ISAQUE DAVID RAMOS PATROCNIO
A SEGURANA ALIMENTAR NO CONSUMO DE
PESCADO CRU COM VALNCIA PARA A
PRODUO DE SUSHI
Lisboa
2009
ISAQUE DAVID RAMOS PATROCNIO
A SEGURANA ALIMENTAR NO CONSUMO DE
PESCADO CRU COM VALNCIA PARA A
PRODUO DE SUSHI
Lisboa
2009
UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA
FACULDADE DE CINCIAS E TECNOLOGIA
Ecologia da Hidrosfera
ISAQUE DAVID RAMOS PATROCNIO
A SEGURANA ALIMENTAR NO CONSUMO DE
PESCADO CRU COM VALNCIA PARA A
PRODUO DE SUSHI
Dissertao apresentada para a obteno do Grau de Mestre
em Tecnologia e Segurana Alimentar, pela Universidade Nova
de Lisboa, Faculdade de Cincias e Tecnologia.
Orientador:
Doutor PEDRO AVROUS MIRA CRESPO
Co-orientador:
Professor Doutor FERNANDO JOS CEBOLA LIDON
Lisboa
2009
DEDICATRIA
Aos meus Pais por todo o apoio dado ao longo da minha vida
Ao meu irmo pelo apoio prestado
Ao Francisco Jos que o meu futuro
A todos que me ensinaram e se esforaram por tudo aquilo que sou hoje
Tudo nesta vida questo de tempo e oportunidade.
I
AGRADECIMENTOS
Ao Doutor Pedro Crespo, na qualidade de orientador, pelos ensinamentos,
ajuda, compreenso e, sobretudo, pela amizade demonstrada.
Ao Professor Doutor Fernando Lidon, na qualidade de co-orientador, pelo
acompanhamento, disponibilidade ao longo deste trabalho. Pela transmisso
de conhecimento durante estes ltimos dois anos.
Ribapeixe, na qualidade da Sr. Ana Paula Andrade, proprietria e
administradora, pela disponibilidade sempre demonstrada.
A todo o corpo docente da FCT que ministrou este mestrado, a todos o meu
sincero agradecimento.
A todos os funcionrios da FCT.
Professora Doutora Virgnia Crespo pela disponibilidade e apoio
demonstrado.
Lisete, pelo apoio, amizade, compreenso e por tudo o que fez ao longo
destes dois anos.
minha famlia, pelo apoio e compreenso (sobretudo nas horas ms) que
sempre demonstrou.
A todos os meus colegas de curso.
embaixada do Japo, Associao da Hotelaria, Restaurao e Similares de
Portugal pela colaborao.
A todos em geral, que de alguma forma contriburam para a realizao deste
trabalho, o meu profundo obrigado.
II
RESUMO
As doenas de origem alimentar so na maioria ocasionadas por
microrganismos ingeridos com alimentos contaminados. Considerando que o
sushi o prato tradicional Japons mais conhecido no mundo, identificado
como peixe cru, justifica-se a necessidade do estudo dos perigos inerentes a
este consumo de alimentos, contribuindo para a segurana alimentar, ligada a
estes produtos e adicionalmente colaborando deste modo, para a manuteno
da sade pblica.
Este trabalho tem por objectivo realizar um estudo orientado para o consumo
de peixe cru, com valncia para o sushi, equacionando a caracterizao dos
diferentes tipos de sushi. Neste contexto, desenvolvem-se ainda, aspectos
relativos contaminao de produtos da pesca e a respectiva deteriorao,
consumo e segurana alimentar. Aborda-se a origem do sushi, enunciamos
dezasseis tipos, descrevemos o sushi e a importncia para a sade. Na
perspectiva do pescado, disserta-se sobre o consumo de peixe em Portugal, e
apontam-se as mudanas post mortem, sensoriais e microbiolgicas, principais
factores que contribuem para a sua deteriorao. Deste modo, enquadrando o
preparo do sushi, discorre-se sobre o pescado mais utilizado no nosso pas
(salmo, atum, camaro e lula), mencionando-se a contaminao dos produtos
da pesca, identificando perigos fsicos, qumicos e biolgicos e referenciando
ainda interaces entre o consumo e segurana alimentar.
Este estudo, permitiu verificar que em Portugal ainda no foram relatadas,
doenas de origem alimentar derivadas do consumo de sushi. Note-se contudo,
que no podemos afirmar categoricamente que elas no existam, pois em
vrios estudos foram isolados Coliformes, Escherichia coli, Salmonella,
Staphylococcus aureus, V. parahaemolyticus e Aeromonas spp. e em atum,
mexilho, camaro, choco, pota, lula, ostra e na sapateira foram detectados
teores em cdmio superiores ao limite mximo admissvel. Deste modo,
sugere-se a introduo de alteraes especficas na legislao nacional para
acompanhar o evoluir do consumo de peixe cru.
Palavras-chave: Pescado cru; sushi; segurana alimentar.
III
ABSTRACT
The food-borne diseases are mostly caused by microorganisms ingested with
contaminated food. Sushi is the traditional Japanese dish better known in the
world, identified as raw fish, yet the study of the dangers inherent to its
consumption is required to ensure the public health.
This work aims to conduct a study oriented to the consumption of raw fish, with
valence for sushi and to consider the characterization of different types of sushi.
In this context, it also addresses issues related to the contamination of fishery
products and their decay, consumption and food security. Thus, we addressed
the origin of sushi, articulate sixteen types, and describe the sushi along with
the importance to health. We further approach the consumption of fish in
Portugal and point the post-mortem changes (i. , sensory and microbiological
main factors contributing to their deterioration). With regard to the preparation of
sushi, we point the fish most commonly used in our country (salmon, tuna,
shrimp and squid), being mentioned the contamination of fishery products,
along with the identification of physical, chemical and biological.
According with this study in Portugal, food-borne diseases derived from the
consumption of sushi where not reported. It should be noted however, that we
can not say categorically that they do not exist, as several studies pointed the
occurrence of coliforms, Escherichia coli, Salmonella, Staphylococcus aureus,
V. parahaemolyticus and Aeromonas spp.. Additionally, it was detected that in
tuna, mussels, shrimp, cuttlefish, squid, squid, oyster and crab, the levels of
cadmium surpassed the maximum permissible limit. Thus, it may be necessary
to progressively improve specific changes in national legislation to monitor
developments in the consumption of raw fish.
Keywords: Fish raw, sushi, food security.
IV
NDICE
1. INTRODUO .......................................................................................................... 1
1.1 Objectivos .......................................................................................................... 3
2. SUSHI ....................................................................................................................... 4
2.1 Histria ................................................................................................................. 6
2.2 Tipos de Sushi ...................................................................................................... 9
2.2.1 Naresushi ..................................................................................................... 9
2.2.2 Niguirisushi ................................................................................................. 10
2.2.3 Makisushi ................................................................................................... 10
2.2.4 Sashimi....................................................................................................... 11
2.2.5 Temakisushi ............................................................................................... 12
2.2.6 Oshisushi .................................................................................................... 12
2.2.7 Chirashisushi .............................................................................................. 13
2.2.8 Mazesushi .................................................................................................. 14
2.2.9 Futomaki ..................................................................................................... 14
2.2.10 Hosomaki ................................................................................................. 15
2.2.11 Kappamaki ............................................................................................... 16
2.2.12 Uramaki .................................................................................................... 16
2.2.13 Gunkansushi............................................................................................. 17
2.2.14 Inarisushi .................................................................................................. 17
2.2.15 Edomae chirashisushi ............................................................................... 18
2.2.16 Gomokusushi............................................................................................ 18
2.3 O sushi original e o sushi moderno ..................................................................... 19
2.4 O sushi e a sade ............................................................................................... 19
3. PESCADO ............................................................................................................... 21
3.1 O consumo de peixe em Portugal ....................................................................... 21
3.2 Mudanas post mortem nos produtos da pesca .................................................. 23
3.2.1 A autlise .................................................................................................... 26
3.2.2 Mudanas ao nvel sensorial ...................................................................... 28
3.2.3 Mudanas microbiolgicas.......................................................................... 30
3.2.3.1 Factores intrnsecos ............................................................................ 32
3.2.3.2 Factores extrnsecos............................................................................ 38
3.3 Outros factores que contribuem para a deteriorao .......................................... 41
3.3.1 Escurecimento enzimtico .......................................................................... 41
3.3.2 Influncia das propriedades intrnsecas ao produto .................................... 42
V
3.3.3 Influncia da eviscerao ........................................................................... 42
3.3.4 Influncia da higiene na manipulao ......................................................... 43
3.3.5 Influncia da captura e da temperatura de armazenamento ....................... 43
3.3.6 Odores atpicos e a sua relao com a origem dos produtos da pesca ...... 44
3.4 Peixes ................................................................................................................. 45
3.4.1 Salmo - Salmonidae ................................................................................. 45
3.4.1.1 Salmo em Portugal ............................................................................ 50
3.4.2 Atum - Thunnus .......................................................................................... 51
3.4.3 Camaro - Penaeus ................................................................................... 55
3.4.4 Lula - Loligo ................................................................................................ 58
4 CONTAMINAO DOS PRODUTOS DA PESCA .................................................... 60
4.1 Perigos Fsicos ................................................................................................... 62
4.2 Perigos Qumicos ................................................................................................ 62
4.3 Perigos Biolgicos .............................................................................................. 71
4.3.1 Bactrias .................................................................................................... 72
4.3.1.1 Bactrias indgenas ............................................................................. 75
4.3.1.2 Bactrias no indgenas ...................................................................... 81
4.3.2 Vrus ........................................................................................................... 87
4.3.3 Parasitas .................................................................................................... 90
4.3.3.1 Anisakis simplex .................................................................................. 93
4.3.3.2 Capillaria sp ......................................................................................... 96
4.3.3.3 Angiostrongylus sp .............................................................................. 97
4.3.3.4 Eustrongylides spp .............................................................................. 99
4.3.3.5 Diphyllobothrium latum ........................................................................ 99
4.3.3.6 Clonorchis sp. e Opisthorchis sp. ....................................................... 101
4.3.3.7 Heterophyes sp. e Metagonimus yokagawai ...................................... 103
5. CONSUMO E SEGURANA ALIMENTAR ............................................................ 106
6. CONSIDERAES FINAIS ................................................................................... 114
7. BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................... 116
7.1 Artigos e Livros ................................................................................................. 116
7.2 Portais da Internet ............................................................................................. 122
7.3 Legislao ......................................................................................................... 126
VI
NDICE DE FIGURAS
Figura 2.1 Mapa Japo com regies e provncias. .................................................... 5
Figura 2.3 Aspecto geral do Nigirisushi. .................................................................. 10
Figura 2.4 Aspecto geral do Makisushi. ................................................................... 11
Figura 2.5 Aspecto geral do Sashimi de atum. ........................................................ 11
Figura 2.6 Aspecto geral do Temakisushi. ............................................................... 12
Figura 2.7 Aspecto geral do oshibako e do prato Oshizushi . .................................. 13
Figura 2.8 Aspecto geral do Chirashisushi. ............................................................. 13
Figura 2.9 Aspecto geral do Inarisushi. ................................................................... 14
Figura 2.10 Aspecto geral do Futomaki. .................................................................. 15
Figura 2.11 Aspecto geral do Hosomaki. ................................................................. 15
Figura 2.12 Aspecto geral do Kappamaki. ............................................................... 16
Figura 2.13 Aspecto geral do Uramaki. ................................................................... 16
Figura 2.14 Aspecto geral do Gunkanzushi. ............................................................ 17
Figura 2.15 Aspecto geral do Inarizushi. ................................................................. 17
Figura 2.16 Aspecto geral do Edomae chirashisushi. .............................................. 18
Figura 2.17 Aspecto geral do Gomokusushi. ........................................................... 18
Figura 3.1 Fases que ocorrem nos tecidos musculares desde a captura at a
putrefaco. ................................................................................................................ 24
Figura 3.2 Principais alteraes da qualidade do peixe conservado refrigerado. ..... 28
Figura 3.3 Alteraes da qualidade do peixe conservado em refrigerado. ............... 30
Figura 3.4 Correlao entre a taxa de alterao dos alimentos e a da actividade da
gua. ........................................................................................................................... 35
Figura 3.5 Salmo-do-atlntico. ............................................................................... 46
Figura 3.6 Ciclo vida do salmo-do-atlntico. .......................................................... 47
Figura 3.7 Distribuio do salmo-do-atlntico. ....................................................... 49
Figura 3.8 Distribuio do salmo-do-pacfico. ........................................................ 49
Figura 3.9 Distribuio de produo em aquacultura salmo-do-atlntico. .............. 50
Figura 3.10 Atum-rabilho. ........................................................................................ 52
Figura 3.11 Distribuio do atum-rabilho. ................................................................ 54
Figura 3.12 Captura global e produo em aquacultura do atum-rabilho. ................ 54
Figura 3.13 Distribuio do camaro-tigre em aquacultura. ..................................... 56
Figura 3.14 Produo em aquacultura, do camaro-tigre. ....................................... 57
Figura 4.1 Distribuio mundial de surtos de intoxicaes por toxinas paralisantes de
bivalves e de ciguatera................................................................................................ 68
VII
Figura 4.2 Teores de Hg em espcies de peixe com limite mx. de 0,5 e 1,0 ppm. . 69
Figura 4.3 Aspecto geral do Vibrio cholerae. ........................................................... 76
Figura 4.4 Aspecto geral da A. hydrophila. .............................................................. 78
Figura 4.5 Aspecto geral da L. monocytogenes. ...................................................... 80
Figura 4.6 Aspecto geral da Salmonella. ................................................................. 82
Figura 4.7 Aspecto geral da Shigella. ...................................................................... 83
Figura 4.8 Aspecto geral da E. coli. ......................................................................... 84
Figura 4.9 Aspecto geral do Staphylococcus aureus ............................................... 86
Figura 4.10 Espcies de anisakidos presentes no pescado: Pseudoterranova
dicipiens (a), Anisakis simplex (b) e Contracaecum osculatum (c). ............................. 93
Figura 4.11 Ciclo de vida de Anisakis simplex. ........................................................ 94
Figura 4.12 Ciclo de vida de Capillaria philippinensis. ............................................. 96
Figura 4.13 Ciclo de vida de Angiostrongylus cantonensis. ..................................... 98
Figura 4.14 Ciclo de vida de Diphyllobothrium latum. ............................................ 100
Figura 4.15 Ciclo de vida de O. Felineus e C. sinensis. ......................................... 102
Figura 4.16 Ciclo de vida do M. yokagawai e a H. heterophie. .............................. 103
Figura 4.17 Ciclo de vida Paragonimus sp. ........................................................... 104
Figura 4.18 Ciclo de vida do Echinostoma sp. ....................................................... 105
VIII
NDICE DE QUADROS
Quadro 3.1 - Gama de pH de alguns grupos microbianos. ......................................... 33
Quadro 3.2 Valor mnimo para o crescimento de microrganismos nos alimentos. ... 34
Quadro 3.3 Eh de crescimento de microrganismos. ................................................ 36
Quadro 3.4 Valor mnimo para o crescimento de microrganismos nos alimentos. ... 39
Quadro 3.5 Lista das denominaes comerciais autorizadas no territrio portugus,
segundo a Portaria n 587/2006 de 22 de Junho, para o salmo. ............................... 46
Quadro 3.6 Composio nutricional do salmo cru por 100g, segundo INS, 2006. .. 48
Quadro 3.7 Lista das denominaes comerciais autorizadas no territrio portugus,
segundo a Portaria n 587/2006 de 22 de Junho, para o atum. ................................... 53
Quadro 3.8 Composio nutricional do atum cru por 100g, segundo INS, 2006. ..... 55
Quadro 3.9 Lista das denominaes comerciais autorizadas no territrio portugus,
segundo a Portaria n 587/2006 de 22 de Junho, camaro. ........................................ 57
Quadro 3.10 Composio nutricional do camaro cru por 100g, segundo INS, 2006.
.................................................................................................................................... 58
Quadro 3.11 Lista das denominaes comerciais autorizadas no territrio portugus,
segundo a Portaria n 587/2006 de 22 de Junho, para a lula. ..................................... 59
Quadro 3.12 Composio nutricional da lula crua por 100g, segundo INS, 2006. ... 59
Quadro 4.1 Nmero e percentagem de surtos ocasionados por alimentos, onde o
alimento implicado foi identificado como peixe ou frutos do mar em pases europeus,
entre 1993 e 1998, segundo o pas e total de surtos. .................................................. 61
Quadro 4.2 Biotoxinas aquticas. ............................................................................ 64
Quadro 4.3 Bactrias patognicas presentes no pescado. ...................................... 73
Quadro 4.4 Vrus e sintomas presentes no pescado. .............................................. 87
Quadro 4.5 Parasitas patognicos presentes no pescado. ...................................... 91
Quadro 5.1 Nveis de metais detectados em diversas espcies de peixes. ........... 107
Quadro 5.2 Microrganismos isolados em sushi. .................................................... 110
UNL-FCT
1
1. INTRODUO
A comida tradicional japonesa, porventura, um dos alimentos que em muitos
pases do mundo mais esto na moda. Neste contexto, o sushi decerto o prato
tradicional Japons mais conhecido no Mundo. Ao viajarmos para qualquer pas,
certamente encontraremos um restaurante japons e este seguramente ter como
prato principal o sushi.
Um alimento seguro significa, ao nvel microbiolgico, que este apresenta uma
ausncia de microrganismos em nmero suficiente capazes de ocasionar infeces
ou intoxicaes alimentares. Casos de doenas de origem alimentar so
frequentemente relatados; eles prevalecero sempre que surja uma populao
susceptvel de em contacto com agentes patognicos em nmero suficiente,
ocasionar a doena. Os factores que contribuem para o aparecimento de doenas
de origem alimentar podem estar associados: grande variedade gentica dos
microrganismos; s condies de humidade e temperatura do ambiente ao qual o
alimento est exposto; ao comportamento humano na higiene pessoal;
urbanizao e industrializao com o aumento da densidade demogrfica de
determinadas regies; a factores socio-econmicos; falta de medidas preventivas
de controlo e de informao ao consumidor; a tecnologias de confeco e de
conservao e tambm a crescente comercializao de alimentos crus,
nomeadamente o consumo de peixe cru, o sushi.
Deste modo, existe uma importante diferena entre a segurana dos alimentos
colectiva ou nacional e aquela individual. Um pas pode ter segurana alimentar
colectiva ou nacional, porm, alguns de seus indivduos podem por momentos, no
dispor desta segurana. Podem consumir usualmente um alimento especfico que
no esteja seguro, ou preferir ocasionalmente esse alimento, podendo incorrer num
consumo crnico (eventualmente de pescado de uma determinada zona de captura
contaminada com metais pesados, por exemplo o caso Minamata) ou consumo
espordico, no entanto qualquer um dos casos pode provocar doenas de origem
alimentar tendencialmente graves, podendo mesmo levar morte. Deste modo
torna-se necessria uma vigilncia constante dos alimentos consumidos pelas
populaes, visando a proteco da sade pblica, individual e colectiva.
UNL-FCT
2
As doenas de origem alimentar ocorrem quando um indivduo contrai uma doena
decorrente da ingesto de alimentos contaminados com agentes que entram no
organismo e podem ser de origem infecciosa ou txica.
A maior parte dos casos de doenas causadas por alimentos no so notificados s
entidades nacionais ligadas rea da sade pblica, porque os seus sintomas so
geralmente ligeiros e a vtima no procura auxlio mdico (aspecto que, de resto
atinge todos os segmentos da sociedade, independente da idade, sexo, estilo de
vida, etnia e nvel socio-econmico), no existindo um conhecimento do nmero
detalhado de casos de doenas de origem alimentar. Note-se, contudo, que algumas
estimativas apontam para que anualmente sejam milhes em todo mundo,
provocando grandes prejuzos econmicos, acabando alguns desses casos mesmo
com a morte do paciente, aspecto que se considera um problema mundial de sade
pblica.
O peixe possui um elevado nvel proteico, fcil digestibilidade, baixa taxa de gordura
e ainda uma presena benfica de cidos gordos polinsaturados mega-3,
(conhecido como protector cardiovascular, pois mantm os nveis de colesterol
dentro de valores considerados adequados). Alm desses factores, o consumo de
peixe tem vindo a aumentar nos ltimos anos devido busca de uma melhor
qualidade de vida, envolvendo prticas alimentares mais saudveis. No entanto, a
carne de peixe, que possui benefcios nutricionais reconhecidos, como qualquer
alimento de origem animal, pode, tornar-se num risco para o consumidor se no
forem respeitados alguns cuidados com a manipulao, conservao e confeco.
Alm do sabor, a preocupao do ser humano moderno com uma alimentao
saudvel fez do sushi um sucesso mundial, com origem no Japo onde o consumo
de peixe cru considerado um prato corriqueiro, aumentando o risco e fazendo com
que esses cuidados sejam ainda mais relevantes. s condies inerentes ao
alimento, podem juntar-se outros factores, nomeadamente uma refrigerao
inadequada, uma conservao em gelo de origem duvidosa, a falta de higiene do
manipulador. De facto, todos estes factores podem contribuir para o aumento e
proliferao de agentes potencialmente patognicos. Note-se contudo que, apesar
das suas inmeras qualidades, o peixe bastante susceptvel deteriorao
microbiana devido sua elevada actividade de gua, ao teor de gorduras facilmente
oxidveis e ao pH prximo da neutralidade (pH 6,6 - 6,8), factores que favorecem o
UNL-FCT
3
desenvolvimento bacteriano. Deste modo, os produtos da pesca podem sofrer
diversos tipos de contaminaes agrupadas em perigos fsicos, qumicos e
biolgicos.
Assim, face a este contexto, justifica-se a necessidade do estudo dos perigos
inerentes ao consumo deste tipo de alimentos (peixe cru), contribuindo deste forma,
para um incremento da segurana alimentar, ligada a estes produtos.
1.1 Objectivos
Este trabalho, que apresenta um caris terico-prtico, e tem por objectivo
caracterizar o sushi e equacionar os padres ligados segurana alimentar
envolvendo o consumo do prato tpico da comida tradicional japonesa, que utiliza
como ingrediente o pescado cru.
UNL-FCT
4
2. SUSHI
Segundo a Comisso Europeia, pela Direco-Geral da Pesca (2002) O peixe faz
bem sade. Mais do que uma afirmao popular, este corolrio constitui uma
verdade cientfica. Os benefcios nutricionais do peixe esto amplamente
comprovados, alm de constituir uma excelente fonte de protena animal, o peixe
contm nveis acentuados de vitaminas A e D, magnsio, fsforo e sais minerais,
que so reconhecidamente complementos indispensveis alimentao do ser
humano. Estudos recentes vieram mesmo comprovar que o peixe gordo contm um
tipo de cido gordo fundamental para o desenvolvimento do crebro dos fetos e
bebs humanos, o mega-3.
Contudo, ainda que no subsistam dvidas sobre os benefcios nutricionais do
peixe, a ocorrncia de vrias crises alimentares acabou por afectar a confiana de
muitos consumidores. De facto, a maior ateno atribuda qualidade dos alimentos
pelo consumidor conduziu a uma exigncia acrescida de garantias e respostas s
respectivas preocupaes.
Segundo FAO (2009), o pescado uma importante parte da dieta diria de muitos
pases, contribuindo com um quarto da oferta mundial de protena de origem animal.
Num grande nmero de pases o pescado uma fonte relevante de emprego, lucro
e trocas externa. O consumo per capita de pescado aumentou de 11,6 kg para 15,7
kg entre 1971 e 1997, ou seja 35,3%, principalmente devido aos pases com
economias emergentes, citando (Delgado et al., 2003),
Segundo Barber e Takemura (2003), a definio de sushi arroz avinagrado com
uma cobertura ou recheio de peixe, marisco, vegetais ou ovos crus, cozinhados ou
marinados. servido como refeio ligeira, entrada ou prato principal, e assume
formas muito diferentes. O sushi um prato japons muito tpico e cuja origens
remontam aos tempos pr-histricos. Atravs dos sculos, ele tem sido apreciado
num grande nmero de variedades; desde o mais simples e quotidiano, como o
atum enrolado com arroz avinagrado e alga nori, ao elegante sushi criado para
ocasies festivas.
O Japo (Figura 2.1) uma nao constituda por ilhas com uma variedade enorme
de peixes e mariscos. O arquiplago consiste em quatro ilhas principais: Honshu;
UNL-FCT
5
Hokkaido; Kyushu e Shikoku (da maior para a menor), uma srie de cadeias de ilhas
e cerca de 3900 ilhas menores. Honshu representa mais de 60% da rea total,
dividido em oito regies e quarenta e sete provncias. As ilhas so montanhosas,
com uma pequena rea cultivvel. A densa populao alimenta-se do que extrai do
mar e dos seus campos de arroz, e isso faz com que a sua cozinha seja focada
naquilo que a natureza local oferece. O que pode parecer extico ao olhar de um
estrangeiro, como a combinao de peixe cru com arroz, torna-se extremamente
lgico num lugar com estas caractersticas (Barber e Takemura, 2008).
Fonte: http://i2.photobucket.com (2009)
Figura 2.1 Mapa Japo com regies e provncias.
UNL-FCT
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2.1 Histria
Ningum sabe ao certo quando surgiu o sushi (em japons ou), se bem que
no sculo V, a.C. j se fizessem conservas de peixe com arroz no Sudoeste da sia
(Barber e Takemura, 2008). O sushi apareceu h sculos como um modo de
conservao do peixe. Era um mtodo proveniente dos pases do sudoeste da sia
que consistia na prensagem de peixe com sal. O peixe fermentava durante alguns
meses antes de ser consumido. Alguns restaurantes em Tquio ainda servem esse
sushi original, chamado Naresushi, feito com carpa de gua-doce. O seu sabor to
forte que acaba por encobrir totalmente o sabor do peixe
(www.acasadoyakisoba.com.br., 2009).
A histria do sushi remonta necessidade de conservao de peixe cru, atravs de
tcnicas desenvolvidas no Sudeste Asitico e China. A cabea e as vsceras eram
retiradas, os filetes do peixe cru eram salgados e acondicionados num barril de
madeira com camadas de arroz cozido entre eles. Com a fermentao natural do
arroz, ocorria a libertao de cido lctico, o que provocava um pH cido ao peixe e
garantia a sua conservao. O longo processo de armazenamento (entre um e trs
anos) do arroz tornava-o imprprio para consumo e apenas o peixe era aproveitado.
Ao ser introduzido no Japo, no inicio sculo VIII d.C. (Barber e Takemura, 2008),
essa tcnica sofreu uma pequena modificao, teve inicio a utilizao de pedras
para prensar o peixe cru e o arroz. Deste modo, foi assim criado um tipo de sushi, o
naresushi, que tinha o odor e sabor fortes como caractersticas dominantes. Um
exemplo actual desse tipo de sushi o funasushi, feito com a carpa (Yoshino, 1997).
No sculo XV, um tipo de sushi chamado namanaresushi foi ento desenvolvido.
Basicamente, tratava-se do naresushi com um perodo de fermentao menor (cerca
de um ms), o que j permitia o consumo do arroz e do peixe juntos. considerada
a primeira forma do sushi moderno (Yoshino, 1997).
A introduo do vinagre na preparao do arroz para sushi ocorreu no sculo XVII,
em Edo (actual Tquio), pelo mdico Matsumoto Yoshiichi. Isto possibilitou a
reduo do tempo de preparao do sushi para um dia. Com a abundncia de
pescados e frutos-do-mar na baa de Tquio, o peixe passou a ser consumido cru e
UNL-FCT
7
fresco. Alm do ganho em tempo de preparao do sushi, o vinagre adicionou um
sabor especial ao prato. Este tipo de sushi chamado de hayasushi.
Ainda no final do sculo XVII, um novo tipo de sushi viria a ser criado na regio de
Osaka: o oshisushi. Numa caixa de madeira, o arroz de sushi e o peixe cru so
colocados com um peso por cima para induzir a respectiva compresso. O sushi
cortado em pedaos rectangulares. O estilo de sushi de Osaka ficou conhecido
como estilo Kansai.
No entanto, no inicio do sculo XIX surge aquele que considerado o primeiro
sushiman da histria um hbil chefe chamado Hanaya Yohei (1799-1858) resolveu
confeccionar um sushi que deixasse de ser apenas um mtodo de preservao, e
acabou por desenvolver um sushi parecido com que actualmente se consome. Ele
criou o tipo de sushi mais popular, o Niguirisushi. Um bolinho de arroz de sushi com
uma fatia de peixe cru por cima, para consumo imediato, que podia ser manuseado
com as mos, dispensando os hashis1. Como no havia refrigeradores, os peixes
eram marinados em molho de soja ou vinagre e o tamanho era aproximadamente o
dobro dos actuais (Barber e Takemura, 2008). Era servido em yattai (barracas) nas
ruas de Tquio. Ele trazia o peixe para a sua yattai em caixas com gelo e os clientes
podiam escolher o prato do dia (www.disksushi.kit.net, 2009).
Na verdade esta barraca era um tipo de carroa com um balco e uma cortina. At
ao comeo deste sculo, os yattais mais populares eram aqueles que tinham as
cortinas mais sujas. A cortina suja significava que a barraca tinha bastante
movimento e portanto era boa. Os clientes comiam o sushi, mergulhavam os seus
dedos em chs e enxugavam as mos na cortina (www.disksushi.kit.net, 2009).
O prato, rapidamente se tornou muito popular no Japo em duas modalidades: o
Kansai, da cidade de Osaka, na regio de Kansai; e o Edo, de Tquio. Osaka
sempre foi a capital comercial do Japo, e os seus comerciantes de arroz
desenvolveram um sushi que consistia em arroz temperado misturado com outros
ingredientes, servido numa embalagem comestvel decorada. Tquio, localizada
1 Hashis so pauzinhos ou palitinhos, tambm conhecidos como hashi ou fachi, so as varetas utilizadas como talheres em boa parte dos pases do Extremo Oriente, como a China, o Japo, o Vietname e a Coreia.
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numa baa rica em peixe e frutos-do-mar, produzia o Nigirisushi, que consistia numa
pequena poro de peixe ou frutos-do-mar sobre um bolinho de arroz temperado.
Desde a dcada de 50 os sushi-bares mudaram para um estilo mais ocidental, com
instalaes fixas e lugares para sentar, no entanto nalguns lugares do Japo, ainda
se pode encontrar antigos sushi-bares, servindo refeies baratas, principalmente na
cidade de Kyushu (www.disksushi.kit.net, 2009).
Outros tipos de sushi tambm acabaram por se tornar populares, destacando-se o
inarisushi, o makisushi (nome genrico para o sushi enrolado) e o chirashisushi. A
grande inovao destes tipos de sushi era a utilizao apenas da fora das mos
para realizar a prensagem.
O niguirisushi tambm conhecido por edomaesushi, em funo de sua origem era
utilizado pescado, frutos do mar e algas retiradas da baa de Tquio. Alm disso, a
vida agitada que tomava forma nas grandes cidades favorecia o estabelecimento
de uma espcie de fast-food, as pessoas petiscavam na entrada dos
estabelecimentos, nas ruas ou beira de estradas. O estilo do sushi de Tquio ficou
conhecido como estilo Edo. Segundo a histria da origem do sushi, o quiosque de
Yohei, no bairro de Ryogoku, foi o primeiro a vender o niguirisushi. Em 1923, aps a
cidade de Tquio ser atingida por um terramoto, muitos proprietrios de quiosques
alimentcios voltaram para as suas regies de origem e disseminaram a receita do
sushi por todo o Japo (Barber e Takemura, 2008).
Finalmente, no sculo XX, com a globalizao, o sushi espalhou-se por todo o
mundo. A partir de 1980, nos Estados Unidos, difunde-se a ideia de que a cozinha
japonesa, especialmente o sushi, saudvel, o que causou o chamado sushi boom
por todo o mundo, nomeadamente com a abertura de sushi-bares, rodzios de sushi,
entre outros. O sushi contemporneo caracteriza-se pela oferta de novos tipos de
sushi com a adopo de elementos culinrios prprios de cada pas, aliados
tcnica e inspirao dos sushimen.
Globalmente pode dizer-se que, alm do sabor, a preocupao do ser humano
moderno com uma alimentao saudvel fez do sushi um sucesso mundial e criou
um novo tipo de sushi: o kawarisushi. O seu representante mais famoso o
california roll, originado nos Estados Unidos.
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2.2 Tipos de Sushi
Actualmente o sushi o nome genrico para todos os pratos advindos do sushi-bar,
e dentro deste sector temos: Naresushi, Niguirisushi, Makisushi, Sashimi,
Temakisushi, Oshisushi, Chirashisushi, Mazesushi, Futomaki, Hosomaki,
Kappamaki, Gunkansushi, Inarisushi, Edomae chirashisushi e Gomokusushi.
2.2.1 Naresushi
O naresushi (Figura 2.2) a forma mais antiga de sushi. caracterizado por um
peixe recheado com sal aps os seus rgos e escamas serem removidos. Estes
peixes so colocados num taa de madeira, so mergulhados em sal e comprimidos
com um tsukemonoishi pesado ou uma pedra especfica. Eles so fermentados dez
dias a um ms. Depois esses peixes so demolhados entre quinze minutos a uma
hora. Os peixes so ento colocados em camadas com arroz cozido no vapor.
Fonte: www.miyakesushi.com.br, (2009)
Figura 2.2 Aspecto geral do Naresushi.
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2.2.2 Niguirisushi
O niguirisushi composto por peixes e outros frutos do mar, fatiados ou inteiros,
sobre bolinhos de arroz (Figura 2.3). o tipo de sushi mais comum, moldado mo.
Representa o estilo de Tquio e muitas das suas verses utilizam marisco ou peixe,
isto porque a antiga regio de Edo era rica em produtos marinhos (Ferreira, 2009).
Fonte: http://www.bento.com.sg, (2009)
Figura 2.3 Aspecto geral do Nigiri sushi.
2.2.3 Makisushi
O makisushi formado por recheios variados (peixes, crustceos, frutas, legumes)
com arroz enrolados na folha de alga nori (a alga nori assemelha-se a uma folha de
papel de tom escuro e estaladia, Ferreira, 2009), que feita pelo mesmo processo
do papel ou seja, folhas de alga maceradas e depois reagregadas em forma de folha
de papel. A produo e consumo da alga nori seca ou tostada remonta 300 a.C.,
mas s no ano de 700 d.C. que se tornou oficial quando foi registado como um
produto agrcola no Taisho Ritsuryo, o primeiro livro das leis japonesas (Barber e
Takemura, 2008).
Nori o termo japons usado para referir-se s variedades comestveis de algas
marinhas das diversas espcies de alga vermelha Porphyra. Normalmente o nori
usado na confeco de dois dos pratos mais tradicionais e conhecidos no Japo, o
sushi e o onigiri, Dentro desta diviso existem ainda o uramaki, no qual o arroz fica
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do lado externo do sushi e no do lado interno, como acontece no makisushi
tradicional (Figura 2.4) (Ferreira, 2009).
Fonte: http://www.bento.com.sg, (2009)
Figura 2.4 Aspecto geral do Makisushi.
2.2.4 Sashimi
O sashimi um prato constitudo por peixes fatiados sempre acompanhados de
legumes (Figura 2.5).
Fonte: http://www.littlesushiontheprairie.com, (2009)
Figura 2.5 Aspecto geral do Sashimi de atum.
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2.2.5 Temakisushi
O temakisushi um prato que contem peas individuais com o nori enrolado em
forma de cone (igual ao cone do gelado) com recheio de arroz e vrios tipos de
peixes, frutos do mar, natto (sopa fermentada), uni (miolo de ourio do mar) (Figura
2.6).
Existem ainda, pratos como o tirashi, que so preparados, numa forma prpria, o
arroz no fundo e o peixe cobrindo todo o arroz.
So acompanhamentos quase obrigatrios, o gari (conserva de gengibre) e o
sudako ou sunomono (picles de pepino agridoce com polvo ou kani) (Barber e
Takemura, 2008).
Fonte: http://www.justhungry.com, (2009)
Figura 2.6 Aspecto geral do Temakisushi.
2.2.6 Oshisushi
Os comerciantes de arroz de Osaka, a capital financeira do Japo, desenvolveram o
oshisushi, ou sushi prensado. Para o sushi prensado, o arroz avinagrado colocado
num molde e coberto com peixe marinado ou outros ingredientes. Quando extrado
do molde, a massa de sushi resultante cortado em pequenos pedaos (Figura
2.7). O chefe alinha o fundo do oshibako (molde de madeira) com a cobertura,
cobre-o com arroz de sushi, e pressiona a tampa do molde para baixo, para criar um
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bloco compacto e rectilneo. O bloco removido do molde e cortado em pedaos
que cabem na boca.
Fonte: http://japas.files.wordpress.com, (2009)
Figura 2.7 Aspecto geral do oshibako e do prato Oshizushi respectivamente.
2.2.7 Chirashisushi
O sushi mais fcil de confeccionar, e mais presente nas cozinhas japonesas, o
chirashisushi, ou scattaredsushi, apenas arroz sushi com outros ingredientes
misturados ou colocados em cima dele. Chirashisushi sem marisco aparece
frequentemente nos cestos de piquenique (Figura 2.8).
Fonte: http://www.unkaizan.com, (2009)
Figura 2.8 Aspecto geral do Chirashisushi.
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2.2.8 Mazesushi
O mazesushi considerado o sushi misturado, existem vrios subtipos de
mazesushi, como o inarisushi e o fukusasushi. inarisushi consiste em bolsas de
coalho de feijo frito, recheadas com arroz sushi. kukusasushi utiliza quadrados
compostos de finas omeletas para embrulhar o arroz sushi. A palavra fukusa
significa quadrado de seda e uma analogia aos embrulhos de seda utilizados para
oferecer presentes valiosos no Japo (Figura 2.9).
Fonte: http://www.unkaizan.com (2009)
Figura 2.9 Aspecto geral do Inari sushi.
2.2.9 Futomaki
O futomaki constitudo por pedaos cilndricos grandes (rolinhos grandes), com o
nori na parte externa. O futomaki tpico tem dois ou trs centmetros de espessura e
quatro ou cinco centmetros de largura. Eles so geralmente feitos com dois ou trs
recheios, escolhidos pela combinao de cores e sabores (Figura 2.10).
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Fonte: http://d0.biggestmenu.com (2009)
Figura 2.10 Aspecto geral do Futomaki.
2.2.10 Hosomaki
O hosomaki caracterizado por se apresentar num pedao cilndrico fino (rolinhos
finos), com o nori na parte externa. O hosomaki tpico tem cerca de dois centmetros
de espessura e de largura. Eles so geralmente feitos apenas com um recheio,
simplesmente porque no h espao suficiente para mais de um (Figura 2.11).
Fonte: http://www.marions-kochbuch.com (2009)
Figura 2.11 Aspecto geral do Hosomaki.
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2.2.11 Kappamaki
O kappamaki um sushi recheado apenas com pepino em tiras, um dos mais
tradicionais sushis. Foi baptizado dessa forma em homenagem ao Kappa, figura
folclrica japonesa, que tinha o pepino como seu alimento preferido. (Figura 2.12).
Fonte: http://foodphotoblog.com (2009)
Figura 2.12 Aspecto geral do Kappamaki.
2.2.12 Uramaki
O uramaki caracteriza-se por um cilndrico mdio, com dois ou mais recheios
(rolinhos de dentro para fora). Uramaki diferencia-se dos outros maki porque o arroz
est na parte externa e o nori na parte interna. O recheio fica no centro, rodeado por
uma camada de nori, uma camada de arroz e uma cobertura de outro ingrediente
como ova de peixe ou sementes de gergelim torradas (Figura 2.13).
Fonte: http://www.missoshiru.com.br (2009)
Figura 2.13 Aspecto geral do Uramaki.
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2.2.13 Gunkansushi
O gunkansushi caracterizado por um pedao pequeno, ovalado (rolinho de navio
de guerra), similar em tamanho e aparncia ao hosomaki. O arroz embrulhado
mo numa tira de nori, mas ao invs do recheio ficar no centro, tem alguns
ingredientes, como ovas de peixe empilhados no topo (Figura 2.14).
Fonte: http://www.travellerkit.com (2009)
Figura 2.14 Aspecto geral do Gunkanzushi.
2.2.14 Inarisushi
O irarisushi ou sushi recheado caracteriza-se por um pequeno embrulho ou bolsa
cheia de arroz de sushi e outros ingredientes. O embrulho confeccionado com tofu
bem frito, uma omeleta fina (fukusasushi), ou folhas de repolho (kanpyo) (Figura
2.15).
Fonte: http://z.about.com (2009)
Figura 2.15 Aspecto geral do Inarizushi.
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2.2.15 Edomae chirashisushi
O Edomae chirashisushi um tipo de sushi conhecido como o sushi espalhado no
estilo Edo, onde os ingredientes crus so arranjados de forma artstica em cima do
arroz na tigela (Figura 2.16).
Fonte: http://leit.ru (2009)
Figura 2.16 Aspecto geral do Edomae chirashisushi.
2.2.16 Gomokusushi
O sushi Gomokusushi conhecido como sushi no estilo Kansai, sendo os
ingredientes, cozidos ou crus, misturados no meio do arroz (Figura 2.17).
Fonte: http://pds.exblog.jp (2009)
Figura 2.17 Aspecto geral do Gomokusushi.
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2.3 O sushi original e o sushi moderno
O sushi moderno feito base de peixe cru que no tenha muita fibra, o que facilita
a mastigao e a digesto. H diversos tipos, que dependem dos ingredientes, da
sua disposio e do seu adorno, mas o arroz comum a todos. Os peixes que
podem ser utilizados nesta especialidade gastronmica so variados, contudo em
Portugal os mais correntes so o salmo e o atum. Porm o sucesso da preparao
do sushi depende muito da habilidade do mestre para cortar o peixe.
2.4 O sushi e a sade
Rico em nutrientes, pobre em calorias, fcil e rpido de fazer e muito saboroso, o
sushi conquista cada vez mais adeptos. A dieta japonesa tpica baseia-se nos
produtos oferecidos pela natureza daquela regio, onde abundam o peixe e os
elementos vegetais. O sushi representativo da sabedoria popular, pois aproveita o
que melhor os alimentos oferecem: as algas, ervas e razes, os derivados de soja,
os legumes, verduras e o peixe fresco. Tem recebido elogios pelos benefcios para a
sade. Neste contexto, a esperana mdia de vida dos japoneses, tanto em homens
como em mulheres, uma das mais altas do mundo. Tudo isto conjugado com um
forte sentido esttico que desperta o paladar.
Alguns relatrios da Organizao Mundial de Sade referem que as mulheres
japonesas tm a maior esperana mdia de vida do mundo, ou seja, oitenta e seis
anos, enquanto que as mulheres portuguesas tm uma esperana mdia de vida de
oitenta e um anos. Quanto aos homens, os que tm possibilidades de viver mais so
os de San Marino, com uma mdia de oitenta anos. Apesar de terem conseguido
superar os japoneses, a sociedade japonesa continua a possui maior longevidade.
Depois de San Marino lideram a lista o Japo, a Austrlia, a Sucia, todos eles com
uma mdia de setenta e nove anos. J os homens portugueses ficam-se pelos
setenta e quatro anos.
O sushi considerado um alimento saudvel por diversas razes. O sushi tem um
baixo valor calrico pois um prato de sushi tpico ronda as trezentas e cinquenta,
quatrocentas calorias. Os peixes de carne branca, como a perca e o vermelho, tm
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menos de cem calorias por cem gramas. Mesmo os peixes mais ricos como a
cavala, a enguia e a parte gorda do atum tm menos de duzentas calorias por cem
gramas. O sushi tambm rico em cido gordo mega-3 que provm do peixe
utilizado, nomeadamente o atum, salmo, cavala, sardinha, pargo e peixe-espada e
eventualmente o polvo, lula e choco, bem como ao camaro, ourio-do-mar e outros
mariscos, ajuda a prevenir doenas cardiovasculares e a artrite (Barber e Takemura,
2008).
No arroz, os glcidos permitem uma libertao lenta da energia (e no contem
glten), e as fibras que proporcionam uma digesto agradvel. Colateralmente, o
arroz tambm uma fonte de niacina (ou vitamina B3, que desempenha um
importante papel no metabolismo energtico celular e na reparao do DNA),
protenas, tiamina (ou vitamina B1, importante para o bom funcionamento do sistema
nervoso, dos msculos e do corao, auxilia as clulas na produo de energia para
que o corpo possa viver, melhor a atitude mental e o raciocnio). Adicionalmente o
sushi tambm rico em iodo proveniente das algas marinhas, nomeadamente a alga
nori. Muito nutritivas, as algas fornecem vitamina A, B1, B2, B3, B6, C que ajudam a
prevenir a deposio de colesterol nos vasos sanguneos. Quanto mais escura for a
nori, maior a sua qualidade (Barber e Takemura, 2008).
Um prato de sushi tambm anti-bacteriano e anti-sptico, pois as propriedades
anti-bacterianas do vinagre ajudam a digesto e contribuem para a diminuio do
risco de hipertenso. Por outro lado, o gengibre um forte anti-sptico natural,
auxiliando a digesto, fortalecendo o sistema imunitrio e ajudando o organismo a
combater gripes e constipaes. A Wasabi (pasta de rbano-bastardo) tambm
estimula a secreo de saliva e ajuda digesto, anti-bacteriana (Barber e
Takemura, 2008).
O sushi tambm rico em minerais, o peixe uma boa fonte de protenas e de
minerais como o zinco, potssio e fsforo e em vitaminas do complexo B. o molho
de soja, feito a partir de feijes de soja fermentados, rico em amido, fibras,
protenas e minerais, entre os quais magnsio, potssio e ferro. Enquanto fonte de
vitaminas, para alm das vitaminas presentes no peixe, o sushi recorre ainda a
diversas plantas e vegetais para dar cor, sabor e teores vitamnicos adicionais a
cada prato. Neste contexto o abacate, o pepino e o rbano so alguns dos vegetais
mais utilizados (Barber e Takemura, 2008).
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3. PESCADO
Segundo a Portaria n. 559/76, de sete de Setembro, entende-se por pescado, os
animais subaquticos (crustceos, moluscos, ciclstomos, equinodermos,
batrquios, rpteis e mamferos), e as suas partes ou produtos, destinados a fins
alimentares. A mesma portaria refere ainda que peixe vivo o que reage ou
manifesta reflexos musculares percusso ou palpao das suas superfcies
externas, e pescado fresco o que no tenha sofrido, desde a sua captura, qualquer
operao de conservao, excepto a refrigerao com ou sem a adio de gelo
fragmentado simples ou misturado com sal, ou que tenha sido conservado a bordo
em gua do mar em salmoura refrigerada. O Decreto-Lei 375/98 de vinte e quatro de
Novembro, define refrigerao como processo que consiste na descida da
temperatura dos produtos da pesca para que esta esteja prxima da do gelo
fundente; e produto fresco, todo o produto da pesca, inteiro ou preparado, incluindo
os produtos acondicionados sob vcuo ou atmosfera modificada que no tenham
sofrido qualquer tratamento destinado sua conservao, excepto a refrigerao.
No entanto, e segundo actual contexto europeu, o cdigo de prticas para peixe e
produtos da pesca (2004) entende peixe como qualquer vertebrado aqutico de
sangue frio (ectotrmico). No se incluem anfbios nem rpteis aquticos; e peixe
fresco como sendo o peixe ou produtos da pesca que no tenham sido sujeitos a
tratamentos de conservao, alm da refrigerao.
3.1 O consumo de peixe em Portugal
A pesca uma importante actividade econmica que, em Portugal, ao contrrio de
alguns pases (Islndia e Noruega) tem um peso reduzido no Produto Interno Bruto
(PIB) e no Valor Acrescentado Bruto (VAB) do pas. Em Portugal, os valores destes
indicadores econmicos situam-se abaixo de 1%. O Valor Acrescentado Bruto do
sector (VAB Pescas) representou, em 2005, cerca de 0,29% do VAB Nacional. A
quebra de importncia do sector na economia nacional deve-se, em grande parte,
tendncia decrescente dos preos de venda registados desde o ano de 2002. Assim,
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no atravs destes indicadores econmicos que se poder medir a importncia
efectiva desta actividade.
No Plano Estratgico Nacional para a pesca 2007-2013, feito o retrato da pesca
nacional, refere que a preparao das grandes linhas de governao para o perodo
2007-2013 aconselha a uma reflexo profunda e fundamentada sobre a forma como
se pretende enfrentar os constrangimentos e desafios que o futuro coloca ao sector
da pesca em Portugal.
As novas tendncias do sector evidenciam a reduo das oportunidades da pesca e,
consequentemente, das capturas. Deste modo os governantes e os profissionais do
sector, discutem a necessidade de uma gesto dos recursos e do meio marinho
mais eficaz, equilibrada e sustentada. Assim sendo, estamos perante um enorme
desafio, de forma, a garantir a sustentabilidade dos recursos, fomentar a
competitividade do sector e assegurar a sustentabilidade econmica e social das
comunidades piscatrias so os desafios que a classe poltica tem para o sector da
pesca nos prximos anos.
O emprego directo no sector (pesca/captura, aquicultura e indstria transformadora
dos produtos da pesca) representa 0,6 % numa populao activa de cerca de cinco
milhes e meio de pessoas. Portugal destaca-se, no quadro da Unio Europeia a
vinte e cinco, pela sua localizao perifrica e pela sua vasta Zona Econmica
Exclusiva, que resulta de uma extensa linha de costa continental e da natureza
arquipelgica das Regies Autnomas dos Aores e da Madeira. Num pas como
Portugal, com uma Zona Econmica Exclusiva (ZEE) de 1 656 mil km2 e uma costa
continental com cerca de 942 km, a pesca constitui uma importante fonte de
subsistncia das populaes ribeirinhas.
De salientar que o consumo per capita dos produtos da pesca em Portugal no ano
de 2003 era de 33,5 kg/pessoa/ano, dividindo-se em, peixe (fresco, refrigerado,
congelado ou em conserva) 22,5 kg/pessoa/ano, bacalhau e outros peixes secos,
salgados, fumados ou em salmoura 5,5 kg/pessoa/ano e crustceos e moluscos
(frescos, refrigerados, congelados ou em salmoura) 5,9 kg/pessoa/ano (Veiga et al.,
2009). Os portugueses so, assim, os maiores consumidores de pescado no seio da
Unio Europeia.
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3.2 Mudanas post mortem nos produtos da pesca
O rigor mortis define-se pela rigidez do tecido muscular de um animal, resultante de
uma srie de modificaes complexas, que surgem nos tecidos aps a morte e
aparece apenas aps o esgotamento dos nveis de glicognio. Assim, quanto mais
elevados forem os nveis de glicognio, mais tarde o rigor mortis se ir instalar,
persistindo o peixe com boa qualidade por mais tempo, pois nesta fase o meio cido
desfavorvel ao desenvolvimento de microrganismos (Lidon e Silvestre, 2008). O
rigor mortis um sinal reconhecvel de morte que causado por uma mudana
qumica nos msculos, provocando um endurecimento ("rigor") dos msculos do
cadver a impossibilidade de os movimentar ou manipul-los (Huss, 1995).
Tipicamente o rigor acontece vrias horas aps a morte clnica e desaparece
espontaneamente dois dias mais tarde, apesar do tempo de incio e durao
depender da temperatura ambiente. Em mdia, presumindo-se a existncia de uma
temperatura amena, comea entre s trs a quatro horas post-mortem,
(endurecendo a carne e aumentando a acidez, nesta fase no ocorre deteriorao,
Lidon e Silvestre, 2008) e o efeito mximo do rigor surge nas doze horas
subsequentes, finalmente o relaxamento ocorre aproximadamente trinta e seis horas
aps a morte (wikipdia, 2009). O desenvolvimento do rigor mortis influenciado
principalmente pela reserva de glicognio, pH do msculo e temperatura. Quanto
mais se prolongar o rigor mortis, mais tempo se mantm o pescado com boa
qualidade (Lidon e Silvestre, 2008).
A especificidade da sua constituio qumica, em conjunto com os possveis efeitos
provenientes das diferentes formas de captura, levam a que os produtos da pesca
se deteriorem mais rapidamente que outros alimentos. Diversos factores influenciam
o incio e a intensidade do rigor mortis nos peixes, destacando-se a espcie,
temperatura, mtodo de manipulao e morte (i , stresse) (Sorensen et al., 2009)
Desta forma, torna-se tambm necessrio recorrer a um conjunto de prticas de
manuseamento e conservao apropriadas.
costume dividir as alteraes que o pescado sofre aps a morte em quatro tipos
diferentes: sensoriais, qumicas, fsicas, microbiolgicas (considera-se ainda, muitas
vezes separadamente, a oxidao lipdica, embora possa ser includa, por exemplo,
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24
nas alteraes qumicas e sensoriais) (Vaz-Pires, 2006). Logo aps a captura/morte
dos animais, ocorrem alteraes a nvel autoltico, qumico, microbiolgico e
sensorial (Huss, 1995).
Aps a morte, os produtos da pesca ficam sujeitos a vrias alteraes de origem
enzimtica e bacteriana que posteriormente podero conduzir a um deficiente
estado de frescura, caso as condies de higiene e conservao no sejam
respeitas (Figura 3.1).
Fonte: Guzmn, 1988.
Figura 3.1 Fases que ocorrem nos tecidos musculares desde a captura at a putrefaco.
O pescado um produto com elevada perecibilidade, devido ao elevado carcter
coloidal da respectiva protena muscular, com grande quantidade de substancias
extractivas nitrogenadas livres (as principais responsveis pelo aroma e sabor
especficos do peixe fresco), produtos intermedirios de metabolismo, aminocidos
livres e xido de trimetilanina ((CH3)3NO) (Lidon e Silvestre, 2008).
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25
Segundo Vaz-Pires (2006) alteraes que o pescado sofre aps a morte so de
diferentes tipos, destacando-se:
Alteraes sensoriais so as que podem ser detectadas pelos rgos dos
sentidos humanos; representam a soma de todas as outras e so as que o
consumidor comum, sem auxlio de instrumentos e mesmo sem tocar no
produto, pode usar no quotidiano. A ttulo de exemplo destaca-se o
aparecimento de cheiros desagradveis ou a perda de transparncia dos
olhos dos peixes;
Alteraes qumicas so as verificadas por anlises qumicas a compostos
que sofrem modificaes, na sua quantidade, ao longo da degradao. H
compostos que so degradados, outros que se formam; desde que haja
alteraes relacionveis com o desenrolar da degradao, podero servir de
mtodo indicador da qualidade (ou, pelo menos, de algumas qualidades) do
pescado. Por exemplo, o pescado, no momento da morte, tem normalmente
um elevado teor de ATP, que consumido rapidamente em minutos ou horas.
Alteraes fsicas so as que se verificam em parmetros fsicos,
mensurveis com instrumentos apropriados. A resistncia elctrica dos
tecidos e a rigidez do msculo porque diminuem gradualmente at
degradao avanada do pescado, so alguns exemplos neste caso;
Alteraes microbiolgicas so as induzidas por microrganismos existentes
no pescado, quer naturalmente, quer atravs de contaminaes posteriores
sua captura. Por exemplo, o nmero total de bactrias geralmente aumenta
durante a degradao do pescado;
Alteraes lipdicas por oxidao, embora tambm sejam alteraes
qumicas, eventualmente com implicaes sensoriais, so frequentemente
consideradas separadamente, j que acorrem principalmente em peixes
gordos, sendo neste caso (ao contrrio dos peixes magros) as principais
causadoras de degradao.
Todas estas formas de degradao esto interligadas e no so facilmente
distinguveis entre si. De facto, note-se que o crescimento bacteriano (alterao
microbiolgica) provoca cheiros desagradveis (alterao sensorial), amolecimento
UNL-FCT
26
do msculo (alterao fsica) e degradao proteica (alterao qumica) (Guzmn,
1988).
3.2.1 A autlise
Existe nos animais aquticos, antes da morte, mecanismos de controlo da respectiva
actividade enzimtica. As enzimas que o pescado segrega, e tambm as que os
microrganismos nele presentes produzem, degradam os alimentos ingeridos, mas os
tecidos das paredes do tubo digestivo mantm-se ntegros. Envolvidos neste
processo de defesa esto a prpria constituio das mucosas de revestimento, bem
como outros sistemas, nomeadamente o sistema imunitrio, que actuam em caso de
invaso microbiana (Vaz-Pires, 2006).
A autlise caracterizada pela aco de enzimas nos constituintes do pescado
aps a sua morte. Elas esto presentes tanto nas vsceras como na carne. A sua
aco tambm resulta na produo de substncias com odor desagradvel,
conjuntamente produzem outras substncias que servem de substrato aos
microrganismos. A autlise tambm causa o amolecimento da carne do pescado,
provoca como exemplo, o fenmeno da barriga dilacerada em sardinhas e das
manchas negras em camares e lagostas (Huss, 1997).
A estrutura das paredes do tubo digestivo vai alterar-se, perdendo gradualmente as
suas capacidades associadas permeabilizao celular. O sistema imunitrio pra
de funcionar e as enzimas presentes vo adquirindo uma maior capacidade de
digesto e invaso dos tecidos circundantes. A este processo de auto-digesto do
pescado chama-se autlise; provocada por enzimas, das quais uma grande parte
constituda por enzimas do prprio pescado e outra parte, normalmente menor, por
enzimas produzidas por microrganismos nele presentes no momento da morte (Vaz-
Pires, 2006).
Se a maior parte dos crustceos capaz de respirar fora do seu ambiente mediante
absoro do oxignio atmosfrico por perodos de tempo limitados, com a maior
parte dos peixes sseos tal no ocorre, constituindo a via glicolitica o processo de
obteno de energia.
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Aps, a morte, o glicognio ou os lpidos armazenados so oxidados pelas enzimas,
e dessa gliclise post mortem resulta a acumulao de cido lctico, o que faz
baixar o pH do msculo (por vezes abaixo de seis). A esta fase, aps a captura dos
produtos da pesca, chamamos de Pr-rigor.
Por norma, um animal sem stress e bem alimentado antes da morte, ter maior
quantidade de glicognio face aquela que tenha sido submetido ao stress e ao
jejum.
As modificaes qumicas que ocorrem durante a deteriorao processam-se de
forma mais pronunciada na fraco lipdica do pescado. Esta fraco pode sofrer
reaces de oxidao e hidrlise, as quais resultam na produo de substncias
responsveis pela rancificao e por sabores desagradveis (Gram et al., 2004).
Em muitos dos processos de autlise esto envolvidas substncias que derivam da
metabolizao do azoto. Uma destas substncias a salientar o xido de
trimetilanina [(CH3)3NO] ou, um agente osmoregulador em peixes. O (CH3)3NO pode
ser transformado em trimetilamina ((CH3)3N), atravs da aco bacteriana, em peixe
refrigerado, ou em dimetilamina (CH3)2NH e formaldedo (HCHO), por influncia
enzimtica, em peixe congelado (Guzmn, 1988). Outra amina biognica produzida
durante os processos de deteriorao a histamina, a qual acima de certa
concentrao sistmica se torna txica, podendo provocar vmitos, diarreias, dores
abdominais, dores de cabea e reaces alrgicas cutneas (Gram et al., 2004).
A dissoluo do estado de rigor mortis um processo complexo e em parte
incompreendido, no entanto, os processos que levam a esta fase parecem ter uma
provenincia autoltica em que o relaxamento do msculo (maturao) est
relacionado com a digesto de alguns componentes por parte de enzimas. Esta
dissoluo, e o eventual processo de deteriorao, coincide ento com as mudanas
autolticas, uma das quais, sendo a degradao do ATP. A esta fase atribui-se o
nome de maturao. Estes processos degradativos e a aco de algumas enzimas
microbianas induzem novamente o relaxamento do msculo, tornando a sua textura
mole (Gram et al., 2004).
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3.2.2 Mudanas ao nvel sensorial
Os fenmenos complexos que ocorrem durante a degradao, principalmente
qumicos, fsicos e microbiolgicos, do origem a efeitos no pescado, detectveis
por simples utilizao dos rgos dos sentidos humanos, as alteraes sensoriais
(Vaz-Pires, 2006).
As primeiras alteraes durante o armazenamento e conservao do pescado
ocorrem (Figura 3.2) no mbito do aspecto e da textura, surgindo posteriormente
alteraes no sabor (Huss, 1995).
Fonte: Huss, 1995
Figura 3.2 Principais alteraes da qualidade do peixe conservado refrigerado.
Pela anlise da Figura 3.2 podem observar-se quatro fases: na primeira fase
verifica-se que o pescado muito fresco, sabor e cheiro a maresia ou neutro e sabor
adocicado; na segunda fase prevalece uma perda do cheiro e sabor caracterstico; e
na terceira fase d-se o aparecimento dos primeiros indcios de deteriorao e de
compostos volteis depende da espcie e do processo de deteriorao (aerbia ou
anaerbia); e durante o estado mais avanado desenvolvem-se cheiros ligeiramente
adocicado, amoniacal, sulfdrico e a rano. A textura do msculo torna-se
progressivamente mais mole e aquosa, ou muito seca; na quarta fase, o peixe pode
ser considerado como degradado e ptrido (Huss, 1995).
A primeira e segunda fase coincidem com as rpidas alteraes autolticas que
ocorrem na primeira fase de post mortem. Na ltima fase ocorre uma actividade
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bacteriana bastante intensa e as alteraes no msculo tornam-se notrias (Nunes e
Batista, 2004).
A avaliao da frescura do pescado recorre inspeco sensorial (desde a dcada
de setenta). Porm, a natureza subjectiva dos mtodos sensoriais exige a adopo
de critrios de avaliao harmonizados e a participao de provadores treinados e
familiarizados com os produtos da pesca e com os critrios de avaliao usados, e
actualmente, est regulamentado a nvel europeu. O Regulamento (CE) n 2406/96
do Conselho, de vinte e seis de Dezembro, que inclui esquemas de avaliao do
grau de frescura para alguns grupos de peixes (brancos, azuis e elasmobrnquios),
cefalpodes e crustceos e que se destinam a ser usados, tanto pela indstria como
pelos servios de inspeco (Nunes e Batista, 2004).
Embora naquele regulamento se encontrem fixadas normas de comercializao para
mais de quarenta espcies, h ainda muitas outras comercializadas nas lotas
portuguesas que no se encontram abrangidas. Alm disso, as descries indicadas
nas tabelas nem sempre so as mais adequadas por no permitirem descrever,
convenientemente, as alteraes que tm lugar. As deficincias de tabelas tm sido
apontadas em vrios pases, o que levou ao desenvolvimento de esquemas
alternativos, que tenham em conta as caractersticas de cada espcie, sejam de
aplicao mais expedita e permitam que as classificaes do grau de frescura
evoluam proporcionalmente com o tempo de conservao em refrigerado.
Um dos recentes esquemas de avaliao sensorial do grau de frescura, o mtodo do
ndice de qualidade, cuja sigla QIM (Quality Index Method), procura ultrapassar as
dificuldades surgidas na aplicao das tabelas da Unio Europeia. Este mtodo
baseia-se na avaliao dos atributos que melhor traduzem as alteraes que
ocorrem no pescado, por exemplo, aspecto da pele, forma dos olhos e cor das
guelras. Para cada um dos atributos seleccionado um conjunto de dois a quatro
descries que melhor reflectem as alteraes ocorridas. A cada um dos descritores
atribuda uma pontuao, pontos de demrito, que varia entre zero e trs. O facto
de cada atributo poder ter dois a quatro descritores marca uma das diferenas do
QIM em relao aos esquemas tradicionais. Outra diferena reside no facto de se
utilizarem vrios descritores especficos de cada produto. Alm disso, o grau de
frescura do produto em causa no se baseia numa mdia, mas no nmero total de
pontos de demrito o qual designado por ndice de qualidade. Os descritores
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utilizados para identificar as alteraes so inequvocos, claros e breves, envolvendo
normalmente apenas uma ou duas palavras. Deste modo, procura-se minimizar
qualquer confuso por parte dos provadores, tornando assim a avaliao fcil,
rpida e objectiva (Nunes e Batista, 2004).
3.2.3 Mudanas microbiolgicas
Muitos autores consideram os microrganismos entre os principais responsveis pela
degradao do pescado, embora a sua aco s se torne evidente
aproximadamente a partir do sexto dia em gelo. Isto porque as alteraes
enzimticas da autlise tm incio principalmente a partir do tubo digestivo, que
muitas vezes retirado durante a eviscerao, e tambm porque, no mbito das
propriedades organolpticas, a autlise no to evidente como a degradao
microbiana (Figura 3.3). No entanto, o principal motivo talvez seja o facto de ser
muito mais difcil controlar os efeitos das enzimas do que os efeitos dos
microrganismos (embora, paradoxalmente, eles tambm actuem muitas vezes
produzindo enzimas) (Huss, 1997).
Fonte: Nunes e Batista, (2004)
Figura 3.3 Alteraes da qualidade do peixe conservado em refrigerado.
a) Curva de crescimento microbiolgico tpica; b) Degradao enzimtica e microbiolgica do
pescado.
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At ao quinto e sexto dia em gelo aps a morte, os microrganismos no revelaram
uma grande capacidade para crescer nem para causar a degradao do pescado
(pelo menos, quando comparada com a aco enzimtica), estando, nesta primeira
fase da degradao, em fase lag, de atraso ou de latncia. Encontrando-se,
portanto, em fase de adaptao ao novo meio (pescado morto), pelo que h que
adaptar os mecanismos de sobrevivncia e crescimento falta de oxignio, e
carncia da chegada regular de nutrientes, menor abundncia de gua disponvel,
e ausncia de remoo de produtos de excreo. Passada esta primeira fase lag,
os microrganismos entram na chamada fase log ou logartmica, ou seja, crescem de
forma exponencial e passam a constituir o principal motivo da degradao. Daqui em
diante (aproximadamente no sexto dia em gelo) os microrganismos vo ser sempre
o principal factor da degradao.
Imediatamente aps a captura, a microflora dos produtos da pesca est presente
apenas no muco superficial, guelras e tracto intestinal, sendo normalmente
inexistente no msculo.
Aps a morte, os produtos da pesca perdem a proteco natural contra as bactrias,
apesar da diminuio do pH, pois esta muito leve, no chegando, por si s, a
constituir uma barreira. Os sucos digestivos, por sua vez, de natureza cida,
perfuram a parede intestinal, causando a decomposio dos tecidos e facilitando
desta forma a aco de microrganismos inicialmente restritos ao tracto intestinal
(Huss, 1995).
Os microrganismos so, independentemente do motivo, o factor mais estudado na
investigao da degradao do pescado nos ltimos anos. H, portanto, que
equacionar as necessidades que os microrganismos apresentam, pois nelas que
se baseiam os mtodos que possibilitam a conservao dos alimentos. Se o
desenvolvimento dos microrganismos for evitado, o pescado perdurar mais tempo
sem se degradar. Estas necessidades so basicamente as mesmas de qualquer ser
vivo: gua, nutrientes e temperatura adequada so as principais, seguindo-se-lhes
outras condies fsicas e qumicas do meio, que tm obviamente de ser
compatveis com a vida (Nunes e Batista, 2004).
As anlises microbiolgicas no fornecem informaes acerca da frescura do
pescado, mas permitem detectar a presena de bactrias patognicas, de
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microrganismos indicadores de contaminao fecal ou at de eventuais prticas de
manuseio deficientes (Huss, 1997).
Segundo Adam e Moss (1995), a contaminao dos produtos da pesca por
microrganismos pode depender de vrios factores, podem ser intrnsecos e
extrnsecos.
No mbito dos factores intrnsecos (limitaes do substrato), aponta-se o/a pH;
Actividade de gua (aw); Potencial de xido-reduo (Eh); Nutrientes ou composio
qumica; Factores anti-microbianos e Estrutura biolgica.
Os factores extrnsecos (limitaes ambientais), integram a Humidade relativa;
Temperatura; Atmosfera gasosa e Taxa de crescimento especfica.
Adicionalmente devem ainda equacionar-se os factores implcitos, o sinergismo
(agentes potenciam-se mutuamente), o antagonismo (agentes prejudicam-se
mutuamente) e o comensalismo (um agente beneficia doutro, sem o prejudicar).
3.2.3.1 Factores intrnsecos
1) pH
O pH influencia as reaces qumicas e bioqumicas e consequentemente os
microrganismos.
O desenvolvimento de um microrganismo s pode ocorrer dentro de uma
determinada faixa de pH. O pH ptimo para uma espcie aquele em que o
microrganismo apresenta o crescimento mais rpido. A zona e tolerncia de pH na
qual o crescimento de uma determinada espcie possvel de um lado e do outro do
pH ptimo, varia no entanto consoante os outros factores do meio (Bourgeois et al.,
1996).
A maioria das bactrias tem um pH ptimo prximo da neutralidade (6,5 a 7,5). Em
geral, as leveduras e principalmente os bolores podem crescer numa gama muito
larga de pH. Este no s afecta a taxa de crescimento dos microrganismos, mas
igualmente a sua taxa de sobrevivncia durante o armazenamento. O Quadro 3.1
apresenta a gama de pH de alguns grupos microbianos.
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Quadro 3.1 - Gama de pH de alguns grupos microbianos.
Adaptado de: Bourgeois et al., (1996)
2) Actividade de gua (aw)
A frase de que Todos os seres vivos necessitam de gua obviamente verdade; a
gua tem que estar presente, mas tambm numa forma disponvel, que possa ser
utilizada pelas clulas (Vaz-Pires, 2006). A gua pode encontrar-se na forma ligada
e livre, resultando num contedo total de gua (humidade). Por exemplo, num
produto congelado existe gua, mas est no estado slido, na forma de cristais, pelo
que, embora presente, no est disponvel para ser utilizada pelas clulas vivas
(Bourgeois et al., 1996).
A melhor medida de concentrao de gua, em termos de propriedades fsico-
qumicas, nos produtos, refere-se medio de sua actividade (aw), ou seja,
medio do teor de gua livre no produto. A actividade da gua (aw), no mais do
que o quociente entre a presso parcial da gua na atmosfera em equilbrio com o
alimento (P) e a presso parcial da gua na atmosfera em equilbrio com a gua
pura mesma temperatura (P0) (Vaz-Pires, 2006).
aw = P/P0
Quando no existe gua livre, a medida de actividade de gua (aw) ser igual a 0,
porm, se a amostra constituda na sua totalidade por gua pura, ento a aw
igual a 1. Portanto, as medidas da aw dos produtos esto compreendidas entre 0 e 1
(sem unidades por ser um quociente entre presses) (Guzmn, 1988). Podendo
apresentar-se intimamente ligada s molculas constituintes do produto no
Microrganismos Mnimo ptimo Mximo
Bolores 1,5-3,5 4,5-6,8 8-11
Leveduras 1,5-3,5 1-6,5 8-8,5
Bactrias 4,5 6,5-7,5 11
Bactrias Acticas 2,0 5,4-6,3 9,2
Bactrias Lcticas 3,2 5,4-6,5 10,5
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podendo ser removida ou utilizada para qualquer tipo de reaco, onde o
metabolismo dos microrganismos paralisado, no havendo desenvolvimento ou
reproduo, ou livre (estando disponvel para as reaces fsicas, evaporao,
qumicas, escurecimento, e microbiolgicas, tornando-se a principal responsvel
pela deteriorao do produto). A velocidade das reaces qumicas, desejveis ou
no, depende da mobilidade e concentrao dos compostos e enzimas envolvidos,
que so conferidas pela quantidade de gua livre. A determinao da actividade de
gua permite a inibio da reproduo microbiana, reaces enzimticas, oxidativas
e hidrolticas do produto (Bourgeois et al., 1996).
O comportamento microbiano frente aw extremamente varivel, sendo que as
bactrias so mais exigentes quanto disponibilidade de gua livre, em relao aos
fungos e leveduras. Os substratos com aw inferior a 0,60 esto assegurados quanto
ao desenvolvimento microbiano. Alimentos com alto teor de lpidos, que apresentam
actividade de gua na faixa de 0,30 a 0,40 so mais estveis oxidao qumica e
microbiana (Vaz-Pires, 2006).
O Quadro 3.2 a seguir apresentado, ilustra o valor mnimo de aw at onde muitos
grupos microbianos e microrganismo especficos tm capacidade de se desenvolver.
Quadro 3.2 Valor mnimo para o crescimento de microrganismos nos alimentos.
Organismos aw Organismos aw
Maioria das bactrias de alterao 0,90 Bactrias halfilas 0,75
Maioria das leveduras de alterao 0,88 Bolores xerfilos 0,61
Maioria dos bolores de alterao 0,90 Leveduras osmfilas 0,61
Organismos especficos Organismos especficos
Clostridium botulinum, tipo E 0,97 Mucor spinosus 0,93
Pseudomonas spp. 0,97 Candida scotti 0,92
Acinectobacter spp. 0,96 Trichosporon pullulans 0,91
Escherichia coli 0,96 Candida zeylanoides 0,90
Enterobacter aerogenes 0,95 Staphylococcus aureus 0,86
Bacillus subtilis 0,95 Alternaria citri 0,84
Clostridium botulinum tipo A e B 0,94 Penicillium patulum 0,81
Candida utilis 0,94 Aspergillus glaucus 0,70
Vibrio parahaemolyticus 0,94 Aspergillus conicus 0,70
Botrytis cinerea 0,93 Zygosaccharomyces rouxii 0,62
Adaptado de: Jay, (1996)
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Actividades da gua inferiores a 0,6 impedem o crescimento de bactrias, da que
seja possvel conservar alimentos mediante desidratao, salga, congelao, etc.
Deste modo, qualquer processo que vise diminuir a quantidade e/ou a
disponibilidade de gua de um alimento permite inibir parcial ou totalmente a
actividade das enzimas e o desenvolvimento de microrganismos e,
consequentemente, aumentar o tempo de conservao desse alimento (Vaz-Pires,
2006). Esta gua, fortemente ligada ao alimento, forma uma espcie de
monocamada com apenas alguns angstrom de espessura e que envolve o alimento.
Trata-se de uma gua que no utilizada para dissolver os constituintes dos
alimentos e, como tal, a velocidade das reaces tende para zero (excepto o caso
da oxidao dos lpidos) (Figura 3.4), no se constatando qualquer desenvolvimento
microbiano (Castro, 2004).
Adaptado de: Castro, (2003)
Figura 3.4 Correlao entre a taxa de alterao dos alimentos e a da actividade da gua.
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3) Potencial de oxido-reduo (Eh)
O potencial de oxido-reduo uma medida da tendncia de um sistema reversvel
de doar e receber electres. Mede a facilidade com que o substrato pode captar ou
receber electres. Entende-se por estado de oxidao quando existe a libertao ou
perda de electres, e estado de reduo quando o composto recebe electres
(Castro, 2004). Deste modo, utiliza-se a equao de Nernst para clculo do potencial
de oxido-reduo ou redox (Eh). A determinao do Eh feita com potencimetros.
Eh = E0 + 0,06/n log (ox)/(red)
E0 = padro redox (pH=0)
N = nmero de electres envolvidos no processo
(ox) (red) = concentrao no estado oxidativo e reduzido
Assim, quanto menor for Eh maior ser a capacidade para ceder electres (Quadro
3.3).
Quadro 3.3 Eh de crescimento de microrganismos.
Adaptado de: Valsechi (2006).
Os microrganismos aerbios so favorecidos com valores elevados para o potencial
redox. Por oposio, os microrganismos anaerbios so favorecidos com nveis
baixos. Note-se que o potencial redox cai com a converso de msculo em carne
(Valsechi, 2006).
Microrganismos Eh de crescimento (em mV)
Aerbios + 350 a 500
Anaerbios
+ 30 a 250
Na ausncia de O2 toleram substrato com Eh elevado (+370)
Na presena de O2 este limite baixa para + 100
Anaerbios facultativos +100 a + 350
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4) Nutrientes ou composio qumica
Os microrganismos usam os alimentos como fontes de nutrientes e energia. A partir
do meio envolvente, usam elementos qumicos para construir a sua biomassa,
extraem molculas que no sintetizam (e que so essenciais para o crescimento) e
utilizam a parte do substrato que pode ser usada como fonte de energia (Vaz-Pires,
2006). Deste modo, a falta de algum nutriente essencial, ou um dfice num nutriente
no essencial mas necessrio, provocara atraso ou impossibilidade de crescimento
(Huss, 1997). No entanto, normalmente no h falta de nenhum nutriente no
pescado, ao contrrio do que acontece em alguns outros alimentos (por exemplo, na
clara do ovo, no existem determinados nutrientes, o que constitui uma forma de
defesa contra os microrganismos). O pescado assim um excelente alimento,
equilibrado e rico em vrios nutrientes essenciais, pelo que os microrganismos no
tm qualquer dificuldade de crescimento neste meio. Trata-se at de um dos motivos
que justificam a elevada perecibilidade do pescado (Vaz-Pires, 2006).
De uma forma geral, entre os microrganismos encontrados nos alimentos, os bolores
formam o grupo de organismos que tem as mais fracas exigncias nutricionais,
seguido pelo grupo das leveduras, as bactrias gram-negativas e finalmente as
gram-positivas (Guzmn, 1988).
5) Factores anti-microbianos
Os factores anti-microbianos so substncias que apresentam a capacidade de
retardar ou impedir a multiplicao microbiana. Estas substncias inibem o
funcionamento enzimtico, interferem na gentica celular ou ligam-se aos nutrientes
essenciais, impedindo a sua utilizao (Huss, 1995).
Estas substncias inibem o crescimento de certos microrganismos, principalmente
das bactrias gram-positivas. Podem, portanto, ter um certo efeito selectivo sobre a
flora e alteraes a curto prazo. O seu papel protector no entanto limitado porque
numerosas espcies microbianas so resistentes. Alm disso vrios destes
compostos so facilmente neutralizados pelo aquecimento, oxidao ou digesto
microbiana.
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6) Estrutura biolgica
A estrutura biolgica constitui tambm uma barreira ou obstculo para o acesso dos
microrganismos s partes perecveis de alguns alimentos, ou seja, aquela que
apresenta nutrientes, e portanto, que permite a multiplicao dos microrganismos
so teoricamente estreis. Tais estruturas podem ser representadas por plos e
peles de animais (pele e escamas de peixes).
3.2.3.2 Factores extrnsecos
1) Humidade relativa
A humidade relativa interfere directamente com a actividade de gua (aw) do
alimento. Se armazenarmos um alimento com baixa aw num ambiente com
humidade relativa elevada, a actividade de gua do alimento aumentar, podendo
sofrer deteriorao por microrganismos. O binmio humidade relativa/temperatura
no pode ser desprezado, sendo que, no geral, quanto mais elevada a temperatura
de armazenamento, menor dever ser a humidade relativa. Note-se que o inverso
tambm se verifica.
2) Temperatura
A temperatura de armazenamento o factor ambiental mais importante que afecta a
durao da conservao e o tipo de alteraes microbianas doa produtos
alimentares (Vaz-Pires, 2006; Huss, 1995).
O ritmo de desenvolvimento de um microrganismo varia com a temperatura e para
alm de certos limites, todo o crescimento impossvel. Teoricamente existe a
possibilidade de alterao
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