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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ JULIO CESAR VIEIRA DE OLIVEIRA CRIME DE ESTUPRO E AS ALTERAÇÕES DA LEI Nº 12.015/09 São José 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

JULIO CESAR VIEIRA DE OLIVEIRA

CRIME DE ESTUPRO E AS ALTERAÇÕES DA LEI Nº 12.015/09

São José

2010

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JULIO CESAR VIEIRA DE OLIVEIRA

CRIME DE ESTUPRO E AS ALTERAÇÕES DA LEI Nº 12.015/09

Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau em Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. MSc. Luiz César Silva Ferreira.

São José

2010

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JULIO CESAR VIEIRA DE OLIVEIRA

CRIME DE ESTUPRO E AS ALTERAÇÕES DA LEI 12.015/09

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de Bacharel e

aprovada pelo Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI,

Centro de Ciências Sociais e Jurídicas.

Área de Concentração: Direito Penal

São José, 26 de Novembro de 2010.

______________________________

Prof. MSc. Luiz César Silva Ferreira UNIVALI – Campus São José

Orientador

_____________________________

Prof. Esp. Roberto Wohlke UNIVALI – Campus São José

Membro

_____________________________

Prof. Bel. Wagner Batista Cardoso UNIVALI – Campus São José

Membro

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Posso não concordar com nenhuma das

palavras que você disser, mas defenderei até a

morte o direito de você dizê-las.

Voltaire

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A Deus, pois ele conspira a favor

daqueles que se despertam para um grande

sonho e se lançam nele com toda força de sua

alma.

A todos aqueles que de alguma forma

aprimoraram o meu conhecimento e que direta

e indiretamente acreditaram e me incentivaram

a correr atrás dos meus ideais.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, pela Sua graça, misericórdia e fidelidade que se renovam a cada dia em minha vida.

Aos pais e irmãos: por serem grandes incentivadores deste projeto.

À esposa: que foi parceira ajudando e cooperando em todos os sentidos para que

tivesse tempo e dedicação ao curso e à monografia. Obrigado pelo carinho e

compreensão nos momentos de ausência.

Aos filhos: de quem recebi uma força extraordinária, embalada na capacidade de

acreditar nos sonhos sem limites.

Aos amigos: para conhecermos os amigos é necessário passar pelo sucesso e

pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e na desgraça a qualidade.

Ao orientador: que com presteza colaborou para esta monografia e no momento

difícil me transmitiu força. Sem o seu aval eu não chegaria ao fim deste Projeto.

A minha amiga Graça: que me auxiliou na revisão deste trabalho.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade

pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade

do Vale do Itajaí – UNIVALI, a coordenação do Curso de Direito, a Banca

Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do

mesmo.

São José, 26 de novembro de 2010

Julio Cesar Vieira de Oliveira

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RESUMO

Este trabalho de Conclusão de Curso tem como área de pesquisa o Direito Penal sob a ótica do crime de estupro na legislação vigente. A importância desta pesquisa justifica-se na intenção de colaborar com o aprofundamento da comunidade acadêmica acerca de tão importante tema. Os tópicos aqui tratados com relação ao Direito Penal e seus princípios, bem como o cenário desde a antiguidade sobre o crime de estupro, tem a intenção de contextualizar o tema, enquanto a abordagem da Lei 8.072/90 tem o mero objetivo da informação que serve de comparativo para o confronto realizado no terceiro capítulo com as alterações editadas pela Lei 12.015/09. Esta abordagem suscita refletir sobre o tratamento das vítimas de estupro, bem como a penalização a ser dada aos agentes causadores, que de acordo com o exposto, julgados estão sendo revistos nos Tribunais, em vista destas alterações. Na verdade, a mudança ocorrida na Lei Hedionda, de modo geral, vem de encontro aos anseios do Princípio Constitucional explicitado no art. 5º da Carta Magna de 1988, e princípio basilar do Direito, enquanto ciência, que é o Princípio da Dignidade Humana. Primar por leis que venham cada vez mais proteger a pessoa humana, é o fim do Direito, que tem como norte regrar a vida da sociedade e em sociedade, e objeto do Direito Penal, enquanto norteador de regras que venham a garantir os direitos individuais. Concluindo, expõe o presente trabalho de monografia as reflexões e decisões jurisprudenciais para que a Conclusão possa responder aos questionamentos levantados no presente trabalho de pesquisa.

Palavras-chave: Direito Penal, Estupro, Código Penal, Lei 12.015/09, Lei 8.072/90, Crime Hediondo, Princípio da Dignidade Humana.

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ABSTRACT

This work Completion of course is to survey the area of criminal law from the perspective of the crime of rape by law. The importance of this research is justified on the intention to collaborate with the deepening of the academic community about important topic. These topics in relation to criminal law and its principles, as well as the scene since ancient times on the crime of rape, is intended to contextualize the subject, while the approach of Law 8.072/90 has the sole purpose of information that serves in comparison to the confrontations taking place in the third chapter as amended by Law 12.015/09 edited. This approach raises reflect on the treatment of rape victims, and the penalty to be given to causative agents, which according to the above, tried in the courts are being reviewed in view of these changes. In fact, the change in the law Hedionda, in general, comes against the wishes of the Constitutional Principle explained in art. 5 of the 1988 Constitution and fundamental principle of law as a science, which is the Principle of Human Dignity. Precedence for laws that will increasingly protect the human person is the end of the law, which is north rule the life of society and in society, and the object of criminal law as a guiding rule that will guarantee individual rights. In conclusion, this paper presents the reflections of a monograph and jurisprudence that the conclusion can respond to questions raised in this research.

Keywords: Criminal Law, Rape, Penal Code, Law 12.015/09, Law 8.072/90, heinous crime, the Principle of Human Dignity: Keywords.

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ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

CF – Constituição Federal

CP – Código Penal

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

RT – Revista dos Tribunais

TFR – Tribunal Federal de Recursos

TJ – Tribunal de Justiça

TRF – Tribunal Regional Federal

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 13

1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O CRIME DE ESTUPRO .................. 15

1.1 ASPECTOS GERAIS ........................................................................................ 15 1.2 PRINCÍPIO GERAL DO DIREITO ......................................................................... 17

1.2.1 O Princípio da Dignidade Humana ...................................................... 17 1.3 PRINCÍPIOS DE DIREITO PENAL ........................................................................ 18

1.3.1 Princípios Concernentes à Aplicação da Pena ................................... 19 1.3.1.1 Princípio da Personalidade .......................................................... 19 1.3.1.2 Princípio da Individualização da Pena ......................................... 19 1.3.1.3 Princípio da Humanidade ............................................................. 20

1.3.2 Princípios Concernentes à Aplicação da Lei Penal ............................. 20 1.3.2.1 O Princípio da Legalidade ............................................................ 20 1.3.2.2 Princípio da Anterioridade ............................................................ 22 1.3.2.3 Princípio da Irretroatividade da Lei Penal .................................... 22

1.4 O ESTUPRO NO PROCESSO HISTÓRICO ............................................................ 23 1.4.1 Evolução Jurídica do Crime de Estupro no Mundo ............................. 23

1.4.1.1 Direito Romano ............................................................................ 23 1.4.1.2 Direito Germânico ........................................................................ 25 1.4.1.3 Direito Hebraico ........................................................................... 26 1.4.1.4 Egito e Grécia .............................................................................. 26 1.4.1.5 Direito Francês ............................................................................. 27

1.4.2 Evolução Jurídica do Crime de Estupro no Brasil ............................... 27 1.4.2.1 Ordenações Afonsinas ................................................................. 28 1.4.2.2 Ordenações Manuelinas .............................................................. 29 1.4.2.3 Ordenações Filipinas ................................................................... 30

1.4.3 O crime de estupro e os Códigos Penais ............................................ 31 1.4.3.1 O Código de 1830 ........................................................................ 31 1.4.3.2 O Código de 1890 ........................................................................ 32 1.4.3.3 Código Contemporâneo ............................................................... 33

2 CRIME DE ESTUPRO E A LEI Nº 8.072/90 .................................................. 35

2.1 ASPECTOS GERAIS ........................................................................................ 35 2.2 LEI DOS CRIMES HEDIONDOS .......................................................................... 36 2.3 CONCEITOS INERENTES À LEI Nº 8.072/90 ...................................................... 40

2.3.1 Conceito de Estupro ............................................................................ 40 2.3.2 Objetividade Jurídica ........................................................................... 41 2.3.3 Sujeito Ativo ........................................................................................ 41 2.3.4 Sujeito Passivo .................................................................................... 43 2.3.5 Elemento Subjetivo do Tipo ................................................................ 44 2.3.6 Elemento Objetivo do Tipo .................................................................. 45

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2.4 PROVA DO CRIME DE ESTUPRO ....................................................................... 47 2.5 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA ............................................................................ 48 2.6 CONCURSO MATERIAL COM O ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR .......................... 49 2.7 CONCURSO DE AGENTES ................................................................................ 50 2.8 EXCLUSÃO DO DELITO .................................................................................... 51 2.9 FORMAS DO DELITO ....................................................................................... 51

3 O CRIME DE ESTUPRO NA REDAÇÃO DA LEI 12.015/09 ......................... 53

3.1 ASPECTOS GERAIS ........................................................................................ 53 3.2 BEM JURÍDICO TUTELADO ............................................................................... 54 3.3 NOVO CONCEITO DO CRIME DE ESTUPRO ......................................................... 55 3.4 SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO ................................................................. 56 3.5 TIPICIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA .................................................................. 57 3.6 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA ............................................................................ 59 3.7 MUDANÇAS EFETIVAS DA LEI Nº 12.015/09 EM RELAÇÃO AO CRIME DE ESTUPRO . 59

3.7.1 Modificação do Título .......................................................................... 60 3.7.2 Unificação do Crime de Estupro e Atentado Violento ao Pudor .......... 60 3.7.3 Sujeito Ativo e Sujeito Passivo ............................................................ 65 3.7.4 Estupro de Vulnerável ......................................................................... 65 3.7.5 Ação Penal .......................................................................................... 67 3.7.6 A Hediondez da Lei ............................................................................. 68 3.7.7 Derrogação do Artigo 9º da Lei nº 8.072/90 ........................................ 68

CONCLUSÃO ....................................................................................................... 71

BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 73

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho de monografia terá como objeto o crime de estupro,

tema inserido no Direito Penal, com foco nas alterações da Lei 12.015/09.

O objetivo geral é refletir, sob a luz da doutrina e jurisprudência, se houve

aprimoramento da legislação nas alterações elencadas na Lei 12.015/09.

Quanto aos objetivos específicos pretende-se: a) abordar o tratamento do

crime de estupro pela legislação da antiguidade aos nossos dias ; b) analisar o crime

de estupro sob a ótica da lei 8.072/90; c) elencar as alterações feitas pela Lei

12.015/09, no que se refere ao crime de estupro e sua penalização.

O objetivo institucional desta Monografia de Graduação é a colação de grau

no curso de Bacharel em Direito da Universidade do Vale do Itajaí – Univali.

Ao legislador compete aprimorar a legislação de modo que atenda ao

princípio fundamental do Direito que é o Princípio da Dignidade Humana, e

especificamente no caso do presente trabalho de monografia, “proteger a

integridade e liberdade sexual das pessoas em um patamar elevadíssimo”.

Para esta abordagem, o primeiro capítulo tratará de aspectos gerais

relacionados ao crime de estupro na antiguidade até os dias atuais, sob a ótica

jurídica. Na sequência serão apreciados alguns Princípios Básicos do Direito Penal,

enquanto norteadores da ação do Direito Penal.

O segundo capítulo discorrerá sobre a abordagem do crime de estupro na

Lei 8.072/90, abrangendo as peculiaridades relativas ao enquadramento deste

delito, considerando a abordagem de crime hediondo.

O terceiro e último capítulo abordará então, as modificações trazidas pela

Lei 12.015/09, enquanto norteadora da dignidade social, uma vez que o amplo

conceito de dignidade abraça também os costumes.

Encerrar-se-á o presente trabalho com as Considerações Finais onde serão

apresentados pontos relevantes que deverão ser identificados no decorrer da

pesquisa, considerando os objetivos traçados, com as impressões pessoais do

autor.

As hipóteses levantadas com relação ao assunto estão diretamente

relacionadas aos questionamentos que suscitam a doutrina e jurisprudência, que, no

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caso, será verificar se os ditames da Lei 12.015/09 vêm de alguma forma mudar o

rumo das decisões tomadas em relação ao crime de estupro, enquanto norteadas

pela Lei Hedionda.

O método de abordagem a ser empregado na pesquisa será o dedutivo. A

análise do conteúdo parte do geral, com a contextualização do tema situado no

âmbito do Direito Penal.

Quanto à técnica, utilizar-se-á a técnica da documentação indireta, através

da pesquisa documental tendo como fontes primárias a Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, o Código Penal, a Lei 8.072/90 e a Lei 12.015/09,

juntamente com a jurisprudência através dos julgados dos Tribunais. A pesquisa

indireta bibliográfica utilizará a doutrina constante dos livros, artigos, bem como todo

o tipo de informação on line, com o objetivo de fundamentar o presente trabalho de

Monografia.

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1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O CRIME DE ESTUPRO

1.1 ASPECTOS GERAIS

O estupro é um ato criminoso que atenta contra a liberdade de escolha

sexual da vítima. Entre os animais, o macho, procura a fêmea quando esta se inclina

ao coito, durante o cio, inebriado por um encantamento, que acontece através de

movimentos, som, odores, exibição de virilidade. Há uma preparação que antecede

a cópula. Assim, também acontece com o ser humano, mesmo grosseiro e rude,

onde o ato sexual se dá após preliminares manifestações de carinho, respeito,

dança e outros recursos.1

Neste contexto, atentar contra a disponibilidade sexual do indivíduo constitui-

se de atitude primitiva e selvagem, como assevera Funari:

Historicamente os povos antigos já reprimiam este odioso comportamento. A lei Mosaica em Deuteronômio 22: 25 a 28 previa e punia tal comportamento com a pena de morte e pecuniária. A primeira hipótese quando o homem, com o uso de força, abusar sexualmente de mulher desposada, ou seja, comprometida para o casamento. A segunda hipótese quando tratar-se de mulher virgem e livre, devia o homem pagar cinquenta ciclos de prata ao pai desta e tomá-la como mulher para toda a vida.2

Entender a evolução histórica do crime de estupro é fundamental para saber

o porquê de a sociedade estar se inclinando para uma evolução deste delito.

Somente através de uma busca profunda em povos remotos é que se vai poder

avaliar o grau de rejeição e repúdio desta violação moral na história humana. O

contexto antropológico nos permitirá analisar de forma racional as dificuldades e o

tamanho da repressão por que passa a vítima.3

Nesta seara, considerando a evolução humana, assim Hungria se pronuncia

1 BOBBIO, Norberto; tradução de Carlos Nelson Coutinho – A era dos direitos. 11º ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 2 FUNARI, Pedro Paulo Abreu. A Vida Cotidiana na Roma Antiga. São Paulo: AnnaBlume, 2003. 3 BOBBIO, Norberto; tradução de Carlos Nelson Coutinho – A era dos direitos. 11º ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

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sobre o crime: “o crime não é somente uma abstrata noção jurídica, mas um fato do

mundo sensível, e o criminoso não é um modelo de fábrica, mas um trecho flagrante

da humanidade.” 4

A liberdade sexual é representada por sua característica maior que é o

consentimento. Quando violada a liberdade sexual, impedindo que a vítima exerça o

poder desse consentimento, afeta o direito sobre o seu corpo, tornando-se assim,

um crime. O crime de estupro se caracteriza quando há utilização de violência ou

grave ameaça, para a prática da conjunção carnal contra a vontade da vítima. 5

É tão degradante o ato criminoso do estupro que no próprio momento de

prestar queixa em uma delegacia, diante do constrangimento, do medo, da falta de

conhecimento maior, da desinformação, a vítima se esquiva e prefere não denunciar

o crime.6

Diante do exposto Bobbio esclarece:

A violência sexual além de deixar marcas físicas horrendas abala de forma psíquica as pessoas, pois na maioria das vezes a vitima é rejeitada pela sociedade e também pelos próprios pais. Quem deveria dar força, não deixa a vitima prestar queixa e ainda a expulsa de casa, como acontece em algumas sociedades muçulmanas, tornando o complexo ainda maior, acarretando uma lesão psicossomática que muitas vezes pode ser irreversível.7

Corroborando com a assertiva Comparato elucida:

O impacto de um estupro pode ser devastador, pois se trata de uma experiência “extremamente desmoralizadora, despersonalizada e degradante”, segundo já mencionou o estudioso Charam (1997). [...]. E as vítimas de estupro têm repetida tendência de virem a apresentar (a curto e longo prazo) transtornos psiquiátricos, especialmente o TEPT, depressão, transtornos fóbico-ansiosos, transtornos relacionados a abuso de substâncias psicoativas, transtornos de personalidade, transtornos dissociativos, transtornos de somatização e transtornos alimentares (grifo do autor).8

4 HUNGRIA, Nelson: Comentários ao Código Penal. Forense: Rio de Janeiro, 1958. 5 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos crimes sexuais. 6. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001. 6 PORTINHO, João Pedro de Carvalho. História, Direito e violência: do estupro e atentado violento ao pudor – Aspectos gerais. história e-história. Ago/2005. Disponível em: < http://www.historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=alunos&ID=10>. Acesso em 18 set. 2010. 7 BOBBIO, Norberto; tradução de Carlos Nelson Coutinho – A era dos direitos. 11º ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 8 COMPARATO, Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva, 2007.

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17

Em resumo, o estupro é na verdade uma forma especial de constrangimento

ilegal, tanto que pelo seu grau de especialização foi trasladado para os crimes

contra os costumes, orientado pela lascívia e assinalado pela desonestidade. 9

1.2 PRINCÍPIO GERAL DO DIREITO

1.2.1 O Princípio da Dignidade Humana

Toda essa gama de preocupação de que se cerca o Estado para dirimir o

problema dos crimes contra a sexualidade, baseia-se na observância do princípio

constitucional mais importante, qual seja a dignidade da pessoa humana, que se

constitui no fundamento de todo o Direito, esteando as operações jurídicas. 10

Assim reza o art. 1º da Constituição da República Federativa do Brasil de

1988, in verbis:

At. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; [...]. 11

Reforçando a importância do princípio da dignidade humana, como pilar em

que se baseiam as relações humanas, ensina Silva Neto:

Sendo a dignidade da pessoa humana o valor fonte de todos os valores constitucionalmente postos, deve ser utilizada como balizamento para eventual declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder Público, ou mesmo para conformar o comportamento de quem quer que esteja, no caso concreto, ofendendo o Princípio Fundamental em questão.12

9 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 2. ed. rev. e atual. ampl. e compl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 470. 10 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 47. 11 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 4. ed. São Paulo: Riddel. 1999. 12 SILVA NETO, Manoel Jorge e. Assédio moral e atuação do Ministério Público do Trabalho. Revista de Informação Legislativa, Brasília: Julho/Setembro, v. 42, n. 167, 2005.

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Assim pondera Nucci sobre o Princípio da Dignidade Humana:

Embora seja nítida a carência de uma definição do que venha a ser tal princípio, especialmente à luz do direito penal, bem como ainda que se possam reconhecer os bons sentimentos propósitos daqueles que assim pensam, não podemos aquiescer que se trate de um princípio penal. A dignidade da pessoa humana, ou seja, o respeito devido pelo Estado ao ser humano, individualmente considerado, não podendo ser sacrificado em nome do interesse coletivo, é uma meta geral, abrangendo toda a face do Estado Brasileiro e, consequentemente, do Estado Democrático de Direito. 13

Tão importante quanto o Princípio da Dignidade Humana, é a compreensão

sobre o direito da personalidade, como explica Diniz:

São direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística e literária) e sua integridade moral (honra, recato, segredo pessoal, profissional e doméstico, imagem, identidade pessoal, familiar e social). 14

Lembra Nucci, que o Princípio da Dignidade Humana é Princípio geral de

direito, próprio do Estado Democrático de Direito, não se trata portanto, de Princípio

Penal exclusivo e específico. 15

1.3 PRINCÍPIOS DE DIREITO PENAL

O princípio se refere ao momento da origem, ou seja, a causa primária,

como regra ou lei enquanto fonte de uma ação. No caso jurídico este conceito

lembra ordenação que disciplina os sistemas de normas, servindo de base para a

interpretação e aplicação do direito positivo. 16

13 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 47. 14 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, vol. I. 15 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 49. 16 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 42.

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1.3.1 Princípios Concernentes à Aplicação da Pena

1.3.1.1 Princípio da Personalidade

Este princípio consubstancia o mandamento constitucional de que a pena

não passará da pessoa do condenado, conforme prescreve o art. 5º, inciso XLV da

CF/88:

Art. 5º [...] XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.17

Em relação a este Princípio aduz Prado: “que se impede a punição por fato

alheio, vale dizer, só o autor da infração penal pode ser apenado.” 18

1.3.1.2 Princípio da Individualização da Pena

Este princípio está previsto no art. 5º, inciso XLVI da CF/88 como se

transcreve:

Art. 5º [...] XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras as seguintes: [...]. 19

Preconiza, desta forma, que as penas devem se ajustar a cada condenado

individualmente sem que ocorra uma padronização. Assim, o justo é fixar a pena de

maneira individualizada, seguindo os parâmetros legais, mas estabelecendo o que é

devido a cada um.20

17 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 4. ed. São Paulo: Riddel. 1999. 18 PRADO, Luiz Régis. Comentários ao código penal. 4. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 29/30. 19 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 4. ed. São Paulo: Riddel. 1999. 20 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 44.

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20

Por força deste princípio o julgador está obrigado a fixar a reprimenda

consoante à cominação legal, espécie e quantidade, e determinar a forma de

execução, ou seja, privação ou restrição da liberdade; perda de bens; multa;

prestação social alternativa ou suspensão ou interdição de direitos. 21

1.3.1.3 Princípio da Humanidade

Decorre do art. 5º, inciso XLVII da Carta Magna que prescreve:

Art. 5º [...] XLVII – não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art.

84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimentos; e) cruéis. 22

Decorre da proibição de penas que atentem contra a incolumidade física e

psíquica do condenado ou mesmo que sejam olvidadas as garantias inerentes ao

apenado e sua consequente segregação. 23

1.3.2 Princípios Concernentes à Aplicação da Lei Penal

1.3.2.1 O Princípio da Legalidade

O Direito Penal tem por base o Princípio da Legalidade que visa limitar ao

Estado seu poder de punir, jus puniendi. Ferramenta central e sempre utilizada por

21 PRADO, Luiz Régis. Comentários ao código penal. 4. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 29/30. 22 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 4. ed. São Paulo: Riddel. 1999. 23 CAPEZ, Fernando. Direito penal: parte geral. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 24

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todos e qualquer operador do direito, entre advogados, juízes, procuradores.

Vislumbra o entender da segurança jurídica ao famoso estado de direito. Razão

esta, por que este princípio ganhou ênfase constitucional e tornou-se o ponto de

destaque para o norte do processo político-jurídico e o desenvolver legislativo e

jurisdicional.24

Dessa forma define Jesus o Princípio da Legalidade:

O Princípio da Legalidade (ou de reserva legal) tem significado político, no sentido de ser uma garantia constitucional dos direitos do homem. Constitui a garantia fundamental da liberdade civil, que não consiste em fazer tudo o que se quer, mas somente aquilo que a lei permite. À lei e somente a ela compete fixar as limitações que destacam a atividade criminosa da atividade legítima. Esta é a condição de segurança e liberdade individual. Não haveria, com efeito, segurança ou liberdade se a lei atingisse, para os punir, condutas lícitas quando praticadas, e se os juízes pudessem punir os fatos ainda não incriminados pelo legislador.25

Por fim, para considerar uma conduta criminosa é imprescindível que haja

uma perfeita adequação do fato com o tipo penal. Tem que estar previsto de modo

tão verossímil, que ao relatar o fato, e adequá-lo à norma, tenha que parecer que

teria previsto quase que perfeito a ação delituosa consumada. A lei deve possuir

definição objetiva e altamente precisa. Para tal conformidade, o tipo penal foi

desmembrado, surgindo assim seus elementos.26

No que tange à exclusiva competência legislativa para definição dos tipos

penais e a legitimidade do Poder Legislativo Prado ensina:

O caráter absoluto da reserva legal impede a delegação por parte do poder legiferante de matéria de sua exclusiva competência, lastreado no princípio da divisão dos poderes. Assim, só ele pode legislar sobre determinado assunto, tal como definir a infração penal e cominar-lhe a respectiva conseqüência jurídica. O motivo que justifica a escolha do Legislativo como o único detentor do poder normativo em sede penal reside em sua legitimidade democrática (representatividade popular – art. 1º, parágrafo único, CF). 27

24 JESUS, Damásio Evangelista. Direito penal-parte geral. 15a ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p.51. 25 JESUS, Damásio Evangelista. Direito penal-parte geral. 15a ed. São Paulo: Saraiva, 1991. P.51. 26 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. 23. Ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 27 PRADO, Luiz Régis. Comentários ao código penal. 4. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 29/30.

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22

Enfim, o Princípio da Legalidade ou Princípio da Reserva Legal determina

que os tipos penais, ou seja, as normas incriminadoras devem resultar de lei em

sentido estrito, produzida pelo Poder Legislativo em âmbito federal diante da

competência constitucionalmente conferida à União. 28

1.3.2.2 Princípio da Anterioridade

De acordo com o art. 1º do Código Penal, a pena deve ser cominada

anteriormente. Não seria eficaz adotar o princípio da legalidade, sem a

correspondente anterioridade, porque criar uma lei, após o cometimento do fato,

seria inútil para a segurança jurídica que a norma deve representar aos seus

destinatários. A certeza da proteção dos direitos dos indivíduos, quanto aos abusos

do Estado, só é assegurada quando a lei penal lança efeito para o futuro, não

atingindo situações consolidadas e sob a égide de norma pretérita.29

1.3.2.3 Princípio da Irretroatividade da Lei Penal

Denominado também de princípio da retroatividade da lei penal benéfica,

aduz que além das regras de legalidade e anterioridade as leis devem ser editadas

para o futuro e, por consequencia lógica, as normas penais em igual passo devem

gerar efeitos para o futuro, e não para o passado, à exceção das normas que

favoreçam o réu. 30

28 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 43. 29 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 43. 30 DELMANTO, Celso et. al. Código penal comentado. 7. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 12.

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23

1.4 O ESTUPRO NO PROCESSO HISTÓRICO

O crime de estupro, segundo (HUNGRIA, 1959 apud TEIXEIRA, CORTEZ E

NETO, 2003) vem sendo repudiado severamente desde a antiguidade, sendo

considerado um grave malefício a ser punido penalmente. 31

A punição para o crime de estupro está relacionada à história dos povos,

considerando os costumes, à formação da sociedade, como também a cultura.

Fundamental ressaltar a história jurídica do delito de estupro, demonstrando que

dentre os atos criminais, há o destaque ao abuso sexual contra a mulher e a criança,

sendo que uma maior atenção ao assunto passou a ser dada com o processo

evolutivo dos conceitos de igualdade e liberdade.

1.4.1 Evolução Jurídica do Crime de Estupro no Mundo

1.4.1.1 Direito Romano

A legislação penal de Roma é de grande valia para que se possa entender o

evoluir deste povo, que tratava sempre qualquer fato degradante social com grande

malevolência e, como fruto do crescimento cultural, o Direito Romano passou a ser a

base para um estudo profundo e de poucas variantes do direito penal, oferecendo

grande contribuição ao mundo nesta questão. 32

Em consonância com esta assertiva, respalda Bittencourt:

O Direito Romano oferece o ciclo jurídico completo, constituindo até hoje a maior fonte originária de inúmeros institutos jurídicos. Roma é tida como a síntese da sociedade antiga, representando um elo entre o mundo antigo e o mundo moderno. 33

31 ELUF, Luiza Nagib. Crimes contra os costumes e assédio sexual: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1999. 32 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral. Vol. I. 7º edição revisada e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 214. 33 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral. Vol. I. 7º edição revisada e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 214.

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Conforme relato histórico, durante a organização jurídica da Roma

Monárquica, dominou o Direito Consuetudinário, com forte dose de rigidez e

formalismo. O estupro de Lucrécia, além de acarretar a revolta dos Senadores, com

a conseqüente derrubada da Monarquia, também levou Lucrécia ao suicídio. 34

O rapto de Lucrécia foi um marco devastador na história de Roma e assim

resume Lins, segundo obra de Plutarco35:

Sexto Tarquínio, filho do rei Tarquínio, assediou Lucrécia. Durante a noite, na cama, mostrou-lhe um punhal e mandou que ela se deixasse possuir. Mas Lucrécia não se intimidou, e ele então ameaçou assassiná-la com desonra, colocando junto a ela o corpo nu de um escravo, para que se pensasse que ela tinha sido morta por seu marido enquanto praticava o adultério. Através desta chantagem, Sexto Tarquínio intentou submeter, pelo terror à desgraça, o pudor obstinado de Lucrecia. Ele espalhava, ainda, que tinha obtido a honra de uma mulher. Lucrécia tão logo se refez confessou o que ocorrera ao marido, suicidando-se em seguida com um golpe de faca no coração. O corpo de Lucrécia foi levado em comoção até o Foro, provocando uma rebelião que depôs a família real e proclamou a República Romana em 509. 36

Há de se ressaltar que a violência carnal era punida com a pena de morte

pela “Lex Julia de vi publica”. Sendo que a palavra estupro vem de “stuprum” se

referindo a qualquer ato sexual indevido, abrangendo também as relações

homossexuais e o adultério. Considerava-se “crimen vis”, reputando-se mais a

violência empregada do que o fim do agente. 37

O Direito Romano contribuiu decisivamente para a evolução do direito penal,

como ensina Zaffaroni:

Nos primórdios de Roma – como nos de qualquer povo primitivo -, o direito penal teve uma origem sacra. Não obstante, a partir da Lei das XII Tábuas (século V a.C.), o direito já se encontra laicizado e estabelece-se a diferença entre delitos públicos e privados. [...]. Os

34 PORTINHO, João Pedro de Carvalho. História, Direito e violência: do estupro e atentado violento ao pudor – Aspectos gerais. história e-história. Ago/2005. Disponível em: < http://www.historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=alunos&ID=10>. Acesso em 18 set. 2010. 35 Segundo a tradição, Plutarco escreveu mais de 200 livros. Chegaram até nós cerca de 50 biografias de gregos (entre elas a "Vida de Licurgo") e romanos ilustres em que ambas são comparadas, conhecidas como as Vidas Paralelas e dezenas de outros escritos sobre os mais variados tópicos, designadas genericamente por Obras Morais ("Moralia"). 36 FUNARI, Pedro Paulo Abreu. A Vida Cotidiana na Roma Antiga. São Paulo: AnnaBlume, 2003. 37 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral. Vol. I. 7º edição revisada e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 214.

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delitos públicos se formavam em torno de dois grandes grupos de delitos: delitos contra o Estado e delitos contra os particulares. 38

O direito penal romano imperial é o triunfo do senado sobre os comícios e do

império sobre a república. Em resumo, trava-se uma batalha que perdura até nossos

dias de nossa história legislativa, que é o direito penal republicano contra o direito

penal imperialista e vice-versa. 39

1.4.1.2 Direito Germânico

Os estudos das sociedades germânicas se concentram em uma sociedade

constituída pela nobreza, homens livres, semilivres e escravos. Todos sob o domínio

pela concepção religiosa de que os deuses construíam o destino da humanidade. 40

Zafaroni esclarece a respeito do direito germânico:

O predomínio germânico se estende desde o século V até o século XI d.C.. O direito germânico evoluiu durante esses séculos, como resultado do reforço de seu caráter estatal. A pena mais grave conhecida pelo direito penal germânico foi a “perda da paz” (Frieldlosigkeit), que consistia em retirar-se a tutela social ao apenado, com o que qualquer pessoa podia matá-lo impunemente. 41

Ferri em seu ensinamento destaca a importância do Direito Germânico:

A característica mais importante do direito germânico, como contribuição secular para a formação da justiça penal na Itália, consiste na progressiva prevalência da autoridade de Estado contra os direitos e os excessos privados da vingança, especialmente junto dos povos que, por um lado, tiveram mais fortemente organizado o poder monárquico e, por outro lado, mais sentiram e sofreram a influência das instituições romanas.42

38 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 164. 39 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 165. 40 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte especial. 1º ao 120- 3º ed. Ver. atual. Ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 125. 41 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 165. 42 FERRI, Enrico. Princípios de Direito Criminal. 4º. ed. São Paulo: Editora e Distribuidora Bookseller, 1999.

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Para o direito germânico, era imprescindível que a mulher ofendida fosse

virgem. Exigia-se o uso da violência para com a ofendida e não consideravam o

crime de estupro consumado, se a violência empregada fosse contra mulher

“deflorada”.43

1.4.1.3 Direito Hebraico

O direito penal hebreu teve como característica mais marcante o Talião, que

neste caso, possuía um sentido puramente metafórico, indicando a

proporcionalidade da pena. Considerava os Dez Mandamentos como fonte de direito

e sobre eles foram elaborados os preceitos jurídico-penais, conhecido como o

Direito Penal Mosaico, por se originar na lei de Moisés. 44

Nesta cultura, as disposições do Antigo Testamento com relevância penal

são muitas e de fundamental importância, pois em torno dos primeiros

mandamentos foram elaborados os delitos contra a religião que compreendiam a

idolatria e a blasfêmia, a feitiçaria, a falsa profecia, a conjunção carnal com mulher

durante o período menstrual. 45

1.4.1.4 Egito e Grécia

A pena aos estupradores no Egito era a mutilação, assim todo o homem que

utilizasse a violência contra a mulher seria castrado. Já na Grécia, primeiro impunha-

se uma pena simples de multa, que com o passar dos anos passou a ser adotada a

pena de morte. A rigor cada cidade, as chamadas polis, possuíam sua própria lei,

mas a base da norma era consuetudinária, ou seja, fundamentada nos usos e

43 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte especial. 1º ao 120- 3º ed. Ver. atual. Ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 125 44 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 160. 45 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 160.

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27

costumes. 46

1.4.1.5 Direito Francês

O Direito Francês distinguia o rapto violento do estupro, significando o

primeiro, a subtração violenta de quaisquer mulheres, com o fim de abusá-las. Já o

estupro, consistia em tomar à força a mulher com o intuito de conjunção carnal. Esta

situação mudou com o Código de 1810, relacionando-se o rapto à subtração de

menor, mas também enquadrado como crime, sendo o estupro um delito distinto. 47

1.4.2 Evolução Jurídica do Crime de Estupro no Brasil

A palavra foral tem origem na palavra fórum, que em Portugal designava os

códigos particulares ou cadernos de leis municipais de uma cidade, vila, ou julgado,

e por serem públicas, eram impreteríveis para os indivíduos da organização ou

colônia. 48

Peças fundamentais da história do direito em Portugal, as Ordenações são

compilações de leis sem carácter sistemático, mas nas quais estão oficialmente

registradas as normas jurídicas fixadas nos diversos reinados, constituindo, de uma

forma geral, o reflexo da luta do Estado pela centralização e pelo estabelecimento

de um ponto de equilíbrio entre as várias forças sociais e políticas.49

46 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos Crimes Sexuais. 6ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001. 47 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos Crimes Sexuais. 6ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001. 48 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 170. 49 PORTUGAL. Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico, Volume I, p. 58. Edição electrónica © 2000-2010 Manuel Amaral. Disponível em: < http://www.arqnet.pt/dicionario/ordenacoesafonsinas.html>. Acesso em: 30 Set. 2010.

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28

1.4.2.1 Ordenações Afonsinas

As ordenações Afonsinas vigoraram no Brasil a partir da sua descoberta e

se caracterizava pela severidade com que punia os delitos. Confundiam-se a figura

do crime com a do pecado, pois eram inspiradas no Direito Canônico. 50

As Ordenações Afonsinas podem ser conceituadas como:

Colecção de legislação mandada compilar por D. João I, continuada no reinado de D. Duarte, e terminada no de D. Afonso V, em 17 de Julho de 1416. Neste trabalho colaboraram os jurisconsultos João Mendes e Rui Fernandes, sendo o trabalho revisto por uma comissão composta deste último e dos doutores Lopo Vasques, Luís Martins e Fernão Rodrigues. Esta compilação ficou a chamar-se Código e ordenações d'el-rei D. Afonso V. Foi publicada em 5 tomos, em Coimbra no ano de 1792, por mandado e diligência de D. Francisco Rafael de Castro, principal da Santa Igreja de Lisboa, e então reitor e reformador da Universidade. A direcção e cuidado da impressão foram cometidos ao lente substituto da faculdade de Leis, Luís Joaquim Correia da Silva, de quem é o prefácio posto no começo do tomo I.51

O delito de estupro era previsto no Livro V das Ordenações Afonsinas, sob o

Título VI, como “Da molher forçada, e como fe deve a provar a força”. Alguns rituais

tinham que ser obedecidos pela mulher caso viesse a se queixar de que algum

homem a tivesse estuprado, tanto para o caso de queixa à justiça, como para o caso

de ter sido estuprada em povoado. Neste último caso, deveria a mulher emitir os

cinco sinais. 52

Na sequência, o rei Dom Pedro editou outra Lei, onde a mulher após sofrer o

ato criminoso, deveria sair pelas ruas gritando “vedes que me fez Foam”, relatando

pelo povoado o nome da pessoa que manteve conjunção carnal com ela pelo uso da

força. Se a mulher não fosse forçada na Vila, salvo em lugar que não pudesse gritar,

quando saísse do lugar, deveria logo chorar e gritar, e ir logo queixar-se à justiça.53

50 PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil:evolução histórica. 2.ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. 51 AMARAL, Manuel. Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico Portugal Volume I, p.. 58. Edição electrónica © 2000-2010 Disponível em: < http://www.arqnet.pt/dicionario/ordenacoesafonsinas.html>. Acesso: 30 Set. 2010. 52 PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil:evolução histórica. 2.ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. 53 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos Crimes Sexuais. 6ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001.

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Com relação ao homem, todo aquele que dormisse forçosamente com

quaisquer mulheres, que vivesse honestamente, seria morto e não poderia ser

absolvido da pena, mesmo que se casasse com a vítima ou, gozasse de algum

privilégio especial, salvo se estivesse nas graças do rei. Punido de igual forma seria

aquele que desse conselho a outrem para cometer o crime de estupro, ou o

ajudasse. 54

1.4.2.2 Ordenações Manuelinas

No Brasil as Ordenações Manuelinas foram promulgadas em 1521 por D.

Manuel, o Venturoso, em substituição às Ordenações Afonsinas, mas foram

elaboradas a partir de 1505, segundo consta do Dicionário Numismático:

Ficaram conhecidas com o nome de “Ordenações Manuelinas” as duas colectâneas de preceitos jurídicos elaboradas, num sistema de cinco livros, a partir de 1505, na corte de D. Manuel I, sob a direcção do Doutor Rui Boto, chanceler-mor do reino. A codificação que vigorou de 1514 a 1521 teve duas edições. [...] Uma nova codificação, promulgada em 1521, que expressamente revogava e proibia os exemplares da anterior, esteve em vigor até 1603 e conheceu oficialmente quatro edições. 55

As Ordenações Manuelinas, embora seguindo uma sistematização quase

idêntica à sua antecessora, apresentam uma técnica legislativa mais perfeita, com

todos os preceitos redigidos em estilo decretório, mesmo quando na reprodução de

normas já vigentes.56

Com relação ao crime de estupro, a pena para o homem, não importando

seu estado, que dormisse com qualquer mulher de modo forçado, mesmo as

escravas, pagava com sua própria vida. Mesmo que o criminoso casasse com a

54 PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil:evolução histórica. 2.ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. 55 AMARAL, Manuel. Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico Portugal Volume I, p.. 58. Edição electrónica © 2000-2010 Disponível em: < http://www.arqnet.pt/dicionario/ordenacoesafonsinas.html>. Acesso: 30 Set. 2010. 56 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos Crimes Sexuais. 6ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001.

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mulher forçada, ainda que por vontade da mesma, não escaparia da morte. 57

A segunda parte do Titulo tipificava “traua della”, que seria literalmente “trava

dela”. Entendia-se como forma de constrangimento, quando algum homem

constrangesse “trauar” alguma mulher, mesmo que com esta não mantivesse

conjunção carnal, tinha como pena 30 dias de cadeia, além da multa imposta para o

Meirinho ou Alcaide, ou seja, qualquer pessoa que o acusasse.58

1.4.2.3 Ordenações Filipinas

No Brasil, historicamente, os crimes sexuais sempre foram combatidos com

vigor, não sendo diferente na vigência do Código Philippino, ou Ordenações Filipinas

que aborda no Livro V – Título VIII, os crimes de violência com o intuito de satisfazer

os prazeres sexuais.59

Assim resume o Quinto Livro, sob a rubrica do Título XVIII, segundo

(ALMEIDA, 1870 apud MARCOCHI, 2002):

(a): Dorme com força; ter cópula por meio de violência ou ameaça com qualquer mulher honesta; (b): Travar de alguém, ou travar alguém pelo braço, agarrar-lhe; (c): É a meretriz, prostituta; (d): O fato da mulher ser escrava não exclui sua honestidade; (e): A pena de morte natural contra o coito ou cópula violenta, e feita por força com alguma mulher foi estabelecida no Direito Romano; esta pena deve ser entendida de morte natural porquanto declara que não se faça execução de morte até que se comunique ao "Rey" a sentença.60

Nas Ordenações Filipinas o crime de estupro previa o estupro voluntário de

mulher virgem que acarretava para o autor a obrigação de se casar com a donzela,

caso fosse impossível o casamento, o estuprador deveria constituir um dote para a

57 PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil:evolução histórica. 2.ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. 58 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos Crimes Sexuais. 6ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001. 59 LARA, Silvia Hunold. Ordenações Filipinas. Livro V, Coleção Retratos do Brasil, Companhia do Brasil, 1999, p. 39 a 41. 60 ALMEIDA, Cândido Mendes de apud MARCOCHI,Marcelo Amaral Colpaert. Código Philipino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal, p. 1168 (redação original).Jus Navegandi. Disponível em:< http://jus.uol.com.br/revista/texto/3404/violencia-real-e-ficta-nos-crimes-contra-os-costumes>. Acesso em: 02 set. 2010.

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vítima, porém, se o autor não tivesse bens, era flagelado e humilhado, entretanto

isto não acontecia se fosse fidalgo ou pessoa de posição social, quando então

recebia somente a pena de degredo.61

Greco, em seu ensinamento, aduz sobre o Código Filipino:

O nosso primeiro Código Penal surgiu no período do Brasil colonial, em 1.603, chamado Código Filipino. Nas Ordenações Filipinas, orientava-se no sentido de generalizada criminalização e de severas punições, predominando a pena de morte, dentre outras, as penas vis (açoite, corte de membro, galés, mutilações, etc.); degredo; multa; e a pena-crime arbitrária, que ficava a critério do julgador, já que inexistia o princípio da legalidade. A preocupação de conter os maus pelo terror vinculava-se ao delito, que era confundido com pecado ou vício. Consagravam-se amplamente nas Ordenações a desigualdade de classes perante o crime, devendo o juiz aplicar a pena segundo a gravidade do caso e a qualidade da pessoa, por isso, em regra, os nobres eram punidos com multa e aos peões eram reservados os castigos mais severos e humilhantes.62

Pode-se afirmar com absoluta certeza que das três Ordenações do Reino,

só as Filipinas foram efetivamente aplicadas no Brasil, principalmente depois da

criação da Relação da Bahia, onde realmente se organizou a administração da

Justiça. 63

1.4.3 O crime de estupro e os Códigos Penais

1.4.3.1 O Código de 1830

A primeira classificação do crime de estupro na legislação brasileira foi no

Código Criminal do Império do Brasil, no ano de 1830, que tratava dos crimes

sexuais no Capítulo II – Dos crimes contra a segurança da honra, Seção I – Estupro,

arts. 219 à 225, in verbis:

61 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos Crimes Sexuais. 6ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001 62 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal,Rio de Janeiro:Impetus Ltda. 8. ed. 1008. p.3. 63 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 6. ed. atual. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 181.

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Art. 219. Deflorar mulher virgem, menor de dezasete annos. Penas - de desterro para fóra da comarca, em que residir a deflorada, por um a tres annos, e de dotar a esta. Seguindo-se o casamento, não terão lugar as penas. Art. 220. Se o que commetter o estupro, tiver em seu poder ou guarda a deflorada. Penas - de desterro para fóra da provincia, em que residir a deflorada, por dous a seis annos, e de dotar esta. Art. 221. Se o estupro fôr commettido por parente da deflorada em gráo, que não admitta dispensa para casamento. Penas - de degredo por dous a seis annos para a provincia mais remota da em que residir a deflorada, e de dotar a esta. Art. 222. Ter copula carnal por meio de violencia, ou ameaças, com qualquer mulher honesta. Penas - de prisão por tres a doze annos, e de dotar a offendida. Se a violentada fôr prostituta. Penas - de prisão por um mez a dous annos. Art. 223. Quando houver simples offensa pessoal para fim libidinoso, causando dôr, ou algum mal corporeo a alguma mulher, sem que se verifique a copula carnal. Penas - de prisão por um a seis mezes, e de multa correspondente á metade do tempo, além das em que incorrer o réo pela offensa. Art. 224. Seduzir mulher honesta, menor dezasete annos, e ter com ella copula carnal. Penas - de desterro para fóra da comarca, em que residir a seduzida, por um a tres annos, e de dotar a esta. Art. 225. Não haverão as penas dos tres artigos antecedentes os réos, que casarem com as offendidas. 64

O Código Criminal do Império fazia uma diferença na quantidade da pena se

a vítima fosse "honesta" ou prostituta, reduzindo a pena que no caso da honesta,

seria de três a doze anos, para um mês a dois anos, no caso da prostituta.65

1.4.3.2 O Código de 1890

O Código Penal dos Estados Unidos do Brasil - Decreto N. 847 de 11 de

Outubro de 1890, trata do crime de estupro em seu TITULO VIII - Dos crimes contra

a segurança da honra e honestidade das famílias e do ultraje público ao pudor,

CAPITULO I - Da violência carnal, arts. 266 à 269, in verbis:

64 BRASIL. Lei de 16 de Dezembro de 1830. Manda executar o Código Criminal. D. Pedro por Graça de Deus, e Unanime Acclamação dos Povos, Imperador Constitucional, e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos os Nossos subditos, que a Assembléa Geral Decretou, e Nós Queremos a Lei seguinte. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm>. Acesso em: 04 out. 2010. 65 GOMES, Luiz Flávio. Presunção de violência nos crimes sexuais. São Paulo: RT. 2001.

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Art. 266. Attentar contra o pudor de pessoa de um, ou de outro sexo, por meio de violencias ou ameaças, com o fim de saciar paixões lascivas ou por depravação moral: Pena - de prisão cellular por um a seis annos. Paragrapho único. Na mesma pena incorrerá aquelle que corromper pessoa de menor idade, praticando com ella ou contra ella actos de libidinagem. Art. 267. Deflorar mulher de menor idade, empregando seducção, engano ou fraude: Pena - de prisão cellular por um a quatro annos. Art. 268. Estuprar mulher virgem ou não, mas honesta: Pena - de prisão cellular por um a seis annos. § 1.° Si a estuprada for mulher publica ou prostituta: Pena - de prisão cellular por seis mezes a dous annos. § 2.° Si o crime for praticado com o concurso de duas ou mais pessoas, a pena será augmentada da Quarta parte. Art. 269. Chame- se estupro o acto pelo qual o homem abusa com violencia de uma mulher, seja virgem ou não. Por violencia entende- se não só o emprego da força physica, como o de meios que privarem a mulher de suas faculdades physicas, e assim da possibilidade de resistir e defender- se, como sejam o hypnotismo, o chloroformio, o ether, e em geral os anesthesicos e narcoticos. 66

No Código de 1890, o delito de estupro era tratado de forma genérica,

englobando crimes como o defloramento e a sedução de mulher. Entendia-se por

violência, o emprego da força física e todos os outros meios que pudessem privar a

mulher de suas faculdades psíquicas, e assim, privá-la da possibilidade de resistir e

defender-se. 67

1.4.3.3 Código Contemporâneo

No Código Penal brasileiro vigente o crime de estupro está inserido no Título

VI - Dos crimes contra a dignidade social - Capítulo I - Dos crimes contra a liberdade

sexual, que se caracteriza na conduta descrita no art. 213 in verbis:

66

BRASIL. Código penal: decreto-lei n. 847 de 11 de Outubro de 1890. Código Penal. . Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm>.Acesso em: 04 out. 2010. 67

PIERANGELLI, José Henrique. Códigos Penais do Brasil – Evolução Histórica. Bauru: Javoli; 1980.

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Art. 213 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. § 1º Se a conduta resulta lesão corporal de maneira grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena – reclusão de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2º Se a conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. 68

Da promulgação do Código Penal de 1940 até os nossos dias, muitas

alterações se processaram com a edição de leis, que têm por finalidade adaptar as

normas do convívio em sociedade às mudanças porque passam o Estado social e

político, adequando valores e imprimindo modernidade e eficiência às novas regras.

E assim também se deu com o crime de estupro, que sofreu alterações importantes

na legislação pátria que merecem destaque nos capítulos seguintes.

68 BRASIL. Código penal: decreto-lei n. 847 de 11 de Outubro de 1890. Código Penal. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm>.Acesso em: 04 out. 2010.

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2 CRIME DE ESTUPRO E A LEI Nº 8.072/90

2.1 ASPECTOS GERAIS

Em qualquer legislação pátria, os valores da época são a base para toda e

qualquer mudança nas normas. Em uma rápida e acentuada analise é fácil constatar

que os nossos legisladores criavam leis de cunho machista, onde a repressão ao

abuso sexual confrontava-se ao instinto sexual do homem. Esta idéia estava

enraizada no anseio social de modo muito superior ao que se verifica atualmente. 69

Noronha bem expressa o cenário da época:

As relações sexuais são pertinentes à vida conjugal, constituindo direito e dever recíproco dos que casaram. O marido tem direito à posse sexual da mulher, ao qual ela não se pode opor. Casando-se, dormindo sob o mesmo teto, aceitando a vida em comum, a mulher não pode se furtar ao congresso sexual, cujo fim mais nobre é o da perpetuação da espécie.70

Para Rolim, ao contextualizar a escrita do Código Penal de 1940, é

necessário considerar o período histórico em que ele foi escrito e os acontecimentos

sociais que marcaram a época. Há de se considerar o processo de urbanização,

modernização e industrialização porque passava este período, exigindo novas

formas jurídicas que viessem a respaldar o Estado nas resoluções de conflito. 71

Há de se reputar as percepções diferentes de estupro, consideradas em

relação às sociedades pré-modernas, e às sociedades modernas. Na primeira, a

mulher e seu acesso sexual eram vistos como patrimônio do homem, já nas

sociedades modernas, as conquistas das mulheres tanto no espaço público, quanto

individual, fizeram por garantir o resguardo de suas garantias individuais. 72

Com relação à epígrafe “Dos crimes contra os costumes”, assevera Capez:

69 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 2. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 721. 70 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. 23. Ed. São Paulo: Saraiva, 2002. P. 70. 71 ROLIM, Rivail Carvalho. Justiça criminal e condição feminina na capital da República em meados do século XX. In: Sociedade e Estado. Volume 22, nº 1, Brasília. 2007. 72 SEGATO, Rita Laura. A estrutura de gênero e a injunção do estupro. In: SUÀREZ, Mireya; BANDEIRA, Lourdes et al (Org). Violência, gênero e crime no Distrito Federal. Brasília:UNB, 1999. p. 387.

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Sob a epígrafe “Dos crimes contra os costumes” tutela o Código Penal a moral social sob o ponto de vista sexual. A lei penal não interfere nas relações sexuais normais dos indivíduos, mas reprime as condutas anormais consideradas graves que afetem a moral média da sociedade. 73

Na verdade, o Código Penal vem por décadas sobrevivendo a várias

Constituições. Contudo, a previsão constitucional dos crimes hediondos na

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, culminou com a lei nº

8.072/9074, trazendo alteração significativa na interpretação dos crimes sexuais,

onde foram incluídos, mais tarde, através da lei nº 8.93075 de 06 de Setembro de

1994, o estupro e o atentado violento ao pudor, como crimes hediondos. 76

2.2 LEI DOS CRIMES HEDIONDOS

A lei nº 8.072/90 dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º,

inciso XLIII, da Constituição Federal, como se transcreve:

Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: [...] V - estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único); VI - atentado violento ao pudor (art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único); [...] (grifo nosso). 77

73 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal – parte especial. 5ª ed. rev. e atual. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 1. 74 BRASIL. Lei n. 8.072 de 25 de Julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8072.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 75BRASIL. Lei n. 8.930, de 06 de Setembro de 1994. Dá nova redação ao art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5o, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8930.htm>. Acesso em: 10 Set. 2010. 76 STRECK. Lênio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica – uma nova crítica do direito. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, cap.3. 77 BRASIL. Lei n. 8.072 de 25 de Julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8072.htm>. Acesso em: 10 set. 2010.

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O Código Penal, com a nova redação da lei nº 8.072/90 com relação aos

crimes de estupro e ao atentando violento ao pudor, dispõe em seu art. 213 e 214, in

verbis:

Art. 213 Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena: reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. Art. 214 Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos (grifo noss). 78

Sobre o delito de estupro como crime hediondo, Mirabete ensina:

A lei nº 8.072 também definiu o estupro como crime hediondo (art. 1º). Posteriormente esta classificação foi confirmada pelo art. 1º, da lei n º 8.930, de 6-9-94, que deu nova redação ao art. 1º da Lei nº 8.072/90. Assim, o autor desse delito não pode ser beneficiado com a anistia, com a graça ou indulto (art. 2º, I), não tem direito à fiança e à liberdade provisória (art. 2º, II), deverá cumprir pena integralmente em regime fechado (art. 2º, § 1º), sua prisão temporária poderá durar 30 dias, prazo prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade (art. 2º, § 3º), e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se poderá apelar em liberdade, podendo ser negado o benefício ainda que seja ele primário e de bons antecedentes. 79

Em relação à hediondez dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor

nas formas típicas simples, há duas orientações, conforme elucida Jesus:

1ª) O estupro e o atentado violento ao pudor, em suas formas típicas simples e na hipótese de violência presumida, não são delitos hediondos, qualificação legal que somente os alcança quando deles resulta lesão corporal de natureza grave ou morte (art.223,caput e par.ún.). Por isso, aos tipos fundamentais e de violência ficta não se aplicam os gravames da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), [...]. Precedentes: STF: HC 78.305-MG [...]; HC 80.223-RJ; [...]. 2ª) O estupro e o atentado violento ao pudor, cometidos com violência real, são delitos hediondos em suas formas típicas simples e qualificadas. Nesse sentido: STJ: REsp 271.107; REsp 271.176; [...]. 80

78 BRASIL. Código penal: decreto-lei nº 847 de 11 de novembro de 1890, com a redação dada pela Lei nº 8.072 de 25 de julho de 1990. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LIM/LIM-25-07-1990.htm>.Acesso em: 04 out. 2010. 79 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 414. 80 JESUS, Damásio E. de. Jurisprudência Temática. In: FILHO, Carlos Henrique de Carvalho. RT/Fasc.Pen., ano 90. v. 789. Jul 2001. p. 506-510.

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No entendimento de Capez, os crimes de estupro e atentado violento ao

pudor na forma simples, constituem crime hediondo. A lei nº 8.072/90 refere-se a

todas as formas, simples e qualificadas destes crimes, tanto que o STF,

reconhecendo sua natureza hedionda, vedava a progressão de regime, sendo esta

decisão reconhecida inconstitucional com base no HC 82.950, por ferir o Princípio da

Individualização da Pena, Princípio da Dignidade Humana e Princípio da Proibição

de Penas Cruéis. 81

Da mesma forma se pronuncia Capez acerca dos crimes de estupro e

atentado violento ao pudor com violência presumida:

Entendemos que também se trata de crime hediondo, pois a lei não faz nem autoriza qualquer distinção entre as formas de violência. Com efeito, submeter uma criança de 9 anos à conjunção carnal, seduzindo-a com doces e brinquedos, não nos parece ser uma conduta menos grave que empregar violência real contra um adulto. [...]. Nesse sentido, vêm se manifestando os Tribunais Superiores. Porém, em face da nova interpretação do STF, que, em controle difuso de constitucionalidade, julgou inconstitucional o art. 2º,§ 1º, da Lei dos Crimes Hediondos, é possível a progressão de regimes, considerando o comportamento de cada condenado e o preenchimento dos demais requisitos necessários à concessão do benefício. 82

Na mesma disposição, há de se reputar os crimes de estupro e atentado

violento ao pudor contra vítima menor de 14 anos, considerando o art. 227, § 4º da

Carta Constitucional de 1988, que enseja punição mais severa aos autores de abuso

e exploração sexual de crianças, in verbis:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente (grifo nosso). 83

81 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 17-19. 82 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 22. 83 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 4. ed. São Paulo: Riddel. 1999.

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Em atendimento à Carta Magna foi promulgada a Lei nº 8.069/90 – Estatuto

da Criança e do Adolescente (ECA), acrescentando parágrafo único nos arts. 213 e

214 do Código Penal, aumentando as penas dos crimes de estupro e atentado

violento ao pudor, quando praticados contra vítima menor de 14 anos, o que seria o

art. 263 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 84

Neste intervalo de tempo, entrou em vigor a Lei dos Crimes Hediondos, ou

seja, a Lei nº 8.072/90, que elevou as penas prescritas no Código Penal para os

crimes acima mencionados, entrando em conflito com a Lei nº 8.069/90. Diante do

impasse, a Lei nº 9.281/96, revoga os parágrafos acrescidos aos arts. 213 e 214 do

Código Penal, em entendimento pacificado pelo STJ (REsp 20.726-SP, DJU 1º-6-92,

p.8060). 85

Para ilustrar, transcreve-se decisão do STJ que prima pela hediondez do

crime, pacificado pela Lei nº 8.072/90:

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO SIMPLES COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. CRIME HEDIONDO NÃO CARACTERIZADO. MATÉRIA NÃO SUBMETIDA À CORTE ESTADUAL NEM AO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INADMISSIBILIDADE. PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL. POSSIBILIDADE, EM TESE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. I - Não se conhece de matéria não submetida à Corte a quo, sob pena de supressão indevida de instância. II - Embora não apreciada, especificamente, a situação do paciente, assenta-se, desde logo, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que "os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor, tanto nas suas formas simples Código Penal, arts. 213 e 214 como nas qualificadas (Código Penal, art. 223, caput e parágrafo único), são crimes hediondos". III - Após o julgamento do HC 82.929/SP pelo Plenário do STF, não mais é vedada a progressão de regime prisional aos condenados pela prática de crimes hediondos. IV - Determinação ao Juízo da Vara das Execuções para que aprecie a possibilidade de concessão da progressão pleiteada, à vista dos requisitos objetivos e subjetivos estabelecidos na LEP. V - Ordem concedida de ofício (HC 93674/SP. Primeira Turma. Ministro Ricardo Lewandowski. DJ 07.10.2008) (grifo nosso). 86

84 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 22. 85 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 22. 86 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2008. HC 93674/SP. Primeira Turma. Ministro Ricardo Lewandowski. Data do Julgamento: 07.10.2008. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp>. Acesso em: 11 out. 2010.

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Decisões em sentido contrário, que consideram crime hediondo, somente os

crimes de estupro e atentado violento ao pudor, que causarem lesão grave ou morte

da vítima, e, que sustentam ainda, que estão fora dessa classificação, os casos de

violência presumida, são recorrentes nos Tribunais. 87

2.3 CONCEITOS INERENTES À LEI Nº 8.072/90

2.3.1 Conceito de Estupro

O estupro caracteriza-se pela prática da conjunção carnal mediante

violência. Originou-se de stuprum, que no direito romano equivalia a qualquer ação

sexual indevida, referindo-se inclusive à pederastia e ao adultério.88

A definição de estupro no Código Penal encontra-se no art. 213, de acordo

com a Lei nº 8.072/90, com redação dada pela Lei nº 8.930 in verbis:

Art. 213. Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena: reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. 89

Pierangeli em seu ensinamento conceitua o crime de estupro:

O estupro é crime invariavelmente considerado por todas as legislações e, como vimos, punido também pelas legislações antigas, laicas ou de cunho religioso. Em todas legislações os seus elementos constitutivos são a violência ou a grave ameaça, isto é, a vis physica e a vis compulsiva (moralis). Variáveis são os seus elementos normativos, também chamados culturais. 90

Fundamentado no poder público e individual e atendendo aos critérios ético-

sociais vigentes, a coletividade dita normas sobre a moral e os bons costumes, para

evitar que estes princípios sejam burlados, vindo a prejudicar os interesses do

87 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de dirieito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 414. 88 COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Direito penal: curso completo. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. 89 BRASIL. Vade Mecum: código penal. 9. Ed. São Paulo: Rideel, 2009. p. 361. 90 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 2. ed. rev. atual. ampl. e compl. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 462.

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indivíduo e da família. 91

Referendando esta assertiva, Gusmão relaciona o estupro como “grave

crime não só como injúria perante os preceitos humanos, como, bem assim, uma

ofensa à religião.” 92

2.3.2 Objetividade Jurídica

Para Mirabete: “protege-se com o dispositivo em estudo a liberdade sexual

da mulher, ou seja, o direito que ela tem de dispor de seu corpo com relação aos

atos genésicos, e não a sua simples integridade física.” 93

Capez acrescenta: “no crime de estupro tutela-se, sobretudo a liberdade

sexual da mulher, ou seja, a liberdade de dispor de seu corpo, de não ser forçada

violentamente a manter conjunção carnal com outrem.” 94

2.3.3 Sujeito Ativo

Somente o homem pode ser sujeito ativo do crime de estupro, como

assevera Jesus:

Somente o homem pode ser sujeito ativo no crime de estupro, porque só ele pode manter com a mulher conjunção carnal, que é o coito normal. [...]. A mulher por sua vez não pode ser sujeito ativo do crime de estupro. Em hipótese de concurso de agentes, porém, pode ser partícipe. 95

Delmanto corroborando com a assertiva, aduz: 91 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de dirieito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 414. 92 GUSMÃO, Chrysolito de. Dos crimes sexuais. 6. ed. Rio de Janeiro: F. Bastos, 2001, p. 80. 93 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de dirieito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 414. 94 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 2. 95 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. v. III. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 95-96.

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Somente o homem como autor material e direto. A mulher, no entanto, pode ser co-autora, através de mandato (autoria intelectual) ou auxílio (p. ex.: ameaça com arma enquanto o homem pratica o coito vaginal); ou ainda partícipe, por meio de instigação (participação moral; p.ex.: emprestando a arma, vigiando o local, deixando aberta a porta para o estuprador entrar, etc). 96

Essa definição de agente criminoso desconsidera o concurso de pessoas na

hipótese de dois agentes ativos de sexos diferentes, conforme previsto no art. 29 do

Código Penal. Segundo este artigo, quem participa do crime sob qualquer hipótese,

se torna figurante influenciador, sendo também responsável. No entanto, não é

qualquer ação que configura o autor concorrente do crime, pois em alguns casos

pode ter este simplesmente participado de modo acessório, de maneira que o

desenvolvimento do crime e suas fases, não necessitariam do seu apoio estrutural

para concretizar-se. Dessa forma, não se pode impor a este, o mesmo julgamento

do autor principal da conduta criminosa.97

Nesta seara, Capez conclui:

Exclui-se, portanto, a prática de atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Assim, se uma mulher, mediante o emprego de violência ou grave ameaça, obrigar outra mulher a praticar com ela algum ato sexual, o crime configurado será o de atentado violento ao pudor, pois não se pode falar em copa vagínica, mas em mera prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal. 98

Contrariando a posição de alguns doutrinadores, Mirabete defende que no

concurso material, como é o caso de várias conjunções carnais praticadas por

agentes diversos, responde cada um como autor do crime, bem como partícipe dos

crimes praticados pelos outros agentes. O que difere da posição de Fragoso (1977

apud Mirabete, 2003), que entende haver, pelo concurso de agentes, apenas um

crime de estupro qualificado. 99

Questionamento levantado por Capez, sobre a situação do marido que

constrange a mulher para a prática de relações sexuais, mediante o emprego de

violência, suscita divergências entre doutrinadores mais antigos, e explica:

96 DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 459. 97 JESUS, Damásio de. A teoria do domínio do fato não tem aplicação aos crimes omissivos. São Paulo: Complexo Jurídico Damásio de Jesus, ago. 2001. 98 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 3. 99 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de dirieito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 415.

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Os doutrinadores mais antigos, como Hungria e E. Magalhães Noronha entendem inexistir o crime de estupro no caso, pois este exige que a cópula seja ilícita (fora do casamento). A cópula decorrente do patrimônio é considerada dever recíproco dos cônjuges, constituindo verdadeiro exercício regular de direito, somente pode a mulher escusar-se se o marido, por exemplo, estiver afetado por moléstia venérea. Tal posicionamento, na atualidade, não mais prospera. A mulher tem direito à inviolabilidade de seu corpo, de forma que jamais poderão ser empregados meios ilícitos, como a violência ou grave ameaça, para constrangê-la à prática de qualquer ato sexual. 100

Neste diapasão, há de se mencionar que o crime de estupro não passa de

um delito de constrangimento ilegal com vistas à conjunção carnal. Embora a

relação sexual voluntária seja inerente ao cônjuge, o constrangimento ilegal

empregado para realizar este ato, à força, constitui-se em abuso de direito, uma vez

que a lei civil não aprova o uso de coação ou outro tipo de violência física ou moral,

nas relações sexuais entre os cônjuges. 101

2.3.4 Sujeito Passivo

Como sujeito passivo deve-se considerar qualquer mulher,

independentemente de suas qualidades, o que nem sempre foi assim. O Código

Penal de 1830, por exemplo, fazia distinção entre o estupro praticado contra “mulher

honesta”, e a violência praticada contra prostituta.102

Mirabete, em alusão ao sujeito passivo esclarece:

Só a mulher pode ser vítima do delito em estudo. A cópula anal e outros atos libidinosos praticados contra homens, com violência ou ameaça, configuram crimes de atentado violento ao pudor.Pode a mulher ser virgem ou deflorada [...], honesta ou prostituta [...], solteira, casada ou viúva, velha ou moça [...]. 103

100 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 4-5. 101 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 4-5. 102 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 876. 103 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de dirieito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 415.

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No entendimento de Greco, há de se considerar o sujeito passivo formal e

material, como esclarece:

O sujeito passivo pode ser considerado formal ou material. Sujeito passivo formal será sempre o Estado, que sofre toda vez que suas leis são desobedecidas. Sujeito passivo material é o titular do bem ou interesse juridicamente tutelado sobre o qual recai a conduta criminosa, que, em alguns casos, poderá ser também o Estado. 104

A doutrina se divide em relação ao fato de o homem ser constrangido a

praticar com a mulher, conjunção carnal, mediante emprego de violência ou grave

ameaça. Uma corrente defende que a mulher deverá responder pelo crime de

constrangimento ilegal, como é o caso de Mirabete (2001:418), uma vez que não

poderá responder pelo crime de estupro e nem de atentado violento ao pudor, pelos

motivos explícitos na lei. 105

Outra corrente abriga a teoria de que deverá a mulher responder por atentado

violento ao pudor, pelo fato de que o simples contato do pênis com a vulva

representa ato libidinoso, como defende Hungria (1981:130). 106

2.3.5 Elemento Subjetivo do Tipo

O elemento subjetivo do crime é o dolo, unificado na vontade de constranger

a mulher à conjunção carnal, com o emprego de violência ou grave ameaça, sem a

exigência de finalidade específica, bastando para o fato tão simplesmente a vontade

de submeter a vítima à prática de relações sexuais completas, com o intuito de

satisfazer sua libido. 107

Sobre a intenção do agente Jesus elucida:

Tal elemento subjetivo irá distinguir a tentativa de estupro do

104 GRECO FILHO, Vicente. Curso de direito penal: parte geral. 3.ed. rev. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2007. v. 1. p. 179. 105 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 5. 106 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 5. 107 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 6.

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atentado violento ao pudor, quando os atos poderão ser os mesmos e somente a intenção do agente fará a distinção entre as duas figuras. O tipo não reclama nenhum fim especial do agente.108

A esse respeito corrobora Campos:

[...] é o dolo vontade livre e consciente de constranger a mulher para fins de com ela manter conjunção carnal. Na corrente clássica do direito penal, é o dolo específico, porque o elemento volitivo está voltado exclusivamente para o ato sexual. Tanto isso é verdade que é pelo elemento subjetivo da conduta que será possível estabelecer a distinção entre a tentativa de estupro e o atentado violento ao pudor consumado, quando este é praticado por um homem contra uma mulher. 109

Nesta seara, Nucci se posiciona:

Elemento subjetivo do tipo é o dolo. Não existe a forma culposa. Há também a presença do elemento subjetivo do tipo específico, consistente na finalidade de obter a conjunção carnal, satisfazendo a lascívia. Aliás, tal objetivo é que diferencia o estupro do constrangimento ilegal. 110

O dolo genérico consubstancia-se na vontade de imprimir violência física ou

moral na realização do ato, e além deste, o crime exige também o dolo específico

representado pela finalidade de manter conjunção carnal ou em executar outros atos

libidinosos. 111

2.3.6 Elemento Objetivo do Tipo

A conduta típica do crime de estupro é o verbo constranger no sentido de

coagir, forçar, obrigar, violentar, em alusão de que para o crime existir deve haver a

resistência inequívoca da vitima, com explícito desejo de evitar o ato. Neste caso, a

108 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 17 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 3. p. 96. 109 CAMPOS, Pedro Franco et. al. Direito penal aplicado:parte especial. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 207. 110 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 875. 111 COSTA JÚNIOR. Paulo José da. Curso de direito penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 674.

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negativa tímida, bem como o silêncio, descaracteriza o crime de estupro. 112

Com esta assertiva, corrobora Jesus:

A conduta consiste em constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça. Constranger significa obrigar, forçar. Para que exista o constrangimento é necessário que haja o dissenso da vítima. É preciso que a falta de consentimento da ofendida seja sincera e positiva, que a resistência seja inequívoca, demonstrando a vontade de evitar o ato desejado pelo agente, ou será quebrada pelo emprego da violência física ou moral. [...]. Para a caracterização do crime exige-se a prática de conjunção carnal. 113

Com este entendimento da doutrina, Nucci acrescenta:

[...] o grau de resistência do ofendido deve ser avaliado sob critérios sensatos, sem a exigência de atitude heróica. Por outro lado, sustentamos deva durar o dissenso da vítima durante todo o ato sexual. Não é viável admitir a dissensão apenas no início, havendo concordância no final. Do mesmo modo, defendemos a possibilidade de cessação do consenso a qualquer momento, sem que exista a viabilidade legal para o agente prosseguir, valendo-se de força física ou qualquer outro método violento. 114

Mirabete leciona em relação à gravidade da ameaça:

Em se tratando de ameaça, deve ela ser grave (promessa da prática de mal considerável), mas não importa a justiça ou não do mal ameaçado. Tem-se em conta, sempre, a capacidade de resistência da vítima. Decidiu-se que, se a menor ofendida, criada em zona rural, não teve condições morais e psíquicas de se opor aos desejos criminosos do pai, pessoa, ademais violenta e arbitrária, que ameaçava voltar a maltratar toda a família caso aquela não cedesse, configurado resultou o estupro, pela violência moral. Também se entendeu configurado o ilícito por se considerar que a resistência da vítima foi inibida pela submissão à vontade paterna decorrente do temor reverencial (JCAT 69/500-501). 115

Em relação às peculiares condições da vítima, como é o caso de vítimas

menores de 14 anos, débeis mentais ou mulheres que não podem oferecer

resistência, considera-se que a conjunção carnal foi praticada com o emprego de

112 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 3. ed. São Paulo: Renovar, 1991. 113 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 17 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 3. p. 96. 114 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.21. 115 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de dirieito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 416.

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violência, mesmo havendo o seu consentimento para a prática do ato sexual. 116

2.4 PROVA DO CRIME DE ESTUPRO

Nem sempre existe vestígios do crime de estupro, mas em caso de haver

vestígios, necessário se faz o exame de corpo de delito, direto ou indireto, que não

poderá ser suprido, mesmo mediante confissão do acusado. 117

Não obstante há uma tendência da jurisprudência dos tribunais, em permitir

outros elementos de prova, como orientam os julgados do STF transcritos:

O exame de corpo de delito direto pode ser suprido, quando desaparecidos os vestígios sensíveis da infração penal, por outros elementos de caráter probatórios existentes nos autos, notadamente os de natureza testemunhal ou documental. (HC 23.898-MG, Rel. Min. Félix Fischer). Penal. Processual. Estupro e atentado violento ao pudor. Ausência de exame de corpo de delito. “Habeas Corpus”. A falta do exame de corpo de delito por si só, não serve para anular o processo, quando a condenação tem amparo em outros elementos de prova, especialmente a testemunhal. (5ª Turma, HC 10.162, Rel. Min. Edson Vidigal. J. 2-9-1999, DJ 27-9-1999. p. 106). 118

Neste ínterim se pronuncia Nucci:

O exame de corpo de delito é prescindível. Pode-se demonstrar a ocorrência do estupro, por outras provas, inclusive pela palavra da vítima, quando convincente e segura. Neste sentido: STJ: “A configuração do crime de estupro prescinde da realização do exame do corpo de delito, sendo suficiente a manifestação inequívoca e segura da vítima, quando em consonância com os demais elementos probatórios delineadores no bojo da ação penal” (HC 8.720-RJ, 6ª T.; rel. Vicente Leal, 16.11.1999, v. u.; DJ 29.11.1999, p. 126).119

Outros elementos de prova admitidos pela jurisprudência envolvem: a)

116 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 2. 117 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 8. 118 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 9. 119 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.880.

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prova da conjunção carnal; b) prova da violência empregada; c) prova da violência

moral; d) prova da tentativa do crime de estupro na hipótese em que não houve

contato corporal; e) prova de autoria; f) palavra da vítima. 120

2.5 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

Sob o título de consumação, não se exige a introdução completa do pênis na

vagina, bastando que seja incompleta, como também não se exige a ejaculação,

como também não há a necessidade da satisfação do desejo sexual do agente. 121

Referendando esta assertiva se posiciona Pierangeli:

O crime de estupro consuma-se com a introdução completa ou incompleta do pênis na vagina (imissio penis in vaginam), sendo dispensável o orgasmo ou a ejaculação, isto é, a imissio seminis. Se virgem a vítima dispensável é o defloramento. 122

Sobre a tentativa de estupro, alguns autores se posicionam como sendo esta

um crime consumado de atentado violento ao pudor. Mas pode haver tentativa de

estupro sem que se caracterize o ato libidinoso, como é o caso de quando o agente

é surpreendido em local ermo determinando que a vítima levante suas vestes, sem

que venha a tocá-la. 123

No posicionamento de Mirabete, o convite ou proposta à prática de

conjunção carnal ou mesmo de ato libidinoso, não se constitui em começo de crime

contra a liberdade sexual, podendo ser enquadrada na contravenção de

importunação ofensiva ao pudor. 124

120 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 8-10. 121 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.877. 122 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte especial. 2. ed. rev. e atual. ampl. e compl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 470. 123 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte especial. 2. ed. rev. e atual. ampl. e compl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 470. 124 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte especial. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 418.

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49

2.6 CONCURSO MATERIAL COM O ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR

De acordo com o direito pátrio, pode haver concurso material entre os crimes

de estupro e atentando violento ao pudor, como leciona Damásio:

O crime de estupro pode ser praticado em concurso com o atentado violento ao pudor, desde que os atos libidinosos praticados não sejam daqueles que precedem ao coito normal. Assim, o coito anal, praticado com a mesma vítima, antes ou depois da cópula normal, se constitui em crime autônomo, em concurso com o estupro, não podendo ser absorvido por este. 125

Os crimes dos arts. 213 e 214 são de espécies diferentes, de forma que

pode haver concurso material entre as infrações, como, por exemplo, se o agente

mantiver conjunção carnal, e, em seguida, coito anal com a vítima. Há, neste caso, a

configuração de concurso material entre dois crimes hediondos. 126

Há precedente do STF acolhendo a possibilidade de continuidade delitiva,

quando não houver configuração de atentado violento ao pudor, e tão somente ato

libidinoso para a preparação à cópula vagínica, como seria o caso de um beijo, por

exemplo. 127

Extrai-se da jurisprudência, decisão do STF ilustrando a assertiva:

STF, 1ª Turma, HC 74.630-MG, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJU, 7-3-1997; STJ, REsp 17.857-SP, 5ª Turma, Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJU, 17-8-1992, p. 12507. No mesmo sentido: "Embora do mesmo gênero, os crimes de estupro e atentado violento ao pudor não são da mesma espécie, o que afasta a continuidade e corporifica o concurso material. ‘Habeas Corpus’ conhecido; pedido indeferido" (STJ, 5ª Turma, HC 10.162, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 2-9-1999, DJ, 27-9-1999, p. 106). 128

Haverá concurso formal, quando o agente, sendo portador de moléstia

125 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 17 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 3. p. 98 126 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.880. 127 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.880. 128 BRASIL. HC 10.162. STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 2-9-1999, DJ, 27-9-1999, p. 106. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/processo/pesquisarProcesso.asp>. Acesso em: 04 out. 2010.

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venérea e ou de moléstia grave, praticar o crime de estupro. Se deste crime resultar

lesão corporal, de natureza grave ou morte, a conduta fica restrita a qualificação

prevista no art. 213 do Código Penal. Havendo a vontade expressa do agente de

lesionar a vítima ou matá-la, agindo com dolo direto ou eventual, haverá concurso

material de delitos. 129

2.7 CONCURSO DE AGENTES

Para haver conjunto de agentes por ocasião da prática do crime de estupro.

Não é exigível que todos estejam no mesmo ambiente, constrangendo ao mesmo

tempo, a vítima. Basta que se apresentem no mesmo cenário, dando apoio, um à

prática delituosa do outro. 130

Neste sentido ilustra-se com decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo –

TJSP, como se transcreve:

Cabe reconhecer a necessidade voluntária e consciente a envolver dois ou mais agentes para a prática de estupro, mesmo se na culminância do ato momentaneamente venham de se isolar em locais contíguos, tanto em proveito da concupiscência como ante a circunstância de subjugarem cada qual vítima diversa visto manterem o domínio funcional dos fatos e emprestarem recíproca colaboração ao êxito do resultado a que afluíam suas vontades. 131

Sobre a questão de crime continuado, quando em concurso de agentes,

Delmanto esclarece:

Se houve estupros sucessivos praticados por vários agentes contra uma só vítima, há continuidade pela autoria direta e co-autoria em relação aos atos do parceiro (TJSP, RJTJSP 104/427). Idem, no caso de pai que mantém relação com a filha menor, em atos sucessivos, durante certo tempo (STJ, REsp 840, DJU 3.9.90, p. 8851). 132

129 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte especial. 2. ed. rev. e atual. ampl. e compl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 470. 130 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.876-77. 131 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. (TJSP). Ap. 169.148-0, São Paulo, 3º C. Rel. Gonçalves Nogueira, 31.10.1994, RT 713/341 132 DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 590.

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Concurso de agentes implica em crime próprio que não impede o concurso

de pessoas, e nem que seja partícipe uma mulher. Neste caso, está integrando o

crime à pessoa que, por exemplo, ajuda a imobilizar a vítima enquanto a outra

pratica o ato. 133

2.8 EXCLUSÃO DO DELITO

O consentimento da mulher exclui a tipicidade, uma vez que não há prática

de agressão sexual quando a outra pessoa a consente. Há de ser o consentimento

manifestado, diverso da coação. 134

2.9 FORMAS DO DELITO

A forma simples está prevista no art. 213, do Código Penal, e a qualificada

pelo resultado, também prevista no art. 223, in verbis:

Art. 223. Se da lesão resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de oito a 12 anos. Parágrafo único. Se do fato resulta morte: Pena: reclusão, de doze a vinte e cinco anos. 135

Com relação ao estupro com violência presumida, está previsto no art. 224

do Código Penal, in verbis:

Art. 224. Presume-se a violência, se a vítima: a) não é maior de catorze anos; b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta

circunstância;

133 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte especial. 2. ed. rev. e atual. ampl. e compl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 470. 134 PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte especial. 2. ed. rev. e atual. ampl. e compl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 470. 135 BRASIL. Código penal: decreto-lei nº 847 de 11 de novembro de 1890, com a redação dada pela Lei nº 8.072 de 25 de julho de 1990. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LIM/LIM-25-07-1990.htm>.Acesso em: 04 out. 2010.

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c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência. 136

Existem três hipóteses para que a lei dispense a violência real e considere-a

presumida, quais sejam:

a) se a vítima não é maior de catorze anos: pode neste caso ceder à

presunção se a ofendida já for corrompida, ou aparentava idade superior por suas

características, e outros;

b) se a vítima é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta

circunstância: a presunção de violência é relativa, pois a lei exige que o agente

tenha conhecimento do estado anormal da vítima;

c) se a vítima não pode oferecer resistência: no caso presunção ampla, pois,

qualquer outra causa, pode significar grave enfermidade, embriaguez, narcotização,

entre outros. 137

Expostos os fundamentos com relação ao crime de estupro na Lei dos

Crimes Hediondos, passar-se-á a analisar este tema segundo a Lei 12.015/09, que

originou uma nova redação ao Título VI da parte especial do Código Penal, em

especial no que se refere ao delito de estupro, assunto este, que motiva o presente

trabalho de pesquisa.

136

BRASIL. Código penal: decreto-lei nº 847 de 11 de novembro de 1890, com a redação dada pela Lei nº 8.072 de 25 de julho de 1990. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LIM/LIM-25-07-1990.htm>.Acesso em: 04 out. 2010. 137

DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 590.

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53

3 O CRIME DE ESTUPRO NA REDAÇÃO DA LEI 12.015/09

3.1 ASPECTOS GERAIS

Anteriormente à reforma dada ao Título VI da parte especial do Código

Penal, Nucci tecia o seguinte comentário:

O Código Penal está a merecer, nesse contexto, reforma urgente, compreendendo-se a realidade do mundo moderno, sem que isso represente atentado à moralidade ou à ética, mesmo porque tais conceitos são mutáveis e acompanham a evolução social. Na atualidade, é difícil negar que há liberação saudável da sexualidade e não pode o legislador ficar cego ao mundo real. 138

A moderna sociedade, com novos valores sociais e constitucionais exigem

que se dê tratamento isonômico entre homens e mulheres, especialmente no que diz

respeito à lei, o que revela que os dispositivos legais vêem inspirados em fatos

valorados. 139

As mudanças ocorridas no diploma legal em face da entrada em vigor da Lei

nº 12.015140 de 07 de agosto de 2009, trouxeram mudanças consideráveis ao Título

VI da parte especial do Código Penal, começando pela nomenclatura, que agora

passa a se intitular “Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual”, em substituição ao

termo “Dos Crimes Contra os Costumes”, o que parece mais adequado, pois indica

real bem jurídico protegido. 141

A mudança que converge ao Princípio da Dignidade Humana, explícito no 138 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 9. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.874. 139 REALE, Miguel. Teoria tridimensional do direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 140 BRASIL. Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009. Que altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm> Acesso em: 20 out. 2010. 141 PEZZOTTI, Olavo Evangelista. Lei nº 12.015/09. Reforma legislativa dos crimes sexuais previstos no Título VI do Código Penal brasileiro. Aspectos relevantes. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n. 2240, 19 ago.2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13356. Acesso em 18 out.2010.

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art. 1º, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

significa que houve uma mudança de enfoque no que concerne à objetividade

jurídica, na exata medida em que a lei contempla crimes atentatórios contra a

dignidade sexual, em detrimento dos costumes sexuais. 142

3.2 BEM JURÍDICO TUTELADO

Em relação ao bem jurídico tutelado, Delgado argumenta: “o bem jurídico

tutelado é a liberdade sexual das pessoas. Não se pode admitir que alguém seja

compelido contra a sua vontade de ter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso ou

permitir que com ele se pratique.” 143

Diante da assertiva, Nucci leciona:

Há muito vínhamos sustentando à inadequação da anterior nomenclatura (“dos crimes contra os costumes”), lastreada em antiquados modelos de observação comportamental da sexualidade na sociedade em geral. Afinal, os costumes representavam a visão vetusta dos hábitos medianos e até puritanos da moral vigente, sob o ângulo da generalidade das pessoas. Inexistia qualquer critério para o estabelecimento de parâmetros comuns e dominadores abrangentes para nortear o foco dos costumes na sociedade brasileira. Aliás, em pior situação se encontrava o travamento da questão sob o enfoque evolutivo, pois os tais costumes não apresentavam mecanismos propícios para acompanhar o desenvolvimento dos padrões comportamentais da juventude e nem mesmo para encontrar apoio e harmonia no também evoluído conceito, em matéria sexual, dos adultos na sexualidade. A disciplina sexual e o mínimo ético exigido por muito à época da edição do Código Penal, nos idos de 1940, não mais se compatibilizam com a liberdade de ser, agir e pensar, garantida pela Constituição Federal de 1988. O legislador brasileiro deve preocupar-se (e ocupar-se) com as condutas efetivamente desastrosas para a sociedade, no campo da liberdade sexual, deixando de lado as filigranas penais, obviamente inócuas, ligadas a tempos pretéritos e esquecidos (grifo do autor). 144

142 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. ps.121-125. 143 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010. 144 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. ps. 11-12.

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O estupro passou a designar a prática de qualquer ato libidinoso, conjunção

carnal ou não, ampliando a sua tutela legal para englobar não só a liberdade sexual

da mulher, mas também a liberdade sexual do homem. 145

Pimentel, anteriormente à edição da nova norma, já questionava a

nomenclatura “Crimes Contra os Costumes”, como se transcreve:

Mais lógico, do ponto de vista de política legislativa e criminal, seria que o crime de estupro fosse considerado dentre os “Crimes contra a pessoa” e não dentre os “Crimes contra os Costumes”. E que não abrangesse apenas a conjunção carnal, mas sim o ato sexual – penetração vaginal, oral e anal do pênis e/ou de outros instrumentos – praticado com violência ou grave ameaça contra qualquer pessoa: mulher, homem, menino ou menina. E, em outra figura, atentado violento ao pudor, com diferentes penas, mais brandas, fossem incluídos os chamados “atos libidinosos diversos da conjunção carnal”, no caso, seriam “os diversos dos atos sexuais que aqui atribuímos ao crime de estupro”. 146

Na verdade, a nova redação do crime de estupro dada pela Lei nº 12.015/09

tem o objetivo de resguardar a inviolabilidade da liberdade e intimidade sexual, ou

seja, a objetividade jurídica da recente norma é resguardar a liberdade sexual do ser

humano, seja homem ou mulher. 147

3.3 NOVO CONCEITO DO CRIME DE ESTUPRO

O conceito de crime de estupro na legislação do Código Penal passou a ser

dado pela redação da Lei nº 12.015/09, in verbis:

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena – reclusão, de seis a dez anos. § 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena – reclusão, de oito a doze anos.

145 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 24. 146 PIMENTEL, Sílvia; SCHRITZMYER, Ana Lúcia P.; PANDJIARJIAN,Valéria. Estupro Crime ou “cortesia”? Abordagem sóciojurídica de gênero. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 1998. p. 24. 147 DELMANTO. Celso. Código penal comentado. 8. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 692.

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§ 2º Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos (grifo nosso). 148

Com essa disposição do texto legislativo, Capez contribui:

Com a nova epígrafe do delito em estudo, entretanto, passou-se a tipificar a ação de constranger qualquer pessoa (homem ou mulher) a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ela se pratique outro ato libidinoso. Deste modo, ações que antes configuravam crime de atentado violento ao pudor (CP, art. 214), atualmente revogado pela Lei n. 12.015/2009, agora integram o delito de estupro, sem importar em abolitio criminis. 149

Para Nucci, esta nova redação denota modernidade e adequação à

realidade atual, quando unifica os crimes de estupro e atentado violento ao pudor

em uma única ordem penal, significa, que sob o título de estupro, está toda a forma

de violência sexual que tenha por fim a satisfação da volúpia. 150

3.4 SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO

O homem ou a mulher podem ser sujeito ativo e passivo do delito de

estupro. Dessa forma, o homem pode ser vítima do crime de estupro, ou porque foi

constrangido à conjunção carnal com uma mulher, ou porque foi forçado a praticar

atos libidinosos com uma mulher ou homem. Há caso em que a mulher também

pode ser sujeito ativo em concurso com o homem, quando, por exemplo, a mulher

aponta a arma para que o homem seja obrigado a praticar ato libidinoso com outro

homem. 151

148 BRASIL. Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009. Que altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm> Acesso em: 20 out. 2010. 149 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 25. 150 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. ps. 11-12. 151 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010.

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Com a modificação do art. 213 do Código Penal, em vista da lei nº

12.015/09, qualquer pessoa pode ser vítima de crime, independente de sua

condição de “casada, viúva ou solteira, honesta ou devassa, freira, meretriz ou

garota de programa”, pois a unificação dos crimes de estupro com atentado violento

ao pudor suprime qualquer referência à honestidade ou recato sexual da vítima,

persistindo, porém, dificuldade de prova com relação aos profissionais do sexo. 152

Diante das mudanças, ficou superada a questão do marido como sujeito

ativo de estupro, quando em conjunção carnal com sua companheira. Justificava-se

o ato, no dever conjugal de relações sexuais entre os cônjuges, o que não mais

procede. 153

Em síntese, o estupro do homem é uma nova realidade jurídica, adequada

ao Princípio Constitucional da Isonomia, quando prevê que homens e mulheres são

iguais em direitos e obrigações.154

3.5 TIPICIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA

O elemento objetivo do crime de estupro consiste no verbo constranger,

como explica Delmanto:

Na primeira figura, o constrangimento visa à conjunção carnal (coito vagínico), sendo indiferente que a penetração seja completa ou que haja ejaculação. Na segunda figura, o constrangimento visa praticar, ou obrigar a vítima a permitir que com ela se pratique “outro ato libidinoso” (diverso da conjunção carnal), correspondendo-se aqui, o sexo anal, o sexo oral, a masturbação, etc. (grifo nosso). 155

A conjunção carnal está diretamente relacionada à cópula vagínica. Os

questionamentos, porém, se dão em relação ao ato libidinoso, cujo conceito é

abrangente, quando se refere aos atos destinados ao prazer sexual. Neste sentido,

152 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. ps. 18. 153 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 127. 154 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010. 155 DELMANTO. Celso. Código penal comentado. 8. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 692.

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há jurisprudência em relação ao fato de um beijo lascivo, configurar ato libidinoso. 156

Prado, já afirmava com relação a questão:

Assim, se é correta a classificação do beijo lascivo ou com fim erótico como ato libidinoso, não é menos correto afirmar que a aplicação ao agente da pena mínima de seis anos, nesses casos, ofende substancialmente o princípio da proporcionalidade das penas. 157

O elemento subjetivo do tipo é o dolo, não existindo a forma culposa. Mas

há, no entender de Nucci, o tipo subjetivo específico, como esclarece.

Embora exista a possibilidade de o estupro dar-se como forma de vingança – ou mesmo para humilhar e constranger moralmente a vítima – tal situação em nosso entender não elimina o elemento subjetivo específico de satisfação da lascívia, até porque, nestas situações, encontra-se a satisfação mórbida do prazer sexual, incorporada pelo desejo de vingança ou outros sentimentos correlatos. Estímulos sexuais pervertidos podem levar alguém se valer dessa forma de crime para ferir a vítima, inexistindo incompatibilidade entre tal desiderato e a finalidade lasciva do delito do art. 213. Acrescente-se, ainda, que somente os sexualmente pervertidos utilizam esse meio para a vingança. 158

Neste diapasão, Capez entende que o dolo específico está inserido no

próprio conceito de ato libidinoso, como elucida:

Entendemos que o tipo penal não requer finalidade específica, contudo é necessária a satisfação da lascívia. Não se trata de finalidade especial, percebida pelo agente, já que esta não é exigida pelo tipo, mas de realização de uma tendência interna transcendente, vinculada à vontade de realização do verbo do tipo. 159

O elemento subjetivo do tipo prescinde de um fim especial para satisfazer a

própria libido e para isso basta a intenção de praticar o ato libidinoso. É na verdade,

a finalidade especial do agente em aplicar o verbo, no caso, constranger. 160

156 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010. 157 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro. Vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 645. 158 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. P. 904. 159 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 33. 160 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 134.

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3.6 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

No caso da segunda parte do art. 213 do Código Penal, a consumação

ocorrerá com a prática de ato libidinoso, ou quando a vítima, em constrangimento,

permitir que com ela se pratique outro ato libidinoso que não seja a conjunção

carnal, podendo este, ser os mais diversos possíveis. 161

E, sobre a matéria Nucci argumenta:

Na forma de conjunção carnal, não se exige a introdução completa do pênis na vagina, bastando que ela seja incompleta. Não se exige, ainda, a ejaculação, nem tampouco a satisfação do desejo sexual do agente (grifo do autor). 162

Anteriormente à lei nº 12.015/09, se o ato não se consumasse por

circunstâncias alheias, mas, se tivesse ocorrido algum ato libidinoso, considerava-se

tentativa de estupro, por não ter havido conjunção carnal. Após a lei nº 12.015/09,

com a unificação do tipo, ou seja, crime de estupro com atentado violento ao pudor

torna-se irrelevante a ausência de conjunção carnal, uma vez que os atos frustrados

por si só, já caracterizam o tipo. 163

3.7 MUDANÇAS EFETIVAS DA LEI Nº 12.015/09 EM RELAÇÃO AO CRIME DE

ESTUPRO

Dentre os objetivos principais da nova lei 12.015/09, encontram-se:

a) a necessidade de se combater de forma mais veemente a exploração

sexual das crianças e dos adolescentes;

b) a modernização do texto legal do Código Penal, especificamente no que 161 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010. 162 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. P. 904. 163 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010.

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se refere a termos e expressões desprovidas de sentido; e,

c) o redimensionamento dos bens jurídicos protegidos nos delitos sexuais,

não havendo mais sentido em se proteger padrões rígidos de sexualidade, em face

do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, verdadeiro princípio-vetor dos

direitos fundamentais no Estado Democrático de Direito. 164

3.7.1 Modificação do Título

O Título mencionava os costumes, a lei preferiu trocar “Crimes Contra os

Costumes”, por “Crimes Contra a Dignidade Sexual”, uma vez que o conceito de

dignidade engloba os valores emanados dos costumes, cujo elemento normativo é a

adequação social. 165

Essa primeira inovação faz com que o Estado reprima, não as opções ou os

comportamentos sexuais das pessoas, mas sim todo tipo de ação violenta, seja

física ou moral, contra a liberdade sexual das pessoas, ou o emprego de fraude, ou

ainda outras formas de exploração sexual. 166

3.7.2 Unificação do Crime de Estupro e Atentado Violento ao Pudor

Com a unificação do crime de estupro com o crime de atentado violento ao

pudor, este perdeu sua autonomia tipológica, passando a existir uma figura penal

unificada com a definição dada ao art. 213 do Código Penal pela Lei nº 12.015/09, in

verbis:

164 RESUMOS JURÍDICOS. Crimes contra a dignidade sexual: mudanças na Lei nº 12.015/09. Disponível em:< http://permissavenia.wordpress.com/2010/03/08/crimes-contra-a-diginidade-sexual-mudancas-lei-12-01509/>. Acesso em: 10.0ut. 2010. 165 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Breves comentários à Lei nº 12.015/2009. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2335, 22 nov. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13362>. Acesso em: 16 out. 2010. 166 RESUMOS JURÍDICOS. Crimes contra a dignidade sexual: mudanças na Lei nº 12.015/09. Disponível em:< http://permissavenia.wordpress.com/2010/03/08/crimes-contra-a-diginidade-sexual-mudancas-lei-12-01509/>. Acesso em: 10.0ut. 2010.

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Art. 213 Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena: reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. 167

O legislador, com esta junção, promoveu uma incriminação unificada das

condutas praticadas com violência ou grave ameaça contra a liberdade sexual. O

artigo passa a compreender os coitos por via vaginal, ou seja, conjunção carnal, anal

e oral que compreendem outros atos libidinosos, praticados contra a vontade da

vítima que podem ser resumidos em atos de violação da integridade sexual de

outrem. 168

A junção dos dois delitos não promoveu abolitio criminis, com relação à

infração de atentado violento ao pudor, pois as ações que antes configuravam crime

de atentado violento ao pudor, então revogado pela Lei nº 12.015/09, integram o

delito de estupro. 169

De acordo com Nucci, não houve uma revogação do art. 214 do Código

Penal como forma de abolitio criminis (extinção do delito), mas houve uma novatio

legis, provocando-se a integração de dois crimes em uma única figura delitiva, o que

é possível, dada a similaridade. 170

Há duas correntes que se posicionam com relação ao fato de a conjunção

carnal e o ato libidinoso, constituírem apenas um delito. Para Nucci, por exemplo, a

nova figura do crime de estupro tem a forma mista alternativa, como esclarece:

É constituída de verbos em associação: a) constranger alguém a ter conjunção carnal; b) constranger alguém a praticar outro ato libidinoso; c) constranger alguém a permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. São três possibilidades de realização do estupro, de forma alternativa, ou seja, o agente pode realizar uma das

167 BRASIL. Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009. Que altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm> Acesso em: 20 out. 2010. 168 LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Novo tipo penal de estupro: formas típicas qualificadas e concurso de crimes. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n. 2258, 6 set. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13462. Acesso em 20 out. 2010. 169 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 25. 170 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. P. 902.

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condutas ou as três, desde que contra a mesma vítima, no mesmo local e horário, constituindo um só delito. [...]. Visualizar dois ou mais crimes, em concurso material, extraídos das condutas alternativas do crime de estupro, cometido contra a mesma vítima, na mesma hora, em idêntico cenário, significa afrontar o princípio da legalidade (a lei define o crime) e o princípio da proporcionalidade, vez que permite dobrar, triplicar, quadruplicar etc. tantas vezes quantos atos libidinosos forem detectados na execução de um único crime (grifo do autor). 171

Aduz ainda, com relação à matéria, que foi adotada nesta redação do art.

213 da lei nº 12.015/09, a fórmula do tipo misto alternativo, que em nome da

legalidade e em respeito à proporcionalidade e às garantias constitucionais

fundamentais, deve ser respeitada. 172

Damásio por sua vez questiona: E se o sujeito, no mesmo contexto, pratica

estupro e atentado violento ao pudor: há concurso de crimes ou delito único? E

elucida:

Entender, na pergunta proposta que existem dois crimes, é concluir que o sujeito cometeu um delito de natureza sexual especificado e outro não especificado. Especificado, a conjunção carnal; não especificado, o outro ato libidinoso diverso da cópula. Não era assim antes da lei nova, pois, embora o verbo fosse o mesmo constranger, configurava núcleo de dois tipos penais incriminadores (arts. 213 e 214). Em suma, na questão em debate, entendemos que existe apenas um crime de estupro [...] (grifo do autor). 173

Neste ínterim, há quem defenda o concurso de crimes, ao considerar que a

nova figura do estupro se enquadra em um tipo misto cumulativo, como é o caso de

Greco Filho, citado por Delmanto:

Não houve abolitio criminis,ou a instituição de crime único quando as condutas são diversas,de forma que nada mudou para beneficiar o condenado cuja situação de fato levou à condenação pelo art. 213 e art. 214 cumulativamente; agora, seria condenado também cumulativamente à primeira parte do art. 213 e à segunda parte do mesmo artigo. 174

171 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. p. 901-902. 172 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. p.904. 173 JESUS, Damásio Evangelista de. Breves notas sobre a lei 12.015, de 10 de agosto de 2009 – I. BLOGDamásio.Disponível em < http://blog.damasio.com.br/?p=1118#more-1118>. Acesso em: 20 out. 2010. 174 DELMANTO. Celso. Código penal comentado. 8. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 693.

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No caso em exame, não ocorreu abolitio criminis, porquanto que a conduta

de constranger pessoa à prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal,

não foi abolida do Direito Penal. Esta conduta, continua sendo punida com a

denominação de estupro de vulnerável, conforme a condição da vítima. Para que

ocorra o abolitio criminis há de haver uma ab-rogação completa do preceito penal,

fazendo com que a norma proibitiva contida implicitamente no tipo penal deixe de

existir. 175

O entendimento de que o autor do delito deve responder por crime único,

mesmo quando praticar conjunção carnal e ato libidinoso, encontra respaldo em

decisões dos Tribunais de Justiça, conforme se ilustra, com a decisão do Tribunal de

Justiça de Santa Catarina – TJSC:

Apelação criminal - Crime contra a dignidade sexual - Estupro contra sobrinha (CP, art. 213 c/c art. 226, II) - Materialidade e autoria comprovadas - Ausência do exame atestando a presença de esperma - Crime consumado - Desistência voluntária ou arrependimento eficaz não configurados - Atentado violento ao pudor (CP art. 214) - Superveniência da lei n. 12.015/2009 - Migração da conduta típica ("outro ato libidinoso") para a previsão legal do delito de estupro (CP, art. 213) - Fenômeno da "continuidade normativo-típica" - Proibição da conduta subsistida – Nova redação que configura tipo penal misto alternativo - Inviabilidade de condenação em concurso de crimes - Retroatividade da lei penal benéfica - novatio legis in mellius (CF, art. 5º, inc. XL e CP, art. 2º, par. un.) - Abolitio criminis peculiar - reconhecimento, ex officio, da extinção da punibilidade quanto ao crime de atentado violento ao pudor (CP, art. 107, III; e, CPP, art. 61) (...) assim, a Lei n. 12.015/2009, ao conferir nova redação ao artigo 213 do Código Penal, instituiu a tipicidade mista alternativa, cuja aplicação repele a possibilidade de concurso de crimes entre o estupro e o atentado violento ao pudor em suas redações pretéritas, de ordem a inviabilizar a dupla punição, razão pela qual, como reflexo, deve ser decretada, ex officio, a extinção da punibilidade do agente condenado pelo delito de atentado violento ao pudor, haja vista a peculiar hipótese de abolitio criminis (CP, art. 107, III; e, CPP, art. 61). 176

175 GÊNOVA, Jairo José. Novo crime de estupro. Breves anotações. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n.2240, 19 ago. 2009. Disponível em<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13357>. Acesso em 20 out. 2010. 176 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). Apelação Criminal 2008.080994-5 Des. Salete Silva Somariva. Disponível em<

http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/7/docs/coletanea_de_julgados_sobre_a_lei_12.015-09.pdf>. Acesso em 15 out. 2010.

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Cem este entendimento, e reconhecendo a tese de crime continuado entre

as condutas de estupro e atentado violento ao pudor, realizadas contra uma mesma

vítima, na mesma circunstância, posiciona-se o STJ:

HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR E TENTATIVA DE ESTUPRO. INFRAÇÕES COMETIDAS, ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 12.015/09, EM SEMELHANTES CONDIÇÕES DE TEMPO, LUGAR E MANEIRA DE EXECUÇÃO, GUARDANDO IDENTIDADE. ATOS POSTERIORES HAVIDOS COMO CONTINUIDADE DO PRIMEIRO. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DO CRIME CONTINUADO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. 1. Segundo o art. 71 do Código Penal, quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. 2. Após as inovações trazidas pela Lei nº 12.015/09, os arts. 213 e 214 do Código Penal hoje estão condensados no mesmo dispositivo legal, constituindo, dessarte, crimes da mesma espécie, o que viabiliza a aplicação da regra do art. 71 da Lei Penal. 3. No caso presente, o intervalo entre os acontecimentos é de aproximadamente um mês. As condições de lugar (residência do acusado) e maneira de execução (aproveitava-se do fato de a vítima estar dormindo em casa) são absolutamente semelhantes, o que conduz ao reconhecimento do crime continuado. 4. Tomando por base o número de infrações cometidas – 2 (duas) – deve incidir a majoração no patamar de 1/6 (um sexto). 5. A pretensão absolutória esbarra na necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório, providência de todo incompatível com a via eleita. 6. Ordem parcialmente concedida para, reconhecendo o crime continuado entre as infrações cometidas pelo ora paciente, reduzir a pena sobre ele recaída, de 10 (dez) anos de reclusão para 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão. 177

Para o caso de gravidez resultante de ato libidinoso diverso da conjunção

carnal, Vieira Segundo esclarece:

Cumpre consignar que agora no caso de gravidez resultante de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, para aplicação da causa

177 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 86110, da 2ª Turma. Relator: Cezar Peluso. Brasília, DF. 02 de março de 2010. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.aspbase=baseAcordaos>. Acesso em: 18 out. 2010.

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especial de exclusão do delito de aborto do art. 128, inciso II, do Código Penal, não há que se falar mais em analogia, pois, o delito de atentado violento ao pudor foi deslocado para integrar o crime de estupro (art. 213), logo, se a gravidez resulta de ato libidinoso diversos da conjunção carnal, ela resulta de estupro, assim, não há mais que se recorrer a analogia para a incidência da referida causa especial da exclusão do delito. 178

Porquanto, como é a opinião da maioria dos doutrinadores, em vista da

fusão dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor, não há que se falar em

concurso material quando o agente praticar conjunção carnal seguido de outro ato

libidinoso. 179

3.7.3 Sujeito Ativo e Sujeito Passivo

Com o advento da nova lei, o abuso sexual copular contra o homem adquire

tipificação de estupro. Sendo assim, qualquer pessoa, ou seja, alguém, e não

apenas a mulher, é sujeito passivo do crime de estupro, conforme tipificado no art.

213 do Código Penal. 180

3.7.4 Estupro de Vulnerável

O estupro mediante violência presumida passou a ser “estupro de

vulnerável”, quando perpetrado contra vítima que não possa oferecer resistência,

conforme art. 217-A do Código Penal, in verbis:

Art. 217-A Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

178 VIEIRA SEGUNDO, Luiz Carlos Furquim. Crimes contra a vida. São Paulo: Memória Jurídica Editora, 2009. 179 VIEIRA SEGUNDO, Luiz Carlos Furquim. Crimes contra a vida. São Paulo: Memória Jurídica Editora, 2009. 180 CHAGAS, José Ricardo. A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeito ativo e passivo. Revista Jus Vigilantibus. 03 set. 2009. Disponível em http://jusvi.com/artigo/41692. Acesso em: 19 out. 2010.

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Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. § 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. § 2º Vetado. § 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. § 4º Se da conduta resulta morte: Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. 181

A tutela penal dos vulneráveis tem o objetivo de defender a intangibilidade

sexual de determinado grupo de pessoas, consideradas em sua condição de

fragilidade, pondo-as a salvo do ingresso precoce ou abusivo na vida sexual. 182

Mesmo criando-se o tipo penal autônomo de estupro de vulnerável, ainda

suscita-se a questão da presunção de inocência na prática de ato libidinoso no caso

das vítimas menores de 14 anos, como pondera Nucci:

O legislador brasileiro encontra-se travado na idade de 14 anos, no cenário dos atos sexuais, há décadas. É incapaz de acompanhar a evolução dos comportamentos da sociedade. Enquanto o Estatuto da Criança e do Adolescente proclama ser adolescente o maior de 12 anos, a proteção penal ao menor de 14 anos continua rígida. Cremos já devesse ser tempo de unificar esse entendimento e estender ao maior de 12 anos a capacidade de consentimento em relação aos atos sexuais. 183

A presunção de violência do estupro deveria ser presumida, como entende

Delgado:

Ora, as meninas de 13 anos de hoje, não podem ser equiparadas àquelas da década de 1930 que inspirou o legislador do Código Penal de 1940. [...] Não há como equiparar uma jovem de 12 ou 13 anos com uma alienada mental, esta é totalmente incapaz de entender o sexo e as suas conseqüências, aquela via de regra, já tem uma noção exata sobre este tema, que hoje faz parte do currículo escolar, das notícias dos meios de comunicação e da

181 BRASIL. Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009. Que altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm> Acesso em: 20 out. 2010. 182 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte especial. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 159. 183 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Comentários à lei nº. 12.015, de 07 de agosto de 2009. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2009. p.37-38.

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própria orientação dos pais. 184

A nova redação aparentemente encerra discussões, que foram iniciadas

com um julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, onde o Ministro Marco Aurélio

adotou o entendimento de que a presunção de violência do art. 225-A, do Código

Penal, quanto às vítimas menores de 14 anos, era relativa, e que, portanto, permitia

prova em contrário. O enunciado conciso do art. 217-A traz implícita a irrelevância

do consentimento do ofendido quanto à prática da libidinagem: crime haverá mesmo

com tal consentimento. 185

3.7.5 Ação Penal

O art. 225 do Código Penal foi completamente reformulado, abolindo-se a

ação penal privada. A ação penal é em regra, pública condicionada à representação

do ofendido ou do seu representante legal. De outra forma, será de ação pública

incondicionada se a vítima é menor de 18 anos ou é pessoa vulnerável, no caso, a

considerada doente mental ou que não pode oferecer resistência. 186

O art. 225 do Código Penal assim dispõe a matéria:

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada á representação. Parágrafo Único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. 187

184 DELGADO, Yordan Moreira. Revista da Associação Paulista do Ministério Público. Jan. 1997. p.29-30. 185 GENTIL, Plínio Antônio Brito; JORGE, Ana Paula. O novo estatuto legal dos crimes sexuais. Do estupro do homem ao “fim das virgens”... Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n. 2243, 22 ago. 2009. Disponível em <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13357>. Acesso em 20 out. 2010. 186 GÊNOVA, Jairo José. Novo crime de estupro. Breves anotações. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n.2240, 19 ago. 2009. Disponível em<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13357>. Acesso em 20 out. 2010. 187 BRASIL. Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009. Que altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm> Acesso em: 20 out. 2010.

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A ação penal privada era prevista para os crimes definidos nos Capítulos I e

II, justificadas pelas consequências danosas à vítima. A exceção à regra se dava na

ação penal pública condicionada, na hipótese de pobreza da vítima. A ação penal

pública incondicionada ocorria quando o crime fosse cometido pelo abuso do poder

familiar, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador. 188

3.7.6 A Hediondez da Lei

A lei nº 12.015/09, ao dar nova redação ao artigo 1º, V, da lei nº 8.072/90 –

Lei dos Crimes Hediondos – tornou clara a hediondez do estupro simples, vindo a

cessar a divergência existente com relação às formas hediondas de estupro. 189

Anteriormente à lei, entendimentos jurisprudenciais como o do STF – HC

93674/SP entenderam que todas as formas de estupro são hediondas. Em

contrapartida, outros julgados sustentaram que apenas as formas qualificadas pela

lesão grave ou morte são hediondas, como é o caso do julgado do STJ – HC

9937/RJ. 190

3.7.7 Derrogação do Artigo 9º da Lei nº 8.072/90

O problema surge a partir do momento em que a lei n.º 12.015/09 em seu

artigo 7º, dispõe estar o art. 224 do Código Penal, revogado. Abriu-se então, a

recente discussão a respeito da perda ou não da eficácia do artigo 9º da lei n.º

8.072/90, havendo quem sustente que a situação prevista no artigo 224 do Código

188 COSTA JÚNIOR. Paulo José da. Curso de direito penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 695-696. 189 GÊNOVA, Jairo José. Novo crime de estupro. Breves anotações. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n.2240, 19 ago. 2009. Disponível em<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13357>. Acesso em 20 out. 2010. 190 GÊNOVA, Jairo José. Novo crime de estupro. Breves anotações. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n.2240, 19 ago. 2009. Disponível em<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13357>. Acesso em 20 out. 2010.

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Penal, foi substituída pelo artigo 217-A, do mesmo diploma. 191

Assim reza o art. 9º da lei nº 8.072/90, in verbis:

Art. 9º. As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º, 158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de trinta anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal.192

Com a revogação do artigo 224 do Código Penal, perdeu eficácia o artigo 9º

da lei nº 8072/90, Lei de Crimes Hediondos, e que previa o aumento de pena de

metade para alguns delitos, dentre eles aqueles previstos nos artigos 213 e 214 e

sua combinação com o art. 223, parágrafo único, todos do Código Penal, quando a

vítima estivesse justamente em qualquer das hipóteses referidas no agora revogado

artigo 224 Código Penal. Para os menores de 14 anos de idade, o caput do novo

artigo 217-A, criado pela lei nº 12.015/09 substituiu a alínea “a” do revogado artigo

224 no que se refere à idade da vítima, enquanto que o §1º do noviço artigo

substituiu as alíneas “b” e “c” do antigo art. 224. Isso no que tange aos crimes contra

a liberdade sexual. 193

A revogação deste dispositivo da lei nº 8.072/90, fez com que as hipóteses

ali elencadas passassem a ser elementares do estupro de vulnerável. Isto quer

dizer, que não poderão mais caracterizar, ao mesmo tempo, as causas de aumento

de pena desse mesmo delito, sob pena de incorrer no indevido “bis in idem”. 194

Portanto, constata-se que houve a revogação parcial do artigo 9º da lei dos

191 SACHES, Ana Carolina Guedes; et. al. A lei nº 12.015 de 7 de agosto de 2009 e seus efeitos sobre o art. 9º da lei de crimes hediondos. Faculdades Integradas Vianna. Ano II. Edição I, maio de 2010. Disponível em:< http://www.viannajr.edu.br/site/jornal/edicoes/3/artigos/A-LEI-N-12015-DE-7-DE-AGOSTO-DE-2009-E-SEUS-EFEITOS-SOBRE-O-ART-9-DA-LEI-DE-CRIMES-HEDIONDOS.pdf>. Acesso em: 04 set. 2010. 192 BRASIL. Lei n. 8.072, de 25 de Julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8072.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 193

SACHES, Ana Carolina Guedes; et. al. A lei nº 12.015 de 7 de agosto de 2009 e seus efeitos sobre o art. 9º da lei de crimes hediondos. Faculdades Integradas Vianna. Ano II. Edição I, maio de 2010. Disponível em:< http://www.viannajr.edu.br/site/jornal/edicoes/3/artigos/A-LEI-N-12015-DE-7-DE-AGOSTO-DE-2009-E-SEUS-EFEITOS-SOBRE-O-ART-9-DA-LEI-DE-CRIMES-HEDIONDOS.pdf>. Acesso em: 04 set. 2010. 194 GÊNOVA, Jairo José. Novo crime de estupro. Breves anotações. Jus Navegandi, Teresina, ano 13, n.2240, 19 ago. 2009. Disponível em<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13357>. Acesso em 20 out. 2010.

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Crimes Hediondos, que continua sendo aplicado apenas às outras hipóteses nele

previstas, ou seja, aos crimes patrimoniais nele elencados. 195

A revogação do artigo 224 do Código Penal, não alterou a situação dos réus

que já foram processados e, ou condenados pelos crimes de estupro e atentado

violento ao pudor mediante o emprego de violência presumida, pois as hipóteses

elencadas no aludido dispositivo passaram a constituir elementos do estupro de

vulnerável, art.217-A com pena mais severa. Não tendo a conduta sido extirpada do

ordenamento jurídico, mas, ao contrário, tendo sido tratada com mais rigor, não

pode retroagir para beneficiar seus autores.196

Em síntese, são estas as principais abordagens com relação ao tema em

questão, cuja importância está na preocupação que os legisladores vêm mostrando,

em adequar as normas do direito pátrio, em consonância com as mudanças nos

hábitos e costumes da sociedade, imprimindo à legislação características de

modernidade.

195 DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010. 196

DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13629>. Acesso em: 25 out. 2010.

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CONCLUSÃO

Com o objetivo de responder aos questionamentos que incitaram a

realização deste trabalho de pesquisa, buscou-se situar o tema a partir de um breve

relato histórico sobre o crime de estupro da antiguidade aos nossos dias, na

intenção primeira de mostrar a evolução deste conceito, através da história.

Dessa forma, os tratamentos para o crime de estupro considerados em

relação às civilizações que analisamos, tiveram relação com a época, os costumes,

e a cultura dos povos. Os princípios constitucionais abordados se fizeram

necessários para entender-se o fundamento que originou a norma.

Na sequência dos fatos, abordou-se a lei nº 8.072/90 e seus elementos, que

passou a abrigar, após nova redação dada pela lei nº 8.930/94, os crimes de estupro

e atentado violento ao pudor como crimes hediondos.

Muito se comentou e muito se especificou sobre os elementos e as

peculiaridades da lei hedionda, cuja edição veio atender aos clamores populares, no

que concerne a penas mais rígidas a crimes que atentam contra a dignidade

humana.

Ao legislador compete realizar diversas reformas na legislação pátria para

adequar a lei às necessidades da sociedade moderna, para que venham a

resguardar os valores vigentes. Desse modo, o legislador buscando cumprir a

obrigação supracitada, publicou em 07 de agosto de 2009 a lei nº 12.015 que alterou

os crimes previstos no Titulo VI, Dos Crimes Contra os Costumes, do Código Penal.

A nova expressão, que passou a designar o Título VI como Dos Crimes

contra a Liberdade Sexual, é mais adequado ao texto constitucional e a nova

realidade social, uma vez que a dignidade sexual integra a dignidade humana. A lei,

além de alterar artigos do mencionado título da parte especial do Código Penal,

igualmente modificou de forma pontual a lei dos crimes hediondos com reflexo no

Estatuto da Criança e do Adolescente.

Esta inovação, como todas inerentes ao ordenamento jurídico, trouxe

divergências doutrinárias e jurisprudenciais, passando o estupro a uma conduta

múltipla, com seu conteúdo variado, englobando a conduta do antigo atentado

violento ao pudor, o que ocasionou mudanças na aplicação das penas.

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De modo geral a lei é boa, o que acontece são pontos falhos, suscetíveis de

melhor observação do legislador, como é o caso, por exemplo, da representação, já

considerada como uma regra que beneficia o acusado, pois retroage em favor do

réu, uma vez que processos em tramitação necessitam se adequar aos ditames da

lei para que tenham prosseguimento.

Outra questão consiste na revogação parcial do art. 9º da lei nº 8.072/90,

que acrescia a pena para quem praticasse o crime contra menor de 14 anos, agora

revogado pela lei nº 12.015/09, no entendimento de alguns, ou substituído pelo art.

217-A, no entendimento de outros.

Houve aprimoramento da legislação nas alterações elencadas pela Lei nº

12.015/09? Pelo que foi exposto, conclui-se que houve evolução em alguns

aspectos com nuances de modernidade, quando retrata a igualdade de todos,

atendendo aos anseios da sociedade. Em outros pontos, trouxe certo retrocesso, o

que se analisa com certa compreensão, uma vez que a intenção certamente é a de

adequar as normas, para um melhor convívio em sociedade e com este

entendimento, anseia-se por reformas que venham a esclarecer os pontos

divergentes, comuns em uma sociedade mutável.

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