutura de categorias proposta por estes autores, estrutura esta caracterizada por representar informações sobre os tipos de clientes, levando em consideração as diferenças existentes entre cada um deles.

Entretanto, ainda na segunda etapa de análise, foi observada particularmente no documento A, uma ideia oposta àquela já inicialmente apresentada no mesmo, que sugere um padrão de identificação com o cliente. Este contexto contraditório pode ser verificado na seguinte citação: “a boa comunicação é compreensível para todos” (Doc A). Baseando-se na teoria da Análise Transacional, pensa-se que uma mensagem que é dirigida a um estado de ego e é recebida por outro, pode não ter, como consequência, uma resposta que provoque uma interação que favoreça a transação comercial. Grönroos (1995) confirma isto ao afirmar que os clientes poderão não aceitar se inserirem em uma transação, caso haja a falta de adaptação dos scripts às suas diferenças individuais. Acredita-se, assim, que o que torna uma comunicação boa não é o fato de ela ser compreensível a todos, mas sim, o fato dela ser adaptável para cada cliente.

Na terceira e última etapa desta análise, nota-se no documento A, uma maior facilidade em distinguir diferentes tipos de transações possíveis de ocorrer a partir dos estímulos sugeridos pelas orientações documentais. Acredita-se que isto se deve ao fato de que neste documento não foi verificada uma conduta no sentido de identificação da personalidade de cada cliente, onde os profissionais de venda são conduzidos a distinguir as diversas facetas (que aqui podem ser considerados traços dos estados de ego) que os clientes apresentam no momento da relação comercial. Além disso, o que pode ser observado é que há indicações de scripts de atendimento ao cliente que se dirigem, de uma forma aparentemente não proposital, a cada um dos três estados de ego proposto pela AT, propiciando assim, a possibilidade de surgimento dos três tipos de transação propostos por esta teoria.

Neste sentido, o documento B apresenta uma orientação mais coerente no sentido de que os vendedores são indicados a fazer “perguntas abertas que levem o cliente a falar um pouco mais, evitando com isso simplesmente que ele responda sim ou não” (Doc B). E ainda: “é melhor fazer algumas perguntas do que achar que sabe todas as respostas” (Doc B). A partir destas citações, acredita-se que estas orientações podem ser facilitadoras no sentido de identificar em qual estado de ego o cliente se encontra, o que segundo Oliveira (1976), é algo que pode ser realizado rapidamente através do estudo da AT.

Para isso, o documento B indica os vendedores a entenderem o que o cliente precisa, através de um levantamento de suas necessidades. Através deste processo, acredita-se que se torna mais viável a identificação do estado de ego em que o cliente se encontra, para assim, adquirir uma postura que mais favoreça o surgimento de uma transação bem sucedida e por consequência, a formação de um bom relacionamento comercial entre vendedor e cliente, pensamento este exposto no documento B através da seguinte citação: “a necessidade de cultivar um relacionamento, e não apenas fazer uma transação com o cliente, muda radicalmente a postura do vendedor” (Doc B).

Desta forma, acredita-se que é mais provável que ocorram transações Paralelas em uma interação comercial que se baseie nas orientações contidas no documento B. Já diante do

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exposto no documento A, alguns fragmentos são extraídos com o propósito de que estes possam ser analisados de diferentes perspectivas, focalizando-os na visão do Pai, do Adulto e da Criança.

Iniciando-se no ego Pai, deve-se reconhecer que os clientes que se encontram neste estado são mais suscetíveis a fazer críticas, podendo ser estas em tom de aconselhamento ou até mesmo de reclamação (BERNE, 1985). Com isto, o vendedor deve buscar ter a flexibilidade de neste caso saber superar as objeções destes clientes. Para um caso como este, a extração do documento que aconselha o vendedor para que este “nunca se justifique, explique a situação e peça desculpas” (Doc A) pode ser adequada por promover uma transação Paralela (Pai-Criança; Criança-Pai); entretanto, pode provocar também uma transação Ulterior, onde o vendedor reage, por exemplo, como uma Criança a um estímulo de objeção de um cliente Pai, quando de fato ele gostaria de responder como um Adulto que pode não estar querendo receber uma possível crítica sem fundamento. Contudo, esta possibilidade de transação Ulterior não pode ser verificada a fundo nesta pesquisa, pois de acordo com Krack, Nasielsku e Graaf (1984), seria necessária a observação do tom de voz e da atitude corporal das pessoas envolvidas na transação, o que aqui não seria possível, por se tratar de uma pesquisa documental.

A citação a seguir: “A capacidade de poder controlar as próprias emoções e as emoções dos outros é a base da arte de saber se relacionar e é fundamental para o sucesso no atendimento” (Doc A) retrata claramente um exemplo de uma atitude baseada em uma pessoa que se encontra no estado de Adulto. Os que se encontram neste estado de ego buscam resolver seus problemas baseados em um pensamento lógico e controlando para que o estado de Pai ou de Criança não contamine o processo, acreditando ser necessário para isso, ter a capacidade de separar-se das emoções (OLIVEIRA, 1976). Dentro de um processo de compra, o Adulto busca se informar melhor sobre o objeto a ser adquirido, de modo a tomar a melhor decisão da forma mais analítica em todos os aspectos. Percebe-se com isso, que uma orientação que pode gerar um estímulo surgido de um estado de Adulto acarretaria uma transação Paralela, caso o cliente que estivesse recebendo este estímulo estivesse também no estado de Adulto. Nos outros dois casos, o que envolve o Pai ou a Criança, a resposta do cliente a um estímulo de um vendedor Adulto poderia causar alguma falha na comunicação e esta não fluir normalmente, acarretando o que a AT chama de transação Cruzada, que é quando estímulo e resposta não se encontram em sintonia.

Já os clientes com o estado de Criança sentem-se mais a vontade em um ambiente de compra no qual eles se sintam exclusivos e possam sentir e demonstrar algum tipo de emoção em um relacionamento comercial. A seguinte citação: “Sempre use calor e amor no atendimento” (Doc A) pode ser bem aplicada a pessoas que se encontrem neste estado, ocasionando em uma transação Paralela, ao mesmo tempo em que pode ser um pouco desapropriada para um cliente que esteja no estado de ego Pai, por exemplo.

Por fim, de uma forma geral, nota-se que um estímulo surgido de um mesmo script pode ocasionar diferentes formas de respostas, existindo por consequência, diversas possibilidades de transações dentro de um relacionamento comercial. Por outro lado, na maioria dos casos, esta possibilidade é percebida somente no momento exato do contato inicial entre o vendedor e o cliente, o que pode ocasionar a não eficácia por completo de um script anteriormente aprendido.

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CONSIDEraÇõES FINAISCom as reflexões trazidas por este estudo, que buscou aliar duas teorias de áreas

distintas, a de scripts e a da Análise Transacional, espera-se que contribuições possam ser geradas no sentido de propiciar uma melhor compreensão da complexidade existente nos processos de interação comercial. Entende-se, inclusive, que os seus resultados se tornam mais relevantes, pelo fato de que, atualmente, poucos estudos têm demonstrado uma preocupação em entender as relações de trocas guiadas por scripts preestabelecidos, apesar de esta forma de interação ser uma realidade observada em inúmeras empresas. Além disso, através da triangulação dos conhecimentos da área de marketing estudados juntamente com os da área comportamental, acredita-se gerar condições favoráveis para um melhor desenvolvimento dos relacionamentos comerciais.

A análise documental realizada baseou-se em materiais utilizados por duas empresas que realizam treinamento da força de vendas no Ceará, tendo estas sido escolhidas tanto pelo critério de acessibilidade, como também por serem empresas que dispõem de uma abrangente área de atuação no Estado. Nos dois documentos estudados, verifica-se que ambas utilizam scripts em seus conteúdos de treinamento como uma orientação aos profissionais de venda em um processo de interação com o cliente. Entretanto, constata-se que apesar da ideia que se tem de scripts ser de algo padronizado, os dois documentos demonstram uma abertura para a flexibilidade desta sequência de ações. Não foi possível avaliar o quanto esta orientação é efetivamente aprendida e posta em prática pelos vendedores no contexto comercial, o que sugere que estudos baseados em observações específicas neste contexto sejam procedidos.

Verifica-se a partir destes scripts que ambos os documentos sugerem ao vendedor uma postura de reciprocidade e espelhamento, indicando-o a agir conforme a atitude do cliente. Em um caso como este, a Análise Transacional denomina o surgimento de uma transação Paralela, sendo esta considerada o tipo de transação onde a comunicação e consequentemente, a interação acarretada é mais favorável. Uma inquietação que surge a partir desta constatação é de se realmente a sintonia entre estímulos e respostas, ou seja, vendedor e cliente assumindo o mesmo estado de ego (transação Paralela) é sempre adequada para favorecer a comunicação em uma interação comercial. Pode-se dar como exemplo um caso em que um cliente possa estar assumindo um estado de ego de Pai de uma forma autoritária, rígida ou até mesmo agressiva. Se neste caso, o vendedor seguir o script de se espelhar na postura do cliente (o que ocasionaria uma transação Paralela segundo a AT) é de se imaginar que provavelmente poderiam surgir conflitos nesta relação, devido ao fato de que questões como poder e submissão devem ser considerados em um plano mais específico de análise.

Constatou-se que a simples existência de scripts não é suficiente para que haja uma relação harmônica entre funcionário e cliente, pois um estímulo surgido de um mesmo script pode ocasionar diferentes formas de respostas. Tal conclusão pode levar as empresas e os profissionais de marketing a reavaliarem o treinamento da equipe de vendas, a fim de que este possa se tornar mais eficaz, à medida que se abandona a ideia de um comportamento padrão e passa-se a buscar uma personalização no atendimento, de forma que seja estabelecida uma comunicação eficaz, baseada nas impressões acerca do cliente, no exato momento do contato do vendedor com o cliente.

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Reconhece-se a limitação do estudo, que se baseou em uma pesquisa documental, tendo em vista que certas peculiaridades contidas nas transações podem ser mais bem percebidas quando analisadas no ambiente real em que elas ocorrem, assim como, algumas características das pessoas envolvidas neste processo, tais como gestos, posturas, tom de voz, não têm condição de serem observadas em materiais documentais. Além disso, somente através de outras estratégias de abordagem que remetam a pesquisa ao ambiente real, ter-se-á possibilidade de perceber se as orientações contidas nos materiais de treinamento analisados estão, de fato, sendo seguidas. Desta forma, diante da complexidade indiscutível existente nas interações entre as pessoas em um ambiente organizacional, acredita-se que a continuação deste estudo através de novas pesquisas guiadas por outros procedimentos metodológicos, será relevante no sentido de enriquecer a compreensão da dinâmica Pai, Adulto e Criança, proposta pela Análise Transacional. Ressalta-se, ainda, que o presente estudo não teve a intenção de indicar como o vendedor deve agir diante de cada estado de ego, mas sim de apontar a existência das diferenças entre estes, para que em futuros trabalhos, este tema possa ser aprofundado.

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