CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS - UEL...possíveis decorrentes da contação de histórias para a...
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ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
ORIENTADORA PROFordf DRordf ELSA MARIA MENDES PESSOA PULLIN
2011
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
2011
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Orientadora Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
Londrina PR 2011
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Comissatildeo examinadora
______________________________________
Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Profordf Drordf Francismara Neves de Oliveira
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Prof Dr Rovilson Joseacute da Silva
Diretor das Bibliotecas do Municiacutepio de Londrina
Secretaria Municipal de Cultura ndash Londrina ndash PR
Londrina _____ de ______________ de 2011
A Deus
Pela certeza de que eras Tu quem me conduzia
quando eu jaacute natildeo tinha mais por onde caminhar
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira
Aos meus pais
A quem honro pelos esforccedilos
Agrave Elsa Pullin
Pela sabedoria e dedicaccedilatildeo
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus
Pela sauacutede feacute e perseveranccedila que tem me dado
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira na hora da tribulaccedilatildeo a qual com paciecircncia
compreendeu minhas faltas e ausecircncias
Aos meus pais
A quem honro pela forccedila pelo exemplo de vida e
pelos anos de dedicaccedilatildeo agrave educaccedilatildeo
Aos meus amigos
Pelo incentivo agrave busca de novos conhecimentos
e pela forccedila em relaccedilatildeo a esta jornada
Agrave Profordf Drordf Elsa Maria M Pullin
Esta que com sua sabedoria e dedicaccedilatildeo orientou-me
sendo sensiacutevel agraves diversas situaccedilotildees e percalccedilos
Aos professores e alunos
Que participaram desta pesquisa e que concederam
informaccedilotildees valiosas para a realizaccedilatildeo deste trabalho
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
23
produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
24
dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
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alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
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de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
27
Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
29
Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
30
Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
33
projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
34
(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
35
envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
36
que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
37
Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
43
Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
44
Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
45
leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
46
alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
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que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
48
sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
49
muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
72
Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
73
Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
76
nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
77
pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
80
de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
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Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
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32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
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As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
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Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
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119
SMOLKA A L B A atividade da leitura e o desenvolvimento das crianccedilas In ______ SILVA E T da BORDINI M da G ZILBERMAN R Leitura e desenvolvimento da linguagem Porto Alegre Mercado Aberto 1989 p 23-41 TEDESCO JC Los desafiacuteos de la educacioacuten baacutesica en el siglo XXI Revista Ibe-roamericana de Educacioacuten Madrid n 55 p 31-47 2011 TEIXEIRA E Competecircncias transversais para o oficio de aluno metodologia acadecircmica em questatildeo ou quando estudar ler e escrever faz a diferenccedila Trilhas Beleacutem v1 n2 p56-65 2000 TORRES S M TETTAMANZY A L L Contaccedilatildeo de histoacuteria resgate da memoacuteria e estimulo agrave imaginaccedilatildeo Revista eletrocircnica de criacutetica e de teorias da literatura Sessatildeo aberta Porto Alegre v 4 n 1 p 1-8 2008 TURCHI M Z O esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil In CECCANTINI JL (Org) Leitura e literatura infantil memoacuteria de Gramado Satildeo Paulo Cultura Acadecircmica Assis SP ANEP 2004 p 38-44 VILELA R A T O lugar da abordagem qualitativa na pesquisa educacional retrospectiva e tendecircncias atuais Perspectiva Florianoacutepolis v 21 n 2 p 431-466 2003 VYGOTSKY L S A preacute-histoacuteria da escrita In ______ A formaccedilatildeo social da mente Satildeo Paulo Martins Fontes 1984 p 119-134 __________ Pensamento e palavra In ______ A construccedilatildeo do pensamento e da linguagem Satildeo Paulo Martins Fontes 2001 p 395- 486 VIEIRA M C T Leitura significativa prazer dever ou relevacircncia social no ensino superior CONGRESSO DE LEITURA DO BRASIL 16 2007 Campinas Anais Campinas SP ALB Disponiacutevel em lthttpwwwalbcombranais16sem12pdfsm12ss06_07pdfgt Acesso em 17 de julho de 2009 WITTER G P Influecircncias socioculturais na leitura anaacutelise do ASIRR (19891994) Transinformaccedilatildeo Campinas v 8 n 3 p 66-80 1996
120
YUNES E PONDEacute M G Leitura e leituras da literatura infantil Satildeo Paulo FTD 1988 ZILBERMAN R A Literatura infantil na escola 6 ed Satildeo Paulo Global 1987 __________ Formaccedilatildeo do leitor na histoacuteria da leitura In PEREIRA V W (Org) Aprendizado da leitura ciecircncias e literatura no fio da histoacuteria Porto Alegre EDIPUCRS 2002 p 15-29 ZUMTHOR P A letra e a voz a literatura medieval Satildeo Paulo Companhia das Letras 1993 ___________ A presenccedila da voz In_________ Escritura e nomadismo Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial 2005 p 61-102 ___________ Introduccedilatildeo a poesia oral Satildeo Paulo Hucitec 1997
121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
2011
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Orientadora Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
Londrina PR 2011
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Comissatildeo examinadora
______________________________________
Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Profordf Drordf Francismara Neves de Oliveira
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Prof Dr Rovilson Joseacute da Silva
Diretor das Bibliotecas do Municiacutepio de Londrina
Secretaria Municipal de Cultura ndash Londrina ndash PR
Londrina _____ de ______________ de 2011
A Deus
Pela certeza de que eras Tu quem me conduzia
quando eu jaacute natildeo tinha mais por onde caminhar
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira
Aos meus pais
A quem honro pelos esforccedilos
Agrave Elsa Pullin
Pela sabedoria e dedicaccedilatildeo
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus
Pela sauacutede feacute e perseveranccedila que tem me dado
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira na hora da tribulaccedilatildeo a qual com paciecircncia
compreendeu minhas faltas e ausecircncias
Aos meus pais
A quem honro pela forccedila pelo exemplo de vida e
pelos anos de dedicaccedilatildeo agrave educaccedilatildeo
Aos meus amigos
Pelo incentivo agrave busca de novos conhecimentos
e pela forccedila em relaccedilatildeo a esta jornada
Agrave Profordf Drordf Elsa Maria M Pullin
Esta que com sua sabedoria e dedicaccedilatildeo orientou-me
sendo sensiacutevel agraves diversas situaccedilotildees e percalccedilos
Aos professores e alunos
Que participaram desta pesquisa e que concederam
informaccedilotildees valiosas para a realizaccedilatildeo deste trabalho
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
23
produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
24
dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
25
alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
26
de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
27
Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
29
Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
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Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
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projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
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(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
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envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
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que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
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Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
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Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
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Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
45
leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
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alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
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que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
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sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
49
muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
72
Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
73
Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
76
nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
77
pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
80
de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
82
Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
84
32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
85
As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
86
Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
REFEcircRENCIAS
ABRAMOVICH F Literatura infantil gostosuras e bobice 5 ed Satildeo Paulo Scipione 2004 ABREU M Quem natildeo lecirc e natildeo escreve da vida pouco desfruta poreacutem In_________ Estado de Leitura Campinas Mercado de LetrasAssociaccedilatildeo de Leitura do Brasil 1999 (Coleccedilatildeo Leituras no Brasil) ALLEBRANDT LI FEIL IS FRANTZLM O valor da literatura na sala de aula e na vida In ________ O tecer da linguagem no cotidiano escolar reflexotildees sobre o ensino e a aprendizagem da linguagem nas seacuteries iniciais do ensino fundamental 2 ed Ijuiacute Rio Grande do Sul UNIJUIacute 1999 p 83-102 ALVES R A menina e o paacutessaro encantado 17 ed Satildeo Paulo Loyola 1999 __________ Escutatoacuteria A casa de Rubem Alves Disponiacutevel em lthttpwwwrubemalvescombrescutatoriohtmgt Acesso em 26 de abril de 2009 ALVES-MAZZOTTI A J O planejamento da pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo Cadernos de Pesquisa Satildeo Paulo n 77 p53-61 maio 1991 ANDRADE C D A palavra maacutegica Disponiacutevel em lthttpwwwportalsaofranciscocombralfacarlos-drumonda-palavra-magicaphpgt Acesso em 15 de abril de 2011 BAJARD E Ler e dizer compreensatildeo e comunicaccedilatildeo do texto escrito 2 reeimp Satildeo Paulo Cortez 1994 BARRETOS S L M et al Literatura infanto-juvenil novos tempos Revista Akroacutepolis Umuarama v 12 ndeg 3 julset 2004 Disponiacutevel em lt httprevistasuniparbrakropolisarticleviewFile416381gt Acesso em 8 de marccedilo de 2011 BARROS M H T C SILVA R J BORTOLIN S Leitura mediaccedilatildeo e mediador Satildeo Paulo FA 2006
110
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121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Orientadora Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
Londrina PR 2011
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Comissatildeo examinadora
______________________________________
Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Profordf Drordf Francismara Neves de Oliveira
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Prof Dr Rovilson Joseacute da Silva
Diretor das Bibliotecas do Municiacutepio de Londrina
Secretaria Municipal de Cultura ndash Londrina ndash PR
Londrina _____ de ______________ de 2011
A Deus
Pela certeza de que eras Tu quem me conduzia
quando eu jaacute natildeo tinha mais por onde caminhar
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira
Aos meus pais
A quem honro pelos esforccedilos
Agrave Elsa Pullin
Pela sabedoria e dedicaccedilatildeo
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus
Pela sauacutede feacute e perseveranccedila que tem me dado
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira na hora da tribulaccedilatildeo a qual com paciecircncia
compreendeu minhas faltas e ausecircncias
Aos meus pais
A quem honro pela forccedila pelo exemplo de vida e
pelos anos de dedicaccedilatildeo agrave educaccedilatildeo
Aos meus amigos
Pelo incentivo agrave busca de novos conhecimentos
e pela forccedila em relaccedilatildeo a esta jornada
Agrave Profordf Drordf Elsa Maria M Pullin
Esta que com sua sabedoria e dedicaccedilatildeo orientou-me
sendo sensiacutevel agraves diversas situaccedilotildees e percalccedilos
Aos professores e alunos
Que participaram desta pesquisa e que concederam
informaccedilotildees valiosas para a realizaccedilatildeo deste trabalho
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
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produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
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dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
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alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
26
de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
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Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
29
Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
30
Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
33
projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
34
(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
35
envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
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que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
37
Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
43
Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
44
Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
45
leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
46
alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
47
que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
48
sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
49
muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
72
Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
73
Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
76
nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
77
pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
80
de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
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Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
84
32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
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As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
86
Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
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119
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120
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121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
ANA CLAacuteUDIA RAMOS
CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
UM CAMINHO PARA A FORMACcedilAtildeO DE LEITORES
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina como requisito para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
Comissatildeo examinadora
______________________________________
Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Profordf Drordf Francismara Neves de Oliveira
UEL ndash Londrina ndash PR
______________________________________
Prof Dr Rovilson Joseacute da Silva
Diretor das Bibliotecas do Municiacutepio de Londrina
Secretaria Municipal de Cultura ndash Londrina ndash PR
Londrina _____ de ______________ de 2011
A Deus
Pela certeza de que eras Tu quem me conduzia
quando eu jaacute natildeo tinha mais por onde caminhar
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira
Aos meus pais
A quem honro pelos esforccedilos
Agrave Elsa Pullin
Pela sabedoria e dedicaccedilatildeo
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus
Pela sauacutede feacute e perseveranccedila que tem me dado
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira na hora da tribulaccedilatildeo a qual com paciecircncia
compreendeu minhas faltas e ausecircncias
Aos meus pais
A quem honro pela forccedila pelo exemplo de vida e
pelos anos de dedicaccedilatildeo agrave educaccedilatildeo
Aos meus amigos
Pelo incentivo agrave busca de novos conhecimentos
e pela forccedila em relaccedilatildeo a esta jornada
Agrave Profordf Drordf Elsa Maria M Pullin
Esta que com sua sabedoria e dedicaccedilatildeo orientou-me
sendo sensiacutevel agraves diversas situaccedilotildees e percalccedilos
Aos professores e alunos
Que participaram desta pesquisa e que concederam
informaccedilotildees valiosas para a realizaccedilatildeo deste trabalho
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
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mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
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que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
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sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
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1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
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A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
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sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
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sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
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Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
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11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
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produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
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dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
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alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
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de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
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Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
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por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
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Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
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Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
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urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
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No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
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projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
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(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
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envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
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que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
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Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
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A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
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Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
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Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
45
leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
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alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
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que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
48
sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
49
muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
72
Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
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Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
76
nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
77
pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
80
de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
82
Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
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32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
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As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
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Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
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responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
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Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
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As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
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Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
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Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
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impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
REFEcircRENCIAS
ABRAMOVICH F Literatura infantil gostosuras e bobice 5 ed Satildeo Paulo Scipione 2004 ABREU M Quem natildeo lecirc e natildeo escreve da vida pouco desfruta poreacutem In_________ Estado de Leitura Campinas Mercado de LetrasAssociaccedilatildeo de Leitura do Brasil 1999 (Coleccedilatildeo Leituras no Brasil) ALLEBRANDT LI FEIL IS FRANTZLM O valor da literatura na sala de aula e na vida In ________ O tecer da linguagem no cotidiano escolar reflexotildees sobre o ensino e a aprendizagem da linguagem nas seacuteries iniciais do ensino fundamental 2 ed Ijuiacute Rio Grande do Sul UNIJUIacute 1999 p 83-102 ALVES R A menina e o paacutessaro encantado 17 ed Satildeo Paulo Loyola 1999 __________ Escutatoacuteria A casa de Rubem Alves Disponiacutevel em lthttpwwwrubemalvescombrescutatoriohtmgt Acesso em 26 de abril de 2009 ALVES-MAZZOTTI A J O planejamento da pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo Cadernos de Pesquisa Satildeo Paulo n 77 p53-61 maio 1991 ANDRADE C D A palavra maacutegica Disponiacutevel em lthttpwwwportalsaofranciscocombralfacarlos-drumonda-palavra-magicaphpgt Acesso em 15 de abril de 2011 BAJARD E Ler e dizer compreensatildeo e comunicaccedilatildeo do texto escrito 2 reeimp Satildeo Paulo Cortez 1994 BARRETOS S L M et al Literatura infanto-juvenil novos tempos Revista Akroacutepolis Umuarama v 12 ndeg 3 julset 2004 Disponiacutevel em lt httprevistasuniparbrakropolisarticleviewFile416381gt Acesso em 8 de marccedilo de 2011 BARROS M H T C SILVA R J BORTOLIN S Leitura mediaccedilatildeo e mediador Satildeo Paulo FA 2006
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121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
A Deus
Pela certeza de que eras Tu quem me conduzia
quando eu jaacute natildeo tinha mais por onde caminhar
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira
Aos meus pais
A quem honro pelos esforccedilos
Agrave Elsa Pullin
Pela sabedoria e dedicaccedilatildeo
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus
Pela sauacutede feacute e perseveranccedila que tem me dado
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira na hora da tribulaccedilatildeo a qual com paciecircncia
compreendeu minhas faltas e ausecircncias
Aos meus pais
A quem honro pela forccedila pelo exemplo de vida e
pelos anos de dedicaccedilatildeo agrave educaccedilatildeo
Aos meus amigos
Pelo incentivo agrave busca de novos conhecimentos
e pela forccedila em relaccedilatildeo a esta jornada
Agrave Profordf Drordf Elsa Maria M Pullin
Esta que com sua sabedoria e dedicaccedilatildeo orientou-me
sendo sensiacutevel agraves diversas situaccedilotildees e percalccedilos
Aos professores e alunos
Que participaram desta pesquisa e que concederam
informaccedilotildees valiosas para a realizaccedilatildeo deste trabalho
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
23
produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
24
dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
25
alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
26
de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
27
Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
29
Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
30
Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
33
projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
34
(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
35
envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
36
que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
37
Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
43
Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
44
Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
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leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
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alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
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que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
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sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
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muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
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Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
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Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
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2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
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interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
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21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
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22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
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221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
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23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
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O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
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alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
72
Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
73
Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
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nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
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pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
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de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
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comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
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Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
84
32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
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As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
86
Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
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119
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120
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121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus
Pela sauacutede feacute e perseveranccedila que tem me dado
Agrave minha filha Ana Carolina
Minha fiel companheira na hora da tribulaccedilatildeo a qual com paciecircncia
compreendeu minhas faltas e ausecircncias
Aos meus pais
A quem honro pela forccedila pelo exemplo de vida e
pelos anos de dedicaccedilatildeo agrave educaccedilatildeo
Aos meus amigos
Pelo incentivo agrave busca de novos conhecimentos
e pela forccedila em relaccedilatildeo a esta jornada
Agrave Profordf Drordf Elsa Maria M Pullin
Esta que com sua sabedoria e dedicaccedilatildeo orientou-me
sendo sensiacutevel agraves diversas situaccedilotildees e percalccedilos
Aos professores e alunos
Que participaram desta pesquisa e que concederam
informaccedilotildees valiosas para a realizaccedilatildeo deste trabalho
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
23
produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
24
dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
25
alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
26
de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
27
Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
29
Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
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Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
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projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
34
(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
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envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
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que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
37
Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
43
Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
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Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
45
leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
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alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
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que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
48
sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
49
muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
72
Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
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Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
76
nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
77
pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
80
de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
82
Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
84
32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
85
As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
86
Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
REFEcircRENCIAS
ABRAMOVICH F Literatura infantil gostosuras e bobice 5 ed Satildeo Paulo Scipione 2004 ABREU M Quem natildeo lecirc e natildeo escreve da vida pouco desfruta poreacutem In_________ Estado de Leitura Campinas Mercado de LetrasAssociaccedilatildeo de Leitura do Brasil 1999 (Coleccedilatildeo Leituras no Brasil) ALLEBRANDT LI FEIL IS FRANTZLM O valor da literatura na sala de aula e na vida In ________ O tecer da linguagem no cotidiano escolar reflexotildees sobre o ensino e a aprendizagem da linguagem nas seacuteries iniciais do ensino fundamental 2 ed Ijuiacute Rio Grande do Sul UNIJUIacute 1999 p 83-102 ALVES R A menina e o paacutessaro encantado 17 ed Satildeo Paulo Loyola 1999 __________ Escutatoacuteria A casa de Rubem Alves Disponiacutevel em lthttpwwwrubemalvescombrescutatoriohtmgt Acesso em 26 de abril de 2009 ALVES-MAZZOTTI A J O planejamento da pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo Cadernos de Pesquisa Satildeo Paulo n 77 p53-61 maio 1991 ANDRADE C D A palavra maacutegica Disponiacutevel em lthttpwwwportalsaofranciscocombralfacarlos-drumonda-palavra-magicaphpgt Acesso em 15 de abril de 2011 BAJARD E Ler e dizer compreensatildeo e comunicaccedilatildeo do texto escrito 2 reeimp Satildeo Paulo Cortez 1994 BARRETOS S L M et al Literatura infanto-juvenil novos tempos Revista Akroacutepolis Umuarama v 12 ndeg 3 julset 2004 Disponiacutevel em lt httprevistasuniparbrakropolisarticleviewFile416381gt Acesso em 8 de marccedilo de 2011 BARROS M H T C SILVA R J BORTOLIN S Leitura mediaccedilatildeo e mediador Satildeo Paulo FA 2006
110
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121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
O CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRO CONTADOR DE HISTOacuteRIASIASIASIAS
- Conta-me uma histoacuteria ndash pedia-lhe a moccedila
- Tenho de pensar ndash respondia-lhe
Ora acontecia que por vezes o tempo que levava em sua meditaccedilatildeo era longo demais para ela que se zangava Mas ele balanccedilava a cabeccedila e respondia impassiacutevel
- Vocecirc deve ter um pouco mais de paciecircncia Uma boa histoacuteria eacute como uma boa montaria A caccedila brava fica escondida e eacute preciso armar emboscadas e ficar de tocaia horas e horas a fio na boca dos precipiacutecios e florestas Os caccediladores mais apressados e impetuosos afugentam a caccedila e nunca obtecircm os melhores exemplares Deixa-me pois
pensar
Mas desde que tivesse meditado o tempo bastante e comeccedilasse a falar natildeo parava enquanto natildeo tivesse contado a histoacuteria completa que corria ininterrupta e fluente como um rio descendo montanha abaixo e em cujas aacuteguas tudo se reflete ndash desde a pequena
folha de grama ateacute o azul da aboacutebada celeste()
Convertia-se num ser todo-poderoso assim que iniciava mais uma demonstraccedilatildeo de sua arte pois aprendera a arte de narrar no Oriente onde essa funccedilatildeo eacute altamente
apreciada e seus praticantes satildeo considerados uma espeacutecie de magos
Jamais comeccedilava suas histoacuterias em paiacuteses estranhos para onde o espiacuterito do ouvinte natildeo podia voar com forccedila proacutepria
Principiava sempre com algo que os olhos pudessem ver depois imperceptivelmente levava a imaginaccedilatildeo dos ouvintes para onde muito bem ele queria de
modo que a narrativa transcorria com naturalidade
Quem o escutava absorto em suas palavras embora continuasse tranquumlilamente sentado o espiacuterito jaacute vagava Alegre e receoso pelas regiotildees mais fascinantes Assim era a
maneira de ele contar suas histoacuterias
Herman Hesse
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
23
produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
24
dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
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alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
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de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
27
Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
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Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
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Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
33
projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
34
(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
35
envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
36
que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
37
Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
42
compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
43
Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
44
Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
45
leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
46
alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
47
que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
48
sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
49
muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
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SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
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242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
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para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
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quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
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realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
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desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
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Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
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Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
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Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
74
em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
75
nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
76
nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
77
pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
78
A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
80
de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
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Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
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32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
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As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
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Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
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119
SMOLKA A L B A atividade da leitura e o desenvolvimento das crianccedilas In ______ SILVA E T da BORDINI M da G ZILBERMAN R Leitura e desenvolvimento da linguagem Porto Alegre Mercado Aberto 1989 p 23-41 TEDESCO JC Los desafiacuteos de la educacioacuten baacutesica en el siglo XXI Revista Ibe-roamericana de Educacioacuten Madrid n 55 p 31-47 2011 TEIXEIRA E Competecircncias transversais para o oficio de aluno metodologia acadecircmica em questatildeo ou quando estudar ler e escrever faz a diferenccedila Trilhas Beleacutem v1 n2 p56-65 2000 TORRES S M TETTAMANZY A L L Contaccedilatildeo de histoacuteria resgate da memoacuteria e estimulo agrave imaginaccedilatildeo Revista eletrocircnica de criacutetica e de teorias da literatura Sessatildeo aberta Porto Alegre v 4 n 1 p 1-8 2008 TURCHI M Z O esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil In CECCANTINI JL (Org) Leitura e literatura infantil memoacuteria de Gramado Satildeo Paulo Cultura Acadecircmica Assis SP ANEP 2004 p 38-44 VILELA R A T O lugar da abordagem qualitativa na pesquisa educacional retrospectiva e tendecircncias atuais Perspectiva Florianoacutepolis v 21 n 2 p 431-466 2003 VYGOTSKY L S A preacute-histoacuteria da escrita In ______ A formaccedilatildeo social da mente Satildeo Paulo Martins Fontes 1984 p 119-134 __________ Pensamento e palavra In ______ A construccedilatildeo do pensamento e da linguagem Satildeo Paulo Martins Fontes 2001 p 395- 486 VIEIRA M C T Leitura significativa prazer dever ou relevacircncia social no ensino superior CONGRESSO DE LEITURA DO BRASIL 16 2007 Campinas Anais Campinas SP ALB Disponiacutevel em lthttpwwwalbcombranais16sem12pdfsm12ss06_07pdfgt Acesso em 17 de julho de 2009 WITTER G P Influecircncias socioculturais na leitura anaacutelise do ASIRR (19891994) Transinformaccedilatildeo Campinas v 8 n 3 p 66-80 1996
120
YUNES E PONDEacute M G Leitura e leituras da literatura infantil Satildeo Paulo FTD 1988 ZILBERMAN R A Literatura infantil na escola 6 ed Satildeo Paulo Global 1987 __________ Formaccedilatildeo do leitor na histoacuteria da leitura In PEREIRA V W (Org) Aprendizado da leitura ciecircncias e literatura no fio da histoacuteria Porto Alegre EDIPUCRS 2002 p 15-29 ZUMTHOR P A letra e a voz a literatura medieval Satildeo Paulo Companhia das Letras 1993 ___________ A presenccedila da voz In_________ Escritura e nomadismo Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial 2005 p 61-102 ___________ Introduccedilatildeo a poesia oral Satildeo Paulo Hucitec 1997
121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-
RAMOS Ana Claacuteudia Contaccedilatildeo de histoacuterias um caminho para a formaccedilatildeo de leitores Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Educaccedilatildeo Universidade Estadual de Londrina 2011
RESUMO
A pesquisa intitulada CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS um caminho para a formaccedilatildeo de leitores objetivou verificar alguns efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores e descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros Situando-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por conseguinte descritivas e interpretativas A parte empiacuterica foi desenvolvida em um ambiente escolar com alunos do 2ordm ano do Ensino Fundamental visto que haacute uma ruptura na passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas salas das seacuteries iniciais Pelos resultados desta pesquisa foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e compreensatildeo de si e do mundo
Palavras-chave Contaccedilatildeo de histoacuteria Leitura Formaccedilatildeo do leitor Ensino Fundamental
RAMOS Ana Claacuteudia Storytelling a path to develop novice readers 2010 Mas-terrsquos Degree dissertation on Education Universidade Estadual de Londrina
ABSTRACT
The research named STORYTELLING a path to develop readers aimed to check some of the effects of oral narratives i e possible effects that resulted from storytel-ling for the development of novice readers It also aimed to find out if and how the teacherrsquos performance during the storytelling influences the studentrsquos interest in read-ing other books Set in the field of qualitative investigations and therefore descriptive and interpretative The empirical part of the research was developed in an educa-tional environment with students of the 2nd grade in elementary school since there is a disruption in the transition from kindergarten to elementary school not only be-cause of the power of the rough transition of the offering of learning environments typical of those teaching structures but because of other interactive possibilities in classes of early grades Through the results of this research it was possible to ex-pose storytelling as one more central strategy for the readerrsquos development assuring this way the enrichment of the educational process under a perspective that values the generation of critical and reflexive individuals Thatrsquos due to the fact that oral narratives especially those that are supported by the reading of literary work as in the case of this research concentrate multi meaning ways for the reading and under-standing of themselves and the world
Key words Storytelling Reading Readerrsquos development Elementary school
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1- Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas62
QUADRO 2- Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo93
QUADRO 3- Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo94
QUADRO 4- Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B) 95
LISTA DE ILUSTRACcedilAtildeO
FIGURA 1 - Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dados70
FIGURA 2 - Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise71
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
FNLIJ Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e Juvenil
IES Instituto de Educaccedilatildeo Superior
INEP Instituito Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira
PCNrsquos Paracircmetros Curriculares Nacionais
SEFMEC Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e Embaixadas da Franccedila
SUMAacuteRIO
INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 13
1 LEITURA UMA PRAacuteTICA CULTURALhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip17
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans) Formadora e (De) Formadora 22
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo 29
121 A arte de narrar o papel do contador na contemporaneidade35
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores38
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar41
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores45
2 MEacuteTODO DE PESQUISA52
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados54
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes55
221 Participantes56
23 Materiais57
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias59
232 Demais instrumentos59
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados60
241 Intervenccedilatildeo61
242 Conversas e entrevistas63
2421 Entrevistas com os alunos63
2422 Entrevistas e conversas com as professoras64
243 Observaccedilotildees65
244 Conversas com a bibliotecaacuteria65
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO68
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo71
32 Entre os entrecruzamentos das matrizes as praacuteticas de leituras e
concepccedilatildeo de leitor84
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta92
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS97
REFEREcircNCIAS109
APEcircNDICES121
APEcircNDICE A - Questionaacuterio para a seleccedilatildeo dos entrevistados (seleccedilatildeo dos
alunos)122
APENDICE B - Termo de Compromisso e Autorizaccedilatildeo123
APENDICE C - Carta de Informaccedilatildeo ao Sujeito de Pesquisa125
APEcircNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido126
APEcircNDICE E - Roteiro de conversa toacutepico guia127
APEcircNDICE F - Sinopse das histoacuterias trabalhadas nas intervenccedilotildees129
APENDICE G - Ficha de observaccedilatildeo131
ANEXO132
ANEXO A - Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca133
13
INTRODUCcedilAtildeO
O presente trabalho ldquoContaccedilatildeo de Histoacuterias um caminho possiacutevel para a
formaccedilatildeo de leitoresrdquo tem por objetivo geral verificar alguns efeitos das narrativas
orais ou seja dos possiacuteveis decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo
de alunos-leitores e como objetivos especiacuteficos os de descobrir se e como o
desempenho do professor durante a contaccedilatildeo de histoacuterias influencia o interesse do
aluno em ler outros livros
A origem desta pesquisa partiu de observaccedilotildees feitas durante a minha
participaccedilatildeo em um projeto interdisciplinar centrado no trabalho com Contos Infantis
desenvolvido com alunos do 2deg ano (do atual ensino de 9 anos) na instituiccedilatildeo em
que atuo
Durante a execuccedilatildeo desse projeto conduzi algumas sessotildees de contaccedilatildeo de
histoacuteria nas quais observei o envolvimento das crianccedilas com o texto narrado e as
reaccedilotildees diversas que a atividade nelas instigava Risos desconfortos tristeza
indiferenccedila entre outras manifestaccedilotildees de sentimentos eram comuns durante cada
sessatildeo Ouvidos e corpos atentos para escutar e natildeo somente para ouvir como
usualmente acontece no cotidiano das demais aulas
Apoacutes as sessotildees dedicava alguns minutos para conversar com as crianccedilas
sobre o que havia sido narrado Muitas delas relatavam suas impressotildees
sentimentos apreciaccedilotildees e seus conhecimentos e por diversas vezes contavam
experiecircncias pessoais relacionadas agrave temaacutetica da histoacuteria O mais fascinante foi a
constataccedilatildeo quanto agrave sua aguccedilada curiosidade quando era apresentado o livro e o
autor da histoacuteria olhos atentos agraves imagens ilustrativas e a toda estrutura do livro
bem como a importacircncia de pegarem o texto impresso e verificarem cada uma a
seu modo se e como ali era constada aquela histoacuteria
A partir de entatildeo passei a valorizar de um modo diferente e a me interrogar
sobre a importacircncia da Literatura Infantil ou seja das produccedilotildees destinadas a
crianccedilas como as que se fazem presentes em livros de ficccedilatildeo (e outros recursos
como os CD`s) concluindo que estas podem e devem ser utilizadas natildeo somente
como pretextos para ensinar conteuacutedos que estatildeo sendo ministrados ou ateacute
14
mesmo para resolver problemas especiacuteficos de comportamento pessoal e social
mas como estrateacutegias para ampliar o imaginaacuterio das crianccedilas e deste modo
inclusive sua inserccedilatildeo social
Ao escutarem algumas dessas histoacuterias as crianccedilas podem reconhecer a
heranccedila social simboacutelica comum que configura a realidade em uma dada sociedade
ou grupo social percebendo a presenccedila das diversidades passando a suspeitaacute-las
bem como o seu lugar no mundo Aleacutem do mais uma questatildeo foi-se impondo em
meus fazeres as histoacuterias quando narradas oralmente podem contribuir e de que
modo para a formaccedilatildeo do aluno como leitor
Tendo por base essa questatildeo que emergiu das experiecircncias e reflexotildees que
fui acumulando ao longo da execuccedilatildeo daquele projeto algumas outras me foram
instigando como estimular os alunos desde as seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo para
o gosto pela leitura tendo em vista que estes se encontram envolvidos em
processos de aquisiccedilatildeo formal de algumas competecircncias linguiacutesticas relacionadas agrave
escrita e agrave leitura Os alunos das seacuteries iniciais sentem prazer na leitura de livros
Satildeo instigados para tal Por que os alunos durante o progresso escolar ficam
encantados ao assistir a uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria mostrando-se
interessados pelo que estaacute sendo narrado poreacutem resistem agrave leitura de livros Como
relatam alguns professores A leitura literaacuteria vem sendo oportunizada e legitimada
nesse niacutevel de ensino nas instituiccedilotildees
Em face dessas questotildees a identificaccedilatildeo e anaacutelise das possiacuteveis
consequecircncias da contaccedilatildeo de histoacuteria para a formaccedilatildeo de leitores que se
encontram nos anos iniciais de sua formaccedilatildeo escolar mais especificamente no 2deg
ano do Ensino Fundamental e das atitudes e desempenho dos professores frente a
essa contaccedilatildeo parecem relevantes para que se atinjam os objetivos propostos para
este trabalho conforme enunciados em seu iniacutecio
A escolha dos alunos do 2deg ano do Ensino Fundamental para a realizaccedilatildeo da
pesquisa se deu pela importacircncia de seu ingresso e conclusatildeo dessa etapa da
Educaccedilatildeo Baacutesica a qual pode deixar marcas algumas delas resistentes a
mudanccedilas futuras por exemplo relacionadas ao ldquoofiacutecio de alunordquo
(PERRENOUD1995) e a sua constituiccedilatildeo como leitor Esse aluno muito mais do
que aprender conteuacutedos valores e atitudes em relaccedilatildeo aos saberes legitimados tem
15
que enfrentar o desafio de se adaptar agraves rotinas da vida escolar especialmente
quando natildeo vivenciaram a escolarizaccedilatildeo anterior (Educaccedilatildeo Infantil) bem como
comeccedilar a adquirir competecircncias transversais (TEIXEIRA 2000) como as
relacionadas ao ato de estudar ler e de escrever
Para muitos alunos o ingresso no Ensino Fundamental oportuniza
experiecircncias expressivas e duradouras pois eacute nesta fase que a maioria deles
comeccedila a dominar as ferramentas iniciais para a leitura e para o caacutelculo letramentos
e conhecimentos indispensaacuteveis para uma vida digna e participativa na sociedade
(GIMENO-SACRISTAacuteN 2008) O processo de letramento eacute contiacutenuo poreacutem esse
periacuteodo eacute muito significativo para a crianccedila Todavia verifica-se que muitas crianccedilas
quando ingressam no 2deg ano do ensino de 9 anos ou 1 ordf seacuterie do ensino de 8 anos
demonstram ser curiosas e interessadas pelo que lhes eacute ensinado poreacutem nem
sempre concluem as seacuteries iniciais do Ensino Fundamental conforme sinopse
estatiacutestica de 2009 realizada pelo INEP ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Aniacutesio Teixeira)
Em face da importacircncia e relevacircncia social deste trabalho a fim de facilitar a
sua leitura a organizaccedilatildeo do trabalho e a acadecircmica das questotildees que orientaram a
proposiccedilatildeo foi distribuiacuteda em quatro capiacutetulos
No primeiro capiacutetulo abordamos na primeira seccedilatildeo a leitura enquanto praacutetica
cultural uma atividade pela qual o leitor ao ler dialoga com os textos se apropria
da heranccedila social simboacutelica pelos conhecimentos atitudes valores e significado
culturais atribuiacutedos aos objetos dos discursos que lecirc Uma praacutetica realizada em um
espaccedilotempo portanto situada na qual autor e leitor se inter-relacionam por isso a
leitura eacute um ato individual produzido e implicado socialmente (MARCUSHI 1998) de
fato converte-se em uma accedilatildeo social Trataremos na segunda seccedilatildeo da leitura
enquanto accedilatildeo transformadora do sujeito Sabemos da importacircncia da leitura para o
processo de construccedilatildeo da realidade e do conhecimento Contudo porque a leitura
trespassa qualquer experiecircncia humana e para a sua produccedilatildeo por sua vez
demanda a curiosidade espontacircnea ou estimulada por outros do sujeito face ao
objeto a ser (re) conhecido o modo como aprendeu a ler pode instigaacute-lo ou natildeo a
accedilotildees transformadoras pessoais e em seu entorno Portanto algumas praacuteticas de
leitura podem gerar efeitos (trans) formadores (de) formadores na formaccedilatildeo do
16
sujeito como alerta Larrosa (2002 b) ainda neste capitulo na terceira seccedilatildeo
discorremos sobre a arte de contar histoacuterias situando-a como uma arte milenar que
sofre os efeitos dos recursos tecnoloacutegicos utilizados para envolver seus ouvintes
ressaltando nas seccedilotildees subsequentes alguns aspectos relevantes no ato de contar
e para a constituiccedilatildeo de leitores
No segundo capiacutetulo descrevemos a parte empiacuterica que sustenta este
trabalho o contexto com a caracterizaccedilatildeo da escola e dos participantes os materiais
e o processo para a geraccedilatildeo dos dados A pesquisa eacute sustentada pelos
pressupostos de um modo de compreender o mundo e as relaccedilotildees do sujeito no
caso do pesquisador com seu objeto de investigaccedilatildeo nos quais as consequumlecircncias
da opccedilatildeo por uma pesquisa qualitativa satildeo evidentes as interpretaccedilotildees do
pesquisador prevalecem nas descriccedilotildees que apresentamos
No terceiro capiacutetulo o de Resultados e Discussatildeo relatamos as anaacutelises
realizadas informando inicialmente os caminhos que as guiaram e orientaram sua
apresentaccedilatildeo Pretendeu-se com isso demonstrar a loacutegica que guiou a totalidade
do processo de investigaccedilatildeo agrave luz dos dados colhidos e das produccedilotildees pertinentes
realizadas por outros autores
No quarto capiacutetulo o das Consideraccedilotildees Possiacuteveis satildeo apresentadas as
nossas ponderaccedilotildees acerca das questotildees que buscamos responder com este
trabalho convidando os leitores a prosseguirem investigando-as de modo a que
ultrapassem os limites deste trabalho alguns deles identificados no presente relato
17
1 A LEITURA COMO PRAacuteTICA CULTURAL
Torna-se imprescindiacutevel criar o haacutebito da leitura uma vez que esta hoje pode ser vista como artigo de primeira necessidade []
eacute mister que cada indiviacuteduo desperte dentro de si o interesse em auto instruir-se para descobrir a forccedila da palavra
Inajaacute Martins de Almeida
Quando lemos natildeo enxergamos apenas as marcas das palavras traccedilos ou
imagens plaacutesticas mas fazemos pelo significado que aprendemos a lhes atribuir
Assim nos comportamos por uma das caracteriacutesticas da espeacutecie humana
(VYGOTSKY1 1984 2001) qual seja a capacidade de atribuir significados e a
compreender siacutembolos e signos
Os vaacuterios artefatos sociais entre eles os produzidos pela escrita possibilitam
aos que se apropriaram dos modos sociais de a utilizarem a produzirem outros
artefatos ou lerem os produzidos por outros Com isso queremos dizer que marcas
sociais definem e inscrevem quaisquer accedilotildees e produccedilotildees individuais Mais do que
isso nos posicionamos entre aqueles que definem a leitura como uma produccedilatildeo
individual independente do suporte que a oportuniza Lemos o mundo com suas
imagens esculturas e demais produccedilotildees como a noacutes mesmos e ao outro com o
qual interagimos sob o efeito das marcas que as praacuteticas sociais nos levam a
identificar interpretar sentir e valorizar cada um desses artefatos Partindo dessas
leituras realizadas nas interaccedilotildees que acontecem sempre em espaccedilos
intersubjetivos quer os percebamos ou natildeo eacute que constituiacutemos nossa subjetividade
Podemos considerar que o ambiente de sala de aula se estabelece como um
espaccedilo intersubjetivo onde acontecem interaccedilotildees entre aluno-aluno e professor-
aluno Serve portanto como um lugar do qual emergem e se constituem modos de
sociabilidade que satildeo ampliados e transformados no cotidiano de suas praacuteticas
coletivas
1 Neste trabalho satildeo utilizadas as grafias que identificam a obra consultada deste autor
18
A escola particularmente pelas praacuteticas que ocorrem nas salas de aulas
constitui modos de ler e estar no mundo (FREIRE 2001)
O leitor pode entatildeo ser ou natildeo um sujeito-ativo na construccedilatildeo de
significados bem como realizar suas leituras de forma interativa e dialoacutegica junto
com outros possiacuteveis leitores Portanto as leituras assim construiacutedas podem ser
entendidas como praacutetica cultural como a compreendem Bourdieu e Chartier (2001)
Concordamos com Rockwell (2001 p14) quando pondera acerca da leitura e
diz ldquoo conceito de praacutetica cultural eacute uma ponte entre os recursos culturais e as
evidecircncias observaacuteveis de atos de leitura em um determinado contextordquo Isso
porque as praacuteticas natildeo satildeo accedilotildees idiossincraacuteticas independentes dos efeitos
culturais acumulados mas determinadas coletivamente o que garante a
permanecircncia do passado no presente configurando-as assim como expressotildees
individualizadas das praacuteticas culturais em um dado espaccedilotempo
O ato de ler textos no caso escritos estaacute relacionado agraves condiccedilotildees
socioculturais e pessoais presentes na situaccedilatildeo decorrentes das histoacuterico-culturais
do grupo de sua pertenccedila A maneira como se lecirc e o sentido que se atribui a um
texto depende entatildeo do lugar e eacutepoca em que o leitor realiza sua leitura como
outros Mollier (2009) documenta
Ao longo de toda a histoacuteria da instituiccedilatildeo escolar o ensino da leitura comeccedilou
voltado agrave memorizaccedilatildeo atraveacutes de repeticcedilotildees de signos escritos e seus respectivos
sons e apoiado em diferentes vertentes pedagoacutegicas buscou na maioria das
vezes transformar os valores e haacutebitos dos grupos sociais O livro como aponta
Heacutebrard (2001 p35) era usado como base ldquo[] aos rituais de coesatildeo social
familiar ou mais ampla [] um grupo de leitores individualizadosrdquo As poliacuteticas
educativas daquele momento concebiam uma uacutenica modalidade de leitura aquela
que permitia ao livro o poder de fixar com toda legibilidade suas mensagens no
iacutentimo das crianccedilas pois estas eram percebidas como ldquocera molerdquo pela pedagogia
claacutessica (CHARTIER 2001 p243) Em outras palavras nessa eacutepoca tornar-se
leitor soacute era possiacutevel sobre o poder do texto do livro pois ldquoensinar a ler um grupo
social ateacute entatildeo analfabeto eacute apresentaacute-lo ao poder com direito infinito do livrordquo
(HEacuteBRARD 2001 p36) Soacute se tornaria culto o sujeito que se deixasse influenciar
pelo livro pelos conhecimentos e ciecircncias contidos nos fragmentos dos textos O
19
sujeito considerado alfabetizado nessa eacutepoca o que tinha uma boa leitura era
aquele que debruccedilado sobre os escritos dominasse apenas os signos linguiacutesticos e
se deixasse ser moldados por eles
A boa leitura sempre sujeitas agraves regulaccedilotildees de cada eacutepoca expressa o
modo de apropriaccedilatildeo e o poder do leitor sobre o texto como o leitor se apropria do
que lecirc e do seu poder sobre o poder do escrito Como aponta Bourdier (2001 p
243) ldquoo poder sobre o livro eacute o poder sobre o poder que exerce o livrordquo Ao realizar
a leitura de um texto o leitor natildeo soacute se apropria da obra como pode exercer poder
sobre ela Se por um lado o poder do texto como em um livro estaacute no
direcionamento do leitor do seu pensar e sentir sobre as informaccedilotildees expliacutecitas e
impliacutecitas contidas no texto por outro lado o poder do leitor sobre o poder do livro
depende de sua condiccedilatildeo de questionar refletir interrogar e interagir os recursos e
estrateacutegias utilizadas pelo autor para tecer seu texto O leitor pode por
conseguinte exercer ldquodomiacuteniordquo sobre a tessitura das palavras do autor de qualquer
texto e ao dialogar com este pode deformar ditos predeterminados em novas
interpretaccedilotildees ou seja em (re)significaccedilotildees Estas geram possibilidades para
novas vivecircncias e quanto mais situaccedilotildees vividas pelo leitor maior poderaacute ser seu
poder sobre os escritos
Atualmente no contexto escolar podem ser identificadas vaacuterias modalidades
de leitura ou seja vaacuterias maneiras de ler e estas soacute se tornam possiacuteveis por meio
das praacuteticas de leitura que nesse contexto satildeo legitimadas ensinadas e
compartilhadas Essas praacuteticas de leitura se revelam pelo que se lecirc agraves razotildees de
ler e ao como se lecirc Como se lecirc em parte depende das competecircncias do leitor
Essas natildeo satildeo inatas satildeo produzidas em um dado espaccedilotempo como
anteriormente argumentamos Hoje um leitor proficiente eacute aquele que aleacutem de
decifrar coacutedigos eacute capaz de compreendecirc-los ou seja a decifraccedilatildeo que em outros
tempo definia o leitor como capaz jaacute natildeo basta ele precisa voltar sua atenccedilatildeo para
os significados e produzir sentidos sobre o que lecirc
As praacuteticas de leitura foram concebidas por Chartier (2001) como uma
praacutetica cultural desempenhada em um espaccedilo intersubjetivo no qual o(s) leitor(es)
pode(m) compartilhar comportamentos atitudes e significados culturais a partir do
ato de ler Como argumentamos a sala de aula no espaccedilo escolar pode e vem
20
sendo tomada como um ambiente intersubjetivo e acreditamos que em seu
interior ocorram atividades que propiciem estas praacuteticas de leitura
Teoacutericos de diferentes origens disciplinares tecircm se preocupado em investigar
a histoacuteria e as praacuteticas de leitura Dentre eles podemos citar Pierre Bourdieu
(2001) Anne Marie Chartier (1995) Roger Chartier (2001) Elsie Rockwell (2001)
Jean Heacutebrard (2001) Lacerda (1999) Mollier (2009) que ao documentarem sobre
os suportes e as praacuteticas de leitura em diferentes contextos soacutecio-histoacutericos
analisam refletem e evidenciam as influecircncias desses suportes e dos modos de ler
em distintas eacutepocas
Vaacuterias reflexotildees podem ser realizadas acerca da leitura e como satildeo
praticadas nas escolas Primeiramente porque eacute comum identificarmos a escola
enquanto um importante espaccedilo de cultura letrada No entanto a aprendizagem da
leitura como ensinam Chartier (2001) Freire (1982) e Soares (1998) sustenta-se
muito mais nas experiecircncias extraescolares do que na aprendizagem escolar ou
seja naquelas experiecircncias vividas pela crianccedila antes mesmo de iniciar seu
processo de escolarizaccedilatildeo experiecircncias com o mundo e nele onde ela busca
compreender seu entorno e responder os questionamentos que lhe fazem
Rockwell (2001) assegura que no ambiente da sala de aula a leitura eacute uma
interaccedilatildeo social visto que ldquoos participantes frequentemente lecircem em voz alta no
meio de um intercacircmbio contiacutenuo oralrdquo (ROCKWELL 2001 p13) O professor
desempenha segundo essa autora o papel de mediador deste intercacircmbio eacute
como se fosse a conexatildeo edificadora na comunicaccedilatildeo entre as crianccedilas e os
textos Rockwell (2001) ainda complementa que ldquoprofessores e alunos constroem
interpretaccedilotildees cruzadas entre convenccedilotildees escolares e conhecimento cotidiano que
tornam o texto mais ou menos acessiacutevelrdquo (ROCKWELL 2001 p13) visto que no
diaacutelogo possiacutevel entre a crianccedila e o texto acontece um entrelaccedilamento entre os
efeitos das experiecircncias preacuteestabelecidas no seu conviacutevio social e as normas ou
praacuteticas adotadas pela escola A acessibilidade aos textos trabalhados em sala de
aula soacute se torna possiacutevel de compreensatildeo por esse diaacutelogo o qual depende das
praacuteticas de leituras exercidas na escola Como afirma Heacutebrard (2001 p37) ldquoao
aprender a ler a crianccedila contentar-se-ia em reinvestir no domiacutenio do escrito as
praacuteticas culturais mais gerais do seu meio imediatordquo
21
Poder-se-ia dizer da necessidade de leitura para algueacutem se informar no
sentido de Bourdieu (2001 p241) isto eacute como a daquele que ldquotoma o livro como
depositaacuterio de segredos segredos maacutegicos climaacuteticos (como um almanaque para
prever o tempo) bioloacutegicos e educativos etcrdquo A escola todavia tende a
desvalorizar esse tipo de leitura por entender que a leitura vai aleacutem da simples
aquisiccedilatildeo de informaccedilotildees estabelecidas pelo texto Hoje no contexto escolar
verifica-se a presenccedila de discursos reguladores como os que compotildeem os PCNrsquos
(BRASIL1997) os quais defendem as leituras como sendo plurais Isso porque
cada leitor no decorrer da sua leitura constroacutei de maneira diferenciada o sentido
do texto mesmo que este - o texto - tenda a traccedilar no seu interior o sentido que ele
desejaria ver concedido
No ambiente escolar haacute muacuteltiplas formas de leitura e os diversos elementos
do contexto condicionam e influenciam a maneira de ler Muitas satildeo as praacuteticas
documentadas em diferentes contextos escolares desde a leitura em voz alta ateacute
as da memorizaccedilatildeo de trechos envolvendo distintas atividades com a escrita As
posturas dos professores ao avaliarem a leitura tambeacutem satildeo diversas Na opiniatildeo
de Rockwell (2001 p16) ldquo[] o interessante eacute explorar as dissociaccedilotildees entre o
protocolo ideal de leitura e as muacuteltiplas formas de ler que satildeo tomadas em salardquo
A praacutetica de narrar histoacuterias eacute uma das tantas formas empregadas pelo
professor em seu trabalho com a leitura em sala de aula Eacute muito comum essa
praacutetica na Educaccedilatildeo Infantil onde os alunos ainda natildeo dominam a tecnologia da
escrita apenas satildeo capazes de ler a linguagem oral imagens gestos e o que estaacute
em seu entorno Poreacutem no decorrer da escolarizaccedilatildeo posterior essa praacutetica
raramente ocorre e deixa a desejar O que se verifica eacute o domiacutenio da leitura de
textos escritos sobre as demais praacuteticas dentre estas a de contar histoacuterias
Entendemos como importante que os professores de todos os anos
escolares (re)conheccedilam a praacutetica de narrar histoacuterias como uma praacutetica de leitura
fundamental para a formaccedilatildeo dos alunos enquanto leitores Todavia eacute
indispensaacutevel que essa importacircncia natildeo fique soacute no discurso Ela deve ser tecida
no dia a dia escolar ano apoacutes ano
22
11 Leitura Accedilatildeo Formadora (Trans)Formadora e (De)Formadora
A leitura eacute de facto em meu entender imprescindiacutevel primeiro para me natildeo dar por satisfeito soacute com as minhas obras
segundo para ao informar-me dos problemas investigados pelos outros poder ajuizar das descobertas jaacute feitas e conjecturar as que ainda haacute por fazer
Seacuteneca
No contexto educativo em especial nas seacuteries iniciais a aprendizagem da
leitura assume um peso significativo e por vezes determinante no sucesso ou
fracasso do aluno Formar alunos leitores tem se constituiacutedo em uma preocupaccedilatildeo
constante no campo educacional uma vez que a leitura eacute fundamental para a
inserccedilatildeo do ser humano nas sociedades atuais (GIMENO-SACRISTAN 2008) O ato
de ler favorece ao leitor o acesso a informaccedilotildees de distintos campos bem como
pode favorecer o desenvolvimento da criticidade levando-o a assumir posiccedilotildees
condignas ao pleno exerciacutecio da sua cidadania porque eacute capaz de aprender a
aprender continuamente bem como de aprender a viver junto (TEDESCO 2011)
Quando pensamos sobre leitura logo nos vem agrave mente o livro Pensar leitura
eacute quase sempre pensar em coacutedigos linguiacutesticos de um texto literaacuterio ou natildeo mas
sabemos entretanto que a leitura vai muito aleacutem da simples decodificaccedilatildeo dos
elementos escritos da liacutengua materna Natildeo descartamos poreacutem o grande meacuterito da
leitura de livros em sala de aula realizada com o intuito de formar ldquobons leitoresrdquo
Todavia deveriacuteamos atentar para a formaccedilatildeo que ultrapassa o domiacutenio da
linguagem oral e escrita
Classificar um sujeito como bom ou mau leitor eacute natildeo soacute arriscado como
passiacutevel de excluirmos algueacutem visto que qualquer pessoa perante um objeto realiza
uma leitura Passamos o tempo todo fazendo leituras e independentemente de
como a realizamos sempre (re)produzimos os efeitos de nossa experiecircncia no
campo simboacutelico que as praacuteticas sociais nos permitem adentrar Poreacutem como
professores somos frequentemente solicitados a qualificar os alunos respondemos
segundo nossa concepccedilatildeo de bom e mau leitor Ao fazecirc-lo demonstramos a nossa
concepccedilatildeo de leitura das competecircncias que consideramos necessaacuterias para
23
produzi-la No nosso caso considerando um bom leitor aquele que interage com
diferentes textos e contextos sendo fluente e criacutetico
Cabe entretanto analisar como vem sendo concebida a formaccedilatildeo de aluno
leitor
Iniciaremos com alguns apontamentos sobre o uso social dos termos formar
leitor e leitura Houaiss (2009) em seu dicionaacuterio epistemoloacutegico apresenta as
seguintes definiccedilotildees Formar lat foacutermoacuteasaacuteviaacutetumaacutere dar forma formar
conformar arranjar organizar regular modelar instruir dar certa disposiccedilatildeo ao
espiacuterito confeccionar (fig) criar produzir Leitor lat lectoroacuteris o que lecirc Leitura
latmedv lectura do rad do supn do v legegravere reunir accedilatildeo ou efeito de ler ato de
apreender o conteuacutedo de um texto escrito ato de ler em voz alta haacutebito de ler
maneira de compreender de interpretar um texto uma mensagem um
acontecimento
Assim sendo podemos entender que segundo a nossa tradiccedilatildeo simboacutelica
formar leitores eacute conduzir as pessoas arranjando e organizando situaccedilotildees para que
sejam capazes de ver conhecer compreender aprender o que foi articulado por
outrem por vezes pelo leitor em situaccedilotildees anteriores Esses comportamentos
incluem a participaccedilatildeo de diferentes dados sensoriais (visatildeo tato audiccedilatildeo etc)
Coelho (2000) elenca as vantagens de o sujeito realizar leituras
especialmente de textos literaacuterios porque estas ldquoestimulam o exerciacutecio da mente a
percepccedilatildeo do real em suas muacuteltiplas significaccedilotildees a consciecircncia do eu em relaccedilatildeo
ao outro []rdquo (COELHO 2000 p16)
A leitura eacute um processo em que o leitor realiza um trabalho ativo na
construccedilatildeo de sentidos para o texto assim ela eacute definida nos PCNacutes - Paracircmetros
Curriculares Nacionais de Liacutengua Portuguesa - (BRASIL 1997) Por conseguinte a
leitura natildeo se reduz a decodificaccedilotildees pontuais dos signos (letras siacutembolos
imagens etc) porque implica em compreendecirc-los visto que alguns sentidos
atribuiacutedos ao texto comeccedilam a ser constituiacutedos pelo leitor antes mesmo da sua
leitura propriamente dita
Smolka (1989) caracteriza a leitura como uma atividade humana Essa
atividade pode ser concebida no sentido psicoloacutegico como sendo um processo
24
dinacircmico que em sua realizaccedilatildeo congrega os efeitos das relaccedilotildees soacutecio-interativas e
individuais-cognitivas Portanto pode-se dizer que a leitura eacute um processo de
interlocuccedilatildeo fundada em interaccedilotildees sociais anteriores Isso porque eacute no seio das
relaccedilotildees cotidianas interindividuais que ocorre a atividade humana e eacute no acircmbito
dessas relaccedilotildees que surgem os signos sinais e siacutembolos sejam eles linguiacutesticos ou
natildeo como instrumentos ou ferramentas que possibilitam futuras interaccedilotildees
Segundo Smolka (1989) a atividade de leitura natildeo se reduz ao conjunto de
atividades das habilidades decodificadoras frente a um texto Ultrapassa-as como
expressatildeo de uma forma de uso da linguagem que sofre transformaccedilotildees no
decorrer da Histoacuteria e que marca o indiviacuteduo configurando suas relaccedilotildees sociais
Podemos ainda como nos aponta Larrosa (2002 a p133) pensar na leitura
ldquocomo algo que nos forma (ou nos trans-forma e nos de-forma) como algo que nos
constitui ou nos potildee em questatildeo naquilo que somosrdquo Olhar para a leitura e
compreendecirc-la como instrumentoprocesso formativo imprescindiacutevel para o ser
humano exige concebecirc-la como uma atividade que estaacute diretamente ligada agrave
subjetividade de quem a realiza isto eacute do leitor Poreacutem para que tal ocorra eacute
necessaacuterio que haja uma relaccedilatildeo iacutentima entre o texto e o leitor de modo que
possam acontecer nessa relaccedilatildeo mudanccedilas em sua subjetividade Portanto
reconhecer a leitura como uma atividade que vai aleacutem da decodificaccedilatildeo eacute entendecirc-la
como um meio eficaz para a aprendizagem e o desenvolvimento individual
Por essa perspectiva no momento em que eacute realizada uma leitura de um
texto literaacuterio ou natildeo e neste caso por exemplo uma ldquoleitura de mundordquo necessaacuterio
se torna que ocorram trocas algumas delas longamente negociadas entre o leitor e
o dito e o natildeo dito isto eacute tambeacutem do que foi silenciado pelo autor do texto
(LARROSA 2002 a) Trocas que implicam muitas das vezes natildeo em simples
informaccedilotildees que possam ser acumuladas mas em cotejamento de crenccedilas valores
e gostos Freire (1989) no livro A importacircncia do ato de ler ensina
[] o ato de ler que natildeo se esgota na decodificaccedilatildeo pura da palavra escrita ou da linguagem escrita mas que se antecipa e se alonga na inteligecircncia do mundo A leitura do mundo precede a leitura da palavra daiacute que a posterior leitura desta natildeo possa prescindir da continuidade da leitura daquele Linguagem e realidade se prendem dinamicamente A compreensatildeo do texto a ser
25
alcanccedilada por sua leitura criacutetica implica a percepccedilatildeo das relaccedilotildees entre o texto e o contexto (FREIRE 1989 p 9)
Os humanos estatildeo o tempo todo fazendo leituras e ao lerem leem o mundo
como este lhes ensinou a ler Leem palavras sons imagens e neste misto de textos
e leituras podem refletir sobre suas accedilotildees e sobre o mundo que estaacute em seu
entorno A leitura mais completa eacute aquela na qual se utilizam todos os sentidos e
natildeo somente a razatildeo eacute feita natildeo apenas com o olhar mas com os sentidos com o
pensamento com um olhar criacutetico para o que se vecircouvesente Como assegura
Rezende (2007)
[] haacute que se ler diferentes coacutedigos pois as vaacuterias leituras complementam-se interligam-se permitem ao leitor novas tessituras que nunca satildeo absolutamente novas Do que lemos sempre sabemos algo o que fazemos eacute complementar reolhar redescobrir acrescentar duvidar confirmar [] (REZENDE 2007 p6)
A leitura permite integrar o que se lecirc ao Eu agraves experiecircncias jaacute vividas instiga
o leitor a expressar sua visatildeo de mundo a partir do que ele concebe e de si mesmo
Sendo assim o ato de ler deve ser considerado um processo interativo no sentido
de que os diversos conhecimentos do leitor interagem a todo o momento com os
oferecidos pelo texto eou contexto Esse tipo de leitura que defendemos propicia ao
leitor que se acerque de outros modos de perceber argumentar e refletir de ser e
de agir que natildeo sejam os seus Sobre a interaccedilatildeo entre o sujeito (leitor) e o objeto
(texto) oportunizada pela realizaccedilatildeo da leitura Foucambert (1994) pondera
[] ler eacute questionar o mundo e ser por ele questionado eacute questionar-se a si mesmo Ler significa tambeacutem construir uma resposta que integra parte das novas informaccedilotildees ao que jaacute se eacute significa tambeacutem ter condiccedilotildees de questionar o texto escrito e de construir um juiacutezo sobre ele (FOUCAMBERT 1994 p5)
Ao realizar uma leitura o leitor pode mergulhar na obra e emergir a partir dela
quando esta o move e o incita a questionar e a interagir (seus conhecimentos
valores crenccedilas atitudes o que lecirc) Em assim sendo pode entatildeo construir um
novo olhar sobre o mundo A partir do momento em que o indiviacuteduo realiza esse tipo
26
de leitura de um texto ele enquanto leitor eacute levado a pensar refletir interrogar e
interpretar sobre aquilo que o texto estaacute lhe dizendo Haacute uma interpelaccedilatildeo do texto
sobre o leitor que o coloca em questatildeo tirando-o de si mesmo e ocasionalmente o
transforma Bourdieu (2001) para sublinhar a importacircncia da leitura de um livro
afirma ldquo[] pode-se transformar a visatildeo do mundo social e atraveacutes da visatildeo de
mundo transformar o proacuteprio mundo socialrdquo
O leitor por sua vez deixa e imprime suas marcas e suas experiecircncias
no texto que lecirc Como salienta Kanaan (2002) o leitor diante de um texto faz-se
interlocutor porque aleacutem de seguir as pistas fornecidas pelo autor do texto lanccedila
tantas outras contribuindo assim para um dos sentidos possiacuteveis do texto Isso
porque ldquosujeitos e textos satildeo afetados (e transformados) reciprocamente pelo ato da
leiturardquo ( KANAAN 2002 p132)
Smith (1999) assinala ainda para a importacircncia de olharmos a leitura como
algo a mais do que eacute usual inclusive em contexto escolares Neste caso ela natildeo
pode se restringir apenas ao campo visual ao simples reconhecimento dos coacutedigos
mas deveraacute conferir significaccedilatildeo a eles e relacionaacute-los com todos os conhecimentos
preacutevios soacute assim haveraacute uma compreensatildeo real da leitura Para tanto Smith (1999)
faz a seguinte afirmativa
Para compreender a leitura [] devem considerar natildeo somente os olhos mas tambeacutem os mecanismos da memoacuteria e da atenccedilatildeo a ansiedade a capacidade de correr riscos a natureza e os usos da linguagem a compreensatildeo da fala as relaccedilotildees interpessoais as diferenccedilas socioculturais aprendizagem em geral e a aprendizagem das crianccedilas pequenas em particular (SMITH 1999 p 9)
Natildeo podemos descartar em geral a importacircncia que os olhos tecircm na leitura
uma vez que eacute atraveacutes deles que a maioria dos dados chegam ao ceacuterebro isto eacute
fornecem a ldquoinformaccedilatildeo visualrdquo Esses dados poreacutem natildeo satildeo o bastante para que
haja leitura Outras informaccedilotildees satildeo necessaacuterias como o conhecimento da liacutengua
em que foi escrito o texto e da sua estrutura conhecimento sobre o assunto ou
seja o conhecimento preacutevio Enquanto o ceacuterebro vecirc isto eacute recebe as informaccedilotildees e
as vai associando e organizando com os conhecimentos preexistentes os olhos
somente recebem e por suas terminaccedilotildees nervosas transmitem as informaccedilotildees
27
Como disse Vieira (2009 p2) ldquoeacute no ceacuterebro que estaacute o mundo intrincadamente
organizado e internamente consistente construiacutedo como o resultado da experiecircncia
e da cultura vivida pelo ser humanordquo
Como vimos argumentando a formaccedilatildeo por meio da leitura soacute eacute possiacutevel
atraveacutes da experiecircncia isto eacute pelo ldquosaber da experiecircnciardquo como aponta Larrosa
(2002) Este autor define experiecircncia como sendo algo que nos passa e natildeo o que
se passa que nos acontece e natildeo o que acontece que nos toca e natildeo o que toca
Podemos concluir que no dia a dia muitas coisas se passam poreacutem poucas coisas
nos acontecem Recebemos muita informaccedilatildeo mas raramente permitimos que elas
nos modifiquem
Ao empregar o termo ldquosaber da experiecircnciardquo Larrosa (2002) refere-se ao
saber no sentido de rdquosabedoriardquo e natildeo no sentido de ldquoestar informadordquo O saber da
experiecircncia natildeo estaacute fora do sujeito como estaacute por exemplo o conhecimento
cientiacutefico O saber da experiecircncia eacute idiossincraacutetico e subjetivo ligado ao soacutecio-
individual e particular
O homem moderno estaacute cada vez mais distante de seus saberes da
experiecircncia pois poucas vezes o individuo os percebe e os conhece A falta de
tempo no mundo moderno pode justificar em parte o distanciamento entre sujeito e
a sua experiecircncia Com relaccedilatildeo ao mundo moderno Larrosa (2002) assinala
A velocidade com que nos satildeo dados os acontecimentos e a obsessatildeo pela novidade pelo novo que caracteriza o mundo moderno impedem a conexatildeo significativa entre acontecimentos Impedem tambeacutem a memoacuteria jaacute que cada acontecimento eacute imediatamente substituiacutedo por outro que igualmente nos excita por um momento mas sem deixar qualquer vestiacutegio (LARROSA 2002 p23 Grifos nossos)
Sabemos que a conexatildeo entre sujeito e o ldquosaberrdquo da sua experiecircncia eacute
necessaacuteria agrave formaccedilatildeo individual por exemplo do aluno mas a velocidade dos
acontecimentos e o que ela provoca - a falta de silecircncio de memoacuteria e a insatisfaccedilatildeo
- satildeo obstaacuteculos para que ocorra essa conexatildeo
Em face disso algumas questotildees nos inquietaram quando da proposiccedilatildeo
deste trabalho quais as consequecircncias de nossos alunos serem formados apenas
28
por informaccedilotildees e natildeo pelo efeito do conjunto delas com os saberes da sua
experiecircncia Quais atividades poderiam ser desenvolvidas De que modo e como
para que os saberes da experiecircncia marcassem os saberes informacionais que
receberiam na escola A contaccedilatildeo de histoacuterias poderia ser uma dessas atividades
A contaccedilatildeo de histoacuteria no contexto escolar eacute um dos recursos que o professor
tem disponiacutevel para fazer com que seus alunos submerjam no mundo da leitura E
quando tal acontece poderatildeo experienciar novos saberes pois as experiecircncias
vividas e sentidas pelo leitor natildeo se encerram ao final da histoacuteria Elas ficam laacute
ldquovolteando pelos meandros do ser humanordquo (SISTO 2005 p70)
Ao entrar em contado com outros saberes o aluno passa a adquiri-los como
se nascessem do rejuvenescimento dos saberes anteriores Haacute um movimento
ciacuteclico no que diz respeito agrave apropriaccedilatildeo de conhecimentos visto que esses nascem
e se renovam a todo instante A leitura eacute um processo que propicia movimento
fazendo com que os velhos saberes sejam aperfeiccediloados pelo ldquosaber da
experiecircnciardquo
No caso da experiecircncia da contaccedilatildeo de histoacuteria as palavras proferidas pelo
contador satildeo como linhas desenhadas pelo ar Enquanto o contador liberta as
palavras presas no texto o ouvinte leitor indireto do texto narrado vai criando e
interpretando os desenhos adentrando-se em um mundo maacutegico e tornando-se co-
autor da histoacuteria Como salienta Sisto (2005 p20) ldquoo que vale mais eacute sentir a
liberdade de ser co-autor da histoacuteria narrada e poder receber a experiecircncia viva e
criada na imaginaccedilatildeo o cenaacuterio as roupas as caras dos personagens []rdquo
Abramovich (1997 p 17) posiciona-se em relaccedilatildeo agrave leitura que acontece por
meio da contaccedilatildeo indicando que esta permite ao aluno sentir emoccedilotildees importantes
com os personagens bem como conhecer e descobrir novos lugares e outros
tempos que natildeo satildeo os seus Isso por que a contaccedilatildeo conduz os ouvintes por
exemplo os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta levando-os a pensar
e a verem com os olhos da imaginaccedilatildeo
Mas por que a contaccedilatildeo de histoacuterias natildeo eacute tatildeo frequente em nossas salas de
aula
29
Como veremos na proacutexima seccedilatildeo a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma arte milenar
que evoluiu e pode ser utilizada como uma estrateacutegia eficiente para a formaccedilatildeo de
leitores
12 Contadores de Histoacuterias uma Arte Milenar Perpetuada no Tempo
O contador de histoacuterias
Eacute aquele que te leva Aos lugares mais distantes Instiga a tua curiosidade Traz agrave tona teus medos
Liberta teus sonhos
Patriacutecia Rocha
A arte de narrar histoacuterias encontra suas raiacutezes nos povos ancestrais que
contavam e encenavam histoacuterias para difundirem seus rituais os mitos os
conhecimentos acerca do mundo sobrenatural ou natildeo e sobre as experiecircncias
adquiridas pelo grupo ao longo do tempo Aleacutem da comunicaccedilatildeo oral e gestual ao
narrarem suas histoacuterias tambeacutem registravam nas paredes das cavernas com
desenhos e pinturas suas experiecircncias algumas delas vividas no cotidiano A
memoacuteria auditiva e a visual eram entatildeo essenciais para a aquisiccedilatildeo e o
armazenamento dos conhecimentos transmitidos Campbell (2005) ponderou acerca
dessas praacuteticas dizendo que elas serviam como meio de sintonizar o sistema
mental com o sistema corporal levando essas populaccedilotildees a viver e a sobreviver
aleacutem de servirem para justificar e interpretar fenocircmenos naturais que vivenciavam
Desde haacute muito a transmissatildeo oral passada de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo foi uma
das soluccedilotildees encontradas pelas comunidades que natildeo possuiacuteam a escrita para
informar agraves geraccedilotildees mais novas os seus saberes valores e crenccedilas Por
conseguinte aqueles saberes considerados imprescindiacuteveis para a sobrevivecircncia
individual e grupal
30
Os contadores eram figuras de destaque na comunidade por serem os que
sabiam apresentar conselhos fundamentados em fatos histoacuterias e mitos mantendo
viva enfim a heranccedila cultural pela memoacuteria do grupo Os contadores retiravam de
suas vivecircncias e dos saberes delas obtidos o que contar Em assim sendo narrar
dependia de eles colherem os saberes da experiecircncia e de produzi-los em objetos
(visuais auditivos etc) para serem apresentados a outros
Para Benjamin (1994) os camponeses sedentaacuterios e os navegantes eou
comerciantes foram os principais responsaacuteveis pela preservaccedilatildeo dessas histoacuterias e
dessa arte Os camponeses fixos em suas terras conheciam intimamente as
histoacuterias do lugar onde moravam e os navegantes eou comerciantes por trazerem
conhecimentos de terras longiacutenquas Os encontros entre narrador (camponeses
navegantes eou comerciantes) e ouvintes (comunidade) criaram um espaccedilo tiacutepico
que Benjamin (1994) denominou de comunidade de ouvintes Eram momentos em
que a comunidade geralmente distribuiacuteda em semiciacuterculos sentava-se agrave volta da
fogueira para ouvir e trocar conhecimentos Um momento performaacutetico acontecia
quando os contadores narravam suas histoacuterias Histoacuterias cheias de ensinamentos e
conhecimentos que geravam nos ouvintes a curiosidade e por vezes o conforto a
reflexatildeo e a transformaccedilatildeo
Os contadores ritualizavam haacutebitos e costumes de uma comunidade muitos
deles com o intuito de constituir uma base ldquoidentitaacuteriardquo ou seja compor a
subjetividade desse grupo Esta praacutetica sustentava o equiliacutebrio do grupo evitando
assim sua desagregaccedilatildeo Portanto desde entatildeo em sua accedilatildeo o contador fazia o
que Patrini (2005) nos dias de hoje recomenda para os novos contadores ldquoconvocar
imagens e ideias de sua lembranccedila misturando-as agraves convenccedilotildees contextuais e
verbais de seu grupo para adaptaacute-las segundo o ponto de vista cultural e ideoloacutegico
de sua comunidaderdquo (PATRINI 2005 p106)
Na Europa segundo Warner (1999) a figura do contador de histoacuteria esteve
sempre ligada agraves mulheres que durante seus trabalhos domeacutesticos ldquoteciamrdquo suas
histoacuterias momentos onde podiam falar e transmitir sua sabedoria jaacute que natildeo lhes
era permitida a participaccedilatildeo na vida social e poliacutetica mais ampla
Por muito tempo o exerciacutecio de contar histoacuterias foi uma praacutetica domeacutestica
quase sempre presente no meio rural sendo abandonada paulatinamente com a
31
urbanizaccedilatildeo e o surgimento de novas tecnologias Com o desenvolvimento
tecnoloacutegico e o surgimento de novas miacutedias como a televisatildeo o cinema e a internet
essa arte foi praticamente banida dos encontros sociais Isso porque segundo
Donato (2005) com o advento da imprensa os livros e jornais tornaram-se os
grandes agentes culturais dos povos Os contadores especialmente os que
narravam oralmente passaram a ser esquecidos embora muitas das histoacuterias que
sustentavam sua praacutetica ainda permaneccedilam em cada cultura por exemplo sobre a
modalidade escrita
Essa nova forma de vida social na qual essas tecnologias comeccedilaram a se
tornar comuns influenciou fortemente a arte do contador tradicional Mas mesmo
assim em ldquouma sociedade que se organiza segundo as teacutecnicas de uma
industrializaccedilatildeo sofisticada e de um olhar social cuja solidatildeo e individualismo satildeo
seu tema principalrdquo (PATRINI 2005 p96) precisa da presenccedila de contadores e de
sua atuaccedilatildeo para suplantar os problemas advindos desse modo de organizaccedilatildeo e de
vida
Benjamin (1994) pondera que devido agrave individualizaccedilatildeo que se manifesta nas
sociedades modernas e agrave extrema importacircncia atribuiacuteda por seus membros agraves
informaccedilotildees ciberneacuteticas estas sociedades estatildeo perdendo os momentos de
familiaridade e intimidade que o universo das histoacuterias possibilita Hoje a
superficialidade das relaccedilotildees sociais faz com que as experiecircncias de compartilha
deixem de existir
Em meados do seacutec XX os contadores de histoacuterias apoacutes terem quase
submergido em consequecircncia do surgimento das novas miacutedias ressurgem como
fenocircmeno urbano dando origem ao que hoje se conhece como novos contadores
ou contadores urbanos Com o surgimento dos contadores urbanos a arte de contar
histoacuterias passou a ser reconhecida tambeacutem no campo pedagoacutegico Esses novos
contadores jaacute natildeo realizam apenas a transmissatildeo oral do que vivenciaram mas isso
sim a transmissatildeo oral de histoacuterias de outros autores e impressas Suas
performances hoje deixam de ser narrativas de experiecircncias por eles vivenciadas
e dos contadores de histoacuterias hoje eacute exigido o domiacutenio de outras teacutecnicas para que
possam (re)contar as histoacuterias narradas por outros algumas impressas outras
disponiacuteveis em espaccedilos da Web
32
No Brasil por volta dos anos 80 bibliotecaacuterios e estudantes da aacuterea de
Educaccedilatildeo desenvolveram um projeto intitulado ldquoHora do contordquo (PATRINI 2005)
tendo por objetivo aproximar o aluno do livro Entre as decorrecircncias da execuccedilatildeo
desse projeto registra-se o surgimento de professores-contadores que em sua sala
de aula ou ateacute mesmo na biblioteca da escola exerciam a contaccedilatildeo com o intuito
de desenvolverem o gosto pela leitura e os ensinamentos da leitura e da escrita
No entanto natildeo havia programas nem consciecircncia por uma grande parte dos
professores da necessidade de adquirem habilidades para contar as histoacuterias de
modo a que proporcionassem aleacutem do prazer e do lazer possibilitado pela sua
escuta o compartilhamento das emoccedilotildees e das vivecircncias Possivelmente porque
esse trabalho de contar histoacuterias estava frequentemente vinculado a preocupaccedilotildees
pedagoacutegicas como as relacionadas agrave aquisiccedilatildeo da leitura e da escrita
Nos anos 90 surgiram novas experiecircncias no campo das praacuteticas orais em
especial relacionadas agrave arte de contar Vaacuterios projetos relevantes foram e vecircm
sendo desenvolvidos oportunizando cursos de formaccedilatildeo e congressos voltados
para esta arte como no caso da FNLIJ - Fundaccedilatildeo Nacional e do Livro Infantil e
Juvenil que promove todo o ano o Salatildeo FNLIJ do Livro Um evento de caraacuteter
institucional onde todas as atenccedilotildees satildeo centradas no livro para crianccedilas e jovens
seus autores e editores e na leitura literaacuteria pois a FNLIJ acredita que a formaccedilatildeo
de leitores se constroacutei pela praacutetica da leitura literaacuteria e por ser ela que consolida a
base humanista dos profissionais de qualquer aacuterea
O Programa Proacute-Leitura de formaccedilatildeo continuada foi criado a partir de uma
iniciativa do SEFMEC - Secretaria da Educaccedilatildeo dos Estados Universidades e
Embaixadas da Franccedila em 1992 (MARINHO 2004) Ele oferece ao professor a
oportunidade de discussatildeo teoacuterica e de ampliaccedilatildeo do seu repertorio de vivecircncias de
leitura atraveacutes de cursos oficinas congressos entre outros e vaacuterios projetos de
incentivo agrave leitura
Preocupado com o deacuteficit educacional e inconformado com o slogan
Brasileiro natildeo gosta de ler o escritor Laeacute de Souza2 vem propondo desde 1998
2 Laeacute de Souza eacute cronista poeta articulista dramaturgo palestrante e produtor cultural jaacute
ministrou palestras em mais de 300 escolas de todo o Brasil cujo foco eacute o incentivo agrave leitura A
33
projetos de leitura com o objetivo de gerar alternativas que favoreccedilam e criem o
haacutebito da leitura Dentre os seus projetos temos Encontro com o Escritor Ler Eacute
Bom Experimente Lendo na Escola Minha Escola Lecirc Viajando na Leitura
Leitura no Parque Dose de Leitura Caravana da Leiturardquo ldquoLivro na Cestardquo
Minha Cidade Lecirc Dia do Livro e Leitura natildeo tem idaderdquo
Com o passar dos anos verificamos a existecircncia de diversas pesquisas
desenvolvidas nos campos das narrativas orais e da literatura Por exemplo Paz
(2007) que em sua pesquisa intitulada Oralidade na Escola e Formaccedilatildeo de Leitor
enfatiza o valor da contaccedilatildeo de histoacuteria e a necessidade do resgate da literatura oral
nas praacuteticas pedagoacutegicas Essa pesquisa de cunho quantitativo foi realizada junto a
alunos da 2ordf 5ordf e 7ordf seacuteries do Ensino Fundamental onde Paz (2007) analisou o
haacutebito e a preferecircncia para ouvir histoacuteria O autor constatou que ldquoo gosto por ouvir
histoacuterias na escola eacute constante e inversamente proporcional agrave escolaridaderdquo (PAZ
2007 p16) Verificou que aproximadamente 90 dos alunos das seacuteries iniciais ou
seja os alunos da 2ordf seacuterie gostam de ouvir histoacuteria enquanto nas outras seacuteries o
percentual sofreu um decliacutenio como identificou junto aos da 7ordf seacuterie entre os quais
esse percentual baixou para 50 Registrou ainda que cerca de 80 dos alunos
da 2ordf seacuterie entendem melhor as histoacuterias contadas pela professora do que quando
leem sozinhos 100 deles interessam-se em buscar outras histoacuterias do mesmo tipo
das contadas pela professora efetivando entatildeo a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuterias na formaccedilatildeo de novos leitores
Salienta-se contudo que as primeiras obras literaacuterias destinadas ao puacuteblico
infanto-juvenil surgiram no seacuteculo XVIII quando a crianccedila deixou de ser vista como
um adulto em miniatura e passou a ser considerada diferente do adulto com
necessidades e caracteriacutesticas proacuteprias Como nos diz Zilberman (1987 p13)
[] a concepccedilatildeo de uma faixa etaacuteria diferenciada com interesses proacuteprios e necessitando de uma formaccedilatildeo especiacutefica soacute acontece em meio agrave Idade Moderna Esta mudanccedila se deveu a outro acontecimento da eacutepoca a emergecircncia de uma nova noccedilatildeo de famiacutelia centrada natildeo mais em amplas relaccedilotildees de parentesco mas num nuacutecleo unicelular preocupado em manter sua privacidade
importacircncia da Leitura no Desenvolvimento do Ser Humano dirigida a estudantes e Como formar leitores voltada para professores satildeo alguns dos temas abordados nessas palestras
34
(impedindo a intervenccedilatildeo dos parentes em seus negoacutecios internos) e estimular o afeto entre seus membros
Inicialmente essas produccedilotildees literaacuterias foram dedicadas agrave disciplina dos
pequenos leitores ou seja fundamentalmente dotadas de caraacuteter extremamente
utilitaacuterio e pedagoacutegico Segundo Lajolo e Zilberman (1999 p 23) era uma literatura
que buscava ldquoo controle do desenvolvimento intelectual da crianccedila e a manipulaccedilatildeo
de suas emoccedilotildeesrdquo Para essas autoras tal literatura vinha ao encontro das ideologias
de uma classe burguesa que desejava atraveacutes da escola e dos livros induzir os
alunos pensarem segundo suas concepccedilotildees Assim reproduziam em seus leitores
ideacuteias como obediecircncia serviccedilo e submissatildeo
Hoje a literatura Infanto-Juvenil continua sendo um meio para um fim mas os
tempos satildeo outros Escrever obras literaacuterias para crianccedilas e jovens tornou-se praacutetica
interessante uma vez que o investimento por parte da Induacutestria Cultural tem
crescido nesta aacuterea Segundo Barretos Gonsalves Silva Morelli (2004 p176) ldquoo
texto literaacuterio que interessa para o mercado deve apresentar diversas interpretaccedilotildees
da realidade capazes de ir muito aleacutem dos limites do cotidiano e da visatildeo comum
criando simulacros do mundo naturalrdquo Por conseguinte essas obras ganham novas
dimensotildees tanto no aspecto quantitativo quanto no qualitativo Assim sendo eacute
indispensaacutevel ao profissional da aacuterea de ensino saber analisar criteriosamente as
obras que recomenda a seus alunos eou utiliza em sala de aula
A arte de contar histoacuterias passa a ser reconhecida como praacutetica oral de um
patrimocircnio cultural capaz de proporcionar prazer e lazer o Projeto Entorno
desenvolvido desde 2006 pela Editora Abril e pela Fundaccedilatildeo Victor Civita eacute um
exemplo disso Realizado em escolas estaduais e municipais o projeto eacute um
conjunto de accedilotildees de apoio agrave leitura por prazer em parceria com as secretarias
municipais e estaduais de Educaccedilatildeo promovendo accedilotildees culturais e educacionais de
estiacutemulo agrave leitura aleacutem da ampliaccedilatildeo do acervo das unidades escolares
Haacute quem ainda contemple a contaccedilatildeo de histoacuterias como um recurso para
solucionar problemas em relaccedilatildeo agrave escrita e agrave leitura Um exemplo disso eacute a
pesquisa desenvolvida por Allebrandt et al (1999) que investiga o papel da literatura
infantil enquanto recurso metodoloacutegico e o seu papel nos processos de ensino e
aprendizagem averiguando a articulaccedilatildeo entre as diversas habilidades que
35
envolvem a linguagem literatura fala leitura escrita gramaacutetica e escuta Os
resultados da pesquisa indicam que o trabalho com a literatura infantil aleacutem de
desenvolver o imaginaacuterio possibilita a ampliaccedilatildeo do conceito de texto e o
conhecimento de tipologias textuais bem como de aspectos externosformais
gramaacuteticas e relaccedilotildees de textualidade
Existem muitas estrateacutegias individuais e coletivas no trabalho com a
literatura no entanto o uso desse recurso deve possibilitar atividades que envolvam
a participaccedilatildeo o movimento a muacutesica o riso o luacutedico e a atribuiccedilatildeo de novos
sentidos evitando-se que textos literaacuterios sejam usados como instrumentos para
introduzir exerciacutecios (cansativos e mecacircnicos) ou mesmo como moralizadores
A pesquisa desenvolvida por Silva e Monteiro (2007) intitulada Contaccedilatildeo de
histoacuteria a importacircncia do papel das narrativas luacutedicas no ensino-aprendizagem
focaliza a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma estrateacutegia para expandir o universo social
e cultural dos alunos frente agrave exposiccedilatildeo de diversos textos Esses autores
concluiacuteram que adolescentes e preacute-adolescentes quando expostos com
regularidade agrave literatura de uma forma luacutedica de modo geral melhoram inclusive
em seu desempenho escolar
121 A arte de narrar O papel do novo contador na contemporaneidade
Os contadores de histoacuteria os cantadores de histoacuteria soacute podem contar enquanto a neve cai
A tradiccedilatildeo manda que seja assim Os iacutendios do norte da Ameacuterica tecircm muito cuidado
com essa questatildeo dos contos Dizem que quando os contos soam
as plantas natildeo se preocupam em crescer e os paacutessaros esquecem a comida de seus filhotes
E Galeano
Em meados do seacuteculo XX poacutes Revoluccedilatildeo Industrial surge nos paiacuteses
industrializados da Ameacuterica e tambeacutem na Franccedila uma nova figura de contadores
36
que podemos chamaacute-los de contadores urbanos ou ateacute mesmo contemporacircneos os
quais fizeram ressurgir a praacutetica do (re)conto Com um novo perfil do contador que
difere dos contadores tradicionais porque segundo Ong (1998) lidam com uma
mateacuteria oral secundaacuteria ou seja com a escrita enquanto os tradicionais usavam a
linguagem oral primaacuteria
Proferem frequentemente palavras a partir das registradas nas produccedilotildees da
literatura arquivadas nas bibliotecas por deacutecadas Esses contadores raramente
utilizam em seu repertoacuterio narrativas orais primaacuterias ou seja aquelas utilizadas
pelos contadores tradicionais Portanto parece correto afirmar que o surgimento
desses novos contadores e o ressurgimento do reconto ocorreram no interior de
espaccedilos quase que sagrados da escrita isto eacute nas bibliotecas A possibilidade
decorreu da cultura escrita que passou a resgatar a riqueza das culturas orais
Produccedilotildees de escritores3 que se mantiveram atentos agraves narrativas das geraccedilotildees
precedentes
Coentro (2008) destaca algumas das diferenccedilas entre os contadores
tradicionais e esses novos contadores Menciona entre outras as relativas ao grau
de escolaridade agrave forma como entram em contato com a histoacuteria aos locais onde
realizam sua performance4 e ao puacuteblico alvo de cada tipo de contadores Apesar de
estes novos contadores terem buscado uma aproximaccedilatildeo eou um resgate dos
contadores tradicionais este resgate estaacute estritamente relacionado agrave memoacuteria e
performance (ZUMTHOR 1993)
Patrini (2005) em seu livro A Renovaccedilatildeo do conto emergecircncia de uma
praacutetica oral apresenta a concepccedilatildeo de alguns contadores franceses e de outros
paiacuteses quanto ao perfil dos novos contadores de histoacuterias Dentre eles cita Bernard
Fabre Bruno de La Salle Fiona Macheod Catherine Zarcate Annie Kiss Michel
Hindeacutenoch Pepito Mateacuteo
3 Por volta do seacutec XV e XVI surgiram vaacuterios escritores preocupados em recuperar as culturas orais ou seja em registrar as faacutebulas e os contos que ateacute entatildeo eram transmitidos oralmente Destacam-se dentre eles Perrault e os Irmatildeos Grimm 4 Termo utilizado por Zumthor (1993) especialista na literatura oral medieval para caracterizar a atuaccedilatildeo dos trovadores e menestreacuteis
37
Hindeacutenoch (apud PATRINI 2005) caracteriza a contaccedilatildeo como uma arte
testemunhal O contador pode ser uma testemunha de algo que estaacute por acontecer
relatando os fatos de maneira proacutepria e pessoal
O contador eacute uma testemunha para mim de algo que vai acontecer Eacute um jogo que eacute preciso aceitar Aceitar nos deixar levar pela mentira A arte do contador consiste antes de tudo em produzir uma versatildeo pessoal dos fatos que ele conta eacute uma arte testemunhal (HINDEacuteNOCH apud PATRINI 2005 p 75)
Podemos entretanto ampliar a definiccedilatildeo proposta por Hindeacutenoch
apropriando-nos do pensamento das contadoras Macleod e Zarcate (apud PATRINI
2005 p74) Estas proferem que o contador aleacutem de ser testemunha de fatos precisa
testemunhar o seu tempo entrando em contato com sua eacutepoca e o mundo em que
vive buscando refletir experimentar e testemunhar construindo assim sua
subjetividade e ampliando sua visatildeo de mundo
Hoje em dia os contadores de histoacuteria devem estar prontos para enfrentar
diversas situaccedilotildees adaptando-se agraves mudanccedilas radicais que o mundo apresenta
Mudanccedilas natildeo soacute na maneira de pensar mas nos modos pelos quais o mundo eacute
percebido Presente numa modernidade radicalizada a arte de narrar sofre os
efeitos dessa radicalidade e o novo contador reconhece a instabilidade Para
complementar a caracterizaccedilatildeo desse novo contador apresentamos a palavra de
Mateacuteo
Eacute algueacutem que atua na praacutetica da narraccedilatildeo o que natildeo significa atuar especialmente em uma praacutetica artiacutestica que supotildee forccedilosamente a representaccedilatildeo O contador pode se adaptar a diferentes espaccedilos diferentes atividades diferentes experiecircncias para recontar uma histoacuteria (MATEacuteO apud PATRINI 2005 p76)
As palavras desse autor permitem definir o perfil do novo contador como
daquele que aleacutem de adaptar-se a diferentes experiecircncias e espaccedilos para transpor
de forma oral o texto escrito necessita de algumas outras habilidades Entre elas as
de poder analisar os mecanismos que entram em jogo na hora de compartilhar a
histoacuteria com a sua audiecircncia de modo a que apresente uma performance adequada
38
A performance do contador entendida enquanto fator constitutivo da sua praacutetica eacute
crucial para a eficaacutecia da transmissatildeo do conto portanto eacute um aspecto importante a
ser levado em conta quando de sua narrativa
122 Contar e encantar a performance dos novos contadores
Como um colecionador que conhece a fundo cada peccedila de sua coleccedilatildeo o contador de histoacuterias haacute de reconhecer cada parte da
estrutura de uma histoacuteria que ele conta
Celso Sisto
Sabe-se que atualmente as fontes do contador satildeo na maioria das vezes
escritas fazendo-se necessaacuterio por parte desse contador uma leitura solitaacuteria antes
da transmissatildeo oral Uma das caracteriacutesticas principais de que o contador de histoacuteria
natildeo pode abrir matildeo eacute a da qualidade literaacuteria dos textos que escolhe para narrar Ele
precisa conhecer e investigar o que eacute produzido na aacuterea de literatura5 e possui uma
boa bagagem pessoal de leitura
Ao escolher a histoacuteria o contador deve levar em consideraccedilatildeo o seu puacuteblico
alvo para quem conta onde conta e o que conta A preparaccedilatildeo da histoacuteria comeccedila
com a escolha criteriosa e cuidadosa do texto pela leitura do dito e natildeo dito do
texto Uma leitura mais aprofundada do texto durante a preparaccedilatildeo do contador
permite-lhes uma visatildeo mais detalhada das entrelinhas e um envolvimento maior
com a escritura podendo assim realizar de maneira mais produtiva sua narraccedilatildeo
Sisto (2005) indica que a leitura das entrelinhas eacute indispensaacutevel para que o leitor no
caso o contador possa ultrapassar a superfiacutecie do texto e implicar-se na realizaccedilatildeo
de uma leitura de profundidade Eacute preciso entatildeo que ele natildeo esqueccedila que a leitura
eacute o exerciacutecio de um diaacutelogo Aleacutem disso o contador precisa apreciar a histoacuteria como
algueacutem aprecia uma obra de arte de modo a que essa apreciaccedilatildeo o desperte para a
sensibilidade e emoccedilotildees
5 A literatura no caso a infanto-juvenil visto que a pesquisa estaacute relacionada agrave formaccedilatildeo de
leitor do Ensino Fundamental I
39
Quando nos referimos agrave performance do novo contador ou do contador
contemporacircneo fazemos alusatildeo agrave maneira pela qual o texto eacute transmitido a seus
destinataacuterios Zumthor (1993 p 222) define a performance como sendo ldquoa accedilatildeo
vocal pela qual o texto poeacutetico eacute transmitido aos seus destinataacuterios Sua transmissatildeo
de boca a boca opera literalmente no texto ela o efetuardquo
O discurso dos novos contadores ou seja a forma com que narram suas
histoacuterias deve ser sempre performaacutetico Por isso os contadores passam a ser
atores de uma teatralidade viva Segundo Zumthor (1997) na performance aleacutem de
um saber-dizer e um saber-fazer o contador tem que saber-ser no tempo e no
espaccedilo e isso soacute lhe eacute possiacutevel atraveacutes da corporeidade O contador deve estar
inteiramente integrado ao texto que narra e por meio da sua performance fazer dizer
e ser a histoacuteria para seus ouvintes Nas palavras de Sisto (2005 p22) ldquoO contador
de histoacuteria natildeo pode ser nunca um repetidor mecacircnico do texto que ele escolhe
contarrdquo
Alguns aspectos essenciais precisam compor a performance do contador
como emoccedilatildeo texto adequaccedilatildeo corpo voz clima e memoacuteria (SISTO 2005) Aleacutem
de o contador ter que pesquisar estudar e treinar para a sua contaccedilatildeo ele precisa
apresentaacute-la com naturalidade A naturalidade implica em seguranccedila e simplicidade
no desempenho As artificialidades durante as falas e a atuaccedilatildeo implicam na
instabilidade do contador perante seu puacuteblico Sisto (2005 p22) garante que ldquoquem
conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre a histoacuteria e o ouvinte
oferecendo espaccedilo para o ouvinte se envolver e recriar
Os principais instrumentos do narrador satildeo sua voz e seu corpo para
transmitir as emoccedilotildees do enredo do texto A voz eacute um elemento natural desde
sempre separado da linguagem ela midiatiza a liacutengua (ZUMTHOR 2005) Diversos
sons satildeo possiacuteveis por meio da voz mesmo quando incompreensiacuteveis em uma
linguagem humana Para que houvesse uma comunicaccedilatildeo acessiacutevel entre os seres
humanos o homem se apropriou da voz para criar sua proacutepria linguagem por
exemplo para cada signo relacionou arbitrariamente um som diferente Tambeacutem
natildeo podemos pensar em uma linguagem que fosse somente escrita pois como
afirma Zumthor (2005 p63) ldquoa escrita se constitui numa liacutengua segunda os signos
graacuteficos remetem mais ou menos indiretamente agraves palavras vivasrdquo
40
A voz tem uma funccedilatildeo elocutoacuteria e durante uma contaccedilatildeo deve ser
modulada de acordo com o que estaacute se narrando Coelho (1986) assinala que
devemos levar em consideraccedilatildeo os seguintes aspectos intensidade clareza e
conhecimento A intensidade estaacute ligada ao timbre de voz Entonaccedilatildeo e ritmo
devem-se adequar agraves emoccedilotildees que o contador quer compartilhar e instigar em seus
ouvintes A clareza por seu lados diz respeito a uma boa dicccedilatildeo correccedilatildeo da
linguagem O conhecimento enfim depende do aprofundamento do contador no
campo da literatura que pretende trabalhar
Atentar para o ritmo da fala projetar a voz pronunciar as palavras com
clareza possiacutevel tornar expressivo o que se diz descobrir a musicalidade das
frases postar-se de forma correta fazer contato visual com o puacuteblico e confiar na
sua contaccedilatildeo satildeo elementos chaves que o contador de histoacuterias deve levar em
conta para produzir uma boa narraccedilatildeo (SISTO 2005)
O corpo tambeacutem assume um papel importante na transposiccedilatildeo do texto
impresso para a narraccedilatildeo oral O corpo fala por si soacute Os gestos devem ser
verdadeiros ou seja resultar de emoccedilotildees de fato vivenciadas Gestos comedidos
controlados geram cansaccedilo e incredibilidade no ouvinte perante aquilo que estaacute
sendo narrado
A integraccedilatildeo entre o texto narrado e a expressatildeo corporal permite ao
contador um resultado satisfatoacuterio em sua atuaccedilatildeo Cada gesto cada palavra
carrega em si e em seu conjunto a narrativa que o contador pretende transmitir
imprimindo assim ao ato de contar sentido e direccedilatildeo Segundo Zumthor (1993) a
performance desempenhada pelo contador deve ser o resultado da sua leitura e
estudo em profundidade da sua accedilatildeo possibilitando dessa forma que a histoacuteria que
conta seja a mais expressiva e plurissignificativa possiacutevel para seus ouvintes
Outro aspecto fundamental durante a performance do contador eacute o do seu
olhar Eacute ele que pode convidar o ouvinte a adentrar na histoacuteria O contador deve ter
um olhar triplicado pois ao mesmo tempo em que olha para a histoacuteria que estaacute
contando tem que voltar seu olhar para si e para seus ouvintes A sensibilidade do
olhar do contador mediaraacute o envolvimento de seus ouvintes com o texto que narra
Como demonstramos a interaccedilatildeo entre contador e puacuteblico difere um pouco
entre os contadores tradicionais e os contemporacircneos Enquanto as participaccedilotildees
41
do puacuteblico dos contadores tradicionais eram contingenciadas muitas vezes pela
hierarquia social o puacuteblico dos contadores contemporacircneos participa de um jogo
relacional no qual o contador manteacutem diaacutelogo aberto independente da origem social
do seu espectador
Nesta seccedilatildeo destacamos o papel da performance dos contadores
contemporacircneos apoacutes termos documentado a contaccedilatildeo de histoacuteria como uma arte
milenar (12) o papel do contador na contemporaneidade (121) poreacutem o
comportamento da audiecircncia tambeacutem eacute importante para a performance do contador
A proacutexima seccedilatildeo apresenta a escuta como traccedilo essencial desses ouvintes
13 Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escutar
O homem natildeo escuta porque tem ouvidos mas tem ouvidos porque ele eacute um ser cujo modo de realizaccedilatildeo
se daacute na escuta
Nancy Unger
Natildeo se encontra em nossos curriacuteculos escolares uma disciplina que trabalhe
e ensine o aprendizado da escuta pois eacute possiacutevel aprender de ouvido como profere
Larrosa (2004)
Mas afinal qual a aprendizagem eacute importante A auditiva que se daacute pelo
ouvir ou pelo escutar
Ao recorrermos agraves acepccedilotildees das palavras ouvir e escutar depararemos com
as seguintes definiccedilotildees proposta por Houaiss (2009)
Ouvir perceber (som palavra) pelo sentido da audiccedilatildeo
Escutar estar consciente do que estaacute ouvindo
Assim o escutar vai aleacutem do ouvir pois ao ouvirmos apenas respondemos
aos sons e quando escutamos aleacutem disso demonstramos ser capazes de
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compreender o que estamos ouvindo Pode-se dizer que ouvimos quando captamos
por meio do aparelho auditivo sons de fontes externas ou por noacutes produzidos e
escutamos quando atribuiacutemos sentido a esses sons Por conseguinte eacute possiacutevel
ouvir sem escutar mas eacute impossiacutevel escutar sem ouvir
Ler com os ouvidos possibilita a quem o faz ser um leitor pelo exerciacutecio da
escuta Quando escuta pode produzir suas tessituras com os sentidos que constroacutei
a partir do texto que lhe eacute narrado por exemplo A diferenccedila entre ler vendo e ler
ouvindo ou melhor escutando se deve ao fato de que existem elementos da
linguagem oral que natildeo podem ser articulados pela liacutengua escrita como aqueles
relacionados agrave intensidade e frequecircncia que geram o ritmo a melodia o sussuro o
gemido dimensotildees imprescindiacuteveis para uma boa leitura oral As emoccedilotildees mais
intensas como as possibilitadas por um texto escrito ou oral estimulam o uso de
sons vocais mesmo que em intensidade imperceptiacutevel aos outros Reyzaacutebal (1999)
nos faz lembrar que eacute por meio da voz que identificamos uma pessoa seu sexo sua
idade e ateacute mesmo seu estado de humor ldquoA voz envolve o corpo por isso se fala
de beber as palavras engolir as palavrasrdquo (REYZAacuteBAL 1999 p 22) A voz de outro
estimula e pode seduzir e levar o ouvinte a se esquivar de alguma situaccedilatildeo
conforme o timbre e a ocasiatildeo em que ouccedila
Kanaan (2002) tece comentaacuterios sobre a origem etimoloacutegica do vocaacutebulo
ldquopalavrardquo que por sua pertinecircncia apresentamos a seguir Logos em grego λόγος
significava inicialmente palavra na modalidade escrita ou falada Mas a partir de
filoacutesofos gregos como Heraacuteclito6 a palavra passa a ter um conceito filosoacutefico
traduzido como razatildeo Para Heidegger esse mesmo logos sempre significou na
liacutengua grega o dito o pronunciado ndash como nome derivado do verbo leacutegein ldquodizer
falar contarrdquo que tambeacutem pode ser entendido como ldquopousar estender diante
recolherrdquo Portanto somos conduzidos a entender que o ldquologos eacute aquilo que
aparece se estende diante de noacutes e ao mesmo tempo recolherdquo(KANAAN 2002 p
141) Deste modo para se escutar o logos eacute preciso que nele estejam presentes
tanto o ldquopousarrdquo quanto o ldquorecolherrdquo (KANAAN 2002 p 141)
6 Heraacuteclito de Eacutefeso foi um filoacutesofo preacute-socraacutetico considerado o pai da dialeacutetica Inserido no
contexto preacute-socraacutetico parte do princiacutepio de que tudo eacute movimento e que nada pode permanecer estaacutetico - Panta rei ou tudo flui tudo se move exceto o proacuteprio movimento
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Conforme relata Pereira e Ribeiro (2010) Heidegger em 1951 pronunciou no
clube de Bremen uma conferecircncia intitulada Logos Nela Heidegger focalizou em
sua anaacutelise alguns dos 126 fragmentos de Heraacuteclito presentes na coletacircnea Diels-
Kranz7 em que comentou acerca do sentido da palavra logos No fragmento 34 o
discurso discorre acerca da escuta Heraacuteclito profere ldquoOuvindo descompassados
assemelham-se a surdos o ditado lhes concerne presentes estatildeo ausentesrdquo
Partindo do pensamento heideggeriano entendemos que o ldquoouvir descompassadordquo
seja o ldquoouvir sem compreensatildeo ouvir sem que o compreender seja exercidordquo
Podemos entatildeo dizer que escutar eacute ouvir compassadamente porque natildeo haacute escuta
sem compreensatildeo
A palavra dita nos atinge conforme a situaccedilatildeo e a sua intensidade e nos afeta
porque vem ao nosso encontro Natildeo eacute necessaacuterio que nos movimentemos ateacute ela
como acontece quando tomamos um texto impresso para ler
Larrosa (2004 p 38) define a palavra dita como ldquouma palavra natildeo fixa mas
fluida uma palavra que natildeo eacute lsquoem si e por sirsquo uma palavra que natildeo aparece na
forma lsquodo que foi ditorsquo mas na forma do [] ainda por dizer []rdquo Por isso
diferentemente da palavra escrita que se mostra soacutelida a palavra dita discorre com
fluidez eacute palavra viva animada que concede ao leitor ou ao ouvinte de uma
narrativa por exemplo navegar pelos interstiacutecios do devir ou do que se estaacute por
dizer
No caso da contaccedilatildeo de histoacuterias Kanaan (2002 p16) salienta que ldquopara
escutar o texto [] eacute necessaacuterio se colocar numa posiccedilatildeo particular a de uma
lsquodisposiccedilatildeorsquo em que afetado pela narrativa do outro pelo lsquotexto do outrorsquo eu
pudesse me colocar receptivo ao que este me comunicardquo E colocar se agrave
ldquodisposiccedilatildeordquo eacute situar-se em uma posiccedilatildeo intersubjetiva pois a escuta permite
(re)editar as marcas da subjetividade do contador e de si proacuteprio enquanto ouve Por
meio da escuta eacute possiacutevel ldquoreeditar experiecircncia criar novos sentidos reconstruir
histoacuterias com base na intersubjetividade que se estabelece entre leitor e textordquo
(KANAAN 2002 p 133)
7 Hermann Diels comeccedilou no final do seacuteculo XIX uma compilaccedilatildeo de testemunhos e
fragmentos dos preacute-socraacuteticos espalhados por diversas obras antigas publicando esse material Posteriormente Walther Kranz organizou novas ediccedilotildees dessa obra que passou a ser conhecida como Diels-Kranz
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Por sua vez Bajard (1994) quando analisa a importacircncia da escuta de um
texto afirma que o foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do texto ele passa a se
situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre uma pessoa que daacute voz
a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxerga (BAJARD 1994 p53)
Garcia Roza 1990 (apud KANAAN 2002 p 141) com relaccedilatildeo agrave escuta e ao
ouvir assegura que ldquoescutamos mais quando natildeo ouvimos tanto quando natildeo nos
colocamos como pura exterioridade em relaccedilatildeo ao que queremos escutarrdquo Portanto
natildeo basta estar de ouvidos atentos para escutar Impedimos a escuta se
mantivermos uma relaccedilatildeo de exterioridade diante do que eacute dito Esse autor ainda
ressalta que ldquoa atitude de escuta soacute se constitui se fizermos parte desse repousar e
recolher o Logosrdquo
Rubem Alves (2009) em seu texto intitulado Escutatoacuterio descreve que para
escutarmos eacute necessaacuterio tempo para apreender o que o outro falou porque soacute
assim podemos ponderar a fala do outro e ficamos cientes do que ouvimos Torna-
se imprescindiacutevel fazermos silecircncio dentro de noacutes para que passemos a escutar De
que adianta ouvir se os pensamentos vagam em direccedilatildeo ao que se iraacute dizer logo
apoacutes sem estar por completo no que se estaacute ouvindo A escuta cria fissuras
silenciosas entre uma palavra e outra Por conseguinte podemos afirmar que
escutar eacute ouvir por inteiro eacute calar a proacutepria voz e concentrar-se nas palavras que
satildeo proferidas por outrem
Ao escutar uma histoacuteria o aluno deve ldquodeixar-se colher e afetar pela fala do
outrordquo (FIGUEIREDO 1994 apud KANAAN 2002 p 145) E ao mesmo tempo em
que eacute colhido e afetado permitir-se acolher analisar avaliar o que lhe foi oferecido
por essas palavras A escuta de uma contaccedilatildeo de histoacuteria possibilita ao aluno entrar
em um mundo de seduccedilatildeo onde sua voz interior pode momentaneamente ser
silenciada para dar lugar a uma nova voz que adentra o seu iacutentimo pelo simples ato
de escutar
Apoacutes essas consideraccedilotildees sobre a importacircncia da escuta para a leitura da
palavra cabe destacar que a posiccedilatildeo de escuta natildeo se restringe agrave palavra oral Ela
eacute necessaacuteria independente do suporte do texto Na uacuteltima seccedilatildeo que compotildee este
capiacutetulo seratildeo analisados aspectos relativos agrave contaccedilatildeo de histoacuterias agrave formaccedilatildeo de
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leitores e agrave mediaccedilatildeo da leitura de textos escritos por parte dos contadores de
histoacuterias
131 O ato de contar e a constituiccedilatildeo de leitores
Ouvir eacute ver aquilo de que se fala falar eacute desenhar imagens visuais
C Stanislavski
O ato de contar histoacuteria pode ser dimensionado como exemplo de uma
atividade realizada a partir de outra produccedilatildeo pois todo o texto narrado tem algum
autor por mais que ele seja desconhecido O contador ao estar ciente disso faz com
que o texto inicial adquira uma forma peculiar de narraccedilatildeo A memorizaccedilatildeo pelo
menos de parte do texto eacute necessaacuteria e natildeo pode ser desconsiderada pelo contador
A reminiscecircncia musa da narrativa era e continua sendo a base da tradiccedilatildeo nessa
forma de transmissatildeo Como adverte Sisto (2005 p60) ldquodecorar muitas vezes
compromete a naturalidade da fala [] necessaacuteria sobretudo nos textos mais
poeacuteticosrdquo Com o tempo percebeu-se que ensaios seriam necessaacuterios para melhorar
a atuaccedilatildeo e a naturalidade na hora de transmitir o texto decorado E por mais que o
contador natildeo reproduza o texto exatamente como estaacute no papel eou como o autor o
produziu ele realiza uma atividade de memorizaccedilatildeo no momento em que relecirc o
texto e assinala palavras que serviratildeo de guia no decorrer do seu discurso para que
possa apresentar seu texto de modo ldquoimprovisadordquo O estudo do texto ldquoimprovisadordquo
gera um exerciacutecio mnemocircnico (PATRINI 2005)
Contador eacute aquele que produz o discurso narrativo ou seja eacute a voz que
propotildee inventa e instiga quem o ouve O termo contador na sua forma vernaacutecula
quer dizer narrador (HOUAISS 2009) aquele que administra a palavra pois se trata
de algueacutem que tem como funccedilatildeo em uma determinada ocasiatildeo contar a outros
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alguma coisa Para fazecirc-lo precisa atuar conduzindo detalhadamente a narrativa
dos fatos Eacute algueacutem que narra pelas palavras gestos e pelo contexto que cria
exercendo assim o poder de seduccedilatildeo Transportar o ouvinte a um mundo por vezes
dele desconhecido e a fatos alguns deles por ele percebidos como enigmas Um
bom contador de histoacuterias deve instigar em seus ouvintes a atenccedilatildeo a curiosidade
a que cotejem seus sentimentos e valores com os narrados pela histoacuteria bem como
a que compartilhem com os demais ouvintes suas reaccedilotildees e vivecircncias relacionadas
agrave histoacuteria aleacutem de instigaacute-los a imaginar criativamente a partir do narrado (SISTO
2005)
A arte de contar histoacuterias depende frequentemente do poder de seduccedilatildeo do
contador poder resultante das relaccedilotildees que ele ao contar faz com a vida dos seus
ouvintes e do modo como trabalha o objeto o texto narrado nem sempre de sua
autoria que deu suporte para a sua accedilatildeo Como ensina Patrini (2005 p105) ldquoo ato
de narrar significa tambeacutem o encontro com os misteacuterios que envolvem o homem e a
vida nos diversos momentos de sua existecircnciardquo
Benjamin (1994) assim define o narrador
[] figura entre os mestres e os saacutebios Ele sabe dar conselhos natildeo em alguns casos como o proveacuterbio mas para muitos casos como o saacutebio Pode recorrer ao acervo de toda uma vida [] Seu dom eacute poder contar sua vida sua dignidade eacute contaacute-la inteira O narrador eacute o homem que poderia deixar a luz tecircnue de sua narraccedilatildeo consumir a mecha de sua vida (BENJAMIN 1994 p221 Grifos nossos)
A figura do narrador pode ser percebida como a de um conselheiro que com
sua sabedoria orienta seus ouvintes Sabedoria esta adquirida natildeo apenas a partir
da proacutepria experiecircncia mas em grande parte pela empatia que sentiu quando
observou as experiecircncias alheias e as assimilou no seu iacutentimo
Benjamin (1994) explica que ldquo[] a arte de contar histoacuterias se perdeu porque
as pessoas perderam o dom de ouvir []rdquo Sabemos que o visual estaacute muito
presente na sociedade moderna e a intensidade e variedade das imagens nos
cativam fazem-nos esquecer da escuta Falamos e ouvimos muito poreacutem estamos
pouco propensos a escutar Entretanto vivemos num mundo onde as relaccedilotildees
interpessoais mais intensas se baseiam na escuta Pela velocidade e rapidez com
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que vivemos o dia a dia deixamos de nos perceber enquanto seres ldquoderdquo e ldquoemrdquo
relaccedilatildeo Por isso acreditamos que os indiviacuteduos precisam aprender a escutar
O trabalho com as narrativas orais isto eacute com a contaccedilatildeo de histoacuteria dentro
das instituiccedilotildees escolares seja em um momento de roda ou na Hora do Conto
frequentemente desenvolvido nas bibliotecas pode propiciar o (re)aprender a
escutar No momento em que o contador narra a histoacuteria ele cria uma conexatildeo entre
texto e ouvinte e este precisa se colocar com a disposiccedilatildeo de escuta Esta condiccedilatildeo
potencializadora de instigar o ouvinte para a escuta do narrado e de si mesmo
criada pelo contador pode ser propiacutecia para a constituiccedilatildeo de futuros leitores
apreciadores e criacuteticos Portanto resgatar a arte de contar histoacuterias aleacutem de
incentivar a escuta imprescindiacutevel para a boa convivecircncia social e para uma boa
leitura propicia a quem as escuta o (re) encontro como o novo Nesta situaccedilatildeo o
imaginaacuterio e a criatividade satildeo potencializados em um mesclar de realidade e magia
pois o ouvinte poderaacute ler como imagens a performance da fala do narrador Sob
essa perspectiva o modo como o contador conduz sua narrativa pode levar o
ouvinte a perceber que muitas dessas histoacuterias contadas estatildeo disponiacuteveis em
outros suportes de leitura que podem ser acessados independentemente por
exemplo em bibliotecas escolares e puacuteblicas
A mediaccedilatildeo entre o texto a ser lido e o sujeito leitor eacute um aspecto pouco
investigado no campo da Educaccedilatildeo Apesar de o professor ser o agente educativo
mais pesquisado (BRZEZINSKI 2009) porque eacute o mediador mais importante para o
educando e o responsaacutevel pela sua formaccedilatildeo pessoal e social dentro da escola
poucos tecircm sido os trabalhos de investigaccedilatildeo que tomam por foco o professor como
mediador da leitura (PULLIN PUumlSCHEL 2004)
Concordamos com Mellouki e Gauthier (2004) que por entenderem o
professor como o principal mediador e interprete criacutetico da cultura escolheram para
tiacutetulo de um de seus trabalhos ldquoO professor e seu mandato de mediador herdeiro
inteacuterprete e criacuteticordquo Nele analisam o papel do professor na escola concebida no
sentido amplo do termo como uma instituiccedilatildeo cultural No contexto escolar contudo
devemos levar em conta a presenccedila e o papel de outros mediadores da leitura
Dentre eles a famiacutelia os livros didaacuteticos as editoras os criacuteticos da literatura as
obras literaacuterias disponiacuteveis a contaccedilatildeo de histoacuterias Witter (1996) por exemplo em
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sua revisatildeo da literatura sobre a influecircncia de agentes e suportes socioculturais para
a leitura destaca a famiacutelia como um dos agentes principais
Segundo Paim e Prigol (2009) a importacircncia da figura do mediador como
basilar para a formaccedilatildeo do leitor comeccedilou a ser destacada em meados dos anos de
1990 Uma das produccedilotildees realizadas sobre mediaccedilatildeo da leitura com destaque para
os mediadores institucionais e natildeo institucionais eacute o livro Leitura mediaccedilatildeo e
mediador de Maria Helena T C de Barros Sueli Bortolin e Rovilson Joseacute da Silva
no qual os autores apresentam uma reflexatildeo sobre o papel dos mediadores
Partindo dessa anaacutelise realizada por esses autores apresentamos a seguir alguns
aspectos e dimensotildees a respeito da mediaccedilatildeo de leitura que pode ser exercidos
pelos educadores nos contextos escolares
Mediar eacute interceder e o mediador da leitura eacute aquele capaz de fazer fluir o
proacuteprio objeto de leitura ateacute o leitor preferencialmente de forma eficaz ou seja
mediador eacute aquele que intermedeia o encontro entre sujeito (leitor) e objeto (objeto a
ser lido) independente do suporte e do texto
Como apontado por Paim e Prigol (2009) nos uacuteltimos anos a mediaccedilatildeo entre
os objetos e os sujeitos tornou-se fulcral para a anaacutelise da formaccedilatildeo do aluno leitor
pois ela determina muitas das dimensotildees do encontro entre o futuro leitor e o objeto
a ser lido seja um texto literaacuterio ou outro objeto qualquer No caso faz-se
necessaacuterio um olhar cuidadoso ao educador que pelo espaccedilo e poder que ocupa no
ambiente escolar eacute um dos responsaacuteveis mais importantes na formaccedilatildeo do
educando especialmente como leitor Vejamos entatildeo uma das ponderaccedilotildees de
Silva (2006a) a respeito
Eacute preciso que se volte a atenccedilatildeo para esse profissional que sua praacutetica seja perscrutada a ponto de se compreender o acircmbito de sua accedilatildeo e ao mesmo tempo possa subsidiar teoricamente o contar histoacuterias o promover a leitura e a literatura no ensino fundamental principalmente nas quatro seacuteries iniciais (SILVA 2006 a p89)
O que com frequecircncia se tem verificado em instituiccedilotildees escolares eacute uma
mediaccedilatildeo da leitura restrita ao seu uso utilitaacuterio com o intuito principal de aquisiccedilatildeo
e ampliaccedilatildeo de informaccedilotildees importantes para os conteuacutedos curriculares utilizada
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muitas vezes como fonte que alicerccedila as boas maneiras e a transmissatildeo de valores
(SILVA 2006 a)
Entretanto os textos ou qualquer objeto quando escolhido para leitura
proporcionam a quem os lecirc a possibilidade de formular sentidos diversos dos
apresentados pelo autor de cotejar seus conhecimentos e valores com os que lhe
parecem expressos pelo texto O leitor pode ler imagens sons gestos como
tambeacutem textos instrutivos informativos de entretenimentos e educativos Cabe
poreacutem ao mediador apresentar e incentivar a leitura de diversos tipos de texto eou
objetos para leitura
Em se tratando da recomendaccedilatildeo da leitura de textos literaacuterios o gosto pela
leitura e os encaminhamentos metodoloacutegicos satildeo essenciais ndash por parte dos
educadores - para que a mediaccedilatildeo seja eficiente (SILVA 2006 a)
Necessaacuterio se torna entatildeo que educadores pedagogos pais enfim todos
aqueles que exerccedilam a funccedilatildeo de mediadores da leitura estejam cientes de que o
grande problema da natildeo-leitura natildeo estaacute na ausecircncia do prazer e sim na ausecircncia
de instrumentos e da interposiccedilatildeo destes instrumentos Haacute muitas pessoas que natildeo
tecircm acesso aos livros por condiccedilotildees financeiras precaacuterias eou ateacute mesmo pela
ausecircncia de bibliotecas puacuteblicas nas cidades Eacute fator determinante tambeacutem que
como mediadores disponham de conhecimentos teoacutericos sobre Leitura e Literatura
sobre os acervos disponiacuteveis sobre os efeitos dos julgamentos da miacutedia para que
possam exercer de maneira efetiva o papel que lhes compete na formaccedilatildeo de
leitores
Para finalizar adentraremos agora na questatildeo da mediaccedilatildeo exercida pela
contaccedilatildeo de histoacuteria realizadas em contextos escolares Morais (1996) salienta que
a primeira etapa para a leitura eacute a audiccedilatildeo de textos de livros
Essa modalidade de encontro com textos escritos provocada por um
mediador da leitura gera efeitos nos planos afetivo cognitivo e linguiacutestico
importantes para a formaccedilatildeo dos leitores Cognitivamente abre portas para o
conhecimento e para os saberes do ouvinte pois como analisamos anteriormente
as histoacuterias permitem que ele estabeleccedila relaccedilotildees entre as proacuteprias experiecircncias e
as vividas pelos personagens algumas delas difiacuteceis de serem experienciadas no
cotidiano Aleacutem disso como pondera Morais (1996)
50
Mais importante ainda talvez pela proacutepria estrutura da histoacuteria contada pelas questotildees e comentaacuterios que ela sugere pelos resumos que provoca ela ensina a compreender melhor os fatos e os atos a melhor organizar e reter a informaccedilatildeo a melhor elaborar os roteiros e os esquemas mentais (MORAIS 1996 p171 Grifos nossos)
No plano linguiacutestico a audiccedilatildeo dos textos por exemplo de livros permite ao
leitor aprender e desenvolver estruturas de frases e textos bem como ampliar seu
repertoacuterio vocabular e linguiacutestico Essa audiccedilatildeo possibilita ainda que o ouvinte
esclareccedila uma seacuterie de relaccedilotildees entre a liacutengua falada e a escrita como por exemplo
sobre o uso e os efeitos de sinais de pontuaccedilatildeo os sentidos que podem ser dados a
um texto entre tantos mais
No plano afetivo o ouvinte dessas histoacuterias no caso a crianccedila descobre o
universo da leitura pela voz de um leitor ou seja pela voz - do mediador ndash
preferivelmente daquele por quem nutre confianccedila sejam seus familiares ou
professor Esta relaccedilatildeo afetiva entre o ouvinte futuro leitor de textos escritos e o
mediador afeta a intensidade das mudanccedilas especialmente das relacionadas aos
aspectos cognitivos e linguiacutesticos
Eacute no ato de narrar uma histoacuteria em voz alta que o mediador pode permitir que
o ouvinte estabeleccedila interaccedilotildees com os colegas Mesmo sabendo que incentivos
para o aspecto intelectual estatildeo correlacionados ao sucesso da aprendizagem no
caso da leitura natildeo devemos voltar nossos olhos apenas para esses resultados
cognitivos Como recomenda Morais (1996 p172) ldquoAo ler para a crianccedila natildeo nos
tornemos seu instrutor quer sejamos pais ou professor Nada melhor do que ter
como meta seu prazer []rdquo
Para tanto eacute papel das escolas oferecerem espaccedilos adequados para que
ocorra o encontro entre o leitor e os livros Silva (2006 a) nos diz
[] cumpre agrave escola proporcionar espaccedilos que favoreccedilam a crianccedila a encontrar-se com o livro sem cobranccedilas desnecessaacuterias de modo que a leitura seja incorporada na vida da crianccedila como tantas outras convivecircncias importantes para o seu desenvolvimento (SILVA 2006 a p95)
51
Considerando todos os aspectos passiacuteveis de serem alcanccedilados pela
atividade da contaccedilatildeo de histoacuteria cabe ao mediador e a escola proporcionar
situaccedilotildees agradaacuteveis de leitura para que futuramente estes pequenos leitores
busquem por si soacute seus caminhos literaacuterios usufruindo daquilo que veio ao
encontro de suas buscas e sentindo prazer em apenas ler
No proacuteximo capitulo apresentaremos a parte empiacuterica deste trabalho a qual
foi desenhada tendo por inspiraccedilatildeo as recomendaccedilotildees da literatura ateacute agora
expostas
52
2 MEacuteTODO DE PESQUISA
O presente trabalho situa-se no campo das investigaccedilotildees qualitativas por
conseguinte descritivas e interpretativas Uma definiccedilatildeo precisa acerca desse tipo de
investigaccedilatildeo eacute quase sempre posta em questatildeo visto que como atesta Vilela (2003
p 458) haacute a ldquoimpossibilidade de se apresentar uma definiccedilatildeo fechada [da] pesquisa
qualitativardquo
Vilela (2003) apresenta uma retrospectiva explicitando os contornos que
favoreceram a mudanccedila do paradigma investigativo hegemocircnico nas ciecircncias
sociais especificamente no campo da pesquisa educacional Demonstra a
hegemonia atual da pesquisa qualitativa neste campo bem como as dimensotildees que
sustentam sua praacutetica salientando as mudanccedilas relativas agraves abordagens
metodoloacutegicas
Segundo Alves-Mazzotti (1991) eacute a loacutegica que orienta o processo de
investigaccedilatildeo e natildeo apenas a utilizaccedilatildeo de recursos metodoloacutegicos relacionados a
uma ou a outra abordagem de pesquisa que definem se um trabalho de pesquisa
pode ser qualificado como exemplo de uma abordagem qualitativa ou natildeo
A loacutegica que sustenta o estudo empiacuterico que desenvolvemos teve por pilar
principal os pressupostos da epistemologia qualitativa conforme apresentados por
Gonzaacutelez Rey (2002) Entre eles o do entendimento de que o conhecimento eacute uma
produccedilatildeo construtivo-interpretativa Em outras palavras natildeo soacute o pesquisador
precisa dar sentido e interpretar continuamente os objetos de seu estudo tambeacutem a
interaccedilatildeo com o sujeito relacionado eacute essencial para o processo de estudo dos
fenocircmenos humanos
A parte empiacuterica deste trabalho foi desenvolvida em um ambiente escolar
porque dentre tantos outros eacute nele que deve ocorrer parte da formaccedilatildeo dos leitores
Aleacutem da situaccedilatildeo da coleta se situar em um ambiente natural conforme sugerido por
Vilela (2003) para a conduccedilatildeo de uma pesquisa qualitativa e ciente quanto ao fato
de que o pesquisador eacute o ldquoelemento mais importante da coletardquo (VILELA 2003
p459) deve utilizar recursos e teacutecnicas que lhe possibilitem condiccedilotildees efetivas de
53
interaccedilatildeo para que possa estudar o fenocircmeno que tenciona investigar (GONZAacuteLEZ
REY 2002) cuidados quanto agrave seleccedilatildeo dos participantes aos materiais e aos
procedimentos que foram tomados conforme expostos nas seccedilotildees que compotildeem
este capiacutetulo ( 21222324)
Sabemos que a ldquoContaccedilatildeo de Histoacuteriasrdquo ocupa alguns lugares no cotidiano
escolar poreacutem nem sempre conhecidos As questotildees que se busca responder com
este trabalho em parte surgiram da vivecircncia da autora deste trabalho como
contadora de histoacuterias No ambiente natural no qual agora procuramos respondecirc-las
outros cuidados se fizeram necessaacuterios como os decorrentes da posiccedilatildeo e funccedilatildeo
de contadora-pesquisadora Assim foi feito pois almejamos elucidar algumas das
questotildees educativas como pesquisadora que (re)adentra observando e intervindo
em situaccedilotildees e contextos que lhes eram familiares poreacutem que precisavam ficar sob
suspeiccedilatildeo para que pudesse conduzir a contento a pesquisa empiacuterica
Desconfianccedila necessaacuteria ainda mais porque sua condiccedilatildeo de contadora-
pesquisadora precisaria transfigurar a sua experiecircncia como contadora na da
pesquisadora responsaacutevel pela coleta e anaacutelise das informaccedilotildees recolhidas
Este capiacutetulo prossegue com as informaccedilotildees da instituiccedilatildeo escolar na qual a
pesquisa foi desenvolvida (21) Logo apoacutes satildeo caracterizados os participantes (22)
os instrumentos (23) e os procedimentos (24) utilizados para a coleta dos dados
Ao final deste capiacutetulo satildeo enunciados e justificados os caminhos que seguimos
para a anaacutelise dos dados
O conjunto de informaccedilotildees deste capiacutetulo pretende demonstrar a loacutegica que
orientou a totalidade do processo empiacuterico desta investigaccedilatildeo Acreditamos que pela
loacutegica induzida desta parte do relato os leitores deste trabalho poderatildeo categorizaacute-la
como uma pesquisa desenvolvida sob a abordagem qualitativa conforme foi nosso
intuito ao seguir as recomendaccedilotildees de especialistas como Alves-Mazzotti (1991)
54
21 O Contexto e o Processo de Geraccedilatildeo dos Dados
A instituiccedilatildeo escolhida para a realizaccedilatildeo da pesquisa localiza-se no municiacutepio
de Londrina proacuteximo ao centro da cidade Eacute uma instituiccedilatildeo religiosa e filantroacutepica
que atendia em 2009 um total de 1208 alunos sendo 318 alunos no Ensino Meacutedio
425 alunos no Ensino Fundamental II 324 alunos no Ensino Fundamental I e 141
alunos na Educaccedilatildeo Infantil As famiacutelias dos alunos dessa instituiccedilatildeo satildeo em sua
maioria de classe meacutedia e alta
O que nos levou agrave escolha desta instituiccedilatildeo Aleacutem da acessibilidade da
pesquisadora agrave mesma visto que trabalha nesta instituiccedilatildeo haacute nove anos outro fator
foi relevante na escolha o fato de a pesquisadora manter uma relaccedilatildeo empaacutetica
com os alunos participantes mantendo contato com os mesmos natildeo soacute durante a
coleta dos dados Isso possibilitou a observaccedilatildeo de situaccedilotildees e accedilotildees de leitura
decorrentes ou natildeo dos efeitos das intervenccedilotildees
A instituiccedilatildeo ocupa um espaccedilo fiacutesico de aproximadamente 26500msup2
ofertando agrave Educaccedilatildeo Infantil um espaccedilo independente poreacutem integrado aos demais
espaccedilos escolares Aleacutem das salas de aula a instituiccedilatildeo dispotildee de uma biblioteca
com um acervo diversificado cerca de 16000 exemplares distribuiacutedos entre livros
CDs revistas e perioacutedicos duas salas de audiovisual com projetor lousa digital e
equipamentos para DVD e VHS trecircs laboratoacuterios de informaacutetica com 20
computadores em cada um um auditoacuterio com 280 lugares um teatro com
capacidade para mais de 900 pessoas trecircs laboratoacuterios - um de fiacutesica outro de
quiacutemica e outro de biologia um ginaacutesio poliesportivo com duas quadras para a
realizaccedilatildeo da praacutetica de Educaccedilatildeo fiacutesica e desportiva Por ser uma instituiccedilatildeo
religiosa haacute uma capela aberta todo o dia para a comunidade em geral aleacutem de
programaccedilotildees fixas de oraccedilotildees e reflexotildees durante a semana para pais
funcionaacuterios e toda a comunidade londrinense
55
22 Razotildees que Guiaram a Seleccedilatildeo dos Participantes
A crianccedila no seu percurso escolar geralmente experiencia uma ruptura na
passagem da Educaccedilatildeo Infantil para o Ensino Fundamental natildeo soacute pela forccedila da
transiccedilatildeo brusca da oferta dos ambientes de aprendizagem comuns a essas
estruturas de ensino como tambeacutem pelas demais possibilidades interativas nas
salas das seacuteries iniciais Uma crianccedila com experiecircncia na Educaccedilatildeo Infantil onde
lhe satildeo favorecidas interaccedilotildees mais pessoais e plurais com espaccedilos ampliados para
a ldquoludicidaderdquo quando ingressa no Ensino Fundamental passa a enfrentar grandes
mudanccedilas que a obrigam a conviver em uma estrutura organizacional cuja tradiccedilatildeo
pedagoacutegica natildeo privilegia praacuteticas educativas mais individualizadas e o luacutedico Sem
contar que estaacute de modo geral entrando em um processo formal de alfabetizaccedilatildeo
para o qual raramente havia sido instigada antes no ambiente escolar
O espaccedilo e o tempo nos quais passam a transcorrer suas atividades na
escola satildeo mais regulados pois haacute uma preocupaccedilatildeo por parte dos professores e
demais agentes educativos nomeadamente dos orientadores e supervisores
escolares soacute para indicar os que lhes satildeo mais proacuteximos para que as atividades
sejam especialmente dirigidas para o ensino da leitura da escrita e dos
fundamentos de um pensar e produzir a matemaacutetica elementar Portanto reguladas
para os letramentos baacutesicos previstos oficialmente para esse niacutevel de escolarizaccedilatildeo
conforme preconizados pelas Diretrizes Curriculares da Educaccedilatildeo Baacutesica para o
Estado do Paranaacute (PARANAacute 2009) e pelos PCNrsquos (BRASIL 1997)
A evidecircncia quanto a essas mudanccedilas enfrentadas pelas crianccedilas na
transiccedilatildeo entre a fase dita preacute-escolar e a escolar se constituiu em uma das razotildees
que levou a definir o criteacuterio para a seleccedilatildeo inicial dos participantes da pesquisa
56
221 Participantes
Foram selecionados para participar da pesquisa alunos (n=49 alunos) e duas
professoras do 2deg ano do Ensino Fundamental
A instituiccedilatildeo em 2009 ofertava duas turmas do 2ordm ano8 doravante
denominadas de turma A e turma B Os alunos distribuiacuteam-se na faixa etaacuteria de seis
a sete anos A turma A contava com 27 alunos matriculados sendo 12 meninas e 15
meninos A turma B contava com 22 alunos matriculados sendo 13 meninos e nove
meninas Do total de alunos das turmas A e B (49) nove foram selecionados para
as entrevistas sendo quatro meninos e cinco meninas
Para a identificaccedilatildeo dos alunos que participaram desses encontros foram
utilizados os seguintes coacutedigos A1 A2 A3 (sexo feminino) A4 A5 (sexo masculino)
e B1 B2 (sexo feminino) B3 B4 (sexo masculino) As letras A e B referem-se agraves
turmas nas quais os participantes estavam matriculados
As professoras-participantes (PA9 e PB) eram as responsaacuteveis pela conduccedilatildeo
das atividades escolares em 2009 respectivamente na Turma A e na Turma B
Informaccedilotildees pessoais e acerca da formaccedilatildeo acadecircmica e experiecircncia profissional
permitiram desenhar os seguintes perfis PA - com idade de 51 anos formada em
Psicologia haacute 25 anos atuava como docente haacute 26 anos PB ndash com idade de 24
anos formada em Pedagogia haacute trecircs anos contava com cinco anos de experiecircncia
docente no Ensino Fundamental
Contamos ainda com a participaccedilatildeo indireta da bibliotecaacuteria jaacute que a mesma
ficou responsaacutevel por fornecer os registros da assiduidade dos alunos agrave biblioteca
8 A instituiccedilatildeo jaacute adotou no Ensino Fundamental o sistema de ensino de nove anos A
nomenclatura que antes era SEacuteRIE passa a ser ANO 9 Para referenciar as professoras-participantes satildeo empregadas as siglas PA para a
professora da Turma A e PB para a professora da turma B
57
23 Materiais
Por terem sido diferentes as fontes utilizadas para a recolha dos dados
optamos por organizar esta parte do relato indicando inicialmente as fontes
secundaacuterias e os instrumentos respectivamente utilizados
A bibliotecaacuteria da instituiccedilatildeo ficou responsaacutevel por ceder agrave pesquisadora
registro quanto agrave assiduidade dos alunos das Turmas A e B agrave biblioteca O registro
ficou limitado ao acompanhamento da retirada e devoluccedilatildeo dos materiais da
biblioteca ao longo do periacuteodo compreendido entre o mecircs anterior ao iniacutecio da
intervenccedilatildeo e o posterior isto eacute de setembro a dezembro de 2009 A biblioteca
conta com um software que viabiliza normalmente o registro diaacuterio da retirada e
devoluccedilatildeo das obras de seu acervo
O formulaacuterio gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca
(Anexo A) informa o histoacuterico das retiradas quando quantas vezes e quem realiza o
empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo Por ele os interessados ndash pais professores
etc- podem averiguar quantos e quais os livros retirados pelo aluno em cada mecircs
As professoras-participantes contribuiacuteram informalmente com subsiacutedios no
iniacutecio e no final da coleta de dados
Com vistas agrave conduccedilatildeo das entrevistas com os alunos foi solicitado agraves
professoras responsaacuteveis pela turma na qual os alunos participantes se
encontravam matriculados que identificassem quatro alunos que consideravam
segundo suas concepccedilotildees ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo leitores
Sendo assim foi entregue em matildeos a cada professora um folha com trecircs
questotildees para serem respondidas por escrito (Apecircndice A) Os alunos identificados
pelas professoras foram submetidos agraves entrevistas A professora da Turma A
selecionou cinco alunos10 sendo dois meninos e trecircs meninas e a professora da
Turma B selecionou quatro alunos sendo dois meninos e duas meninas
10 A PA selecionou uma aluna a mais do que o previsto porque acreditava que ela poderia
contribuir muito para a pesquisa
58
O protocolo que serviu para a seleccedilatildeo dos alunos a serem entrevistados
consistiu em um questionaacuterio preenchido individualmente pelas professoras
participantes (PA PB) Nesse questionaacuterio as professoras foram instigadas a
responder trecircs questotildees que as interpelavam a exporem sua concepccedilatildeo de ldquobomrdquo e
ldquomaurdquo leitor e a indicar o nome dos alunos que consideravam ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores
Eacute comum considerar o ldquobomrdquo leitor como aquele que lecirc com objetivo
determinado avalia o que lecirc possui bom vocabulaacuterio tem habilidades para
conhecer o valor do livro adquire livros com frequumlecircncia lecirc vaacuterios assuntos e lecirc por
prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo e o ldquomaurdquo leitor como sendo aquele que lecirc pouco natildeo
gosta de ler lecirc palavra por palavra soacute tem um ritmo de leitura natildeo avalia o que lecirc
acreditando em tudo o que leu possui vocabulaacuterio limitado e raramente discute com
colegas o que lecirc Sabemos poreacutem que se torna inconveniente classificarmos o
leitor em ldquobomrdquo ou ldquomaurdquo visto que a leitura acontece a todo o momento passamos o
tempo todo fazendo leituras Portanto ldquosomos leitoresrdquo independentemente da
maneira com que as realizamos Entretanto esses qualificativos em relaccedilatildeo aos
alunos satildeo utilizados frequentemente por professores
Os demais materiais utilizados para a coleta de dados foram livros de
Literatura Infantil diaacuterio de campo gravador e um toacutepico guia
Foram utilizados 10 livros de Literatura Infantil seis (selecionados pela
pesquisadora) para uso nas sessotildees de intervenccedilatildeo e quatro (selecionados pelas
professoras) utilizados nas sessotildees de observaccedilatildeo
Os livros escolhidos satildeo de autores contemporacircneos e entre as razotildees para
essa seleccedilatildeo destacam-se autores reconhecidos e legitimados no campo da
Literatura Infantil livros com textos adequados agrave faixa etaacuteria dos alunos-
participantes e ao seu niacutevel de letramento nuacutemero de livros11 disponiacuteveis na
biblioteca da instituiccedilatildeo
As obras literaacuterias trabalhadas pelas professoras regentes da Turma A e B
foram selecionadas no iniacutecio do ano tendo sido solicitadas na lista de materiais dos
11 A instituiccedilatildeo possui 244 livros dos autores escolhidos para o trabalho com as intervenccedilotildees Sendo 177 da Ana Maria Machado 61 do Rubem Alves 5 da Letiacutecia Dansa e 1 da Maria Monteiro Cardoso
59
alunos como livros paradidaacuteticos para serem trabalhados durante o ano todo Aleacutem
da leitura dos livros os professores planejam outras praacuteticas acerca das obras
Portanto uma obra eacute trabalhada de acordo com o planejamento da professora
durante mais ou menos um mecircs As obras utilizadas na fase de intervenccedilatildeo foram
selecionadas pela pesquisadora
231 Relaccedilatildeo das obras literaacuterias
Relaccedilatildeo das obras usadas como suporte em cada situaccedilatildeo
Intervenccedilatildeo Menina bonita do laccedilo de fita de Ana Maria Machado O
segredo da lagartixa de Letiacutecia Dansa e Selmo Dansa Ah cambaxirra se eu
soubesse de Ana Maria Machado Beto o carneiro de Ana Maria Machado A
bruxa que roubou o sol de Mariana Monteiro Cardoso A menina e o paacutessaro
encantado de Rubens Alves
Observaccedilatildeo O leatildeo e o ratinho faacutebula de Esopo adaptada por Selma
Braido A casa sonolenta de Audrey Wood traduzido por Gisela Maria Padovan A
aacutervore do Beto de Ruth Rocha Ningueacutem eacute igual a ningueacutem de Regina Otero e
Regina Rennoacute
232 Demais instrumentos
Um diaacuterio de campo foi utilizado pela pesquisadora durante todo o periacuteodo da
coleta de dados para o registro de observaccedilotildees de impressotildees e do que
considerava relevante Nele foi registrada a transcriccedilatildeo parcial de conversas
60
informais que aconteceram pelos corredores da instituiccedilatildeo com professores alunos
bibliotecaacuteria e que contribuiacuteram para a pesquisa
Um gravador da marca FP ndash Fast Playback 2SPEED ndash Panasonic foi utilizado
para a gravaccedilatildeo das entrevistas realizadas com os alunos-participantes
24 Procedimentos para a Coleta Propriamente Dita dos Dados
Inicialmente conversamos com o diretor geral da instituiccedilatildeo ocasiatildeo em que
apresentamos o Projeto com vistas agrave autorizaccedilatildeo de sua execuccedilatildeo junto aos alunos
e professores do 2ordm ano Apoacutes os esclarecimentos foi entregue e assinado um Termo
de Compromisso e Autorizaccedilatildeo (Apecircndice B) Posteriormente foi encaminhada aos
pais dos alunos da Turma A e B uma Carta (Apecircndice C) caracterizando de modo
geral a pesquisa e um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apecircndice D)
solicitando autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo da mesma Apoacutes a obtenccedilatildeo do aceite e
assinatura dos respectivos Termos que acompanharam essas cartas a
pesquisadora estabeleceu contato individual com as professoras das turmas para
apresentar o projeto e solicitou a permissatildeo para a execuccedilatildeo da intervenccedilatildeo a ser
conduzida junto a seus alunos em horaacuterio de aula
O periacuteodo da coleta compreendeu trecircs momentos preacute-intervenccedilatildeo
intervenccedilatildeo e poacutes-intervenccedilatildeo O momento compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo possibilitou
momentos de conversas com professores e com a bibliotecaacuteria bem como para o
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes Entre 26 de outubro a
31 de novembro de 2009 foram realizadas as intervenccedilotildees No periacuteodo
compreendido entre 31 de novembro a 15 de dezembro de 2009 foram realizadas
novas conversas com as professores e com a bibliotecaacuteria bem como um novo
levantamento dos livros retirados pelos alunos participantes entre o periacuteodo de 26 de
novembro a 20 de dezembro de 2009
61
Trecircs situaccedilotildees configuraram as relaccedilotildees diretas da pesquisadora com os
participantes (alunos e professores) a da intervenccedilatildeo a das conversas e entrevistas
e a das observaccedilotildees Passaremos entatildeo a descrever os procedimentos usados em
cada uma
241 Intervenccedilatildeo
As intervenccedilotildees desenvolvidas junto aos alunos-participantes das Turmas A e
B tiveram como objetivos incentivaacute-los a assumir posiccedilotildees dialoacutegicas frente aos
textos pelo entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo aos textos
trabalhados em cada sessatildeo
Para tanto a pesquisadora realizou doze sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias
seis em cada turma As sessotildees foram conduzidas pela pesquisadora identificada
como ldquocontadora-pesquisadorardquo Essas sessotildees aconteceram independentes por
turma poreacutem no mesmo periacuteodo e dias conforme sumarizado no Quadro 1
As sessotildees de intervenccedilatildeo na Turma A aconteciam antes do intervalo e as da
Turma B apoacutes o intervalo
62
SESSAtildeO DIA TIacuteTULO DO LIVRO AUTOR(A)
ILUSTRADOR(A)
1 2610 Menina bonita do laccedilo de fita Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Claudius
2 0511 O segredo da largatixa Autores Letiacutecia Dansa e Salmo Dansa
Ilustrador Salmo Dansa
3 0911 Ah cambaxirra se eu soubesse
Autora Ana Maria Machado
Ilustradora Graccedila Lima
4 1611 Beto o carneiro Autora Ana Maria Machado
Ilustrador Fernando Nunes
5 2311 A bruxa que roubou o sol Autor Mariana Monteiro Cardoso
Ilustrador Paulo Tenente
6 3011 A menina e o paacutessaro encantado
Autor Rubens Alves
Ilustradora Bianca
Quadro 1 Distribuiccedilatildeo das sessotildees e das obras trabalhadas
Cada sessatildeo foi dividida em trecircs momentos recepccedilatildeo contaccedilatildeo e conversa
informal sobre a histoacuteria
No primeiro momento o da recepccedilatildeo a professora da turma conduzia os
alunos ateacute o espaccedilo acordado com a pesquisadora e esta apoacutes recepcionaacute-los
apresentava a histoacuteria que seria contada naquele dia No segundo momento o de
contaccedilatildeo a contadora-pesquisadora narrava a histoacuteria definida para aquele
encontrosessatildeo e observava as reaccedilotildees e o envolvimento dos alunos durante a
atividade No terceiro momento o da conversa informal sobre a histoacuteria a
contadora-pesquisadora conversava com todos os alunos sobre o enredo das
histoacuterias observando suas reaccedilotildees e argumentos perante as accedilotildees dos
personagens
Apoacutes cada sessatildeo as informaccedilotildees obtidas pelas observaccedilotildees da contadora-
pesquisadora foram registradas no diaacuterio de campo
63
242 Conversas e entrevistas
Em uma pesquisa qualitativa a entrevista eacute uma das opccedilotildees para a coleta dos
dados sendo amplamente empregada Por ela podem ser obtidos dados baacutesicos
para o desenvolvimento e a compreensatildeo das relaccedilotildees entre os sujeitos
pesquisados e o objeto de pesquisa (BAUER GASKELL 2002)
Utilizamos para a coleta de dados dois tipos de entrevista a entrevista em
profundidade com um uacutenico respondente no caso com cada professora e a
entrevista com um grupo focal isto eacute um grupo de inquiridos no caso com os
alunos de cada turma que participaram das sessotildees de intervenccedilatildeo
As entrevistas realizadas com o grupo focal foram semi-estruturadas e para
isso nos apoiamos em um toacutepico guia (Apecircndice E) para que os diaacutelogos natildeo
fugissem dos objetivos da pesquisa As entrevistas com os professores em alguns
momentos foram semi-estruturadas e em outros sob a modalidade de conversaccedilatildeo
continuada portanto menos estruturada pela pesquisadora Assim o fizemos com o
intuito de como dizem Bauer Gaskell (2002 p64) ldquo[] absorver o conhecimento
local e a cultura por um periacuteodo de tempo mais longo do que em fazer perguntas
dentro de um periacuteodo relativamente limitadordquo
2421 Entrevistas com os alunos
Por turma apoacutes cada sessatildeo da intervenccedilatildeo a contadora-pesquisadora
instigava-os a uma conversa Essas conversas aconteciam em situaccedilotildees grupais por
turma com os cinco alunos da Turma A e os quatros da Turma B sendo gravadas
64
para posterior transcriccedilatildeo Essas sessotildees ocorreram em uma das salas da
instituiccedilatildeo nos horaacuterios destinados agrave Hora do Conto12
Essas situaccedilotildees de coleta foram grupais poreacutem conduzidas por roteiros sob a
modalidade de toacutepicos (Apecircndices E) os quais guiavam as proposiccedilotildees que a
contadora-pesquisadora enunciava para os alunos-participantes servindo de
lembrete para que ela natildeo se esquecesse de abordar algum aspecto relevante aleacutem
de se constituir em um recurso para monitorar o tempo de duraccedilatildeo do encontro com
cada grupo A duraccedilatildeo dessas situaccedilotildees foi de aproximadamente quinze minutos
por grupo e sessatildeo
2422 Entrevista e conversas com as professoras
As entrevistas com as professoras (PA PB) aconteceram individualmente e
em duas ocasiotildees No iniacutecio da pesquisa informalmente para expor o projeto para
esclarececirc-las acerca do mesmo bem como para levantar a opiniatildeo de cada uma
acerca do interesse dos alunos em realizarem leitura e a frequecircncia com que a
fazem Nessa oportunidade foi solicitado a cada uma que respondesse ao
questionaacuterio (Apecircndice A) informando quais alunos considerava ldquobonsrdquo e ldquomausrdquo
leitores e indicassem dois alunos que poderiam exemplificar cada uma dessas
categorias de leitor
Durante o tempo em que a pesquisa foi desenvolvida ou seja desde a fase
preacute-intervenccedilatildeo ateacute a da poacutes-intervenccedilatildeo aconteceram conversas informais em
momentos distintos da coleta nas quais as professoras relatavam situaccedilotildees que
exemplificavam a mudanccedila ou natildeo de comportamento dos alunos perante a leitura
Depois de concluiacutedas as etapas de intervenccedilatildeo e de observaccedilatildeo foi realizada
uma nova entrevista com cada professora para levantar a opiniatildeo de cada uma
12 A Hora do Conto tem como objetivo aproximar mais a crianccedila do livro ou seja da Literatura Infantil a fim de desenvolver o prazer pela leitura A professora escolhe um livro da Literatura Infantil e atraveacutes da leitura ou contaccedilatildeo trabalha a seu modo o texto
65
quanto a possiacuteveis mudanccedilas que tivessem percebido no comportamento dos
alunos e informassem as mais significativas
243 Observaccedilotildees
Em cada turma foram realizadas duas sessotildees de observaccedilatildeo em sala de
aula tendo por foco a atuaccedilatildeo da professora regente nos horaacuterios destinados agrave Hora
do Conto
As observaccedilotildees realizadas tiveram como meta verificar a performance adotada
pela professora durante a situaccedilatildeo de contaccedilatildeo com o intuito de identificar ldquoserdquo e
ldquocomordquo ela incentivava os alunos agrave expressatildeo oral para o compartilhamento do
entendimento de seus sentimentos e vivecircncias em relaccedilatildeo ao texto narrado
(Apecircndice G)
As observaccedilotildees na Turma A aconteceram nos dias 03 e 09 de dezembro de
2009 e as histoacuterias narradas pela PA foram estas na sequecircncia O leatildeo e o ratinho
e A casa sonolenta Na turma B essa situaccedilatildeo de coleta ocorreu nos dias 02 e 10
dezembro de 2009 e as histoacuterias narradas pela PB foram respectivamente A aacutervore
do Beto e Ningueacutem eacute igual a ningueacutem
244 Conversas com a bibliotecaacuteria
Foram realizadas informalmente conversas com a bibliotecaacuteria para saber
acerca da assiduidade dos alunos agrave biblioteca do formulaacuterio ndash jaacute mencionado
anteriormente - gerado pelo programa de controle informatizado da biblioteca no
qual foi possiacutevel fazer um levantamento das retiradas quando quantas vezes
66
realizaram o empreacutestimo e a data da devoluccedilatildeo dos livros por cada um dos alunos
Por meio das conversas foi possiacutevel coletar algumas informaccedilotildees expressivas para
a anaacutelise
Uma vez descrito o meacutetodo que orientou a execuccedilatildeo da pesquisa que integra
este trabalho cabe indicar os fios que orientaram a tessitura da anaacutelise das
informaccedilotildees recolhidas
O fio principal tem sua origem na adoccedilatildeo de uma perspectiva de pesquisa
qualitativa e interpretativa com vistas agrave construccedilatildeo de ldquoum conhecimento prudente
para uma vida decenterdquo (SANTOS 2000 p 74)
As induccedilotildees propostas para a interpretaccedilatildeo das informaccedilotildees coletadas foram
produto dos diaacutelogos constantes entre os dados recolhidos ao longo da coleta com o
que a pesquisadora sabia a partir da sua experiecircncia enquanto contadora de
histoacuterias e da leitura de textos da literatura pertinente
Cuidados esses porque estamos cientes quanto aos possiacuteveis efeitos das
construccedilotildees explicativas que foram emergindo ao longo da coleta que de algum
modo afetaram os processos de inter-relaccedilatildeo que identificamos conforme o relato
no proacuteximo capiacutetulo
Necessaacuterio se torna ainda advertir o leitor que natildeo foi pretensatildeo da autora
deste trabalho propor uma regra ou lei explicativa para o objeto selecionado ndash efeitos
da contaccedilatildeo de histoacuterias Estamos mais interessadas em ser o mais fiel possiacutevel ao
que foi observado e colhido nas situaccedilotildees com os participantes Daiacute a profusatildeo de
reproduccedilatildeo de trechos das suas falas situando detalhadamente os locais e
contextos em que foram enunciadas Em assim sendo tentamos natildeo tratar como
trivial visto que quaisquer das informaccedilotildees recolhidas devem ser ldquo[encaradas] como
portadoras potenciais de significados que precisam ser desveladosrdquo (VILELA 2003
p 459)
Por isso selecionamos um trecho desse autor porque em nossa opiniatildeo
expressa claramente a trama vivenciada na experiecircncia de contadora-pesquisadora
Os processos de investigaccedilatildeo satildeo mais importantes que os resultados da pesquisa As atitudes os medos as expectativas e os sentimentos se revelam e permanecem presentes nos processos
67
desenvolvidos durante a investigaccedilatildeo e muitas vezes natildeo satildeo traduziacuteveis nos produtos finais das pesquisas Os pesquisadores devem estar atentos a essas manifestaccedilotildees e devem procurar o significado dessas no contexto da pesquisa Especialmente nas pesquisas educacionais as estrateacutegias qualitativas de pesquisa permitem deslindar como as expectativas estatildeo presentes no desempenho de atividades curriculares nos procedimentos pedagoacutegicos e nas interaccedilotildees diaacuterias em sala de aula (VILELA 2003 459 Grifos nossos)
Para finalizar este capiacutetulo reafirmamos que a opccedilatildeo metodoloacutegica que
fundamentou este trabalho a nosso ver pode gerar a possibilidade e criaccedilatildeo de um
espaccedilo de reflexatildeo e anaacutelise de uma das praacuteticas escolares comuns como eacute a da
contaccedilatildeo de histoacuteria sociais efetuada pela pesquisadora em parceria com os
sujeitos participantes Acima de tudo a nossa proposta eacute de um trabalho coletivo e
reflexivo que possibilita um olhar cuidadoso completo e pormenorizado sobre o
objeto de investigaccedilatildeo Mesmo levando em consideraccedilatildeo que a complexidade do
trabalho da pesquisadora aumenta consideravelmente a proposiccedilatildeo da pesquisa
qualitativa com vistas ao trabalho coletivo e agrave interdisciplinaridade revela dados
informaccedilotildees caracteriacutesticas e peculiaridades das representaccedilotildees dos sujeitos
analisados
68
3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO
Por ser uma pesquisa situada no campo das investigaccedilotildees qualitativas
tomaremos por base a anaacutelise descritiva e interpretativa para produzir uma das
leituras possiacuteveis para descrever e interpretar os dados coletados De acordo com
Luumldle e Andreacute (1986) o(a) pesquisador(a) deve assumir dois papeacuteis ao mesmo
tempo um subjetivo de participante e outro objetivo de investigador(a) para se
aproximar do fenocircmeno pesquisado como um todo Contudo eacute necessaacuterio que
eleela se atenha a uma descriccedilatildeo precisa do objeto pesquisado e na anaacutelise do
processo dinacircmico para a sua apreensatildeo leve em conta as suas principais
dimensotildees Dessa forma pode evitar induccedilotildees e conclusotildees idiossincraacuteticas
Sendo assim procuramos nas produccedilotildees dos participantes estar atentas agrave
escuta dos seus dizeres com o intuito de natildeo deixarmos passar despercebidas as
particularidades de cada fala Ao assim procedermos entendemos que se possam
ler as entrelinhas e natildeo somente as linhas (ECO 1986) ou seja os ditos e os natildeo
ditos que ocorreram nos diaacutelogos (LARROSA 2002 a) Para que natildeo nos
deixaacutessemos influenciar apenas pela subjetividade durante a anaacutelise interpretativa
dos dados procuramos evitar deduccedilotildees imprecisas relacionar criticamente as
leituras pessoais que haviam sido produzidas com as dos demais autores
apresentados neste relato Enfim buscamos problematizar e compreender as
dimensotildees do objeto pesquisado
A princiacutepio as descriccedilotildees e interpretaccedilotildees isto eacute a escrita final da leitura que
apresentamos dos dados foi possibilitada pelo uso de teacutecnicas comuns agrave anaacutelise de
conteuacutedo a qual por ser uma ldquoconstruccedilatildeo socialrdquo (BAUER GASKELL 2002 p 203)
precisa ser avaliada
Como qualquer construccedilatildeo viaacutevel ela leva em consideraccedilatildeo alguma realidade neste caso o corpus de texto e ela deve ser julgada pelo seu resultado Este resultado contudo natildeo eacute o uacutenico fundamento para se fazer uma avaliaccedilatildeo Na pesquisa o resultado vai dizer se a anaacutelise apresenta produccedilotildees de interesse e que resistam a um minucioso exame mas bom gosto pode tambeacutem fazer parte da avaliaccedilatildeo (BAUER GASKELL 2002 p 203 Grifos nossos)
69
Para que a anaacutelise da leitura do discurso dos participantes seja realizada a
contento Freitas e Janissek (2000) recomendam a eleiccedilatildeo de categorias como
procedimentos essenciais para fazer a ligaccedilatildeo entre os objetivos da pesquisa e os
resultados Cientes de que ldquoAs categorias quando natildeo se tem uma ideacuteia precisa
devem surgir com base no proacuteprio conteuacutedordquo (FREITAS JANISSEK 2000 p 44) ao
inveacutes de categorias levantadas a partir apenas do corpus linguiacutestico ousamos eleger
algumas matrizes pautadas nos objetivos da pesquisa que orientaram o relato da
anaacutelise
Para que o leitor possa penetrar com clareza na anaacutelise e discussotildees
realizadas reportamo-nos aos objetivos que fundamentam este trabalho
Oslash Verificar alguns dos efeitos das narrativas orais ou seja dos possiacuteveis
decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias para a formaccedilatildeo de alunos-leitores
Oslash Descobrir se e como o desempenho do professor durante a contaccedilatildeo
de histoacuterias influencia o interesse do aluno em ler outros livros
As duas matrizes que orientaram a anaacutelise dos dados foram
v Leitura como ato formativo e possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo - espaccedilo no
qual eacute ressaltada a leitura como praacutetica cultural a formaccedilatildeo da subjetividade e a
constituiccedilatildeo do sujeito
v Concepccedilatildeo de leitor e praacuteticas de leitura - espaccedilo no qual foi focalizada
a influecircncia do trabalho com a literatura literaacuteria realizada na instituiccedilatildeo de ensino
bem como as concepccedilotildees e praacuteticas pertinentes por parte do professor
Poreacutem na tessitura dessa parte do relato fomos sentindo que apresentar a
anaacutelise e os resultados divididos em matrizes natildeo compreendia em sua extensatildeo as
praacuteticas e processos de subjetivaccedilatildeo que tiacutenhamos observado e registrado A nosso
ver natildeo seria possiacutevel por exemplo falar de leitura como ato formativo sem
adentrar nas praacuteticas de leitura nem tampouco falar da concepccedilatildeo de leitor sem
abordar as praacuteticas culturais e a questatildeo da subjetividade Por que segmentar e
delimitar saberes e fazeres que satildeo entrecruzados na praacutetica cotidiana Seria como
criar e cair na armadilha descrita por Garcia (2007)
70
No rastro do cientificismo moderno seguido pelas ciecircncias sociais resignamo-nos e naturalizamos a praacutetica de conhecer satisfazendo-nos e crendo em roacutetulos embalagens que se criam por noacutes ou por outros para pretensamente explicar o viver humano ordinaacuterio (GARCIA 2007 p131)
Resta-nos entatildeo pedir licenccedila para desconstruir paradoxalmente as ldquoloacutegicasrdquo
dessa costumeira produccedilatildeo de conhecimento e retirar as demarcaccedilotildees previstas
inicialmente para narrar as realidades estudadas natildeo pelo que supomos serem mas
pelo que elas nos acontecimentos vivenciados foram e pareceram para noacutes estar
relacionadas Isso porque ao longo das tessituras da anaacutelise percebemos que os
entrecruzamentos das duas matrizes anteriormente propostas eram imprescindiacuteveis
para chegarmos a resultados significativos
A figura que apresentamos a seguir sintetiza os entrecruzamentos e parte da
dinacircmica utilizada para a anaacutelise dos dados
ANAacuteLISE DOS DADOS
M A T R I Z E S
leiturfo
praacuteticas de leitura
conc
possda
ENTRECRUZAMENTOS DE
MATRIZES
M A T R I Z E S
iacuteveis efeitos contaccedilatildeo
Figura 1 Matrizes e entrecruzamentos utilizados para a anaacutelise dos dad
epccedilatildeo de leitor
a como ato rmativo
os
71
Na sequecircncia apresentamos o relato das anaacutelises seguindo o quadro das
matrizes selecionadas e de seus entrecruzamentos
Para a demonstraccedilatildeo de nossas interpretaccedilotildees a seguir apresentadas
utilizaremos recortes (R1 a R28) das transcriccedilotildees das sessotildees e dos registros do
diaacuterio de campo estes identificados nos proacuteprios recortes
A figura a seguir nos apresenta as caixas de textos utilizadas para cada tipo
de recorte
FIGURA 2 Identificaccedilatildeo dos recortes para a anaacutelise
31 Entre os entrecruzamentos de matrizes a leitura como ato formativo e
possiacuteveis efeitos da contaccedilatildeo
Sob a perspectiva construcionista que adotamos ressaltaremos que ao longo
da vida associamos as diferentes experiecircncias que temos com e no mundo e assim
construiacutemos um tipo de conhecimento que nos permite (re)conhecer a noacutes mesmos
os outros e o que nos rodeiam e que dirige nossas interaccedilotildees no mundo agrave nossa
volta Conhecimento este natildeo restrito a dimensotildees cognitivas porque trespassado
pelas emoccedilotildees e sentimentos que nos foram dadas a sentir tambeacutem pelos efeitos
das praacuteticas dos que nos socializaram (BERGER LUCKMAN 1999)
Posto isso entendemos que ao construir nosso conhecimento do mundo
vamos tambeacutem cifrando e decifrando-o e assim produzimos e somos produzidos
por nossas leituras de materiais linguiacutesticos ou natildeo
RECORTES
Caixa de texto utilizada para os recortes das transcriccedilotildees das sessotildees com os alunos participantes
Caixa de texto utilizada para os recortes do diaacuterio de campo
Caixa de texto utilizada para os recortes das entrevistas com as professoras
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Ler um texto escrito eacute dialogar eacute escutar e responder para entender o outro
e a noacutes mesmos Entender enfim o sentido que foi dado pelo autor e por noacutes agraves
coisas Eacute se (trans)formar ou se (de)formar (LARROSA 2002) por meio dos
recursos palavras imagens e espaccedilos usados pelos autores e em alguns casos
administrados pelos editores O leitor ao dialogar com um ou com o conjunto de
textos assim produzidos propicia a ocorrecircncia de mudanccedilas pois quando a leitura
termina no papel continua na vida (SISTO 2005)
Em assim sendo o leitor permite que sua formaccedilatildeo seja (de)formada pelos
efeitos de sua accedilatildeo e consequentemente seja (trans)formado Portanto
compreender a leitura enquanto processo formativo eacute compreender que esta vai
aleacutem da pura decodificaccedilatildeo de coacutedigos linguiacutesticos apresentados sob a modalidade
oral ou escrita
O que os dados recolhidos e interpretados a partir dos entrecruzamentos
de matrizes construiacutedas para a sua anaacutelise nos dizem Como os alunos e os
professores participantes deste trabalho entendem leitura
Os dados colhidos permitem que se constate que a leitura eacute entendida por
crianccedilas como uma accedilatildeo que leva a aquisiccedilatildeo de conhecimento (R1) Elas jaacute
percebem que uma funccedilatildeo significativa da leitura eacute a da aprendizagem para a
aquisiccedilatildeo de novos saberes
R1
A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute Quando eu tava jogando jogo da forccedila laacute na biblioteca neacute era substantivo (pausa para pensar) alguma coisa assim que eu natildeo sabia o que era daiacute quando eu vi quando eu fui escrever a palavra eu consegui daiacute eu vi que girassol era(pensa) alguma coisa que eu natildeo me lem bro(risos)
Pesq mas vocecirc sabia na hora A2 eacute daiacute eu nunca sabia antes Pesq vocecirc descobriu que girassol eacute uma flor A2 Eacute um substantivo(pensa) com(pensa novamente) Pesq Composto A2 Eacute composto
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Podemos verificar no recorte acima que A2 reconhece a leitura como sendo
um meio de aquisiccedilatildeo de conhecimento ao relatar que aprendera que a palavra
girassol eacute um substantivo composto O modo como a leitura eacute conduzida pelo
professor pode entretanto levar as crianccedilas a entendecirc-las como algo obrigatoacuterio e
sujeito a cobranccedilas (R2R3) Evidenciamos no R3 um utilitarismo subjacente na fala
do B1 e B3 quando afirmam que eacute importante ler para saber dar respostas a algum
questionamento realizado pela professora apoacutes a leitura
Sabemos que uma caracteriacutestica especiacutefica do ser humano eacute a da sua
capacidade de construir significados novos ou natildeo a partir do conjunto de signos
construiacutedos legitimados e utilizados em sua comunidade e que os modos gestos e
praacuteticas da leitura no decorrer da histoacuteria permitem que a consideremos uma praacutetica
cultural necessaacuteria para a participaccedilatildeo ativa e autocircnoma do sujeito (FREIRE 1989)
bem como o exerciacutecio pleno de sua cidadania (GIMENO-SAacuteCRISTAN 2008) Como
essas competecircncias em leitura natildeo satildeo inatas ao ser humano mas decorrem dos
muacuteltiplos efeitos das praacuteticas sociais inclusive das praacuteticas educativas dos
professores em sala de aula a posiccedilatildeo que ocupam e assumem esses
socializadores quando lidas com textos escritos ou natildeo afetam o comportamento
R3
Pesq B1 vocecirc acha importante lermos histoacuterias B1 Ahratilde (Balanccedila a cabeccedila dizendo sim) Pesq Por quecirc B1 Assim por exemplo eu li uma histoacuteria aiacute a pessoa tambeacutem leu e pergunta alguma coisa para mim vai que eu natildeo sei neacute Pesq E vocecirc B3 acha importante lermos histoacuterias B3 Ahratilde ( afirmaccedilatildeo) Pesq Por quecirc B3 porque se a professora perguntar alguma sobre a histoacuteria vo cecirc natildeo vai saber
R2 Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009Diaacuterio de Campo 02122009
Durante a hora do conto a professora da TB reforccedila por vaacuterias vezes a importacircncia de presta rem atenccedilatildeo pois apoacutes a contaccedilatildeo faraacute alguns questionamentos sobre a histoacuteria E se natildeo prestarem atenccedilatildeo natildeo saberatildeo responder
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em relaccedilatildeo agrave leitura das novas geraccedilotildees Construiacuteda pelo processo contiacutenuo de
letramentos diversos a leitura enquanto accedilatildeo individual de uma praacutetica social
(MARCUSHI 1998) permite transformaccedilotildees no modo de sujeito-leitor perceber e
utilizar os coacutedigos escritos
Eacute comum que uma crianccedila na fase do seu letramento inicial na escola isto
eacute no inicio da apropriaccedilatildeo dos coacutedigos da escrita prefira ler textos escritos agrave
narraccedilatildeo oralleitura dos mesmos produzida por outros Apropriar-se dessa
tecnologia parece garantir preferecircncia e motivaccedilatildeo Isso natildeo quer dizer que natildeo
goste de ouvir as leituras produzidas por outros Os dois recortes a seguir que
contemplam falas dos alunos participantes satildeo indiacutecios que fundamentam essas
hipoacuteteses explicativas Vejamos nos recortes (R4 e R5) a seguir
Afinal pode-se concluir que natildeo haacute quem natildeo goste de ouvir uma boa
histoacuteria Eacute ouvindo histoacuterias que se pode sentir emoccedilotildees importantes [] e viver
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouverdquo
(ABRAMOVICH 2004 p164) e na medida em que as histoacuterias nos fazem redefinir
R5 Pesq B1 vocecirc gosta mais de ouvir a professora contando a histoacuteria ou vocecirc gosta mais de ler sozinha a histoacuteria B1 Ah eu gosto de ler Pesq e vocecirc B3 B3 mais de ler Pesq e vocecirc B4 B4 ler B2 ler
R4
Pesq Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou vocecirc ler a histoacuteria A5 eu ler A4 eu ler Pesq e vocecirc A1 eu tambeacutem A2 eacute os dois os dois A3 lecirc
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nossa imagem social diante daquilo que somos vamos resgatando nossas crenccedilas
refazendo nossa trajetoacuteria afetiva revisitando nossos sentimentos recordando
nossa infacircncia e remexendo a nossa imaginaccedilatildeo (SISTO 2005 p 24)
A escuta das histoacuterias permite obter resposta(s) a questotildees que nos intrigam
e possibilita que nos identifiquemos com os personagens e com eles podermos
sorrir gargalhar chorar e assim perceber que outros em circunstacircncias diversas
sentem e lidam com dificuldades que entenderiacuteamos ser soacute nossas
As praacuteticas de algumas comunidades letradas datildeo conta da importacircncia da
contaccedilatildeo de histoacuterias para os membros que a compotildeem (ABREU 1999) porque
ouvir histoacuteria eacute conhecer outros lugares etnias ficar a par de saberes alguns
escolarizados em disciplinas como Portuguecircs Histoacuteria Geografia Filosofia Poliacutetica
permite enfim conhecer um pouco de tudo como ensina Abramovich (2004)
A literatura enquanto uma das produccedilotildees que a linguagem possibilita
oportuniza que os autores interajam com o leitor Isso porque seus textos tratam de
temas relacionados agrave vida que ultrapassam o espaccedilo-tempo em que foram
produzidos
O interesse pela leitura se consolida pelas praacuteticas cotidianas desde a
infacircncia seja pelas accedilotildees da escola eou da famiacutelia A escola enquanto instituiccedilatildeo
social e os professores enquanto seus agentes principais de leitura satildeo
responsaacuteveis pela constituiccedilatildeo do aluno como leitor Poreacutem a famiacutelia desempenha
um papel muito importante nessa formaccedilatildeo (FREIRE 2010)
A formaccedilatildeo do leitor inicia-se no ambiente familiar atraveacutes de encontros
Encontros com as palavras com o livro com os demais artefatos culturais mas
sabemos que os afazeres do dia-a-dia comprometem e limitam o espaccedilo-tempo para
os encontros Se devem comeccedilar no ambiente familiar precisam sem duacutevidas ter
continuidade na escola
A praacutetica da leitura e a demonstraccedilatildeo do interesse pela mesma por parte dos
pais ou ateacute mesmo dos cuidadores das crianccedilas servem como estiacutemulo para o
desenvolvimento do gosto pela leitura dos filhos Eacute necessaacuterio que em casa o
acesso a livros de assuntos os mais diversos seja oportunizado A prova disso estaacute
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nos relatos das crianccedilas que desenvoltas nas conversas durante as entrevistas
afirmam receber estiacutemulo por parte da famiacutelia
Podemos verificar tanto no R6 quanto no R7 que as crianccedilas A1 e A3 relatam
essa participaccedilatildeo da famiacutelia No R7 A1 informa que o pai tem o haacutebito de contar
histoacuterias para ela Jaacute A3 no R6 relata ter uma minibiblioteca em casa Em uma
conversa informal pelos corredores da escola essa crianccedila contou que a biblioteca eacute
dela e do irmatildeo mais velho e que a matildee sempre compra livro para os dois
Freire (2010 p 192) afirma que ldquoa escola eacute a principal instacircncia responsaacutevel
pela formaccedilatildeo de leitores mas natildeo a uacutenica jaacute que o ambiente favoraacutevel e
estimulante deveria comeccedilar na famiacutelia []rdquo A forma pela qual a famiacutelia e
posteriormente a escola conduzem a leitura pode contribuir para o desenvolvimento
de um olhar mais apurado propiciando a reflexatildeo acerca do que eacute lido ou escutado
Isto porque Bajard (1994) garante que ldquoo foco natildeo reside mais na apropriaccedilatildeo do
texto ele passa a se situar na singularidade de uma comunicaccedilatildeo espacial entre
R7
A1 Meu pai conta uma histoacuteria laacute do meu livro que tem um monte de historinha daiacute eu sempre quero que ele lecirc de novo Tinha uma laacute de coraccedilatildeo que um menino era mau soacute por causa de uma aranha no coraccedilatildeo que teve que um dar o coraccedilatildeo A2 Ah Era um elefante (questiona A1) A1 Natildeo era um garotinho que eacute mau Pesq mas ai ele (pai) sempre conta para vocecirc A1 Natildeo mas a gente conta outras por que a que eu jaacute es- cutei ele fala que natildeo pode ler mais Que natildeo tem mais graccedila
R6
A2 A A3 natildeo pegava haacute muito tempo porque ela perdeu um li- vro soacute por issomas ela adora livro Ela tem uma mini bi- blioteca na casa dela
A3 Eacute verdade a gente tem um quarto vazio e a gente tirou uns armaacuterios que tinha e a gente colocou um monte de ar- maacuterios cheio de livrosNenhum armaacuterio sem livros alguns tem que ficar em cima da mesa ateacute
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pessoa que daacute voz a um texto e outra que ao escutaacute-lo o enxergardquo (BAJARD 1994
p53)
Em sendo assim as famiacutelias por exemplo poderiam incluir nos programas de
finais de semana aleacutem da rotina de passear ou ir a um shopping uma parada
obrigatoacuteria na livraria nem que seja soacute para conferirem os novos lanccedilamentos e
lerem as informaccedilotildees da contracapa Agrave noite antes de dormir os mais velhos avoacutes
pais ou irmatildeos deveriam contar histoacuterias de ficccedilatildeo ou ateacute mesmo da vida real para
as crianccedilas e estes ao som da histoacuteria contada poderiam imergir em outros
mundos mundos maacutegicos ou reais e adormecer entre sonhos fantasias e fatos
reais
Na medida em que esses comportamentos de incentivo agrave leitura por parte de
pais e professores ocorrerem os mais jovens desde crianccedila poderatildeo perceber que
a leitura torna-os mais criacuteticos e capazes de interagir melhor uns com os outros e
com o mundo No R8 estatildeo transcritas as impressotildees e observaccedilotildees registradas no
diaacuterio de campo
R8 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 16161616111111112009200920092009
Tenho percebido que alguns alunos especificamente (A1 ndashA2 ndash A3 ndash B4) satildeo mais desenvoltos durante as entrevistas Natildeo apenas respondem as perguntas feitas por mim mas tambeacutem discutem colocam suas opiniotildees intervecircm contradizem argumentam imaginam inventam Demonstram uma destreza e pertinecircncia na hora de dialogar surpreendentes No decorrer das intervenccedilotildees e nas conversas informais que fui tendo com estas crianccedilas pude perceber que aleacutem de instigados pela professora recebem de seus pais incentivo para lerem
Durante minha passagem pela Instituiccedilatildeo fora dos momentos de intervenccedilotildees presenciei a matildee de A2 na biblioteca da Instituiccedilatildeo lendo diversos livros enquanto aguardavam a saiacuteda dos filhos Acredito ser um haacutebito desta matildee fazer leituras diaacuterias Sem contar que durante a minha visita a um Sebo no centro da cidade encontrei a matildee da A2 juntamente com ela e o irmatildeo comprando e trocando alguns livros
Jaacute A3 que tem uma mini biblioteca em sua casa confessou compartilhar com o irmatildeo a leitura de livros O irmatildeo mais velho a ajuda na leitura ora ele lecirc uma paacutegina ora ela lecirc outra A matildee de A3 eacute coordenadora de um Museu na cidade e busca colocar os filhos sempre em contado com os livros A3 e seu irmatildeo sempre trazem livros de diversos assuntos para a escola
Natildeo posso esquecer-me de A1 que aleacutem de demonstrar bastante apreciaccedilatildeo pela leitura afirmou durante uma das entrevistas levar livros todos os dias porque assim sua matildee pode ler para ela quando fosse dormir
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A escuta das leituras realizadas por outros e a leitura individual natildeo soacute
contribuem para o desenvolvimento cognitivo da crianccedila como interveacutem nas
dimensotildees de subjetividade Instiga-a ainda agrave reflexatildeo ao desenvolvimento da
sensibilidade e do senso criacutetico aleacutem de incitar o imaginaacuterio o luacutedico e o prazer
(COELHO 1986)
Perceber a leitura enquanto processo formativo exige pensaacute-la como uma
atividade que estaacute diretamente ligada agrave subjetividade do leitor natildeo soacute com o que o
leitor sabe mas tambeacutem com aquilo que ele eacute (LARROSA 2002 b)
Quando a pesquisadora produziu a leitura do texto Ah Cambaxirra se eu
pudesse(MACHADO 2003) propocircs aos alunos que refletissem acerca do
problema que o paacutessaro estava enfrentando com a perda de sua aacutervore por causa
do lenhador A partir dessa reflexatildeo registramos que alunos da turma A desvendam
e compartilham com o grupo as estrateacutegias pessoais que utilizariam para solucionar
essa situaccedilatildeo (R9) Estrateacutegias decorrentes das formas de pensar agir e dos
valores sociais apropriados pelas experiecircncias anteriores
79
Como ensina (SILVA 2009 p106) ldquoSeus desejos [] preferecircncias
sentimentos e emoccedilotildees juntamente com sua histoacuteria de vida eacute o que determina
como se relacionaraacute com seu mundo exteriorrdquo Pela escuta e leitura a crianccedila e
qualquer leitor desvenda natildeo soacute os sentidos do texto mas com frequecircncia eacute levado
a refletir e a fundamentar decisotildees Portanto a leitura permite ao indiviacuteduo
(re)significar seus saberes pelo efeito do tipo de interaccedilatildeo que manteacutem com o texto
em uma dada situaccedilatildeo ou seja pela relaccedilatildeo que jaacute viveu e sabe com aquilo que eacute
proposto pelo texto
As histoacuterias estruturam o imaginaacuterio iacutentimo das crianccedilas impelindo-as a
interpretar e relacionar os acontecimentos de sua realidade com os da ficccedilatildeo por
vezes presentes nos textos que escutam ou que leem Deste modo a subjetividade
R9
Pesq Mas natildeo era mais faacutecil ela ir para a aacutervore que estava do la do do que ir de casa em casa para resolver o seu problema A2 Eacute que o galho era muito bonito e ela queria fazer naquela aacutervore daiacute ela teve que ir ateacute resolver o problema dela Pesq A4 se vocecirc fosse a Cambaxirra o que vc faria na hora que o lenhador fosse cortar a aacutervore A4 Eu ia bater nele ( risos) A1 era soacute bicar Pesq vocecirc acha que resolveria o problema bicando A4 Sim Pesq E vocecirc A3 o que vocecirc faria A3 Eu ao inveacutes de ir na casa do outro e ir passando de casa em casa que cansa muitoentatildeo eu ia para outra aacutervore A2 mas o galho era muito bonito e ela queria ficar Pesq mas a A3 iria para outra aacutervore fazer seu ninho natildeo eacute A3 A3 Ahratilde A2 Eu natildeo Pesq o que vocecirc faria A2 Eu teria feacute e ia de casa em casa ateacute resolver o meu pro- blema Porque se eu mudar de arvore natildeo vai resolver nada Tipo a minha matildee taacute comprando um Caderno e eu quero muito o outro caderno e ela natildeo compra o que eu quero soacute porque ela natildeo gosta e daiacute eu vou falar -Taacute bom e deixar que ela compra o que eu natildeo quero Natildeo Tem que comprar o que eu gostei Se vocecirc quer uma coisa vocecirc tem que resol- ver
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de quem escuta ou lecirc sofre modificaccedilotildees algumas significativas a partir dessas
ligaccedilotildees realizadas
Eacute possiacutevel verificar no recorte R10 a incitaccedilatildeo que as histoacuterias causam nas
crianccedilas e as ligaccedilotildees que fazem ao relacionar realidade com ficccedilatildeo Apoacutes a
apresentaccedilatildeo da histoacuteria Menina bonita do laccedilo de fita (MACHADO 1999) as
crianccedilas dialogaram sobre a mesma e compararam o desejo e accedilotildees do
personagem com os fenocircmenos da realidade vivida por elas
Quando ressaltamos que as leituras possibilitadas por situaccedilotildees de contaccedilatildeo
de histoacuterias incitam aleacutem do cognitivo e do experimental o imaginaacuterio o luacutedico e o
prazer eacute porque os contextos gerados por essas situaccedilotildees congregam o real com a
fantasia de modo maacutegico e atraente Entendemos essas leituras natildeo soacute como
passatempo um mecanismo de evasatildeo do mundo real mas formativas Porque
como ensina Bajard (1994) a leitura em voz alta contraacuteria agrave silenciosa eacute uma
atividade que envolve convivecircncia e por isso formativa (BAJARD 1994) ldquoA leitura
que envolve convivecircncia funciona como conhecimento socialrdquo (BAJARD 1994
p51) Contudo a evoluccedilatildeo das representaccedilotildees da ldquoleitura em voz altardquo permite que
algumas de suas funccedilotildees ldquomesmo natildeo inerentes ao ato de lerrdquo (BAJARD 1994
p53) permaneccedilam importantes Uma delas decorre da convivecircncia que a leitura em
voz alta pressupotildee para a sua realizaccedilatildeo
Essa funccedilatildeo de convivecircncia se estabelece a partir de um texto escrito preexistente que natildeo eacute o uacutenico canal de comunicaccedilatildeo uma vez que se articula com outras linguagens Essa situaccedilatildeo de
R10
A1 Eacute assimtipo eu gosto de vocecirc mas soacute que daiacute o coelho ele gostava tanto da menina ela era tatildeo bonita que ele queria saber como mas eu aprendi que vocecirc natildeo pode ser como o outro A5 Soacute se for um irmatildeo gecircmeo Pesq Seraacute que um irmatildeo gecircmeo eacute igual A4 eacute A5 eacute A3 agraves vezes natildeo (pensa) natildeo O meu irmatildeo teve um amigo que era gecircmeo mas um era maior do que o outro um deles tinha olho verde e o outro azul
81
comunicaccedilatildeo pluricodificada a partir de um texto jaacute existente se identifica no plano da semioacutetica agrave comunicaccedilatildeo teatral (BAJARD 1994 p 53)
Se salientamos que as histoacuterias contadas incitam o imaginaacuterio eacute porque a arte
narrativa conta o sonho como se fosse realidade e a realidade como se fosse sonho
(BONTEMPELLI apud HELD 1980) Independentemente dos gecircneros das
literaturas sejam elas realiacutesticas ou fantaacutesticas todas carregam com si poder do
imaginaacuterio E como ressalta Bernard (apud HELD 1980 p 28) ldquotodos os gecircneros
satildeo portadores de imaginaacuterio para quem souber fazecirc-lo aflorarrdquo
Held (1980) defende o imaginaacuterio como a principal caracteriacutestica da literatura
infantil Ao ouvir uma histoacuteria a crianccedila ou quem a escuta relaciona o mundo real
com o ficcional como podemos observar no recorte R11 De maneira luacutedica quem a
escuta apropria-se de saberes cognitivos e de experiecircncias Cada um projeta e
introjeta pela escuta ou leitura do texto seus anseios anguacutestias e desejos Da
dinacircmica desses processos resultam mudanccedilas iacutentimas algumas das quais
instrumentais para a soluccedilatildeo de problemaacuteticas presentes ou mesmo futuras A
histoacuteria dentro do mundo imaginaacuterio da crianccedila trata de relaccedilotildees e situaccedilotildees reais
que ela natildeo pode entender sozinha (ABRAMOVICH 2004) No Recorte R11 apoacutes a
leitura da histoacuteria Beto o carneiro (MACHADO 1993) podemos observar a relaccedilatildeo
que as crianccedilas fazem do mundo real com o ficcional quando a pesquisadora os
questiona quanto agrave soluccedilatildeo que dariam se estivesse no lugar do carneiro B2 diz
tentar ser uma pessoa pois segundo suas experiecircncias e seu conhecimento os
animais morrem raacutepido e as pessoas somente quando envelhecem Jaacute B3 desejaria
ser um tigre
R11
Pesq B3 se vocecirc fosse carneiro e natildeo tivesse feliz em ser carneiro o que ia fazer B3 eu ia tentar ser um tigre pra conhecere depois ia voltar ser ovelha B2 eu ia tentar ser pessoa porque animal morre muito raacutepido Pesq e pessoa natildeo morre raacutepido B1 Pessoa natildeo Precisa taacute bem velho para morrer B2 tipo a minha voacute
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Held (1980) ainda nos assegura
[] a ficccedilatildeo responde a uma necessidade muito profunda da crianccedila natildeo se contentar com sua proacutepria vida Assim a narraccedilatildeo fantaacutestica reuacutene materializa e traduz todo o mundo de desejos compartilhar da vida animal tornar-se invisiacutevel mudar seu tamanho e resumindo tudo isso- transformar agrave sua vontade o universo (HELD 1980 p 52)
Poreacutem ldquoeacute evidente que as aquisiccedilotildees feitas sem verdadeiro emprego de
interesses de uma crianccedila sem que se sinta interessada e apaixonada natildeo deixam
traccedilos duraacuteveisrdquo (HELD1980 p226)
O contato que a leitura possibilita ou a contaccedilatildeo de histoacuterias que tenha por
suporte obras literaacuterias auxiliam na compreensatildeo do real Porque as histoacuterias
narrada vatildeo se entrelaccedilando com a histoacuteria de vida do proacuteprio sujeito que constroacutei
pela possibilidade do simboacutelico um mundo de identidades e relaccedilotildees de significados
essenciai referentes agrave dimensatildeo humana da vida Isto eacute possiacutevel ser observado nos
diaacutelogos apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria O segredo da lagartixa (DANSA 2000) que
compotildeem o recorte R12 A conversa gira em torno da accedilatildeo egoiacutesta da personagem
e as crianccedilas passam a fazer comparaccedilotildees entre as experiecircncias vividas com a
histoacuteria ficcional da obra
83
Contar histoacuteria eacute como entrar no imaginaacuterio iacutentimo da crianccedila O contador de
histoacuteria eacute como uma ponte para fazer o ouvinte chegar ao livro O contador liberta as
palavras Eacute como se as palavras estivessem presas nos textos e fossem libertadas
pela boca do contador Contar e ouvir histoacuterias tem tudo a ver com a nossa cultura
oral O ato de contar histoacuterias eacute praacutetica que remete a mecanismos tradicionais de
transmissatildeo de conhecimentos aleacutem de oferecer a possibilidade da troca de
vivecircncias e saberes de forma luacutedica transformando num jogo o que na verdade
constitui o aprendizado
O contador torna o livro vivo o livro ganha corpo e voz A literatura por meio
da contaccedilatildeo e dos encontros entre sujeitos e objeto permite unir geraccedilotildees consente
tambeacutem em mostrar para a crianccedila o reflexo da proacutepria alma o lado sombrio e natildeo
sombrio fazendo com que sonhe tenha medo se alegre e assim ela possa
compreender que a vida natildeo eacute faacutecil e que assim como os personagens passamos
por muitos obstaacuteculos
Eacute com perseveranccedila e fazendo do encanto de ler uma realidade palpaacutevel que
se transforma uma crianccedila num amante fiel da leitura
R 12 Pesq Vocecircs satildeo egoiacutestas que nem a lagartixa ou vocecircs divi- dem o amor B4 Dividi B3 eu natildeo divido Eu sou um pouco egoiacutesta B1 com a minha irmatilde eu to brigada entatildeo eu natildeo divido mas aqui eu divido Pesq o B3 falou que eacute um pouco egoiacutesta Por quecirc B3 B1 Porque eu natildeo dou um pouquinho da Traquinas (bolacha) pro Guilherme ou pro Enrico B4 eu soacute sou egoiacutesta com o meu irmatildeo Ele eacute muito chato Ele natildeo divide nem o Playstation (viacutedeo-game) B2 eu tambeacutem sou egoiacutesta com minha irmatilde com minhas duas irmatildes Com a primeira eu sou egoiacutesta que eacute a pe- quenininha porque ela me bate ela me arranha e natildeo deixa pegar os brinquedos dela Com a grandona eacute a mesma coisa B1 eu sou egoiacutesta sabe por quecirc As minhas irmatildes quando pegam alguma coisa para comer elas datildeo uma mordida antes que eu veja
84
32 Entre os entrecruzamentos de matrizes as praacuteticas de leituras e a
concepccedilatildeo de leitor
Mesmo sem saber o poder que pode exercer sobre o texto e o livro as
crianccedilas jaacute satildeo capazes de perceber o poder que o livro exerce sobre elas
Entendem que as obras literaacuterias estatildeo ali para informar algo mas natildeo deixam de se
envolver questionar interrogar refletir sobre accedilotildees de personagens e decisotildees
tomadas pelo autor Podemos verificar este envolvimento no R13 quando as
crianccedilas satildeo questionadas sobre a accedilatildeo do personagem protagonista da histoacuteria e
acabam por buscar alternativas para o final
O leitor eacute capaz de ler aleacutem do texto capa as imagens as cores refletindo
sobre o objeto com o qual dialogam (SISTO 2005) Dentro do ambiente escolar o
mediador tem a possibilidade de ampliar a leitura de seus alunos oportunizando o
degustar natildeo soacute o texto impresso mas as cores as imagens enfim todos os
elementos que compotildeem a obra literaacuteria No decorrer da pesquisa durante as
observaccedilotildees das performances dos professores em situaccedilatildeo de contaccedilatildeo pudemos
presenciar uma das professoras realizando a leitura das imagens das cores do livro
com o qual estava trabalhando e fazendo interpelaccedilotildees durante a apreciaccedilatildeo das
mesmas Eacute o que podemos ver no R14
R 13
A2 eu ia eu ia mudar Pesq vocecirc ia mudar A2 Como iria ser o seu final A2 Eu ia colocar assim ele viram (o segredo da caixinha) e daiacute ela teve um monte de amigos e todos os dias quase os amigos dele ia na casa dela
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As praacuteticas de leitura desencadeadas pelo professor e a sua concepccedilatildeo de
leitura influenciam o modo como as crianccedilas percebem e sentem a leitura As
crianccedilas vatildeo construindo seu conceito de leitura a partir das praacuteticas exercidas no
seu conviacutevio social A praacutetica exercida pela PA expostas no R15 e a sua concepccedilatildeo
de leitura retratada no recorte R16 parecem se refletir no entendimento de leitura de
seus alunos como consta no recorte R17
R15 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a apresentaccedilatildeo da histoacuteria O leatildeo e o Ratinho a professora ia questionando os alunos sobre a atitude do leatildeo e do ratinho Estas interpelaccedilotildees permitiu que os alunos fossem refletindo e colocando seus pensamentos sobre as accedilotildees dos personagens
R14 Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009Diaacuterio de Campo 09122009
A professora da TA iniciou sua leitura do Livro ldquoA casa sonolentardquo questionando os alunos sobre a ilustraccedilatildeo sobre as cores e as formas (das letras) utilizadas na capa do livro ldquoQual a cor que predomina na capa Por que seraacute que a ilustradora escolheu esta corO que mais podemos observar nesta capaldquo (questionamentos feito pela professora)
R 16
PA O bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire lO bom leitor lecirc com prazer e natildeo por obrigaccedilatildeo Adquire liiiivvvvros ros ros ros
comcomcomcom freqfreqfreqfrequuuuecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com ecircncia na biblioteca possui bom vocabulaacuterio discute com osososos colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo colegas e professores o que lecirc Ele lecirc muito e gosta de ler Natildeo aaaacredito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de credito que exista ldquomaurdquo leitor o que existe eacute a falta de estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila estimulaccedilatildeo adequada para favorecer a leitura na crianccedila Para que Para que Para que Para que isso ocorraisso ocorraisso ocorraisso ocorra a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo a influecircncia do meio eacute muito significativa A estimulaccedilatildeo dos paisdos paisdos paisdos pais prprprproooofessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para fessores e do meio em que convive eacute fundamental para desenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devemdesenvolver a leitura de forma prazerosa na crianccedila Devem----se se se se favorecerfavorecerfavorecerfavorecer agraves criaagraves criaagraves criaagraves criannnnccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leituccedilas as diversidades de leitura para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu ra para ampliar o seu
conhecimento e fconhecimento e fconhecimento e fconhecimento e faaaacilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizadocilitar o seu aprendizado
86
Com isso concordamos com Chartier (2001) ao afirmar que as praacuteticas de
leituras desempenhadas em um espaccedilo intersubjetivo propiciam o compartilhamento
de significados atitudes e comportamentos e a escola sendo este espaccedilo
intersubjetivo deve assegurar estas praacuteticas de leitura A concepccedilatildeo que cada
professor tem de leitura eacute o que iraacute conduzir a sua praacutetica dentro de sala de aula ou
seja dentro deste espaccedilo intersubjetivo
As praacuteticas de leituras satildeo consideradas um desencadeador de debates
sobre diversos assuntos do mundo tanto do mundo simboacutelico quanto do mundo real
da crianccedila Promovem confronto e contraposiccedilatildeo de saberes pelo compartilhamento
de significados construiacutedos no pensamento da crianccedila atraveacutes de diferentes
vivecircncias No recorte R18 podemos certificar a afirmaccedilatildeo feita anteriormente no
relato da pesquisadora A PA faz interferecircncias permitindo o diaacutelogo entre ouvinte e
texto
A aprendizagem pela leitura comeccedila muito antes do processo escolarizaccedilatildeo
(CHARTIER 2001) Inicia-se com as experiecircncias vividas pela crianccedila na busca de
R18 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 03030303121212122009200920092009 Durante a leitura do livro ldquoO leatildeo e o Ratinhordquo a professora PA foi questionando os alunos quanto a atitudes e accedilotildees dos personagens e assim criando um diaacutelogo entre a leitura e as posiccedilotildees e contraposiccedilotildees dos alunos O interessante eacute que estas pausas para questionar natildeo interferiram na dinacircmica da leitura mesmo porque os alunos estavam envolvidos nos diaacutelogos quando natildeo estavam atentos ao julgamento dos colegas
R17 Pesq Por que eacute importante lermos histoacuterias A1 Porque eacute importante para a nossa inteligecircncia Pesq Noacutes ficamos mais inteligentes quando lemos A3 fica A2 fica sim A1 por que a gente aprende mais A2 Vai que a gente natildeo sabe alguma coisa ai quando a gente lecirc a histoacuteria a gente sabe o que que eacute
87
responder questionamentos sobre o mundo Este compartilhamento este contato
com outros saberes com outras formas de pensar proporcionaraacute na crianccedila a
construccedilatildeo de forma mais elaborada e complexa do seu pensamento Podemos
observar a partir das conversas realizadas apoacutes a narraccedilatildeo da histoacuteria Menina
bonitas do laccedilo de fita (MACHADO 1999) a relaccedilatildeo que a crianccedila faz das
experiecircncias vividas com as leituras realizadas B3 segundo suas vivecircncias justifica
como a menina deveria ter agido com o coelho branco jaacute que o mesmo desejava ser
negro como a menina (R 19) A insistecircncia do coelho para que ela lhe dissesse
como havia conseguido ficar negra fez com que a menina inventasse uma mentira
jaacute que desconhecia o motivo pelo qual tinha aquela caracteriacutestica fiacutesica
Muitas vezes vemos que a praacutetica de leitura instituiacuteda nas escolas cai em um
ldquomodismordquo no qual a leitura deixa de ser uma praacutetica social para se tornar um
exerciacutecio em que prevalece apenas uma voz a do autor do texto ou seja para se
tornar em leitura parafraacutestica Como ressalta Geraldi (1985 p78) ldquo[] na escola natildeo
se leem textos fazem-se exerciacutecios de interpretaccedilatildeo e anaacutelise de textos e isto natildeo eacute
mais que simular leiturardquo
Mas natildeo podemos culpabilizar somente o professor Devemos voltar os
nossos olhos para todo o processo educativo e para as condiccedilotildees de formaccedilatildeo e
trabalho do professor Geraldi (1985) alega que este ldquomodismordquo adveacutem da falta de
investimento maior na formaccedilatildeo continuada e na ausecircncia de conhecimento de um
referencial teoacuterico consistente que baseie a sua praacutetica
Podemos perceber a prevalecircncia da voz do autor a anaacutelise e interpretaccedilatildeo
sem que haja a possibilidade de reflexatildeo sobre o olhar do autor do outro e de si
mesmo no recorte R20
R 19
Pesq Que natildeo podemos mentir para os outros B3 eacute para os outros Pesq O que aconteceu na histoacuteria para vocecirc aprender isso B3 porque a menina tinha mentido para o coelho ela tinha que ter dito a verdade para ele ter ficado no sol ele ia ficar preto bem raacutepido
88
Quando o professor enquanto mediador por meio das praacuteticas de leitura
possibilita o diaacutelogo entre as experiecircncias preacute-estabelecidas vivenciadas
socialmente pelo aluno e o texto este potencializaraacute em seus alunos uma leitura
polissecircmica As praacuteticas de leitura devem ter perspectivas mais amplas que vatildeo
aleacutem da mera decodificaccedilatildeo Para isso eacute preciso propor atividades desafiadoras que
induzam o aluno a comentar sobre o que leu e descobriu a relacionar a registrar a
estabelecer relaccedilotildees podendo assim construir novas siacutenteses usando e explorando
sua subjetividade
Nem sempre o que o aluno lecirc eacute compreendido pelo mesmo Segundo
Kleiman (2004) a compreensatildeo natildeo estaacute garantida no ato de ler Por isso eacute
necessaacuterio que o professor provoque seus alunos-leitores incite a reflexatildeo a
respeito do que leu Isso fica claro nas palavras proferidas pela PA no recorte R 21
R 20 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 10101010121212122009200920092009 A professora sentou com a turma em roda para ler o livro rdquoNingueacutem eacute igual a ningueacutemrdquo Ela foi lendo e mostrando as figuras por vaacuterias vezes eacute interrompida pelas brincadeiras dos alunos a mesma paacutera a histoacuteria para chamar-lhes a atenccedilatildeo Ao final da histoacuteria lanccedila perguntas diretas perguntas que natildeo sugerem reflexatildeo e consequentemente as respostas satildeo diretas PB Eacute legal chamarmos o amigo por apelido Aluno Natildeo PB Noacutes devemos respeitar o amigo natildeo eacute verdade Aluno Eacute PB Noacutes somos todos iguais ou um eacute diferente do outro Aluno Um eacute diferente do outro PB Entatildeo noacutes natildeo somos iguais ao outro se o amigo eacute mais baixo ou mais magro ou usa oacuteculos noacutes natildeo podemos ficar tirando sarro ou dando apelidos A professora explicou todo o sentido da histoacuteria segundo a visatildeo da autora As perguntas natildeo motivaram para uma maior reflexatildeo e discussatildeo acerca do assunto (diferenccedilas) e logo apoacutes explicar a histoacuteria a professora solicitou que todos fossem para seus lugares fechando o livro e guardando-o no armaacuterio
89
As praacuteticas de leitura vivenciadas pela e na escola devem possibilitar a
formaccedilatildeo do aluno-leitor um aluno capaz de fazer uma leitura criacutetica da realidade
capaz de fazer um exerciacutecio de articulaccedilatildeo entre diferentes textos e assim perceber
os muacuteltiplos sentidos que podem ser estabelecidos a partir de uma leitura mais
polissecircmica do texto
Entre as praacuteticas de leitura o trabalho com a literatura infantil atraveacutes da
contaccedilatildeo de histoacuteria tem sido um recurso metodoloacutegico de papel bastante
significativo no processo ensino-aprendizagem Mas assim como pode ser uma
praacutetica desencadeadora de atividades que constituiratildeo o sujeito pode tambeacutem ser
utilizada de forma negativa como instrumentos moralizadores com o ensejo de
introduzir exerciacutecios mecacircnicos e esteacutereis criando barreiras em face da leitura
desvalorizando sua verdadeira funccedilatildeo de gerar reflexatildeo desejo imaginaccedilatildeo e
prazer (ALLEBRANDT FEIL FRANTZ 1999)
Considerando que o ser humano eacute por natureza um contador de histoacuterias
algumas teacutecnicas e vivecircncias podem ajudaacute-lo a utilizar bem essa caracteriacutestica que
lhe eacute proacutepria Dessa forma a atividade de contar histoacuterias se transforma num
importantiacutessimo recurso de formaccedilatildeo do leitor
Sabemos que os alunos quanto mais se afastam da infacircncia ou seja das
primeiras leituras mais precisam ser estimulados motivados para que seus desejos
natildeo se percam no desalento Para se contar uma histoacuteria eacute necessaacuteria uma
preparaccedilatildeo longa desde a escolha ateacute a performance para a apresentaccedilatildeo da
mesma Esta preparaccedilatildeo eacute que faraacute o professor-contador transformar-se em um
exiacutemio contador Todo professor deve ser um contador de histoacuteria pois eacute atraveacutes
das histoacuterias que encantamos e envolvemos nossos alunos Como podemos ver no
comentaacuterio feito pela professora PB no recorte R22
R 21 PA Natildeo haacute idade para incentivar na crianccedila a leitura Eacute fundamental que a palavra escrita esteja ao seu alcance desde cedo E o que fazer quando a crianccedila natildeo demonstra nenhum interesse pela leitura O primeiro passo eacute descobrir se ela realmente entende o que anda lendo O ideal eacute partir de leitura de texto curto ou pequenos trechos de histoacuteria mais longa Tambeacutem colocar a crianccedila em contato com diferentes tipos de texto
90
R 22 PB Eacute sempre assim Eles nunca se concentram na hora da histoacuteria Quando vocecirc (referindo-se agrave pesquisadora-contadora) conta eacute diferente eles prestam mais atenccedilatildeo porque vocecirc conta sem o livro muda sua voz faz gestos
Como afirma Sisto (2009 p71) ao contar uma histoacuteria o professor precisa
estar atento ldquo[] ao fluxo da emoccedilatildeo na hora de contar agrave linguagem empregada []
ao ritmo da fala agraves imagens que cria com a voz o corpo e a emoccedilatildeo para fazer o
outro criar tambeacutem []rdquo Eacute preciso estar atento ao efeito que a histoacuteria causa em
nossos alunos (R23)
Atraveacutes das intervenccedilotildees realizadas pela pesquisadora-contadora foi
possiacutevel averiguar que aleacutem do cuidado em selecionar histoacuterias adequadas para
seus alunos o professor deve estar atento agrave preparaccedilatildeo da histoacuteria a ser narrada
Estar atento natildeo soacute agrave palavra mas aos gestos aos movimentos corporais e faciais
agraves pausas e aos silecircncios na hora de proferir a histoacuteria O comentaacuterio feito pela PA
recorte R24 nos mostra o quanto eacute importante estar atento aos recursos como voz
gestos entre outros na hora de contar uma histoacuteria
R 23 Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo Diaacuterio de Campo 09090909121212122009200920092009
Foi interessante ver como a professora PA se apropriou da entonaccedilatildeo da voz para narrar a histoacuteria rdquoA casa sonolentardquo No iniacutecio da histoacuteria todos os personagens dormem (neste momento a professora foi sussurrando em sua narrativa) Depois quando todos satildeo acordados pela picada de uma pulga sua narraccedilatildeo se tornou raacutepida e com um tom mais elevado
R 24
PA
Todas as intervenccedilotildees foram oacutetimas para contar as histoacuterias escolhidas a pesquisadora utilizou diferentes recursos como entonaccedilatildeo de voz e expressatildeo corporal o que prendeu a atenccedilatildeo da turma Os alunos esperavam ansiosos pelas intervenccedilotildees e durante as mesmas permaneciam compenetrados As histoacuterias escolhidas tambeacutem foram muito boas
91
Como alega Sisto (2005) exige-se do contador contemporacircneo antes de
tudo uma praacutetica de leitor e por conseguinte um apuro criacutetico e um aprimoramento
teacutecnico Seriacuteamos ingecircnuos se acreditaacutessemos que basta escolher um livro de
nosso apreccedilo para garantir o sucesso da contaccedilatildeo
Quando ousamos contar uma histoacuteria para nossos alunos natildeo podemos
desperdiccedilar esta oportunidade de se contar sem que a histoacuteria esteja pronta para
seduzir o aluno (R25) O professor precisa dominar o texto preparar previamente a
contaccedilatildeo utilizar conscientemente seja os recursos do proacuteprio corpo (emoccedilatildeo
memoacuteria gestos voz) seja os recursos teacutecnicos (naturalidade ritmo entonaccedilatildeo
pausas)
Apoacutes o teacutermino da contaccedilatildeo de histoacuteria o aluno sente a necessidade de
prolongar seu prazer de escutar Eacute neste momento que o professor deve promover o
encontro entre o aluno e o livro onde estaacute a histoacuteria contada eacute o momento de
apresentar o registro escrito as ilustraccedilotildees de confirmarnegar as hipoacuteteses
levantadas enquanto a histoacuteria era ouvida Circunstancialmente o aluno percebe que
pode reler os trechos de que mais gostou pular paacuteginas ler uma frase aqui outra
ali enfim pode escolher o rumo de sua leitura e ir em busca de outras histoacuterias
trilhando os caminhos para a sua formaccedilatildeo de leitor criacutetico
O que temos comprovado na praacutetica eacute que depois de ouvir uma histoacuteria bem
contada a reaccedilatildeo imediata do aluno eacute pedir o livro para vecirc-lo O professor que se
preocupa com a promoccedilatildeo da leitura deve disponibilizar para os alunos livros dos
mais variados gecircneros e autores gibis jornais e revistas de forma a possibilitar-lhes
a ampliaccedilatildeo do repertoacuterio enquanto leitores
R 25
PA Pude perceber que eles ficaram mais pacientes durante nossas sessotildees de leitura e houve maior interesse em ouvir a histoacuteria contada Alguns alunos se interessaram tanto pelas histoacuterias contadas pela pesquisadora que retiraram o(s) livro(s) em questatildeo na biblioteca para realizarem a leitura em casa
92
Tanto os recursos do instrumental humano quanto os teacutecnicos utilizados
garantem um sucesso maior no encantamento pela histoacuteria Isto soacute nos leva a crer
que a massificaccedilatildeo da leitura ou seja aquela leitura obrigatoacuteria quando todos os
alunos leem o mesmo livro e ao final do bimestre o professor realiza uma prova
constatando o aprendizado natildeo garante a formaccedilatildeo adequada que buscamos de
um leitor polissecircmico
33 O prolongamento do leitor no prazer da escuta
Em conversas informais no decorrer da pesquisa com a bibliotecaacuteria da
instituiccedilatildeo onde foram coletados os dados ela alega que os alunos mais
frequentadores da biblioteca com o intuito de retirar livros satildeo os mais novos
especialmente os alunos de 2deg 3deg e 4deg anos Eles sempre recorrem agrave bibliotecaacuteria
quando natildeo conseguem encontrar o livro desejado Durante o intervalo tambeacutem
costumam frequentar a biblioteca observam os livros novos folheiam outros
comentam com os colegas os livros que jaacute leram
Este interesse espontacircneo em preferirem ir agrave biblioteca isto eacute a escolha por
um ambiente destinado agrave guarda de livros parece ser um indiacutecio ao mesmo tempo
do desejo e do prazer em realizar leituras
O desejo em dar continuidade agrave histoacuteria escutada eacute propiciado pelo
prolongamento do prazer (SISTO 2005) A busca pelo prazer em continuar a viagem
ao mundo maravilhoso e imaginativo volvendo seus olhos iluminados e curiosos
para um mundo fantaacutestico
Pelos dados obtidos com auxiacutelio do sistema de registro da biblioteca
constataremos a busca do aluno pelo prazer e desejo em submergir nas leituras dos
livros que foram apresentados de forma luacutedica e satisfatoacuteria nas sessotildees de
contaccedilatildeo de histoacuterias O sistema de registro nos permitiu analisar a quantidade e
93
quais os livros retirados por cada aluno verificar o dia do empreacutestimo as datas
previstas para devoluccedilatildeo e a data da devoluccedilatildeo efetiva
Como informado ao longo do periacuteodo compreendido entre 26 de setembro a
26 de outubro de 2009 mecircs que antecedeu o iniacutecio da intervenccedilatildeo foram
identificados a quantidade e quais os livros retirados por cada aluno da turma A e B
O Quadro 2 apresenta o levantamento acerca da acessibilidade dos alunos
da Turma A e B agrave biblioteca para a retirada dos livros por periacuteodo antes e apoacutes a
intervenccedilatildeo
TURMAS
Nuacutemero de Alunos que Retiraram Livros
ANTES
POacuteS INTERVENCcedilAtildeO
TURMA A
(n= 27)
19
19
TURMA B
(n=22)
19
20
Quadro 2 ndash Nuacutemero de alunos que retiraram livros na Biblioteca antes e apoacutes a intervenccedilatildeo
A acessibilidade agrave retirada dos livros da biblioteca no periacuteodo que antecedeu
as intervenccedilotildees e durante as mesmas se manteve na turma A e houve um pequeno
acreacutescimo na turma B Foi possiacutevel verificar que entre 70 e 90 dos alunos que
iniciam o Ensino Fundamental como foi o caso dos alunos dessas turmas se
interessam e procuram livros da Literatura Infantil e embora estes apenas leiam as
imagens das ilustraccedilotildees como informaram B2 e B4 no recorte (R 26) abaixo natildeo
deixam de realizar leituras
94
No Quadro 3 informamos a quantidade de livros retirados pelos alunos das
turmas A e B Constata-se um aumento na quantidade de alunos da Turma A que
retiraram mais de 5 livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo em relaccedilatildeo ao periacuteodo que a
antecedeu Aleacutem disso o leitor pode verificar que 407 dos alunos da Turma A
retiram pelo menos um livro por mecircs
Entre os alunos da Turma B apesar de se registrar um aumento na retirada
de livros no periacuteodo poacutes intervenccedilatildeo com a quantidade de no miacutenimo trecircs livros
neste periacuteodo esse nuacutemero foi menor do que o constatado na Turma A
NUacuteMERO DE LIVROS RETIRADOS
TURMA A
(n=27)
TURMA B
(n=22)
ANTES POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO ANTES
POacuteS
INTERVENCcedilAtildeO
1 3 1 - -
2 1 2 1 -
3 2 1 2 2
4 3 2 - 4
5 3 2 1 1
Mais de 5 7 11 15 13
Quadro 3 Comparaccedilatildeo entre as retiradas de livros na Biblioteca por turma antes e poacutes-intervenccedilatildeo
No Quadro 4 podemos comprovar que houve interesse dos alunos em
buscar o livro apresentado pelo professor na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
R 26 Pesq Vocecirc gosta de ouvir B2 Eacute B2 Daiacute quando eu to com pressa eu comeccedilo a ler assim nem leio Pesq soacute lecirc os desenhos B2 Eacute Pesq e vocecirc B4 B4 mesma coisa que a B2 Quando eu tocirc com preguiccedila eu pego e
leio assim (raacutepido soacute olhando as imagens) e quando eu tocirc nor- mal assim eu gosto de ler
95
Quadro 4 Relaccedilatildeo de livros e total de retiradas (Turma A e B)
Quando na situaccedilatildeo de contaccedilatildeo de histoacuterias a escolha do livro e sua
apresentaccedilatildeo por professores acontecem de maneira provocativa e instigante para o
aluno este como leitor procura ter em matildeos esse livro O livro ldquoO segredo da
Lagartixardquo como se constata no Quadro 6 foi o que despertou maior interesse para
os alunos Paz (2007) em sua investigaccedilatildeo na qual pretendeu verificar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como um recurso que contribui na formaccedilatildeo de novos leitores como noacutes
o fizemos comprovou que entre alunos da 2ordf seacuterie a contribuiccedilatildeo da contaccedilatildeo de
histoacuteria eacute efetiva pois registrou que 100 dos alunos entrevistados afirmaram ir em
busca do livro apoacutes uma sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria
No levantamento feito poacutes intervenccedilotildees pudemos verificar que do total de
alunos que participaram de ambas as turmas 326 dos alunos foram em busca
dos livros apresentados
Sendo assim podemos concluir que para os alunos se formarem leitores eacute
imprescindiacutevel o esforccedilo por parte dos professores por exemplo quando cria
situaccedilotildees de contaccedilatildeo de histoacuterias E por esforccedilo entende-se que esse profissional
esteja disposto em investir seriamente na seleccedilatildeo dos textos na preparaccedilatildeo das
histoacuterias que iraacute contar para seus alunos dominando e aprimorando os recursos de
seu corpo da voz e os demais que possam expressar as emoccedilotildees que o texto
pretende gerar Quando assim procede aumenta a possibilidade de que o aluno
estabeleccedila com esse texto e a leitura muacuteltiplas relaccedilotildees Algumas delas de prazer
de identificaccedilatildeo de interesse e se constitua como leitor que pode ser livre na
Livro Trabalhado nas Intervenccedilotildees
Nuacutemero de Alunos por Retirada do Livro
Menina bonita do laccedilo de fita 3
O segredo da lagartixa 11
Ah Cambaxirra se eu soubesse 1
Beto o carneiro -
A bruxa que roubou o sol 1
A menina e o paacutessaro encantado -
96
interpretaccedilatildeo dos diversos textos que circunscrevem seu mundo independente dos
suportes e tecnologias utilizadas pelos autores para produzi-los
Dessa forma o professor estaraacute cumprindo seu papel de agente da leitura
que natildeo mede esforccedilos para formar leitores criacuteticos Precisa enfim ter em mente
que qualquer leitor estaacute apto a melhorar a sua capacidade interpretativa ldquopois
interpretaccedilatildeo nada mais eacute do que o exerciacutecio do proacuteprio pensamento em torno de
um pensamento alheiordquo (YUNES PONDEacute 1988)
Se por um lado constatamos o valor da contaccedilatildeo de histoacuterias por outro
percebemos que essa praacutetica estaacute submergindo principalmente no ambiente
familiar Verifica-se assiduamente que o encantamento por histoacuterias e as viagens
pelo mundo do imaginaacuterio estatildeo sendo substituiacutedas por outras atividades natildeo
literaacuterias
Entretanto situando a questatildeo no contexto escolar natildeo devemos esquecer
o alerta de Gimeno-Sacristaacuten (2008) quanto diz
O inimigo da leitura natildeo reside como actualmente alguns temem na cultura audio-visual que domina os meios de comunicaccedilatildeo e na extensatildeo das novas tecnologias mas nas desafortunadas praacuteticas de leitura dominantes a que submetemos os nossos alunos durante a escolaridade (GIMENO-SACRISTAN 2008 p 87 Grifos nossos)
Com os resultados desta pesquisa natildeo queremos afirmar que apenas a
praacutetica de contar histoacuterias no ambiente escolar seja suficiente para formar leitores
queremos sim propor e defender essa praacutetica como um recurso fundamental para o
processo de formaccedilatildeo de leitores especialmente nas fases de letramento escolar
inicial
97
4 CONSIDERACcedilOtildeES POSSIacuteVEIS
Haacute muitos e muitos anoshellip Era uma vez Em um lugar distante daqui
Enunciados como esses instigam deslocamentos de ordem espaccedilo-temporal
no indiviacuteduo que os ouve ou lecirc bem como das circunstacircncias socioculturais que
engendraram sua subjetividade podem ser provocados por relatos de outros
propostos por quem os conta por autores desconhecidos comuns na literatura de
cordel (ABREU 1999 GALVAtildeO 2003) outros autobiograacuteficos como o de Anne
Frank ou por exemplo autobiografias que foram objeto de anaacutelise de Sophia Lyra
por Morais (2000) de Ceciacutelia Assis Brasil por Bastos (2000) por contos tradicionais
e pela literatura O fato eacute que se pode de um lado dar razatildeo a Paulo Leminsky
quando escreveu ldquoNada tatildeo meu que natildeo possa dizecirc-lo nossordquo como aos dizeres
de Escarpitt e Baker (1975 apud MELO 1999 p 73) quando afirmaram
A fragilidade dos haacutebitos da leitura tem causas mais remotas que recuam agrave idade preacute-escolar Eacute provavelmente nessa idade que se formam as atitudes fundamentais diante do livro [] Eacute conveniente entatildeo que o livro entre para a vida da crianccedila antes da idade escolar e passe a fazer parte de seus brinquedos e atividades cotidianas
Contudo a figura do narrador estaacute desaparecendo como jaacute reconhecia
Walter Benjamin
[] satildeo cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente Quando se pede num grupo que algueacutem narre alguma coisa o embaraccedilo se generaliza Eacute como se estiveacutessemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienaacutevel a faculdade de intercambiar experiecircncias [] Uma das causas desse fenocircmeno eacute oacutebvia as accedilotildees da experiecircncia estatildeo em baixa e tudo indica que continuaratildeo caindo ateacute que seu valor desapareccedila de todo (BENJAMIN 1994 p 197)
Verifica-se nos dias atuais uma reduccedilatildeo dos meios impressos de
comunicaccedilatildeo ocasionada possivelmente pela coexistecircncia da leitura desses
98
impressos com outros suportes ndash ldquoque dispensam ou reduzem sensivelmente a
mediaccedilatildeo do coacutedigo alfabeacuteticordquo (MELO 1999 p61) ndash criados pela moderna
tecnologia Junta-se a isso o fato de que ldquoTanto o acesso quanto o tempo dedicado
pelo puacuteblico ao raacutedio e agrave televisatildeo satildeo maiores que aqueles destinados ao livro ao
jornal e agrave revistardquo (MELO 1999 p 61) Por isso hoje mais do que antes compete agrave
escola despertar atitudes positivas nos alunos em relaccedilatildeo agrave leitura
Cremos que devemos propor aos nossos alunos um convite para adentrar o
mundo da imaginaccedilatildeo a cada livro aberto e a cada histoacuteria contada E nessas
viagens carregadas de emoccedilatildeo e reflexatildeo provocar neles o desejo de silenciar o
coraccedilatildeo e escutar com os olhos as palavras proferidas pelo corpo e gestos do
professor-contador
Eacute comum presenciarmos nos espaccedilos escolares alunos de anos posteriores
a seacuteries iniciais alegarem natildeo ter apreccedilo pela leitura Poreacutem constatamos que os
alunos das seacuteries iniciais em especial os do 2ordf ano do Ensino Fundamental
apreciam a leitura satildeo assiacuteduos agrave biblioteca e gostam de levar livros para casa
Contudo cultivar este prazer nos alunos requer um esforccedilo tanto dos
professores quanto da famiacutelia visto que eacute no ambiente familiar que a crianccedila tem o
primeiro contato com a leitura Ela lecirc os gestos da matildee o timbre no som da voz e
suas accedilotildees nos primeiros anos de vida e posteriormente vai ampliando o seu
modo de ler constituindo-se assim continuamente como um leitor
Ao ingressar no espaccedilo escolar a crianccedila em especial das seacuteries iniciais
ou seja do Ensino Fundamental comeccedila a passar por um processo de letramento
extremamente significativo para ela E eacute neste momento que o professor deve estar
atento para cultivar o desejo e o prazer pelo ato de ler Os alunos nesta fase
preferem ler sozinhos visto que jaacute conseguem decodificar os signos da escrita e
isso lhes daacute muito prazer
Haacute pesquisas internacionais como a de Sainsbury e Schagen (2004) na
Inglaterra pelo survey que aplicaram a 5076 alunos com idades entre nove e 11
anos de idade buscam caracterizar o tempo que os alunos dispensam na escola e
em casa agrave leitura o interesse e atitudes dos mesmos em relaccedilatildeo agrave leitura e
informam que com a idade e a escolaridade o interesse pela leitura diminui Os
resultados da pesquisa dessas autoras permitiram que concluiacutessem que o
99
envolvimento das crianccedilas com livros de literatura por lhes possibilitar experimentar
outros mundos e papeacuteis contribui para o desenvolvimento pessoal e social como
tambeacutem para suas habilidades de ler Sugerem entretanto que os professores
devem se preocupar com as atitudes dos alunos quanto agrave leitura porque ldquomais do
que qualquer outro conteuacutedo escolar as atitudes acerca da leitura tecircm uma
importacircncia central para a aquisiccedilatildeo das habilidades de leiturardquo (SAINSBURY
SCHANGE 2004 p375)
Um dos fatores que parece contribuir para o desinteresse pela leitura ao
passar dos anos de escolaridade estaacute relacionado ao modo como o professor tem
trabalhado a literatura O texto literaacuterio eacute usado na maioria das vezes como suporte
para trabalhar outras disciplinas inclusive na alfabetizaccedilatildeo no primeiro ano do
Ensino Fundamental A literatura passa entatildeo a ter um caraacuteter utilitaacuterio e o aluno
vai deixando de apreciar o literaacuterio que ao inveacutes de expressatildeo criadora torna-se
mateacuteria aprisionada Essa visatildeo utilitaacuteria da literatura tem sua origem nos primeiros
escritos literaacuterios que foram produzidos para o puacuteblico infantil nos fins do seacuteculo XVII
e durante o seacuteculo XVIII o que ainda vemos muito presente nas escolas (LAJOLO
1986 MARTINS 2003 PERROTTI 1999)
Hoje as criaccedilotildees literaacuterias principalmente no que diz respeito agrave literatura
infantil jaacute natildeo tecircm mais esse caraacuteter utilitaacuterio de antigamente (LAJOLO 1986
MARTINS 2003 PERROTTI 1999) e no contato com estas obras literaacuterias o leitor
sofre transformaccedilotildees enriquecendo seu mundo externo e sua subjetividade na
ampliaccedilatildeo de sua experiecircncia de vida tornado-se assim um leitor criacutetico
Considerando o prazer da crianccedila em realizar leituras literaacuterias e as criaccedilotildees
literaacuterias atuais que visam formar um leitor criacutetico faz-se necessaacuterio que o professor
em suas praacuteticas educativas motive cada vez mais este aluno leitor apresentando-
lhes obras literaacuterias que instiguem sua fantasia possibilitando-lhe adentrar no
mundo de magia realidade e descobrimento Esse mundo de fantasia e realidade
pode proporcionar ao aluno um interesse maior para a leitura
interpretaccedilatildeocompreensatildeo aleacutem de contribuir com o desenvolvimento da
capacidade de observaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo
A presente pesquisa indicou que a contaccedilatildeo de histoacuterias eacute uma dentre as
praacuteticas de leitura e um recurso importante e interessante agrave matildeo do professor para
100
fazer com que seus alunos se constituam se aproximem dos outros e do mundo
Mas para que esse recurso atinja essas metas eacute preciso que o professor
desempenhe a contento essa contaccedilatildeo Natildeo basta ler o texto que escolheu ou lhe
foi indicado para ler para seus alunos precisa fazecirc-lo com maestria ler para o outro
com emoccedilatildeo despertando emoccedilotildees inquietaccedilotildees e prazer Ao assim proceder de
certo seus alunos iratildeo desenvolver atitudes positivas em relaccedilatildeo agrave leitura e
passaratildeo a admirar os textos produzidos por outros isto eacute se envolveratildeo nos textos
com espanto misturado a prazer Se por um lado ldquoo espanto atrai o olhar porque vecirc
aleacutem de si vecirc o outrordquo (NOVELLI 2000 p189) a satisfaccedilatildeo e o prazer de ler
aliados ao interesse satildeo por sua vez demonstraccedilatildeo de uma atitude positiva em
relaccedilatildeo agrave leitura conforme verificado nesta pesquisa e em pesquisas de larga escala
como na de Sainsbury e Schagen (2004)
Um dos desafios que a Educaccedilatildeo Baacutesica do seacuteculo XXI enfrenta eacute o de
ensinar seus alunos a aprenderem a viver juntos conhecendo e respeitando as
diferenccedilas Ensinar de modo a que tal aconteccedila eacute um dos dois pilares dessa
educaccedilatildeo segundo Tedesco (2011) O outro eacute o de que as escolas propiciem aos
alunos condiccedilotildees para que adquiram repertoacuterios que os tornem capazes de
aprender a aprender Para que este uacuteltimo repertoacuterio possa de fato se estabelecer
atitudes positivas e praacuteticas efetivas de leitura satildeo imprescindiacuteveis Na perspectiva
do primeiro desses desafios enunciados por Tedesco (2011) selecionamos as
palavras de Turchi (2004) quando essa autora ao analisar a produccedilatildeo no campo da
literatura infantil afirma ldquoas crianccedilas de um mesmo paiacutes estatildeo expostas a fronteiras
e diferenccedilas Elas habitam vaacuterios mundos dentro de um mundo vivenciam
subculturas dentro de uma cultura e por isso precisam de diferentes vozes narrativas
que lhes falem de perto dessa diversidaderdquo (TURCHI 2004 p 40)
Foi possiacutevel verificar tambeacutem que uma boa performance durante a contaccedilatildeo
mobiliza uma seacuterie de vivecircncias entre o dito e o natildeo dito no texto possibilitando
infinitas leituras O bom leitor no caso os alunos quando na situaccedilatildeo da intervenccedilatildeo
demonstravam natildeo deixar as palavras entrarem apenas pelos ouvidos eles as
recebiam com os olhos atentos inclusive na performance e estabeleciam sentido ao
texto escrito e interpretado por quem o lia (pesquisadora-contadora) Mesmo
sabendo que quaisquer sentidos satildeo construiacutedos no interior da linguagem por
101
conseguinte expressam convenccedilotildees institucionalizadas ldquoreguladoras do dizer e dos
significados permitidosrdquo (GRIGOLETTO 1992 p 87) as experiecircncias particulares
instigadas por essa leitura foram socializadas porque o clima instaurado pela
contadora nas sessotildees de intervenccedilatildeo assim o permitiram
Aleacutem dessa performance a escolha da histoacuteria a ser contada eacute muito
importante Isso porque se deve estar atento agrave faixa etaacuteria especialmente ao niacutevel
de desenvolvimento sociocognitivo dos alunos e aos valores socioculturais dos
ouvintes no caso alunos para que a seleccedilatildeo da histoacuteria seja adequada aos seus
interesses e relacionada agraves coisas que estatildeo vivendo ou que gostariam de viver
(SISTO 2005)
Apesar de alguns autores como Perrotti (1990) e Giordano (2009)
destacarem os efeitos de tutela na formaccedilatildeo das novas geraccedilotildees o fato eacute que a
escola precisa favorecer a formaccedilatildeo de leitores especialmente dos que se
encontram nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo Deve entretanto conduzir essa
formaccedilatildeo de modo a que todos os envolvidos professores e bibliotecaacuterios sejam
mediadores com o perfil desenhado pelas palavras de Silva (2006 p 78) ldquopara
mediar a leitura eacute preciso ser generoso com o outro em formaccedilatildeo e lembrar-se do
proacuteprio percurso como leitorrdquo Ao assim procederem poderatildeo incentivar outros a
serem leitores
Quanto agrave escolha desses textos lembramos algumas das ponderaccedilotildees de
Turchi (2004) quando discute o esteacutetico e o eacutetico na literatura infantil Essa autora
salienta ldquoum dos grandes desafios da literatura infantil eacute movimentar o imaginaacuterio na
sua maior potecircncia e ao mesmo tempo lidar com o limite do discursordquo (TURCHI
2004 p 39) Talvez um dos criteacuterios mais importantes para essa seleccedilatildeo seja o que
os textos respondam a esse desafio Concordamos ainda com os argumentos da
autora quando desenha os contornos da literatura infantil ldquoMais do que qualquer
gecircnero a literatura infantil parece potencializar o que afirma Bakhtin (1993 p 101)
sobre a linguagem literaacuteria lsquotrata-se natildeo de uma linguagem mas de um diaacutelogo de
linguagens um fenocircmeno pluriestiliacutestico pluriliacutengue e plurivocalrdquo (TURCHI 2004 p
39)
102
Para que os mediadores para a formaccedilatildeo de leitores no caso professores e
bibliotecaacuterios possam favorecer essa formaccedilatildeo precisam ser leitores Natildeo
quaisquer mas deles deve ser exigida a formaccedilatildeo profissional para o respectivo
exerciacutecio Entretanto algumas consideraccedilotildees iniciais no que toca aos professores
precisam ser pelo menos anunciadas uma circunstacircncia eacute a de lerem para a escola
textos didaacuteticos outra a de terem por praacutetica a leitura de textos literaacuterios
Batista (1998) para responder agrave questatildeo se os professores(as) satildeo natildeo-
leitores recorreu a pesquisas de outros estudiosos e concluiu que a auto-imagem
deles como leitores ldquoeacute a todo o momento arranhada pela imprensa pela pesquisa
pelos formadores de professores()rdquo (BATISTA 1998 p 58) Por sua vez Brito
(1998) reconhece que esse grupo profissional lecirc diferentes tipos de texto Contudo
por sua leitura limitar-se ldquoa um niacutevel pragmaacutetico dentro do proacuteprio universo
estabelecido pela cultura escolar e pela induacutestria do livro didaacuteticordquo (BRITO 1998 p
77) natildeo permite que se possa afirmar que ele seja um leitor Isso porque ldquosua leitura
de textos lsquoliteraacuteriosrsquo eacute a dos livros infantis e juvenis produzidos para os alunos ou dos
textos selecionados pelos autores dos didaacuteticosrdquo (BRITO 1998 p 77)
Argumenta Kleiman (2002) quanto a que ldquoum primeiro passo na formaccedilatildeo de
leitores eacute a seduccedilatildeo tornando a atividade de leitura o mais atraente possiacutevelrdquo
(KLEIMAN 2002 p27) Esta autora indica alguns caminhos que o professor deve
percorrer quando tem por meta instigar o aluno a ler Ela poreacutem aponta que eacute
responsabilidade da escola por conseguinte natildeo apenas do professor formar
leitores autocircnomos Vejamos suas ponderaccedilotildees
Somente quando se ensina ao aluno a perceber esse objeto que eacute o texto em toda sua beleza e complexidade isto eacute como ele estaacute estruturado como ele produz sentidos quantos significados podem ser aiacute sucessivamente revelados ou seja somente quando satildeo mostrados ao aluno modos de se envolver com esse objeto mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim compreendecirc-lo entatildeo haacute ensino da leitura O papel da escola nesse processo eacute o de fornecer um conjunto de instrumentos e de estrateacutegias para o aluno realizar esse trabalho de forma progressivamente autocircnoma (KLEIMAN 2002 p27 Grifos nossos)
103
Ao se considerar o ldquoprofessor como um outro altamente significativo no
processo de socializaccedilatildeo e de formaccedilatildeo de crianccedilas na qualidade de leitorasrdquo
(EVANGELISTA 1998 p81) outros profissionais do ensino sobretudo os
bibliotecaacuterios escolares desempenham um papel importante para aquela formaccedilatildeo
de leitor acima indicada Isso porque na escola professores e bibliotecaacuterios
ldquoconstituem-se em sujeitos significativos na formaccedilatildeo de leitores-alunosrdquo
(EVANGELISTA 1998 p 81) por suas praacuteticas educativas cotidianas um em sala
de aula e o outro na biblioteca da escola na medida em que dividam a
responsabilidade de educar (SILVA 1986 MARTINS BORTOLIN 2006)
Os resultados da presente investigaccedilatildeo indicaram a procura espontacircnea das
crianccedilas por livros na biblioteca Tal fato fornece indiacutecios de que a biblioteca da
instituiccedilatildeo na qual este estudo foi conduzido eacute um espaccedilo que propicia muacuteltiplas
leituras prazerosas visto os alunos preferirem ir para a biblioteca do que para o
paacutetio no intervalo das aulas Poreacutem isso natildeo eacute comum nas instituiccedilotildees escolares
como indica Bortolin (2006) Na maioria das bibliotecas escolares as condiccedilotildees
fiacutesicas e humanas raramente criam ldquoum espaccedilo que desperte interesse ou vontade
de permanecer nela [por sua vez] os bibliotecaacuterios (ou aqueles que ocupam o seu
lugar) por exemplo estatildeo esquecendo de animar a leitura [de] promover accedilotildees
(cotidianas e contiacutenuas) destinadas ao fomento do ato de lerrdquo (BORTOLIN 2006 p
69)
Em relaccedilatildeo agrave adequaccedilatildeo e preparaccedilatildeo do professor como contador de
histoacuterias necessaacuterio se torna que ele goste de ler pois como salienta Coelho
(1986) se algueacutem como quer formar leitores antes de tudo precisa ser leitor
Uma histoacuteria bem preparada ao ser narrada eacute capaz de envolver o aluno e
seduzi-lo Para tanto o professor antes de tudo tem que gostar da histoacuteria que iraacute
narrar e consequentemente ler muitas vezes para possa se familiarizar e tomar
consciecircncia dos detalhes essenciais da histoacuteria Quando assim procede ele poderaacute
iniciar a contaccedilatildeo da histoacuteria de forma natural com clareza e intensidade na voz
Natildeo devendo esquecer ainda dos movimentos corporais que contribuem para
enriquecer o sentido do que estaacute sendo contado
104
A maneira pela qual o professor conduz suas praacuteticas apoacutes uma contaccedilatildeo de
histoacuteria influencia a apreciaccedilatildeo ou rejeiccedilatildeo das obras literaacuterias por parte dos alunos
Sisto (2005) nos assegura que eacute interessante que o professor natildeo cobre dos alunos
a repeticcedilatildeo de dados da histoacuteria porque este tipo de accedilatildeo natildeo acrescenta em nada
na expressatildeo criadora do aluno ou seja natildeo contribue para a magia da histoacuteria
Uma conduta recomendaacutevel segundo esse autor eacute a de estimulaacute-los a um debate
com foco na temaacutetica da histoacuteria e na relaccedilatildeo que ela possa ter com as vivecircncias
dos alunos
Outra maneira de garantir o interesse dos alunos eacute a de que eles sejam
instigados a fazer relaccedilotildees com outros textos que abordem o mesmo assunto mas
que apresentam pontos de vista distintos sobre uma mesma questatildeo Natildeo podemos
nos esquecer que a apresentaccedilatildeo do livro do(a) autor(a) e ilustrador(a) eacute essencial
para que o aluno possa aprender a contextualizar a histoacuteria no campo das demais
produccedilotildees aleacutem de viabilizar que tenham futuramente acesso ao texto que lhe
agradou E ao ir agrave biblioteca em busca daquela histoacuteria ele poderaacute entrar em
contato com tantas outras
Um aspecto significativo que observamos durante a pesquisa diz respeito agrave
assiduidade agrave biblioteca Logo que iniciamos a intervenccedilatildeo percebemos o interesse
dos alunos em procurarem nela os livros apresentados na contaccedilatildeo A ida agrave
biblioteca para realizar empreacutestimo do livro de mesmo tiacutetulo de outras obras do
autor ou ainda do mesmo gecircnero foi registrada informalmente e pelo programa de
controle da proacutepria biblioteca Isso eacute um indiacutecio de que a conduta do professor
durante e apoacutes a contaccedilatildeo de histoacuteria parece fomentar o interesse do aluno em ir agrave
busca de outras obras literaacuterias
De modo geral podemos concluir que a apresentaccedilatildeo de obras literaacuterias por
meio da contaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia que estimula a criatividade mobilizando a
imaginaccedilatildeo do leitor
Como afirma Scliar (apud QUADROS ROSA 2009 p25) ldquoContar e ouvir
histoacuterias estaacute embutido em nosso genoma eacute algo que acompanha a humanidade
desde haacute muito tempordquo Existe um fio muito fino que liga quem conta a quem ouve
uma histoacuteria mas ningueacutem sabe ao certo qual o poder que uma histoacuteria possui
105
quando contada Sabemos que ela possibilita a caminhada pelo desconhecido e
que aleacutem de transformar desperta no ouvinte a sensibilidade Como atesta Sisto
(2005 p130) quem ouve uma histoacuteria ldquo[] deixa-se invadir oferece sua boca como
bauacute seus olhos como receptaacuteculo seu corpo como relicaacuteriordquo ou seja o ouvinte se
transforma no personagem mais precioso da contaccedilatildeo de histoacuterias
Nos rastros das histoacuterias contadas o professor-contador teraacute compartilhado
uma legiatildeo de palavras com outros coraccedilotildees causando infinitos efeitos em quem o
escuta E no brincar com a voz e o corpo o professor-contador vai equilibrando-se
nas palavras e nas riquezas que a histoacuteria presenteia envolvendo o ouvinte em idas
e vindas a outros mundos espaccedilos dos quais de certo natildeo hesitaratildeo em voltar
Foram trecircs meses de trocas e aprendizagens na instituiccedilatildeo em que
desenvolvemos a pesquisa Desses encontros foi possiacutevel demonstrar a contaccedilatildeo
de histoacuteria como mais uma estrateacutegia fundamental na formaccedilatildeo do leitor garantindo-
se com isso o enriquecimento do processo educacional sob uma perspectiva que
valoriza a constituiccedilatildeo de sujeitos criacuteticos e reflexivos Isso porque as narrativas
orais especialmente as que tecircm por suporte a leitura de textos literaacuterios como foi o
caso deste estudo condensam em si caminhos plurissignificativos para a leitura e
compreensatildeo de si e do mundo
Nesta pesquisa foi possiacutevel entender pelo menos parcialmente como satildeo
tecidas as relaccedilotildees dos alunos com a leitura por meio das praacuteticas desenvolvidas
pelos professores como contadores de histoacuterias
Os resultados e as anaacutelises foram apresentados natildeo como resultados finais
sobre a temaacutetica mas como uma exemplificaccedilatildeo de um estudo no campo Outros
sem duacutevida satildeo necessaacuterios Esperamos que a leitura do presente relato instigue a
quem se disponha a investigar em situaccedilatildeo de campo esta temaacutetica a ultrapassar as
limitaccedilotildees que neste se fazem presentes decorrentes algumas delas por exemplo
da pesquisadora ser professora na instituiccedilatildeo e ter desempenhado o duplo papel de
pesquisadora e contadora de histoacuterias Entretanto muitos satildeo os que defendem o
professor como pesquisador de sua praacutetica por considerarem que essa dupla funccedilatildeo
gera efeitos na sua formaccedilatildeo profissional na medida em que o leva a analisar e
refletir sobre seus proacuteprios fazeres
106
Um fato desde a proposiccedilatildeo deste estudo foi assumindo a forma de
desafio ao qual futuramente pretendemos responder as razotildees que levam
professores de 5ordf 6ordf 7ordf e 8ordf seacuterie a se afastarem do trabalho com as narrativas
orais
Defendemos ao longo deste relato o poder da linguagem e da leitura para a
constituiccedilatildeo subjetiva e cidadatilde de nossos alunos Concordamos por exemplo com
Benveniste (1976 p 27) quando afirma ldquoO homem sentiu sempre ndash e os poetas
frequumlentemente cantaram ndash o poder fundador da linguagem que instaura uma
realidade imaginaacuteria anima as coisas inertes faz ver o que ainda natildeo eacute traz de
volta o que desapareceurdquo e com Manguel (1997 p 20) ao dizer que ldquoTodos lemos a
noacutes e ao mundo agrave nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos Lemos
para compreender ou para comeccedilar a compreender Natildeo podemos deixar de ler
Ler quase como respirar eacute nossa funccedilatildeo essencialrdquo Natildeo nos esqueccedilamos poreacutem
das palavras quase de advertecircncia de Zilberman (2002 p 21) quando pondera ldquoa
leitura proposta pela escola soacute se justifica se exibir um resultado que estaacute aleacutem
delardquo
Constatou essa autora que ldquo[] em depoimentos de escritores sobre suas
leituras de infacircncia verifica-se que sua atitude perante os livros natildeo coincide com as
expectativas da escola e vice-versa a escola natildeo lhes oferece o modelo desejado
de aproximaccedilatildeo aos textos literaacuteriosrdquo (ZILBERMAN 2002 p21)
Se isso ainda acontece a escola natildeo estaacute desempenhando uma das suas
funccedilotildees a de ensinar a ler Como argumentamos anteriormente compete ao
professor de quaisquer disciplinas ensinar a ler inclusive esses tipos de textos
podendo fazecirc-lo demonstrando ldquoao aluno modos de se envolver com esse objeto
[texto] mobilizando os seus saberes memoacuterias sentimentos para assim
compreendecirc-lordquo (KLEIMAN 2002 p 28)
O estudo que desenvolvemos testando o uso da estrateacutegia da contaccedilatildeo de
histoacuterias literaacuterias para a formaccedilatildeo de leitores demonstrou essa mobilizaccedilatildeo por
parte dos alunos- participantes O desafio que se foi impondo ao longo da execuccedilatildeo
deste estudo e jaacute anunciado parece importante que seja enfrentado com uma ou
mais pesquisas
107
Sob o tiacutetulo Entre Vozes e Silecircncios a Arte de Escuta na seccedilatildeo 3 do
primeiro capiacutetulo deste trabalho discorremos sobre a importacircncia da escuta
Iniciamos lembrando as ponderaccedilotildees de Larrosa (2004) quanto agrave inexistecircncia nos
curriacuteculos escolares de uma disciplina que trabalhe e ensine o aprendizado da
escuta Ensina-se um pouco de tudo mas o ensino da escuta eacute ignorado Cobrado
frequentemente poreacutem relacionado a questotildees disciplinares O silecircncio em sala de
aula se constitui na maioria das vezes em um indiacutecio de ordem poreacutem nele se
institui o apagamento de outras vozes e natildeo como condiccedilatildeo para aprender a viver
juntos conhecendo e respeitando as diferenccedilas como sugeriu Tedesco (2011)
O uso da estrateacutegia de contaccedilatildeo de histoacuterias possibilita essa e outras
aprendizagens entretanto quando utilizada em nossas escolas acontece apenas
nas seacuteries iniciais da escolarizaccedilatildeo formal
Concluiacutemos indicando a necessidade de se valorizar as narrativas orais e
essas em nossa opiniatildeo natildeo deveriam ficar restritas agrave contaccedilatildeo de histoacuterias Outros
espaccedilos-tempos como os criados por sessotildees de teatro encontros literaacuterios rodas
de conto apenas para citar alguns poderiam ser criados e passarem a ser rotina em
nossas escolas Transcrevemos na paacutegina seguinte o poema de Carlos Drummond
de Andrade que ressalta a importacircncia porque natildeo dizer maacutegica da leitura
108
A palavra A palavra A palavra A palavra maacutegicamaacutegicamaacutegicamaacutegica Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro
Como desencantaacute-la
Eacute a senha da vida
a senha do mundo
Vou procuraacute-la
Vou procuraacute-la a vida inteira
no mundo todo
Se tarda o encontro se natildeo a encontro
natildeo desanimo
procuro sempre
Procuro sempre e minha procura
ficaraacute sendo
minha palavra
VtUumlAumlEacuteaacute WUumlacircAringAringEacuteCcedilw wx TCcedilwUumltwx
109
REFEcircRENCIAS
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121
APEcircNDICES
122
APEcircNDICE A
QUESTIONAacuteRIO PARA SELECcedilAtildeO DOS ENTREVISTADOS
1 Na sua concepccedilatildeo o que eacute um ldquobomrdquo e um ldquomaurdquo leitor
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
2 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquobonsrdquo leitores Justifique sua escolha
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3 Escolha dois alunos que vocecirc considera ldquomausrdquo leitores Justifique sua escolha
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
123
APEcircNDICE B
TERMO DE COMPROMISSO
Sr Diretor
XXXXXXXXXX
Eu Ana Claudia Ramos aluna regularmente matriculada no Curso de
Mestrado em Educaccedilatildeo da Universidade Estadual de Londrina com o nuacutemero
200910180042 e sob a orientaccedilatildeo da Profa Dra Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
venho solicitar o apoio desta instituiccedilatildeo para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa que subsidiaraacute a produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS
DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA
FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE ALUNOS LEITORESrdquo Comprometo-me a
socializar com toda a equipe desta instituiccedilatildeo bem como os demais membros da
comunidade os resultados da pesquisa realizada bem como seu produto final que
se constitui na dissertaccedilatildeo de Mestrado
Londrina ____de _______ de 20___
__________________
Ana Claacuteudia Ramos
Mestranda em Educaccedilatildeo - UEL
124
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO
Eu ___________________________________________________ diretor do
Coleacutegio XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX aceito receber a mestranda Ana
Claudia Ramos para desenvolver as atividades de pesquisa que subsidiaraacute a
produccedilatildeo da Dissertaccedilatildeo de Mestrado ldquoOS DECORRENTES DA CONTACcedilAtildeO DE
HISTOacuteRIAS COMO UMA ESTRATEacuteGIA FUNDAMENTAL NA FORMACcedilAtildeO DE
ALUNOS LEITORESrdquo no periacuteodo de 26102009 agrave 10122009
Londrina ___ de______________ de 20___
_____________________________________________
Diretor XXXXXXXXXX
125
APEcircNDICE C
CARTA DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DE PESQUISA
Eu Ana Claudia Ramos discente do Curso de Mestrado em
Educaccedilatildeo da UEL-Universidade Estadual de Londrina pretendo desenvolver uma
pesquisa que tem como objetivo investigar alguns dos efeitos das narrativas orais
ou seja os decorrentes da contaccedilatildeo de histoacuterias como uma estrateacutegia fundamental
para a formaccedilatildeo de alunos-leitores A participaccedilatildeo dos alunos desta instituiccedilatildeo
auxiliaraacute nos levantamentos de dados e natildeo traraacute qualquer benefiacutecio direto para a
mesma mas proporcionaraacute um melhor conhecimento a respeito do tema
pesquisado Somente com esta pesquisa seraacute possiacutevel que os estudos sejam
satisfatoacuterios
Os dados para o estudo seratildeo coletados atraveacutes de uma intervenccedilatildeo
ou seja por meio de sessotildees de contaccedilatildeo de histoacuteria e entrevista com um grupo
focal ambas seratildeo gravadas A coleta de dados seraacute realizada pela pesquisadora
responsaacutevel nas dependecircncias da proacutepria instituiccedilatildeo e sua aplicaccedilatildeo natildeo acarreta
riscos aos sujeitos e nem prejuiacutezo no andamento das atividades de sala
Este material seraacute posteriormente analisado garantindo-se sigilo
absoluto sobre as gravaccedilotildees sendo resguardado o nome dos participantes bem
como da instituiccedilatildeo
A divulgaccedilatildeo do trabalho teraacute finalidade acadecircmica esperando
contribuir para um maior conhecimento do tema estudado Aos participantes cabe o
direito de retirar-se do estudo em qualquer momento sem prejuiacutezo algum
_______________________ ________________________________
Ana Claacuteudia Ramos Universidade Estadual de Londrina
126
APENDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende agraves exigecircncias legais o(a)
senhor(a)________________________________________________matildee do
aluno(a) _________________________________________apoacutes leitura da CARTA
DE INFORMACcedilAtildeO AO SUJEITO DA PESQUISA ciente dos serviccedilos e
procedimentos aos quais seraacute submetido natildeo restando quaisquer duacutevidas a respeito
do lido e do explicado firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de
concordacircncia em participar da pesquisa proposta
Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal pode a
qualquer momento retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e
deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho
realizado torna-se informaccedilatildeo confidencial guardada por forccedila do sigilo profissional
Natildeo existiratildeo despesas ou compensaccedilotildees pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo Tambeacutem natildeo haacute compensaccedilatildeo financeira relacionada agrave
sua participaccedilatildeo Se existir qualquer despesa adicional ela seraacute absorvida pelo
orccedilamento da pesquisa
Caso vocecirc tenha duacutevidas ou necessite de maiores esclarecimentos
pode nos contactar Ana Claudia Ramos pelos telefones 3357023199262223 ou
procurar o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina na Avenida Robert Kock nordm 60 ou no telefone
3371 ndash 2490
Londrina de de
________________________________________
Assinatura do responsaacutevel legal
127
APEcircNDICE E
Toacutepico Guia
As questotildees seratildeo utilizadas como molas propulsoras para iniciar a entrevista
outras questotildees poderatildeo e deveratildeo ser feitas no percurso da conversa
confrontando opiniotildees e vivecircncias
bull Vocecircs acham importante lermos histoacuterias
bull Vocecircs gostam mais de ouvir a professora contando histoacuteria ou ler
sozinho
bull Vocecircs tecircm haacutebito de ouvir e ler histoacuterias em casa
bull Quem costuma contar para vocecircs histoacuterias em casa
bull O que eacute mais interessante ler um livro ou ouvir uma histoacuteria contada
por outra pessoa
bull Vocecircs acham que noacutes aprendemos mais lendo ou ouvindo histoacuterias
Ou aprendemos da mesma forma tanto lendo quanto ouvindo
bull Sua professora tem o haacutebito de contar histoacuteria
bull O que vocecircs sentem ao ouvir a professora contando uma histoacuteria
bull Como seria se sua professora nunca contasse histoacuteria para a sua
turma
bull Vocecircs ficam curiosos em ler novamente a histoacuteria contada pela sua
professora
bull Vocecircs tecircm o habito de retirar livros na biblioteca
bull Vocecircs os retiram por que a professora manda ou porque vocecircs
gostam
bull Quantas vezes vocecircs vatildeo retirar livro na semana
128
bull O que vocecircs acham quando a professora conta histoacuteria sem mostrar o
livro
bull Como que eacute ouvir histoacuteria sem ver as imagens
bull Vocecircs conseguem ou natildeo imaginar os personagens
bull Vocecircs jaacute tinham ouvido esta histoacuteria Vocecircs conhecem alguma histoacuteria
parecida
bull O que vocecircs mais gostam quando a professora (pesquisadora) conta
as histoacuterias
bull Vocecircs acham que eacute importante ouvirmos histoacuterias Por quecirc
bull Hoje estaacute sendo a uacuteltima sessatildeo de contaccedilatildeo de histoacuteria O que vocecircs
acham
bull De todas as histoacuterias contadas quais vocecircs mais gostaram Por quecirc
bull Vocecircs preferem ouvir algueacutem contando histoacuteria ou ler sozinhos a
histoacuterias
Quanto agrave histoacuteria
bull O que mais chamou a atenccedilatildeo na histoacuteria ouvida
bull Se vocecirc pudesse mudar o final da histoacuteria como o faria
bull Se estivesse no lugar do personagem X qual seria sua atitude
129
APEcircNDICE F
SINOPSE DAS HISTOacuteRIAS TRABALHADAS NAS INTERVENCcedilOtildeES
PRIMEIRA SESSAtildeO Menina bonita do laccedilo de fita
O livro narra agrave histoacuteria de um coelhinho branco quer ter uma filha pretinha
como aquela menina do laccedilo de fita Mas ele natildeo sabe como a menina herdou
aquela cor Ele tenta descobrir- atraveacutes da menina- o segredo para ser pretinha
daquele jeito Depois de diversas tentativas ele descobre - atraveacutes da matildee da
menina - e consegui realizar o que tanto desejava
SEGUNDA SESSAtildeO O segredo da lagartixa
Estaacute histoacuteria contada em 28 quadrinhas fala de uma lagartixa anti-social que
vivia num jardim isolada de todos Ela mantinha um segredo guardado em uma
caixinha e este era bonito demais para natildeo ser revelado
TERCEIRA SESSAtildeO Ah cambaxirra se eu soubesse
A histoacuteria conta a faccedilanha de uma ave que tenta impedir que um lenhador
derrube a aacutervore de galho mais bonito onde ela deseja fazer o seu ninho Mas o
lenhador cumpre ordens do capataz que cumpre ordens do baratildeo ateacute chegar ao
imperador Todos afirmam cumprir ordens de seus superiores e tecircm medo de
desobedececirc-los Entatildeo ao enfrentar o temido imperador a cambaxirra ameaccedila sair
por aiacute e pedir ajuda a todo o mundo
130
QUARTA SESSAtildeO Beto o carneiro
O livro narra agrave histoacuteria de um carneirinho chamado Beto que mais parecia um
novelo branco e macio de latilde Beto era rebelde e natildeo gostava de ter que obedecer
sempre sem nunca poder questionar Beto natildeo estava satisfeito em ser quem era
Sonhava e tentava tornar-se bem diferente dos outros carneiros Depois de muitas
tentativas malsucedidas Beto encontra algueacutem muito especial a ovelhinha negra
Memeacutelia E eles descobrem que tecircm muita coisa em comum
QUINTA SESSAtildeO A bruxa que roubou o sol
A histoacuteria se passa eu uma floresta encantada onde viviam animais fadas
duendes e aves Nesta floresta vivia uma bruxa muito malvada e infeliz que decidiu
roubar o sol pois ele era fonte de tanta luz e alegria As fadas perceberam o que
tinha acontecido puseram-se a procurar o Sol Ao encontraacute-lo libertaram-no e tudo
voltou ao normal
SEXTA SESSAtildeO A menina e o paacutessaro encantado
A histoacuteria relata a relaccedilatildeo de amor e amizade de uma menina e um paacutessaro
encantado E para natildeo sofrer a saudade e ausecircncia da separaccedilatildeo do seu melhor
amigo resolveu aprisionaacute-lo em uma gaiola Percebendo que tal atitude foi
acabando com a alegria e o amor que existia entre os dois resolveu libertaacute-lo
131
APEcircNDICE G
FICHA DE OBSERVACcedilAtildeO UTILIZADA NAS SESSOtildeES DE CONTACcedilAtildeO
As anotaccedilotildees foram realizadas a cada 5 minutos
Protocolo orientador para as anotaccedilotildees
Houve interrupccedilatildeo por parte dos alunos para algum questionamento
Houve interrupccedilatildeo externa (direccedilatildeo professores funcionaacuterios)
Houve interrupccedilatildeo por parte da professora
Envolvimento de todos ao ouvir a histoacuterias
Envolvimento de menos da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Envolvimento de mais da metade dos alunos ao ouvir a histoacuteria
Observaccedilotildees
132
ANEXO
133
ANEXO A ndash Formulaacuterio de controle informatizado da biblioteca
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
- CONTACcedilAtildeO DE HISTOacuteRIAS
-
- Profordf Drordf Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin
-
- A Deus
-
- AGRADECIMENTOS
- NOVELLI P G A Filosofar eacute olhar para ad-mirar educar eacute atrair o olhar para seduzir Acta Scientiarum Human and Social
-