Luiz Bernardo de Almeida
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LUIZ BERNARDO DE ALMEIDALUIZ BERNARDO DE ALMEIDALUIZ BERNARDO DE ALMEIDALUIZ BERNARDO DE ALMEIDA
(UMA VIDA, UMA OBRA, UM EXEMPLO...,
A PERSONAGEM DO SÉCULO XX)
2
Introdução................................................................................................................................... 3 Capítulo I.................................................................................................................................... 4 A personagem do século XX...................................................................................................... 4
Na viragem do século, a homenagem da Junta de Freguesia................................................ 4 Vida e obra ............................................................................................................................. 5 A escola primária da Praça................................................................................................... 24 A estrada nacional n.º 32 e outras acessibilidade ................................................................. 26 A Banda de Música e o Centro Recreativo Musical e Literário...........................................29 O contributo do Comendador António Almeida Pinho (a Casa de Saúde e a Central Hidroeléctrica)...................................................................................................................... 42 Outros pormenores da obra do Comendador........................................................................ 44 A mudança da sede do concelho, o plebiscito e a influência do Comendador..................... 45 A morte de D. Ana Horvath ................................................................................................. 50
O Funeral de Ex.ma Senhora D. Ana Horvath de Almeida.............................................. 59 Os casamentos de Marinha da Silva Santos e o seu “protegido” Francisco Lopes .............. 63 A ordem da Comenda e a formação maçónica..................................................................... 69 O que é a Maçonaria?........................................................................................................... 70 Crónica de uma digressão ao Solar das Laranjeiras ............................................................. 79 O Testamento ....................................................................................................................... 86 A morte de Luiz Bernardo de Almeida ................................................................................ 89 Alguns objectos pessoais de Luiz Bernardo......................................................................... 92
Capítulo II................................................................................................................................. 95 A SUA OBRA PÓSTUMA – A FUNDAÇÃO LUIZ BERNARDO DE ALMEIDA ...................................... 95
A génese da Instituição......................................................................................................... 95 A abertura da Instituição: os primeiros utentes e a Directora do Lar ................................... 98 O desenvolvimento dos serviços e o aparecimento de uma nova perspectiva de intervenção............................................................................................................................................ 100 Algumas notas finais .......................................................................................................... 105
Bibliografia............................................................................................................................. 107
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Introdução Neste trabalho foi preocupação minha descobrir as principais fontes da história biográfica do cidadão Luiz Bernardo de Almeida. Para tal servi-me de alguns jornais da época e outras publicações, dos registos existentes na Conservatória de Vale de Cambra e de outros que permanecem no Arquivo Distrital de Aveiro. Igualmente, do arquivo histórico da Fundação. Explicar fenómenos como a emigração para o Brasil ou a influência da sua formação maçónica, é um trabalho que já foi abordado pelo Prof. Adelino Augusto Moreira de Almeida. Compreender as relações que Luiz B. Almeida mantinha com a imprensa, com o Estado, com as pessoas que o rodeavam e com a própria família é uma tarefa que se impõe a quem pretender conhecer mais sobre esta personalidade. Apesar de ter feito algum esforço junto da embaixada Portuguesa no Rio de Janeiro, da sua vida no Brasil pouco se sabe. Seria outro pormenor a desenvolver. Este é, pois, o trabalho que me propus realizar.
4
Capítulo I
A personagem do século XX Na viragem do século, a homenagem da Junta de Fregu esia
Em Fevereiro do ano 2000, a Junta de Freguesia de Macieira de Cambra,
assinalou o 486º aniversário da atribuição da carta de Foral, por D. Manuel I, às
“Terras de Cambra” identificou Luiz Bernardo de Almeida como o “homem do século
XX”.
Numa pequena publicação1 alusiva ao acto referia-se que:
“A atribuição da Carta de Foral, por D. Manuel I, a 10 de Fevereiro de 1514 às
“Terras de Cambra”, mais não é do que o reconhecimento da importância desta
terra e do desenvolvimento que na altura se assistia. Estávamos numa altura em
que o País conhecia alguma prosperidade, fruto do comércio com o Brasil,
descoberto no ano de 1500.
À semelhança desta atribuição, a homenagem que prestamos aqui hoje, ao
benemérito Comendador Luiz Bernardo de Almeida, mais não é do que o nosso
reconhecimento ao homem do século XX, que mais deu a esta terra e que mais
desenvolveu, não só Macieira de Cambra, mas todo o concelho, com as suas obras
e estímulos desinteressados.
A Junta de Freguesia de Macieira de Cambra, ao atribuir pela primeira vez, na
história desta terra, o mais alto galardão, uma primeira medalha de honra, em ouro,
não podia de maneira alguma deixar de atribuí-la, a título póstumo, a Luiz Bernardo
de Almeida2. Seria imperdoável e uma injustiça muito grande para com aquele que
fez desta terra ímpar, cuja obra é reconhecidamente inigualável, sabendo transmitir
às gerações vindouras o orgulho de pertencerem a Macieira de Cambra.
Luiz Bernardo de Almeida é de facto o homem do século XX”.
1 - De minha autoria (na altura exercia o cargo de Tesoureiro da Junta de Freguesia); 2 - A Fundação é a depositária da medalha;
5
Vida e obra
Natural do lugar de Paredes, da freguesia de Macieira de Cambra, nasceu em
15 de Novembro de 1859 3 .
Era filho de Bernardo Luiz de Almeida e de Josefa da Conceição.
Neto paterno de José Luiz de Almeida e de Teresa de Pinho, estes também
naturais do lugar de Paredes, freguesia de Macieira de Cambra, e materno de João
Correia e de Maria da Conceição, do lugar de Soutelo, freguesia de Chave,
concelho de Arouca.
Foram seus padrinhos de Baptismo Luiz António de Almeida do lugar do
Borralhal e Josefa Joaquina esposa de António Luiz do lugar de Vilarinho, desta
freguesia de Macieira de Cambra.
Faleceu em 4 de Junho de 1947, com oitenta e sete anos 4 .
Foi casado com Ana Horvath de Almeida, em primeiras núpcias e
posteriormente, após o falecimento daquela, em 13 de Fevereiro de 1932, casou
com D. Marinha Silva dos Santos, nesse mesmo ano em 10 de Dezembro. Luiz
Bernardo de Almeida tinha 73 anos e a D. Marinha teria 41 anos de idade. Era
natural da freguesia de Figueira, concelho de Lamego. Não deixou filhos.
3 - ARQU Foto Erro! Apenas o documento principal. - Luiz Bernardo, D. Ana Horvath e sua mãe D. Josef a
IVO DISTRITAL DE AVEIRO: assento de nascimento do ano de 1859, lavrado a folhas 52 do Livro para Registo Baptismos, n.º 9, da freguesia de Macieira de Cambra, concelho de Vale de Cambra; 4 - Registo n.º 106, do ano de 1947, na Conservatória de Vale de Cambra;
6
A sua obra foi tão vasta e tão abrangente, estendendo-se aos mais diversos
domínios da vida quotidiana das pessoas, que se corre o risco de se esquecer
iniciativas fundamentais, próprias, que impulsionaram o desenvolvimento desta
terra. No entanto, para que se registe e perpetue, baseado em publicações da
época, nomeadamente o JORNAL DE CAMBRA de Novembro de 1931, que
dedicou, exclusivamente, uma publicação aos Comendadores Luiz Bernardo de
Almeida e António de Almeida Pinho, seu primo, e outros jornais locais da época,
bem como um artigo publicado no jornal A voz de Cambra de 15 de Junho ano de
1973, republicado no ano de 1975, no número 20 da Revista “AVEIRO E O SEU
DISTRITO”, assinado por Augusto Carlos Aguiar, que me serviram de guião para
este trabalho, aqui ficam algumas referências relativas à sua biografia.
“Em 15 de Novembro de 1859, nasceu no lugar de Paredes, Macieira de
Cambra, Luiz Bernardo de Almeida, filho de Bernardo Luiz de Almeida e de Josefa
da Conceição, nascida a 29 de Outubro de 1835 e falecida a 21 de Março de 19405,
tendo por avós paternos José Luiz de Almeida e Teresa de Pinho e avós maternos
João Correia e Maria da Conceição.
Bernardo Luiz de Almeida nasceu em 1832 e foi para o Brasil com 20 anos,
tendo regressado para casar com Josefa da Conceição no ano de 1858.
5 - Arquivo Distrital de Aveiro, Livro de Baptismos n.º 7 da freguesia de Chave – Arouca, pág. 232 – verso, de 1823 – 1859 e registo de óbito n.º 58 da Conservatória de Vale de Cambra;
7
Em 1862 Bernardo resolve regressar ao Brasil.
Em 1870, o seu filho Luiz Bernardo, com apenas 11 anos, abalou para além
Atlântico na companhia de sua mãe, D. Josefa, e de seu primo António de Almeida
Pinho, fixando-se em terras de Vera Cruz.
Em colaboração com seu primo António Almeida Pinho, montaram uma
indústria de serralharia e de fundição, sendo bem sucedidos a ponto de ambos
receberem do governo Brasileiro, como mérito, a Ordem da Comenda, galardão
somente concedido a pessoas que incrementam o desenvolvimento daquele país.
Para desenvolvimento da sua indústria efectuou várias digressões por alguns
continentes, conhecendo e talvez se apaixonando, na Áustria, por Dona Ana
Horvath de Almeida, com quem casou em primeiras núpcias.
Foto 1 – Luiz Bernardo em Bristol
Demonstrando não ser egoísta, associou na firma que fundou na Rua dos
Arcos - Rio de Janeiro, seus sobrinhos Aníbal Soares Abrantes e Delfim de Almeida
Pinho, sendo estes, posteriormente, os proprietários e gerentes daquele
estabelecimento fabril que funcionou com a designação de «Fábrica Progresso».
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Foto 2 – Fachada principal da Fábrica Progresso no Brasil
Também estes últimos, naturais de Macieira de Cambra, sempre deram
provas de carinho pela sua terra, pois nunca regatearam franco auxílio a todas as
iniciativas de melhoramentos locais. A eles se deve a construção do jardim desta
vila, que hoje ostentamos em pleno coração, com orgulho e como sala de visitas.”
Foto 3 – Inauguração do Jardim na Praça em Ma cieira de Cambra
O seu primo, Padre Bernardo Tavares de Pinho, na inauguração da escola de
Macieira discursa:
9
“Passou os anos da sua meninice no lugar de Macieira-a-Velha, na
companhia de seus tios e meus avós, onde imediatamente começou a sentir a
vergasta da disciplina e desde logo ficou sujeito à lei duríssima do trabalho”.
Emigrou para o Brasil em 1870, com 11 anos, juntamente com sua mãe,
Josefa da Conceição e um primo António de Almeida Pinho.
É o seu pai, já no Rio, que os manda chamar.
Luiz Bernardo enceta um percurso de labor e sacrifício, trabalhando durante o
dia e estudando à noite numa luta feroz contra a pobreza e contra o analfabetismo.
Durante anos mantém essa luta com o destino e progressivamente vem-lhe
uma vida desafogada.
“No ano de 1873 a febre amarela, então flagelo daquelas paragens e no ano
de 1874 a varíola quase o arrebataram aos carinhos de seus pais e lhe querem
roubar o triunfo da peleja que tinha travado pela vida. Vencedor das terríveis
enfermidades continua a labuta na sua oficina, até que no ano de 1881 uma
pneumonia dupla quase o vitima, quase o desalenta e faz sentir no seu coração
quebrantos dolorosos. Com as forças ainda alquebradas no ano de 1886 vem ele
pela primeira vez à sua terra natal visitar os seus parentes, os seus amigos e
procurar alívio para a sua saúde abalada”.
Regressa ao Rio de Janeiro, onde por força do seu esforço continuado a sua
pequena oficina se transforma num grande complexo industrial, na rua dos Arcos,
uma gigantesca indústria de serralharia e fundição, onde é sócio o primo António de
Almeida Pinho 6 .
A fábrica Progresso, assim se chamava, foi de tal modo bem sucedida,
contribuindo também para o desenvolvimento do Brasil que o Governo Brasileiro
lhes vem atribuir a Ordem da Comenda.
A distinção tem ecos além Atlântico e na sua terra, o Jornal de Cambra, n.º
89 de 26.09.1909, pág. 2, reproduz:
Mercê Honorífica “O nosso conterrâneo Sr. Luiz Bernardo de Almeida, de Paredes,
Macieira, grande industrial no Rio de Janeiro, à rua Francisco Belisário, 30 a 32,
fundador e sócio da importante fábrica de fundição metalúrgica “Progresso” foi
agraciado pelo Governo de S. M. Fidelíssima, com o Grau de Oficial da Real Ordem
Civil do Mérito Industrial”.
Serão os seus sobrinhos, Aníbal Soares Abrantes e Delfim de Almeida Pinho
que posteriormente se tornarão proprietários e gerente daquele estabelecimento.
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Por esta altura o Comendador Luiz Bernardo de Almeida achava-se já casado
com D. Ana Horvath, filha de D. Teresa Horvath e Wenscelau Horvath, negociante
da Praça do Rio de Janeiro, natural de Viena de Áustria, onde nascera a 3 de Junho
de 1864, senhora de alta cultura e fina educação.
Em Novembro de 1931, o Jornal de Cambra publica uma edição especial
dedicada aos Comendadores Luiz Bernardo de Almeida e ao seu primo António de
Almeida Pinho. Nessa edição, enaltece-se a obra do comendador…
Foto 4 -Jornal de Ca mbra de Novembro de 1931
Neste jornal que abaixo transcrevo, refere-se que:
“Desde que fundamos este jornal, em cujo programa se compreende, no
capítulo FAZER JUSTIÇA A TODOS, as nossas homenagens àqueles que,
por qualquer forma, contribuam para o engrandecimento d’este Concelho, era
nosso intuito prestar, em primeiro lugar, o preito da nossa admiração aos dois
6 - O Povo de Cambra 8 de Junho de 1913;
11
grandes beneméritos Cambrenses, que aqui têm dado o maior exemplo de
dedicação à sua terra e de amor por todos aqueles que precisam de auxílios
na vida!
Os Ex.mos Comendadores Srs. Luiz Bernardo d’Almeida e António d’almeida
Pinho, são duas extraordinárias figuras n’estas terras ideais de beleza e de labor!
Ajustam-se tão bem estes dois Homens nos seus sentimentos de filantropia e
de progresso, como até os seus nomes (coincidência interessante!) na composição
tipográfica têm a mesma extensão, tão exacta, como perfeitas são as suas
consciências e o seu modo de ver o próximo e a vida dos povos!
Aproveitamos a data do aniversário natalício do Ex.mo Sr. Comendador Luiz
Bernardo d’Almeida para esta simples mas sinceríssima homenagem da nossa
simpatia e da gratidão do povo aos dois heróis do Bem-fazer!
As galas d’este dia na Quinta Progresso, esse éden d’onde procede a
trindade de benemerência, que tantas vezes por nós tem sido referida, quer O Jornal
de Cambra associar-se de coração e com entusiasmo d’alma.
15 de Novembro é a data do aniversario natalício d’esse grande benemérito,
a quem o formoso concelho de Macieira de Cambra, devendo já muitíssimo, vai ficar
devendo o maior melhoramento para o seu futuro, que é a estrada n.º 32, de S.
Pedro do Sul a S. João da Madeira (que já há mais d’um século devia existir, pois
mais d’um século tem atrasado a real existência e expansão de muitas povoações,
que, sem ela, não têm vivido, mas apenas vegetado); que há quase meio século
está começada e só agora ao impulso d’este Benemérito, vai ser concluída!
Homens como o Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, são glórias
d’um País, são a vida d’essas terras onde a acção governativa não chega, nem
mesmo com o indispensável!
O gesto do Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, dando o decidido
impulso para a conclusão d’essa imprescindível via de comunicação entre uma
grande parte da região e que virá ser verdadeiramente o principio de vida de
povoações laboriosas como são as da parte nascente ou extremo do concelho de
Macieira de Cambra como Junqueira, Arões, etc., deve-se registar como um dos
mais nobres actos de amor ao progresso e futuro dos povos, que n’estes tempos
calamitosos em que particularmente predomina o egoísmo, enfermam e morrem de
inacção!
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Pela falta d’essa estrada, que de sacrifícios essas povoações hão passado,
só para vegetar; que de riquezas se têm perdido; que de interesses para a vida
geral se têm desaproveitado!
Que os poderes públicos, aos quase é prestado esse inapreciável concurso, é
então grande obra de fomento nacional, e os povos beneficiados reconheçam que
para o Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida a maior satisfação d’esse seu
rasgo de extraordinário bairrismo, que poderemos chamar mesmo de filantropia e
patriotismo, é a conclusão rápida de tão grande melhoramento quão imperiosa
necessidade!
E é inspirado em mais esse seu acto nobilitante de amor à terra linda do seu
berço, esta terra a que nos prendem íntimos laços e que tanto admiramos pelas
suas belezas naturais e pelos melhoramentos com que os seus beneméritos a têm
dotado, que nós vimos prestar ao Ex.mo Comendador Luiz Bernardo d’Almeida esta
nossa humilde mas sincera homenagem, aproveitando para isso o dia dos seus
anos.
Esse Homem, que não se cansa de fazer bem, que se esforça, que se
sacrifica porque a sua terra tome lugar no carro do Progresso, merece a gratidão
dum povo inteiro!
Que todos moralmente o auxiliem na sua obra de comum engrandecimento!
Podia o Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, como fazem n’uma
grande maioria ou quase todos aqueles que vivem da fortuna, instalar-se e
comodamente na sua casa, a descansar das suas lides extenuantes de tantos anos
e cuidar apenas de si e dos seus; mas Sua Ex.ª prefere a isso o labor contínuo e a
sua preocupação pelo bem geral e principalmente pelo bem da sua terra!
É uma coincidência interessante que, sendo 15 de Novembro uma data
comemorativa do Brasil, seja também a data do aniversario natalício d’um Português
que à grande Nação de Ordem e Progresso tem ligado um grande nome, em acções
edificantes de trabalho e em actos de benemerência extensivos a Portugal e à sua
pátria natal!
Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida é bem um exemplo e uma
nobre figura representativa da união dos dois povos irmãos e amigos, que devem
caminhar de braço dado no caminho do Progresso e da Civilização!
Faz agora anos que foi imposta ao Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo
d’Almeida a comenda com que o Governo quis distinguir o grande português e que
também assenta no peito do ínclito benemérito!
13
Recordamos também com simpatia esse momento solene em que começou a
ser reconhecida pelos poderes públicos a alta benemerência do Ex.mo Sr.
Comendador Luiz Bernardo d’Almeida.
Neste dia, em que todas as flores do jardim da Quinta Progresso (esse lugar
de delicias que o Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida fez d’uma floresta,
como tantas outras coisas belas do seu espírito activo e empreendedor) são poucas
para o oferecer a quem tanto se tem preocupado com as necessidades particulares
e necessidades comuns da sua terra, nós vimos oferecer ao venerando
aniversariante as flores da nossa admiração e do nosso respeito pela sua
extraordinária obra de Bem-fazer, com votos ardentes que d’há muito tempo
fazemos pelas maiores felicidades sua Ex.ª, n’um futuro indefinido, tendo a seu lado
os dois Anjos do seu Lar.
Neste mesmo jornal, o Presidente da Junta de Santa Cruz da Trapa, Joaquim
Teixeira, subscreve o seguinte:
“A personalidade do Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, é inteiriça,
sem jaça e sem mácula.
Humilde de nascimento, educou-se na escola activa do trabalho, triunfando
por si, pelas suas indómitas qualidades de energia e honestidade. A sua existência
é um apostolado de virtudes cívicas, de abnegação e generosidade.
Conquistando vastos recursos, sente o prazer de ser útil e o seu oiro
benfazejo tem enxugado muita lágrima, confortado muito infeliz.
Desvelado protector de hospitais, asilos, creches, pratica a assistência em
todas as suas modalidades. A instrução popular, infelizmente tão descurada entre
nós, deve-lhe aprisionado carinho. O sumptuoso edifício escolar de Macieira, ficará
para atestar aos vindouros, que é por aquele caminho, tão inteligentemente traçado
por sua Ex.ª, que Portugal há de levantar-se e caminhar afoito, senhor dos seus
destinos.
O seu cérebro e o seu braço não repousam nunca.
Ultimamente meteu ombros a um empreendimento grandioso, a conclusão da
estrada 32, ligando a Beira com a capital do norte e atravessando o ridente e
opulento Vale de Cambra. Artéria de real valor turístico e económico, há dezenas de
anos que jazia no mais absoluto ostracismo, tais as dificuldades que opunham à sua
conclusão.
Surge a figura nobre e simpática, de extremo patriota – o Senhor
Comendador Luiz Bernardo d’Almeida.
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O magno problema é posto em equação, joeirasse ao sol, e, no meio da
estupefacção e assombro de todos, aparece o Diário do Governo, dando conta dum
contrato realizado entre o Estado e Sua Ex.ª, pelo qual abona avultadas verbas, e
oferece graciosamente, largas somas. Desatou-se em fim, o nó gordo!
Mas Sua Ex.ª foi mais além! Dotado de admirável espírito prático, depressa
compreendeu as dificuldades burocráticas, que, por vezes, esterilizam as mais
altruístas iniciativas, e, para remar com segurança, ele mesmo se constitui
empreiteiro do famoso empreendimento. De facto a sua rija tempera, de português
da velha guarda, tem removido todas as dificuldades, afastado importunos estorvos,
e os trabalhos prosseguem, ó vante, vitoriosos, devendo alcançar, dentro em pouco,
a sua finalidade e o seu triunfo.
Há um ano, os povos da Beira, num gesto que muito a honra, foram em
brilhante jornada ao solar de Sua Ex.ª, em Macieira, patentearem a sua gratidão
indelével, o seu reconhecimento perene.
Dia histórico, dia feliz, em que as palavras firmes de Sua Ex.ª deixaram em
todos os assistentes a convicção segura de que essa doirada aspiração de tantos
anos, havia por fim encontrado o seu paladino, o seu executor.
Por isso, nós, Beirões, almas simples de serranos, nutrimos pelo grande
patriota e benemérito, religiosa veneração; e hoje, que transcorre o seu aniversário
natalício, desejamos todos, bem do coração, que no seu lar viva permanente alegria
e a Providência lhe conserve, por longos anos, a preciosa existência.
José Pereira Dias, presta homenagem aos dois beneméritos qualificando a
iniciativa como “uma homenagem justa” e vai mais além dizendo o seguinte:
“ O JORNAL DE CAMBRA vai prestar uma homenagem, no dia 15 do
corrente, aos grandes beneméritos Cambrenses, Comendadores Luiz Bernardo
d’Almeida e António d’Almeida Pinho.
Homenagear beneméritos é prestar-lhes culto com fervorosa devoção e amor.
Esta, para os nossos queridos conterrâneos reveste este sentimento, com o
acréscimo de uma prece pela sua saúde e vida prolongada.
O povo de Cambra deve-lhes muito.
Antes do aparecimento destes exemplares da benemerência, o velho
concelho de Macieira de Cambra, quase que não era conhecido, porque vivia sob o
império dum absolutismo livre e duma liberdade escrava.
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Vivia o dinheiro acumulado e patinhava na miséria o proletário honesto,
mendigando um dia de trabalho, sequer, para matar a fome.
O dinheiro, ou se canalizava para o estrangeiro, ou se trocava por bilhetes de
Tesouro.
Os ricaços nem queriam valorizar propriedades para não aturar o proletário
ou trabalhador.
Não queria e não quer massadas – basta-lhe o grande incómodo de encher o
recibo, quando o sabe fazer, para receber o dividendo.
Luiz Bernardo d’Almeida e Almeida Pinho, são excepções: vêem a crise do
trabalho e atenuam-na, na medida do seu esforço, matando a fome a centenas de
famílias, não só em grandes obras de interesse geral, como na estrada 32, próxima
de seu termo, como o sumptuoso hospital de Macieira de Cambra, como ainda
valorizando as suas propriedades particulares.
Para atenuar a crise gravíssima do desemprego tem o Estado estes dois
belíssimos exemplos de tenacidade, caridade e amor!
Mande o Estado abater os touros para touradas e ordene a cultura das
campinas, que produzirão abundante trigo, que importamos em grande escala, para
exportamos esse sedutor metalizaremos como a libra….
Uma outra personalidade, José Alves Neto, para além de se referir a Luiz
Bernardo também se pronuncia sobre António A. Pinho:
Sr. Carlos Alberto da Costa:
Muito agradeço o seu estimado postal e a gentileza do convite que n’ele
contem. Igualmente vos saúdo, desejando-vos inúmeras felicidades. Algo doente e
preocupações assaz fortes me inibem de satisfazer desejos próprios e os que V…
me propõe.
Agradeço muito penhorado o ensejo que me dá em felicitar, por intermédio do
seu conceituado Jornal de Cambra, o grande Benemérito Ex.mo Sr. Comendador
Luiz Bernardo d’Almeida.
Não costumo fazer afirmações a cálculo e evito o mais possível a lisonja; as
que tenho feito perante os que me ouvem e lêem não se repetem, ficam gravadas
nas almas sinceras e justas.
Devo, porém, notificar que marquei na minha vida e na dos meus, um
costume, que continuo a executar com máxima satisfação.
16
O dia 15 de Novembro, como o dia 3 de Junho, são datas que respeito como
as das grandes festas nacionais e santificadas.
Os grandes Beneméritos, as grandes inteligências e principais factores do
bem e progresso dum povo ou da humanidade, podem não me conhecerem, eu é
que me descubro reverente à sua passagem e rogo ao Deus da minha fé e crença o
prolongamento de suas vidas, porque têm jus à minha gratidão e à de todos os que
se conhecem.
Macieira de Cambra deve engalanar-se festivamente e cheia de orgulho em
possuir tão bons filhos como incontestáveis grandes Beneméritos.
Fosse o Porto possuidor de tão belos ornamentos e saberia talvez melhor
galardoar os seus constantes benefícios prestados, como o tem feito a muitos que,
felizmente, de séculos em séculos se evidenciam.
Julgo supérfluo patentear mais uma vez ao feliz povo de Cambra o valor, o
belo carácter, a filantropia do Homem que a tem engrandecido e que já todo o País
conhece como grande Benemérito d’esse lindo rincão na Natureza, cuja alma
jardinada e toda formosa nos inebria.
Felicito V… pela ideia que teve em dedicar o seu muito apreciado Jornal de
Cambra à defesa do concelho, fazendo realçar com nitidez e sinceridade os seus
grandes valores.
É justo que neste dia, em tipo maiúsculo, igual ao do seu título diga:
Povo de Cambra, feliz povo que tens em teu seio um dos maiores
Beneméritos do País, levanta-te orgulhoso e cheio d e alegria a saúda-lo!
Avante! Como um só homem consócio do cumprimento du m dever, diz-lhe que
a tua gratidão será eterna, que vossos filhos també m o saberão testemunhar!
Lembra-se V… de tornar extensiva a homenagem do seu novel Jornal ao
outro grande Benemérito Cambrense, Ex.mo Sr. Comendador António Almeida
Pinho.
Todos os que conhecem S. Ex.ª têm a certeza de que para Ele é motivo de
grande satisfação e alegria o dia 15, com a saúde e prolongamento da vida do seu
maior amigo e primo.
António de Almeida Pinho é outro eu do grande Benemérito Ex.mo Sr.
Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, que está à frente da sua instituição industrial
e sempre presente em espírito no coração de todos os Cambrenses sinceros, e isto
basta para seu elogio.
17
Os grandes exemplos, a prática do bem, a acção permanente, infatigável e
o nervosismo de dedicação inigualável do Ex.mo Sr. Comendador Luiz B. de Almeida,
têm mais a coroa-lo esse padrão de glória em ter conseguido dotar Macieira de
Cambra com mais Beneméritos.
Ex.mo Sr. Comendador António Almeida Pinho é digno continuador da sua
grande obra.
Sinceramente o saúda e abraça o amigo leal e admirador,
JOSÉ ALVES NETO
Algumas quadras constam deste mesmo jornal, dedicadas “Aos Ex.mos
Comendadores Luiz B. d’Almeida e António A. Pinho”
Uma nova canção, uma canção melhor! Ela ressoa como flautas e violinos! O
“Miserável” passou, o toque fúnebre fica em silêncio.
(H.HEINE)
Pudesse eu tanger a lira
Como vates sublimados,
Que nos meus versos alados,
Rendilhados e sem par,
Daria n’este áureo dia,
Sem jactância de louvores,
Alguns dos belfos primores,
Que iriam por terra e mar!
Iriam contar ao longe
Que n’este canto da terra
Sobre o campo, sobre a serra
Há corações a primor;
Almas ternas, generosas,
Que, amando os seus conterrâneos,
Fazem votos espontâneos
P’ra mitigar negra dor!
Uns, tocados de bondade,
18
Socorrem os indigentes;
Outros, bem mais diligentes,
Dão reluzentes fanaes,
Onde a infância, desprovida
Do conforto da riqueza,
Encontrará luz acesa
Que lhe dará dons vitais.
Fazer escolas excelsas,
N’esta quadra d’egoísmo,
É mostrar grande civismo,
Ter dotes do coração;
Porém, hospitais, asilos,
Onde o pobre encontre abrigo,
Quem os dá é vero amigo
D’um povo, d’uma nação!
Estradas, prédios altivos,
Mil trabalhos benfeitores,
São acções de mil louvores,
Que todos devem tecer
A quem por amor sincero
Da pobreza verdadeira,
Não poupa esforço ou canseira
P’ra bondoso a socorrer.
Salve, pois, varões ilustres,
D’este povo a galhardia,
Terras de Santa Maria
Aqui vos deram a luz!
E que prolongue vossos anos
Vereda cheia de flores,
Cantando sempre louvores
Ao doce olhar de Jesus!
19
CIBICIDA
Armando Albergaria, escreve:
“Mais um aniversário passa no próximo dia 15 do corrente o Grande
Cambrenses Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida.
Benemérito, coração cheio de bondade, ternura e energia, como ainda não
tivemos igual, ele tem realizado neste feliz concelho de Macieira de Cambra, que lhe
foi berço, uma obra de muito grande valor.
À instrução, foi ele quem lhe deu até hoje, maior impulso e protecção.
Em 1913 mandou edificar, nesta liberal vila um edifício escolar que é, sem
dúvida, um dos primeiros do distrito de Aveiro.
Abriu a estrada que liga esta vila com a de Arouca; tomou há cerca de 3
anos e à sua conta a construção de 27 quilómetros da estrada n.º 32 (através as
serras deste concelho, fazendo ligação directa de Viseu ao Porto) e já quase
concluída. Para esta estrada abonou o grande benemérito ao Estado, mil, oitocentos
e noventa e seis contos!
É ainda da sua iniciativa o monumental Hospital-Asilo de Macieira de Cambra,
no qual funciona uma esplêndida farmácia, fornecendo-se nela, gratuitamente, aos
pobrezinhos, todos os medicamentos necessários para a cura dos seus males.
É ainda a este grande Cambrenses que se deve a fundação da importante
“Empresa de Transporte Progresso”, também desta vila, da qual são directores os
nossos amigos Srs. Manuel Anacleto e seu filho José Anacleto.
O serviço que a toda esta região, concelho de Oliveira de Azeméis e
Estarreja, presta esta empresa é deveras magnífico:
Dá-nos ligação directa para quase todos os comboios, tanto do Vale do
Vouga como da Companhia Portuguesa, incluindo o rápido. Além destas carreiras
de O. Azeméis e Estarreja, tem as diárias para o Porto, com serviço especial aos
sábados, para os teatros, servidas por magníficas caminhêtas, das melhores
marcas.
E se em Macieira de Cambra ainda não se fez sentir a crise de trabalho, que
está alastrando por todos os pontos do país, é ao nosso grande benemérito Ex.mo
Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida que tal facto se deve.
E quantos lares, quantas criancinhas teriam de passar a mor parte das vezes
sem agasalho e sem o pão de cada dia, se não fosse a acção enérgica de tão ilustre
Cambrense?
20
O que seria de todo este concelho, se não fosse o progresso por ele
desenvolvido?
Pois, para coroar e encher de alegria todas as suas benemerências, tem o Sr.
Comendador a seu lado sua extremosa esposa, a Sr.ª D. Ana Horvath de Almeida.
O Sr. Luiz Bernardo de Almeida para a acção enérgica do trabalho; e sua
esposa, para completar a sua obra, vai levar aos pobrezinhos mais desprovidos o
conforto e regalo de que só o seu coração é capaz.
Por isso ao passar 74º aniversário do grande benemérito, nós lhe prestamos
aqui a nossa homenagem de gratidão e respeito, fazendo ardentes votos para que a
respeitável família da Quinta Progresso se conserve entre nós, prosseguindo
sempre na sua obra.
“Ad muitos anos”!
Macieira de Cambra, 10/ XI/ 931.
ARMANDO ALBERGARIA, (Do Correio de Azeméis)
Continuando a leitura do jornal, encontramos:
“A benevolência dá mais amigos que a riqueza e mais crédito que o poder –
F. ENELON
Fomos convidados pelo nosso grato amigo Sr. Carlos Alberto da Costa, afim
de, no seu Jornal de Cambra dissermos algo, no n.º especial de homenagem aos
dois grandes beneméritos de Macieira de Cambra, Ex.mos Senhores Comendadores
Luiz Bernardo de Almeida e António de Almeida Pinho.
Que dizer mais desses dois invulgares portugueses, que há longos anos
vimos admirando pelas suas benemerências, pelo seu crédito, pelo seu afincado
amor ao trabalho, amealhando fortuna que se vê empregada no engrandecimento
da terra querida que teve a felicidade de lhes ser berço?...
D’esses dois Homens de superior envergadura moral, já temos, na imprensa,
dito muito, referente à instrução, desvelado carinho pelos pobres, derramamento de
luz, de estradas e elegantes construções pela Suiça Portuguesa!...
Associando-nos do coração à merecidíssima homenagem da iniciativa de o
director de O Jornal de Cambra a tão prestantes cidadãos, modelos de exemplo,
ficamos por aqui dando o precioso espaço a outras penas de mais valor; e
congratular-nos-emos em ver confirmadas as modestas mas sinceras referências
que temos feito aos dois admiráveis serranos!...
21
J. TAVARES VALENTE
Uma das obras mais valorosas do espírito empreendedor do Eximo Senhor
Comendador Luiz Bernardo de Almeida é essa magnífica Empresa de Transportes
Progresso e que foi no género o primeiro grande melhoramento da Região e que
tem prestado inapreciáveis serviços, principalmente aos povos d’estes três
importantes concelhos: Cambra, Azeméis e Estarreja.
N’este momento de homenagem para o grande Benemérito Eximo Senhor
Comendador Luiz Bernardo de Almeida, nós não podemos deixar de nos prender a
esta sua belíssima iniciativa de progresso.
E, falando da Empresa de Transportes Progresso, é justo não esquecermos
os dois homens que têm concorrido para o seu crédito e fama de que já hoje goza, o
Sr. Manuel Anacleto e seu digno filho, José Anacleto, que lhe têm dado todo o seu
esforço, para que seja tida como a Empresa de Transportes de melhores carros e de
melhores “chaufeurs” e à qual não se pode, até hoje, durante perto de dez anos,
apontar um desastre por descuido ou incompetência!
As suas carreiras entre Cambra, Oliveira de Azeméis e Estarreja, desde o seu
início, são importantíssimas e importantíssimas são as suas carreiras Cambra,
Oliveira de Azeméis e Porto. O público encontra nelas, além das maiores
comodidades, o bom trato e todas as possíveis atenções do pessoal condutor.
Noticiando “A Solenização do aniversário natalício do grande Benemérito
Cambrense Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, no seu palacete, que se ergue
poeticamente, na encantadora “Quinta Progresso”, é digna de referência e de
apreço pelo seu auto significado de dedicação e justiça.
O dia raiara lindo, encantador, inesperado d’então o tempo do verdadeiro
Inverno que estivera até à véspera.
Vão chegando os convidados e amigos, a quem o Ex.mo Comendador e sua
ilustre Esposa vão recebendo com a maior afabilidade e se estendem pelas
sumptuosas galerias.
Ao toque regulamentar da sineta, todos se encaminham para a mesa e
tomam os seus lugares.
O ilustre aniversariante vê-se rodeado de amigos caros e de telegramas e
cartas com palavras de dedicação de muitos outros que não puderam assistir, mas
que estão ali em coração, n’aquele dia grande, de alegria para um lar e de felicidade
para um povo, que na existência do grande Benemérito tem o seu futuro garantido!
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A cadeira do Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’ Almeida estava
ornamentada com as bandeiras nacionais de Portugal e Brasil.
D’entre a assistência numerosa e selecta n’aquela linda sala ornamentada de
pratas e cristais, que brilham por entre flores e a cuja mesa se têm sentado bem
altas individualidades, podemos tomar nota dos seguintes nomes:
Dr. Augusto Amaral, P.e Francisco Vasconcelos, prior de Rôge; Francisco
Monteiro, D. Maria Amélia Tavares de Pinho, D. Ana Neto, Ml.e Ana Neto, D.
Feliciana Rosa de Abreu, Ricardo Luiz de Abreu, D. Leonor Ayres Martins Machado,
Emiliano C. Pães Machado, D. Thomazia Monteiro e filhos, D. Rosalina de Almeida
Moreira, Luiz de Sousa Moreira e filhos, Francisco Tavares de Pinho, Dr. Luiz
Correia de Sá, Adriano Martins de Sousa, Manuel de Almeida Pinho, D. Beatriz
Tavares de Almeida e filho, Manuel Francisco da Silva, José Pinto Grilo, Manuel
Anacleto e filhinho Luiz, D. Maria José Cândida da Silva, José Tavares Valente,
Carlos Teixeira e Mário Machado.
À tarde, estiveram na “Quinta Progresso”, a cumprimentar o Ex.mo Sr.
Comendador Luiz Bernardo d’Almeida muitos dos amigos, entre eles, o ilustre
republicano ex.mo Sr. Tavares da Fonseca, proprietário da encantadora vivenda “Boa
Vista”, onde n’esse dia vimos hasteada a bandeira nacional.
Os brindes foram afirmações do maior afecto e admiração pelo ínclito
benemérito e por sua veneranda Esposa.
O Ex.mo Sr. Machado, o primeiro a brindar, recorda o estado de doença do
Ex.mo Comendador na data do seu aniversário em 1930, não podendo sair do leito
da dor, quando os seus amigos a ele se reuniam como agora; e tanto mais se
rejubila n’aquele momento por o ver ali, na melhor disposição, dando graças à
Providência e ao ilustre médico Sr. Dr. Augusto Amaral que não o desamparou e viu
nas suas melhoras mais um triunfo da sua operosa clínica.
O Ex.mo Sr. Dr. Augusto Amaral, congratula-se por ver ali o grande
benemérito, salvo das garras da doença atroz que o tem perseguido, felicitando o
povo a quem ele tanto tem beneficiado e que deve pedir a todo o momento o
prolongamento da sua preciosa existência.
O Ex.mo Sr. Ricardo de Abreu, dá às suas palavras a eloquência e a poesia
que lhe são peculiares, para falar do Ex.mo Comendador, tendo imagens belíssimas
da benemerência do ilustre Cambrense, que não se tem cansado de prestar
benefícios à sua terra, que tem o dever de o venerar, como o seu maior amigo. Tece
23
um huno mavioso e de afecto ao grande benemérito e a sua santa Esposa, que são
os ídolos d’um povo.
O Ex.mo Sr. Alves Neto, espírito de delicadeza e prestantismo, sente a alegria
de sempre, ao assistir à festa natalícia do grande Benemérito e comum amigo, por
quem tem a mais profunda admiração.
O director de “O Jornal de Cambra”, saudando o Ex.mo Comendador e grande
Benemérito Luiz Bernardo d’Almeida, saúda também o outro grande Benemérito
Ex.mo Sr. Comendador António d’Almeida Pinho.
O Ex.mo Sr.. J. Tavares Valente, fala do Ex.mo Benemérito Comendador Luiz
Bernardo d’Almeida e de sua Ex.ma Esposa D. Ana Horvath d’Almeida, e tem
palavras do maior enternecimento para esses dois entes, a que se acostumou a
venerar.
O Ex.mo Sr.. Francisco de Pinho, brinda às altas qualidades de benemerência
do Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, brinda-se ao Ex.mo Sr. Manuel
Anacleto, artista de méritos, inteligentíssimo gerente da grande Empresa de
Transportes “Progresso” e que ultimamente tem sido hábil dirigente dos serviços da
Estrada n. 32.
Foi lembrado o Ex.mo Sr. Agostinho de Campos, bairrista inapreciável, que
teve sempre a preocupação de fazer conhecida a sua terra.
A Natureza quis associar-se à solenização, fazendo raiar o sol amigo, que
nuvens tenebrosas de tempestade esconderam por muitos dias.
E assim, no aniversário do Ex.mo Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, tudo
se conjugou para que a “Suiça Portuguesa” vivesse um dos seus maiores dias em
homenagem ao maior propulsor do seu futuro!
As homenagens do Jornal:
Na prevenção de maus juízos de algum espírito mal intencionado, nós, ao
prestarmos homenagens como a que hoje prestamos aos beneméritos Ex.mos Sr.
Comendadores Luiz Bernardo d’Almeida e António d’Almeida Pinho, frisamos
sempre esta nota:
Aqueles a quem prestamos semelhantes preitos não têm nada que nos
agradecer, senão o povo, o povo beneficiado, em nome do qual nós fazemos justiça
a essas almas do Bem, como é dever nosso faze-la a todos aqueles que n’esta terra
mereceram ou venham a merecer o reconhecimento público.
Outros beneméritos Cambrenses nós homenagearemos”.
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Depois de Luiz Bernardo estar longos anos no Rio de Janeiro, regressou
à sua terra natal dando inicio à sua fantástica obr a de benemerência:
A escola primária da Praça
Mandou construir a escola de Macieira de Cambra, que no ano de 1913
ofereceu ao Estado. Este edifício com amplas instalações tinha residência para um
professor, cantina, recintos para recreio, balneários e era dotado de água corrente.
Era considerado um dos melhores do país, naquela época.
Luiz Bernardo de Almeida pela mão do então Presidente da Câmara, seu
amigo, Manuel de Oliveira Campos, é sensível tal como muitos brasileiros, à
importância da instrução e preocupa-o que nem todos tenham condições para
aprender. Em 6 de Março de 1910 o “Jornal de Cambra” noticia que o Presidente
mandou distribuir em 5 de Março, pelas crianças pobres da escola de Macieira uma
grande quantidade de livros para a 2ª, 3ª e 4ª classes, que assim fazia todos os
anos e ainda durante o ano lectivo fornecia papel, lápis e tinta.
Sabe-se também que gratuitamente fornecia material didáctico e batas aos
alunos da escola que mandou construir. A nova escola, pela mão do seu
representante Manuel Oliveira Campos, fica pronta em pouco mais de dois anos e
será inaugurada em 1913, no dia do aniversário da esposa do Comendador.
A nova escola, com cerca de 600 m2 de área coberta, denuncia traços
comuns a outros projectos contemporâneos, nomeadamente à “Quinta Progresso”,
de 1915, habitação do Comendador e essa comprovadamente do projectista João
José Gomes.
25
Foto 5 - Pormenor da Quinta Progresso
A pesquisa, no entanto, deixou-nos entrever na imprensa, no n.º 273 do
“Jornal de Cambra” de 8 de Junho de 1913:
“…como todos sabem, o grandioso prédio foi desenhado pelo Sr. Manuel de Oliveira
campos, que também se encarregou de dirigir-lhe a construção.”
No dia da inauguração das escolas, no salão nobre, estiveram presentes
além dos doadores, o Governador Civil do Distrito de Aveiro, Bacharel Alberto
Ferreira Vidal, o Inspector do Círculo escolar, o Administrador do concelho, Pe.
Tomás Correia do Amaral, para além de outras individualidades e de inúmeros
cidadãos.
Existia no Salão Nobre de edifício, juntamente com as fotografias dos
beneméritos, uma acta que retratava o momento:
“Aos três dias do mês de Junho de mil novecentos e treze, reunidos os
presentes no edifício das escolas oficiais desta freguesia, sito à Avenida Miguel
bombarda, generosamente doado ao Estado pelo Benemérito cidadão Luiz
Bernardo de Almeida, os Ex.mos Senhores Governador Civil do Distrito e “Inspector
do Círculo Escolar, autoridades civis e grande multidão de pessoas, além do referido
doador, procederam com todas as formalidades legais à inauguração e abertura
solene do dito edifício, declarando neste acto o Ex.mo Inspector Escolar que aceita a
doação pelo Estado, ficando desde esta data autorizada a transferência das escolas
para o mesmo edifício, onde continuarão desde hoje abertas à frequência escolar.
26
E, para constar, foi lavrada esta acta que depois de lida em voz alta, vai ser
assinada por todas as pessoas presentes e colocada no salão nobre do Edifício”.7
O Governo da República, sensibilizado com o gesto do Comendador e sua
esposa fazem publicar no diário do governo louvor a estes beneméritos, atribuindo
às escolas a designação do nome dos beneméritos conforme se reproduz:
Diário do governo n.º 130 Ano 1913, Quinta-feira, 5 de Junho
2ª Repartição
“Tendo chegado ao conhecimento do Governo da República Portuguesa que
os beneméritos cidadãos Luiz Bernardo de Almeida e sua esposa, D. Ana Horvath
de Almeida, de Macieira de Cambra, doaram ao Estado um magnífico edifício, por
eles mandado construir, para a instalação de escolas daquela vila, e que custou a
quantia superior a 12.000 escudos: manda o Governo da República Portuguesa,
pelo Ministro do Interior, que sejam publicamente louvados aqueles cidadãos e que,
em homenagem ao acto de benemerência por eles praticado, seja dado o nome do
doador à escola do sexo Masculino e o da doadora à escola do sexo feminino.
Dada nos Paços do governo da República, em 3 de Junho de 1913 – O
Ministro do Interior, Rodrigo José Rodrigues.”
Foto 6 – Escola Primária doada por Luiz B. Alm eida e Ana Horvath
A estrada nacional n.º 32 e outras acessibilidade
7 - O Jornal de Cambra de 9 de Junho de 1983?
27
A acção do Comendador estendeu-se às acessibilidades, financiando, por
empréstimo à Junta Autónoma das Estradas, sem juros, a abertura e empedramento
de 25 quilómetros de estrada, entre Cepelos e o Rio Teixeira, que nos ligou ao
distrito de Viseu.
Foto 7 - Estrada n.º 32 / ponte de Arõ es
Esta estrada também foi conhecida como a estrada n.º 42, e mais tarde,
estrada nacional n.º 227.
Foto 8 - O Jornal de Cambra de 15 de Agosto de 1932 referindo-se à estrada n.º 32
Neste Jornal, transcreve-se a notícia publicada no Jornal da Beira.
Reclama-se de um troço que falta construir, entre a capela de Santa Joana
de S. Pedro do Sul e a Ponte Teixeira.
A população de S. João da Serra e de Oliveira de Frades, reclama da
situação de isolamento em que vive, porque faltam terminar uns escassos
quilómetros.
28
Sem esquecer o que se passa no concelho de Cambra, refere-se ao
Comendador Luiz Bernardo de Almeida e elogia o trabalho deste pela conclusão da
estrada, já no ano anterior, até à Ponte Teixeira.
Nesta área, a obra do Comendador não se limitou à estrada n.º 32.
Foto 9 - Visita do Di rector-Geral da Administração Geral de Estradas
Por sua iniciativa mandou construir a estrada que liga a vila de Macieira de
Cambra ao lugar de Pena - Algeriz, tornando mais fácil o acesso ao concelho de
Arouca e Castelo de Paiva.
Igualmente, mandou construir um troço de estrada que vai da ponte da
Gandra a S. João da Madeira.
A abertura da rua em Vale de Cambra, denominada actualmente por Avenida
Infante D. Henrique, é da sua responsabilidade.
Juntamente com aquele que foi seu motorista, Manuel Anacleto, fundou a
Empresa de Transportes Progresso, no ano de 1920.
Instalou umas bombas de gasolina em Macieira-a-Velha.
29
Foto 10 – Mini-autocarro
A Banda de Música e o Centro Recreativo Musical e L iterário
Subsidiou a Banda de Música de Macieira de Cambra e contribuiu para que
muitas centenas de pessoas cultivassem esta arte.
Esta colectividade denominava-se “Filarmónica Lira Cambrense” e foi
fundada no ano de 1873.8
Foto 11 - Filarmónica Lira Cambrense
Padre Manuel Tavares de Paiva, natural de Tagim, Padre Manuel Tavares de
Amorim, Pároco da freguesia de Rôge e Manuel Correia Vaz de Aguiar, natural da
sede do concelho foram os seus fundadores.
No entanto, os impulsionadores foram:
Comendador Luiz Bernardo de Almeida
Isaías de Almeida Vide
30
Alberto de Almeida Cruz
Vasco Hernâni da Graça Branco
Conquistou fama entre as melhores da região, mantendo-se em actividade
até1955.
Praticamente, o Comendador Luiz Bernardo de Almeida foi fundador da
“Filarmónica Lira Cambrense” onde, para além da contribuição monetária, custeou
todas as despesas de manutenção, comprando todo o instrumental.
No início, a Banda era constituída por 30 músicos e o primeiro regente foi o
Sr. José de Oliveira que permaneceu durante 33 anos, morador no Arzinho, lugar da
Carvalha.
Para além daquele, seguiram-lhe outros regentes, nomeadamente os
senhores Domingos Tavares Russo (Domingos da Russa), Carlos Dores (da GNR
do Porto), Artur Tavares de Pinho que depois de ter passado pela Banda de Música
de Carregosa, regressa à Banda da sua terra natal agora como maestro depois de
ter sido executante9, Joaquim José Vieira (durante 12 anos), Lourenço Pestana,
Manuel da Silva Pereira, Sebastião Quadros, Martins da Feira, Joaquim da Costa
Rocha, Reis de Coimbra, Domingos Ruas, António José da Costa, Augusto Vieira,
Artur Sampaio e maestro Biscaia.10
8 - “Homenagem aos músicos cambrenses”, de minha autoria; 9 - “Mestre e compositor Artur Tavares de Pinho nasceu em 1880 em Tagim, freguesia de Macieira de Cambra, filho de Manuel Tavares de Pinho, daí natural, e de Maria da Silva, natural de Macinhata da Seixa, ambos já falecidos. Era casado com Deolinda de Jesus Valente, tecedeira, natural de Carregosa.
De uma família vocacionada para a música – recorde-se que seu pai e dois irmãos eram músicos na banda da sua terra natal – Artur de pinho iniciou-se na arte dos sons ao ingressar como executante na velha banda musical de Macieira de Cambra, que sob a égide do Comendador Luís Bernardo de Almeida alcançou renome.
Uma vez integrado no elenco da banda da sua terra, Artur Tavares de Pinho seduziu-se pela cultura musical e, daí em diante, é um autodidacta que devora livros e tratados musicais e vem a tornar-se um compositor talentoso e inspirado e um regente conceituado e competente que regeu as bandas de música de Carregosa nos anos de 1909 a 1911 inclusive, Macieira de Cambra, Cabeçais e, finalmente, a de Fajões.
Em 11 de Junho de 1926, Artur Tavares de Pinho deu a primeira lição a um grupo de cerca de trinta jovens que se dispunham a aprender música e tocar instrumentos de corda e que vieram a formar uma tuna, a Tuna Invicta de Fajões, como veio a ser designada.
Desde 1926 até 1938 que Tavares de pinho foi sucessivamente mestre regente daquela tuna, depois da orquestra e da sua sucessora, a Banda, que já desde 1935/36 tinha instrumental metálico e de sopro e era designada por Banda Musical de Fajões.
Por divergências surgidas em 1938, no final da época, mestre Artur abandonou, desgostoso, a regência da Banda de Fajões.
Sucedeu-lhe, então, por uma época o regente Ramiro Santos, de apelido “O Caneca”, de Matosinhos. Em 1939/ 1940, Artur Tavares de Pinho retomou a regência da Banda de Musical e, nesse ano, deixou-a
definitivamente e fixou-se no lugar de Borralhais da freguesia de Carregosa, para não mais reger banda alguma. A maior parte dos trechos executados pela antiga Tuna Invicta de Fajões foram escritos por mestre Artur Pinho. No
arquivo da Banda de Fajões ainda constam algumas partes para este ou aquele instrumento de partituras musicais, saídas da inspiração e talento de Tavares de Pinho.
Por deferência de seus netos, Manuel Soares Ferreira dos Santos e António Correia de Pinho, sabemos que mestre Artur de Pinho compôs, além de diversas aberturas, valsas e marchas, que andam dispersas, as seguintes partituras e obras: a rapsódia “Fajões em Festa”, de 1937, o tratado de composição “Theorias e Problemas da Sublime Língua Universal”, de 1900 e os arranjos das óperas “Giovana de Arco, acto primo”, de G. Verdi e “Linda Di Chumounix” de G. Donizetti, ano de 1909, data em que mestre Artur contava 29 anos.
De sua autoria existem várias marchas graves, fúnebres e outros cânticos religiosos. Compôs o hino dedicado a Luiz Bernardo de Almeida. Faleceu, com 66 anos, de «lesão orgânica do coração», às cinco horas de 30 de Dezembro de 1946, no lugar de
Borralhais da Freguesia de Carregosa e foi sepultado no cemitério local. 10 - Revista do Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 29 de 1941;
31
O maestro e compositor, Artur Tavares de Pinho, compôs e dedicou ao
Comendador o “Hino a Luiz Bernardo de Almeida” uma partitura composta para ser
executada pela Banda de Música
Suponho que a Filarmónica Lira Cambrense terá tocado, pela primeira vez,
no ano de 1913, na altura da inauguração da escola.
Foto 12 - Primeira página da partitura
Em colaboração com outros “Macicambrenses” foi instalado, em edifício, o
Centro Recreativo, Musical e Literário Luiz Bernardo de Almeida.
“Os vastos salões, que o Centro Recreativo Musical e Literário ocupa, são
amplos, higiénicos, e confortáveis; têm bom mobiliário, cantina e quarto de banho;
das varandas avista-se um panorama admirável”.
Música, Literatura, Bilhar, Pingue-pongue, Cinema, etc., tudo ali se encontra
para recreio dos sócios. Há, também, um grupo cénico, que tem dado várias récitas
com muito agrado.
Os Macieirenses, povo laborioso e altruísta, empregam o melhor dos seus
esforços no progresso geral da terra que os viu nascer.
É muito digno Presidente desta agremiação, o Sr. Vasco Hernâni da Graça
Branco, distinto secretário de Finanças, que nas suas horas vagas dedica a sua
laboriosa actividade ao desenvolvimento desta associação.11
11 - Ferreira, António Martins: “Vale de Cambra e as suas belezas naturais”;
32
Na altura da inauguração, em 21 de Julho de 1942, discursaram o Presidente
da Assembleia e o Presidente da Direcção, respectivamente o Dr. Augusto Correia
do Amaral e Vasco Hernâni da Graça Branco:
“ Minhas Senhoras!
Meus Senhores!
É hoje que me cumpre presidir pela primeira vez a esta Assembleia Geral, e
agradecer-vos antes de mais nada a imerecida honra que me destes da escolha do
meu nome para cargo tão respeitável, e que eu de forma nenhuma posso
desempenhar a vosso contentamento, quer pela falta das altas qualidades que lhe
são imprescindíveis e que eu não possuo, quer pela minha descontinua e mórbida
disposição para o trabalho e para a acção, que não me deixa cumprir rigorosamente
com todos os meus deveres.
Ainda bem que hoje não me encontro nesse estado, e pude vir aqui
apresentar-vos aqueles agradecimentos e os da vossa anuência ao meu convite,
pela generosidade da vossa presença nesta distinta Assembleia.
O concurso do vosso esforço, da vossa dedicação, era-nos moral e
materialmente necessário, e aqui vimos solicitá-lo. Nenhuma obra, em qualquer
parte, consegue ser verdadeiramente profícua, duradoura, completa, perfeita, sem o
entusiasmo e valiosíssima cooperação dos seus compatriotas. Agora, de mais a
mais, trata-se de uma alta e justíssima obra de patriotismo, e talvez amanhã de
beneficência, que muito carece do influxo da vossa bondade, do carinho, do zelo, da
solicitude e do entusiasmo da vossa alma ardentemente amante desta terra, desta
terra que pela fertilidade do seu solo, pelas suas múltiplas e radiantes belezas
nativas, e pelo espírito de iniciativa, de trabalho, de lealdade e lisura dos seus filhos
bem merecia ter uma sorte mais ditosa, mais risonha.
Como sabeis, nasci ali em baixo, em um pequenino lugar desta freguesia,
onde para sempre se fecharam os olhos da pessoa que mais estremeci e adorei
neste mundo. Foi aí que recebi os primeiros afagos e os primeiros beijos, que soltei
os primeiros gemidos e os primeiros risos, que verti as primeiras lágrimas, que
soletrei as primeiras letras, que rezei as primeiras orações, foi aí que sofri as
primeiras advertências e os primeiros castigos, que matei a primeira sede, na água
de uma fonte que havia junto da casa onde nasci e que brotava límpida e cristalina
da rocha dura, foi aí que trepei ás primeiras árvores em busca de algum ninho
escondido nas suas frondes espessas, foi aí sob a influência um pai austero e de
uma mãe amorosa que recebi os primórdios de uma educação que constituiu de
33
futuro a base de todo o meu modo de ser moral e social, e foi também aí que de
joelhos e com as mãos erguidas, me despedi para sempre da amantíssima mãe que
Deus me deu.
Como poderei eu portanto não ter um grande amor a esta terra, onde fui
nascido, baptizado e criado, onde se desenrolam os primeiros anos da minha
infância, onde se constituiu o primeiro lar da minha família! Quantas recordações
alegres pungentes e quantas saudades deliciosas e amargas me assaltam a
memória ao avivar estas coisas!
Cumpre-nos a todos, os bons filhos desta terra, procurar honrá-la e
engrandece-la, cada um na medida das suas forças, no âmbito da sua acção.
Eu, infelizmente, um pouco abalado por doença, pela idade, e por várias
contrariedades, pouco mais posso fazer e pouco ou nada tenho feito, o que torna
extremamente fácil a minha substituição e imperceptível a minha falta.
A uma geração sucede outra geração e a que aí vem muito tem que aprender
no exemplo de inabalável persistência e de patriótica dedicação de alguns dos seus
filhos, nomeadamente de Luiz Bernardo de Almeida, António de Almeida Pinho, Dr.
Adolfo Coutinho e António Aguiar.
Calculo que a morte apanhou o segundo de surpresa, quase repentinamente,
e não o deixou por isso levar por diante a sua grande obra de engrandecimento
desta terra. Ainda bem que em seu lugar deixou pessoa que o substituísse condigna
e magistralmente – sua distinta e insinuante esposa, a Ex.ma Sr.ª D. Áurea de Sousa
Pinho, que todos nós conhecemos e apreciamos, e que tantas e tão boas provas já
nos deu da sua extrema gentileza e grande amor por esta terra.
É nelas e no grande benemérito Luiz Bernardo de Almeida que este povo
deposita as suas melhores esperanças! Que o exemplo deles frutifique, insinuando-
se no ânimo dos novos, e a nossa terra, que tanto nos últimos tempos tem sofrido,
não demorará a atingir o lugar a que lhe dão direito a exuberância e peregrinas
belezas do seu solo, a salutar amenidade do seu clima, a expansão sempre
crescente da sua agricultura, e o espírito laborioso, inteligente e honesto dos seu
filhos.
Que breve soe essa hora de suprema ventura e se repercuta na cumeada
das nossas serras, e descendo a ondear a água dos nossos rios, vibre por toda a
parte, nas encostas e nos vales, como um hino de felicidade e de triunfo, se difunda
por todos os sítios, cantos e recantos, nos campos e nos montes, nos córregos e
desfiladeiros, como uma grande bênção de paz e amor lançados sobre toda a
34
vastidão desta terra bendita, onde se abriram os olhos para a contemplação dos
seus encantos e para a doce apreciação das suas maravilhas, e onde se fecharam
os dos nossos pais para mergulharem nos insondáveis abismos da eternidade”.
O Sr. Vasco Branco, presidente da Direcção diria o seguinte:
“ Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia Geral
Minhas Senhoras e meus Senhores,
O dia 21 de Julho de 1942, tem para Macieira de Cambra uma alta
significação moral por ser neste dia que se reúne neste Centro pela primeira vez em
Assembleia Geral, os seus associados, sob a presidência de uma figura nobre,
encanecida pelos trabalhos e vigílias em prol da humanidade.
Essa figura respeitável a quem esta freguesia, este concelho, e até fronteira
fora dele, deve ser grata pelos serviços humanitários recebidos – é o Sr. Dr.
Augusto Correia do Amaral.
Nesta Assembleia, que a todos deve interessar vivamente, terão os
associados ensejo de conhecer a vida interna desta instituição, os seus fins morais
e razões da sua criação, de muitos já reconhecidas. Serão eleitos os seus corpos
gerentes, por eleição directa dentre os seus associados, de livre escolha de todos
os presentes e que virão substituir os de nomeação provisória, que hoje cessam o
seu mandato.
Todos os associados podem integrar-se hoje no conhecimento dos diversos
fins para que foi criado este Centro, nas Leis e princípios oficiais porque se regulam
os seus serviços nos diferentes sectores da sua administração, em todas as fases
da sua vida interna.
Sobre a mesa encontrarão minuciosamente, relatórios diversos, contas e
pareceres da sua aprovação. Que não hajam ilusões sobre a sua veracidade,
porque tudo está concretizado com documentos aprovados, que serão dirigidos às
Estâncias superiores, para ser confirmada a aprovação.
As suas contas e relatórios serão publicados na imprensa, para conhecimento
directo de todos, antes de subirem à aprovação superior.
Não querem os corpos gerentes, a quem hoje caduca o seu mandato, que
sobre eles impenda a menor desconfiança relativa à sua honestidade, por isso que a
sua administração em cada um dos seus sectores está perfeitamente,
concretamente demonstrada.
35
Esta explicação era de algum modo necessária, para deprimir
responsabilidades, que por ventura lhes possam atribuir.
Para terminar, atendendo à protecção, carinho e simpatia, que o Patrono
deste Centro, Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida, vem dispensando a esta
progressiva instituição, atendendo ao esforço e boa vontade com que fez promover
no Rio de Janeiro uma subscrição em beneficio desta nova instituição, famoso
baluarte moral da nossa terra, que rendeu a avultada quantia 16,112$00 e
considerando que sem o seu precioso auxílio, moral e material, o Centro Recreativo,
correria perigo eminente de naufragar, proponho que o Sr. Comendador Luiz
Bernardo de Almeida seja nomeado, por aclamação, presidente honorário e que da
deliberação tomada seja dado conhecimento a Sua Excelência.
Mais proponho para que o Ex.mo Sr. Manuel Anacleto, que a este Centro vem
dispensando grande simpatia e protecção, facilitando economicamente o acesso do
regente da Lyra Cambrense, a esta localidade, seja nomeado também por
aclamação, sócio honorário em harmonia com os nossos estatutos.
Por último proponho que o Sr. Aníbal Soares Abrantes, residente no Rio de
Janeiro, seja nomeado sócio benemérito deste Centro Recreativo, e que desta
deliberação lhe seja dado conhecimento, por esta direcção.12
Nesta Assembleia estaria indigitado para os Corpos Sociais desta
Colectividade as seguintes individualidades:
ASSEMBLEIA GERAL
Dr. Adolfo Coutinho
Dr. Augusto Correia do Amaral
Dr. José Marques Mendes
Francisco Tavares de Pinho
DIRECÇÃO
Presidente: Manuel Francisco da Silva
Vice-Presidente: Manuel de Almeida Vide
1º Secretário: Sérgio Pinheiro Aguiar
2º Secretário: Américo Amael Albergaria
Tesoureiro: Joaquim Correia de Pinho
12 - Discursos extraídos de documento do meu arquivo pessoal;
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VOGAIS
Manuel de Oliveira Jorge
Isaías Teixeira
Manuel de Almeida Pinheiro
António Miguel de Almeida
CONSELHO FISCAL
Presidente: António Albergaria Coutinho
Secretário: Afonso Oliveira
Relator: Augusto de Oliveira Vasconcelos
COMISSÃO DE DEFESA E PROPANGANDA
António Bernardo A. Moreira
Sérgio Pinheiro de Aguiar
António Coelho Vide
José Fernandes de Oliveira
José Maria de Sousa
SECÇÃO MUSICAL
Manuel Joaquim Matos
Américo Correia da Silva
Manuel Correia de Pinho
Joaquim de Oliveira Campos
Gabriel Soares Barbosa
No entanto, Vasco Branco continuaria a assumir os destinos desta, e no ano
de 1944, homenageou os referenciados já no seu discurso de 1942.
Essa homenagem, cujos discursos abaixo se transcrevem, deixa-nos
perplexos com tamanha gratidão. Também não seria para menos!
“O dia 22 de Outubro de 1944 é de grande gala para Macieira de Cambra, dia
memorável para a sua actual geração, sempre que lhe aflorem ao espírito os nomes
dos 3 insignes beneméritos da nossa querida e amada terra: - Os senhores
Comendador Luiz Bernardo de Almeida, Aníbal Soares Abrantes e Manuel Anacleto.
Neste momento Macieira de Cambra está em festa, festa simpática e
significativa e vibra de emoção e contentamento, porque se vai desempenhar de
37
uma grande dívida de gratidão, vai cumprir uma augusta e nobre missão, qual é a
de render sincera e eloquente homenagem de gratidão e reconhecimento, em
assembleia geral, no seu Centro Recreativo aos três grandes beneméritos acima
referidos, os quais tanto se têm evidenciado em protecção e carinho a esta linda
terra, a este rincão privilegiado, a quem a natureza dotou com os mais sublimes e
invejáveis atractivos.
Aos três ínclitos cidadãos, o Centro Recreativo, Musical e Literário Luiz
Bernardo de Almeida, assim como todos os elementos desta útil e simpática
associação dedicam sincera, e carinhosamente, esta sessão solene.
Raras vezes aparecem na nossa terra, pequena, é certo, geograficamente,
mas grande, muito grande, pela fidalguia dos seus dotes educativos, bairrismo e
amor pátrico, raras vezes, repito, aparecem na nossa terra e até no nosso país,
dentro do mesmo século, três homens tão eminentes e ungidos de tão sublimes
virtudes cívicas, como os nossos homenageados de hoje. Parece que a natureza faz
enorme esforço e fica fatigada de os produzir, depois de uma tão árdua tarefa.
Só muito mais tarde, passados muitos anos e até séculos, voltam a aparecer
outros, seus émulos, patentear às novas gerações iguais benemerências,
cimentadas pelo exercício de sacrossantas virtudes, em que se destacam a caridade
e o amor do próximo, de todas as mais santas, porque são o crisol onde o coração
se retempera e a alma se purifica, aproximando-se de Deus.
São os nossos homenageados de hoje, como astros de primeira grandeza, a
que irradiam brilhantes beneces, que frutificam pelo impulso do seu coração e
magnanimidade da alma, convencem pelo exemplo e cativam por maneiras
delicadas e sinceros sorrisos, que não são mais do que o espelho da alma.
Feitas estas singelas considerações de ordem moral e psicológica, passarei a
dizer o que sinto em referência a cada um dos nossos homenageados.
O Senhor Comendador Luiz Bernardo de Almeida, sob os impulsos do seu
coração Diamantino de verdadeiro Português, ingente amigo da sua terra natal, que
há mais de 30 anos tem procurado engrandecer, elevar e fazer progredir por
inúmeros actos de beneficência, altruísmo e filantropia, ao ter conhecimento de que
um grupo de rapazes desta freguesia, cheios de seiva e vigor, animados de boa
vontade, aspiravam a organizar um Centro Recreativo e especial protecção à sua
Banda, que viam cair dia a dia e que, além disso, sentiam a falta de um Clube
Recreativo, onde se reunissem nas suas horas de ócio, não só para se distraírem
como também para trocarem impressões sobre os múltiplos problemas em equação,
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relativos ao progresso da sua amada terra, começaram a expandir e a intensificar os
seus pensamentos, no sentido de que Macieira se emancipasse do marasmo em
jazia mergulhada há muitos anos.
O Senhor Comendador Luiz Bernardo de Almeida abraçou com ardor,
entusiasmo e boa vontade a aspiração manifestada por a mocidade macieirense,
enfileirou a seu lado e sentiu germinar em seu coração altruísta o desejo de mais
uma vez demonstrar que, pela sua parte, a vontade dos rapazes devia de vingar e
não hesitou em estimular e secundar. Estava a semente lançada à terra, só faltava
fecunda-la para que germinasse e crescesse depressa.
Tudo agora dependia do Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida, que
seria a mola de aço para accionar a nova máquina fomentadora do progresso de
Macieira de Cambra.
Assim lho fizeram sentir. Integrado o Sr. Comendador em tudo que se tinha
passado, pôs a disposição dos promotores da nova iniciativa a sua fecunda bolsa,
de onde foi saindo, a título de empréstimo, sem juro, a quantia de cerca de 30 mil
escudos, a prazo indeterminado, para ocorrer às grandes despesas a fazer com a
instalação do novo Centro Recreativo.
Assim se conseguiu o carvão para accionar a máquina. Faltava, porém, a
casa para a instalar. Mas o Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida, sempre
bondoso e altruísta, cortou o nó gordo: - Alugou, mediante renda convencionada, o
palácio onde neste momento nos encontramos a render homenagem sincera a Sua
Ex.ª o grande paladino das glórias desta terra abençoada.
No frontispício deste edifício acha-se patente, em caracteres bem visíveis, o
nome de S. Ex.ª, patrono desta nobre e prestimosa instituição, iluminado
permanentemente de noite com uma lâmpada eléctrica, para o gravar bem na
memória de todos, a qualquer hora.
Mas ainda não é tudo! O Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida mandou
proceder, por conta própria, à adaptação deste edifício para nele se instalar o centro
recreativo e fez construir anexa uma bela casa para ensaios da Banda e estudos.
Com o numerário emprestado pelo Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida se
pagaram as primeiras despesas feitas pela Direcção do centro Recreativo, tais como
os fundamentos da Banda, compra do bilhar, mobiliário, etc.
Macieira de Cambra orgulha-se de possuir um Centro Recreativo bem
instalado e regularmente mobilado, que tem merecido os maiores elogios dos seus
visitantes. É a melhor instituição que a nossa terra hoje possui.
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Não vive desafogadamente, é certo, mas as suas condições de vida tendem a
melhorar. Apesar de tudo, crê-se que há elementos derrotistas, não sendo amigos
de Macieira, procuram entravar o seu progresso.
Além de tudo que fica dito, muitos outros benefícios tem o Sr. Comendador
Luiz Bernardo de Almeida prestado a Macieira. Entre eles citaremos o grandioso
edifício escolar, que mandou erigir a espensas suas, no coração da vila. É um
grande amigo da instrução das criancinhas da sua terra natal, a ponto de se
convencer, com justa razão que é necessário cuidar com assiduidade e com o maior
interesse e perseverança, da regeneração moral do povo, como condição
necessária, não só da prosperidade do país, mas também da existência como
estado livre e independente, tendo sempre em vista os perigos que ameaçam os
povos contemporâneos e em especial as pequenas nações.
Convenceu-se também o Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida de que
nem só aos poderes públicos, mas também à iniciativa particular competia promover
no maior grau possível, o derramamento da instrução que é base da regeneração
moral da colectividade e que todos os cidadãos, em geral, deviam igualmente velar
pela educação da mocidade, de qualquer modo que possa concorrer para que ela
se melhore e aperfeiçoe.
Só isto vale um poema.
Acha-se há dias em Macieira e aqui presente neste momento, vindo do Rio de
Janeiro, o nosso conterrâneo e amigo Sr. Aníbal Soares Abrantes, insigne
benemérito, sócio gerente da grande casa comercial da rua dos Arcos, que gira sob
a firma L. B. de Almeida & Cª, a quem rende as mais eloquentes e sinceras
homenagens e dou as boas vindas.
Ainda muito novo embarcou para a grande capital federal, há 26 anos, sob a
égide do Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida e entrando na casa comercial
da qual hoje é sócio gerente, desde logo se dedicou ao trabalho com afane,
conseguindo elevar-se por si mesmo ao lugar, que hoje ali ocupa.
Inteligente e honesto, desde logo cativou a estima e consideração não só dos
sócios da casa, como dos numerosos empregados técnicos, a quem se impôs pelas
suas nobres qualidades de espírito e do coração. Alguns anos depois, tendo-se
imposto à consideração geral do pessoal da casa, graças ao seu invulgar aprumo
probidade e proficiência foi elevado à categoria de sócio gerente, lugar que
desempenha com grandes conhecimentos técnicos e comerciais.
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É uma figura marcante na grande República, a quem certamente está
reservado um grande triunfo e um risonho futuro. Há muito tempo, que o Centro
Recreativo de Macieira de Cambra aguardava a sua vinda a esta terra, que embora
não seja a sua, por aqui passou grande parte da sua mocidade e aqui recebeu as
primeiras luzes da instrução há cerca de 26 anos.
Sua Excelência nos releve esta franqueza a este à vontade. Estas
homenagens, que hoje lhe são rendidas já há muito lhe são devidas e bem
merecidas, mas por falta de oportunidade não se tinha levado a cabo. Os serviços
que Sua Excelência nos prestou no Rio de Janeiro não podiam ser pagos com um
simples muito obrigado.
Que a modéstia de Sua Excelência nos releve a indiscrição. Quando da
fundação do Centro Recreativo, a sua Direcção lutava e ainda hoje luta, com
enormes dificuldades financeiras para poder solver uma boa parte dos seus débitos.
Em sessão e com apoio moral do Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida, elaborou-se uma carta circular, que foi assinada pela Direcção e por pessoas categorizadas da terra e remetida ao Sr. Aníbal Soares Abrantes, para o rio de Janeiro que ali abriu uma subscrição e foi o maior subscritor. Decorridos poucos meses o Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida recebeu uma letra do Banco no valor de 16.114$00, que o Sr. Comendador creditou ao Centro Recreativo, ficando a dívida ao Sr. Luiz Bernardo de Almeida muito reduzida, isto é a menos de 50%. O gesto do Sr. Aníbal Soares Abrantes acusou justificado júbilo entre os
associados, que desde logo conheceram o seu valor moral e as suas belas
qualidades do espírito e do coração. Não nos enganávamos, com efeito, porque tem
chegado ao nosso conhecimento, que durante os poucos dias em que é hóspede de
Macieira de Cambra, tem praticado actos de verdadeira filantropia.
No seu peito se alberga uma alma de eleição. Para com o Centro Recreativo
tem sido generoso e por certo não param aqui as suas benemerências. É por isso
que este cortejo de homenagens lhe são devidas e bem merecidas. Sua Excelência
vai deixar-nos, talvez brevemente, mas de ora-avante, estará sempre presente a
todas as evoluções deste Centro recreativo, porque nos deixa um eloquente
representante ali pendente do quadro que encerra a sua fotografia.
De futuro, qualquer pessoa estranha que visite as instalações do Centro
Recreativo, aquele novo retrato chamará logo à atenção dos visitantes que
perguntarão: - De quem é aquele retrato? A resposta não se fará demorar e será
cabal e completa: É de Sua Excelência o Sr. Aníbal Soares Abrantes grande
benemérito da nossa terra e amigo ingente deste Centro Recreativo.
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Na sua visita que em 1944 fez a Macieira de Cambra, deixou bem vincado
neste Centro Recreativo, em caracteres de outro inapagáveis, a forma que há-de
imperar no futuro e através das novas gerações, porque o seu coração bem formado
encerra o talismã de nobilíssimas virtudes, das quais se destacam o altruísmo, a
filantropia, a caridade e amor do próximo, aliadas ao seu a cendrado amor pátrio.
É finalmente o coração generoso e uma alma de eleição. O sorriso que lhe
aflora aos lábios e a expressão simpática do seu rosto são a pedra de toque por
onde se afere a nobreza aos seus sentimentos humanitários de todos bem
conhecidos. São estas as minhas sinceras homenagens rendidas a Sua Excelência.
Manuel Anacleto! Quem o conhece? É um filho adoptivo de Macieira de
Cambra onde há muitos anos veio fixar residência e considera esta terra como sua,
porque cá tem passado uma boa parte da sua vida, a trabalhar com inteligência e
aprumo. Veio para Macieira de Cambra, há mais de 40 anos, como motorista do Sr.
Comendador Luiz Bernardo de Almeida. Habituou-se a amar Macieira como sua
terra natal e sempre tem dado excelentes provas de bom filho.
Depois que aqui constituiu família foi concessionário de várias carreiras de
viação entre Macieira de Cambra e Porto e Oliveira de Azeméis e Arouca.
Foi durante a constância da carreira de Macieira de Cambra ao Porto que
conquistou com muita justiça o seu diploma de benemérito. Macieira de Cambra
nunca poderá olvidar os bons serviços que lhe prestou o Sr. Manuel Anacleto a
favor da sua Banda, durante uma boa dezena de anos, pois que gratuitamente fez
transitar nas suas camionetas o regente da Banda de Macieira ao Porto e vice-
versa, duas vezes por semana.
Esses transportes, durante tantos anos, deviam ter custado alguns milhares
de escudos, mas o Sr. Manuel Anacleto, nunca cobrou um centavo pelo seu
trabalho, apesar de não ser rico. A sua generosidade é hoje premiada com estas
homenagens que lhe estão sendo rendidas neste Centro Recreativo.
Todos reconhecem, que o Sr. Manuel Anacleto é um verdadeiro amigo de
Macieira de Cambra, que também está ligado por laços e pelos bons e apreciáveis
serviços que gratuitamente tem prestado a esta terra mereceu enfileirar na galeria
dos nossos beneméritos.
Está portanto, no lugar que honrosamente conquistou pelo seu trabalho e bairrismo,
está no lugar que justamente lhe compete. O Sr. Manuel Anacleto é também um
verdadeiro amigo deste Centro recreativo e seu sócio benemérito, novo foro que
conquistou com a sua inscrição mensal que a isso lhe dá juz.
42
As homenagens que aqui hoje lhe são rendidas, são bem merecidas, e mais
do que isso, são justas. A César o que é de César. Eis aqui, posto que mal
alinhavados, os motivos das homenagens que hoje rendemos aos beneméritos e
amigos de Macieira de Cambra”.13
Foto 13 - cartão de sócio
O contributo do Comendador António Almeida Pinho (a Casa de Saúde e a Central Hidroeléctrica)
Sob o patrocínio do seu primo A. Pinho, o Comendador ergueu um edifício,
na Cruz de S. Domingos, destinado a hospital.
No ano de 1928, A. Pinho vem a Portugal com o propósito de inaugurar o
mesmo. Apesar de o edifício ter sido visitado por um membro do Governo, na
verdade, por razões políticas nunca chegou a funcionar como tal.
13 - Ferreira, António Martins:” Vale de Cambra e as suas belezas naturais”;
43
Foto 14 - Casa de Saúde em dia de visita de um representante governamental
Funcionou como seminário e posteriormente como casa de saúde de apoio
aos tuberculosos.
Luiz Bernardo instalou em edifício seu a Farmácia Progresso, passando a
fornecer, durante largos anos e gratuitamente, medicamentos aos pobres mais
necessitados da freguesia, poupando-os a doenças graves que não teriam
possibilidades de enfrentar por falta de recursos.
Foto 15 – Casa de Saúde/Sanatório Almeida Pinho
Para além da despesa da construção do Hospital, A. Pinho investiu na
Central hidroeléctrica, fornecendo gratuitamente a luz eléctrica para diversos
equipamentos habitacionais e outros.
44
“A grandiosa obra da captação da água e sua Central Eléctrica em Santa
Cruz, que pode fornecer de luz e energia todo o concelho, é a mais importante da
Região!
Só por isto, quanto lhe não deve já o povo de Cambra, principalmente Vale de
Cambra!
Felicitando o Ex.mo Sr. Comendador António d’Almeida Pinho, por esse seu
empreendimento de progresso para o seu concelho, aproveitamos o ensejo para
felicitar também o Ex.mo Sr. Luiz Moreira de Sousa pela maneira hábil e persistente
como acompanhou todos os trabalhos d’esse inapreciável melhoramento”.14
António Almeida Pinho faleceu a 30 de Janeiro de 1942.
Foto 16 - Central hidroeléctrica (pormeno r no interior)
Outros pormenores da obra do Comendador
Durante alguns anos estabeleceu mensalidades, em dinheiro, para muitos
pobres da freguesia, minorando a esta classe de desprotegidos da sorte, de
situações angustiosas.
Mandou construir dezenas de edifícios, habitacionais, por todo o concelho, de
que resultou o embelezamento da terra, contribuindo para minorar, o desemprego
de muitos trabalhadores quando a crise de trabalho se colocava com certa
14 - O Jornal de Cambra de Novembro de 1931;
45
acuidade. E com isso lucrou também o comércio que vendia materiais de
construção, ferragens e drogas.
Fez o primitivo abastecimento de água à sede do concelho (não ao domicílio)
mas através de um fontanário que mandou instalar na “feira do gado”, mais tarde
conhecida por “feira de fruta” e hoje conhecido pelo jardim da “feira dos ovos”.
De igual modo, mandou construir um fontanário em Macieira de Cambra, o
qual, embora actualmente não sirva para satisfazer as necessidades do povo, por
falta de água, não deixou de atender durante largos anos às mais imperiosas
necessidades dos seus habitantes.
Procurou em tempos, com a criação de uma escola nocturna para menores e
adultos, no lugar de Macieira-a-Velha, atenuar o elevado grau de analfabetismo que
entre nós existia. E, para melhor analisar a que ponto chegavam as seus dotes de
benemerência, mandou tirar, pela admiração que lhe mereciam as belezas da sua
terra, alguns milhares de postais ilustrados que distribuiu gratuitamente pelos
estabelecimentos para serem vendidos a um centavo, revertendo a produto a favor
das indigentes.
Para completar a sua gigantesca obra, legou por disposição testamentária a
sua fortuna de milhares de contos para a Fundação «Asilo Luiz Bernardo de
Almeida», actualmente, Fundação Luiz Bernardo de Almeida, vocacionada a apoiar
as pessoas “inválidas e desvalidas de ambos os sexos”, conforme consta do seu
testamento.
Sobre esta Instituição, falarei mais à frente.
Entretanto, julgo importante, pronunciar-me sobre outros aspectos que
marcaram a vida do Comendador, nomeadamente a mudança da sede do concelho,
a morte de sua esposa Ana Horvath, o casamento com D. Marinha e dizer algo
sobre as pessoas que, depois da sua morte, não fizeram juz à sua memória, da
sua vida privada e da sua formação maçónica.
A mudança da sede do concelho, o plebiscito e a inf luência do Comendador
Após algumas anexações ao concelho de Oliveira de Azeméis, em 13 de
Janeiro de 1898 foi restaurado o concelho de Macieira de Cambra, integrando as
actuais nove freguesias do concelho de Vale de Cambra.
O Decreto 12976 de 31 de Dezembro, publicado no ano de 1926, no Diário
do Governo n.º 4, veio extinguir o concelho de Macieira de Cambra e criar o novo
46
concelho de Vale de Cambra, abrangendo a mesma área e freguesias, com sede na
povoação da Gandra, freguesia de Vila Chã. O lugar da Gandra passou a
denominar-se de Vale de Cambra.
No entanto, esta mudança não foi pacífica, pelo contrário. Houve contestação
e revolta. Os “republicanos” de Macieira de Cambra aliados ao Comendador,
intensificam a sua luta e junto da população das freguesias de Cepelos, Junqueira e
Arões procuram reunir apoios para restabelecer a sede do concelho.
O hospital está quase concluído e a estrada n.º 32 dá os primeiros passos.
Foto 17 - Luiz B. Almeida com a pop ulação de Junqueira
As estruturas políticas do Estado Novo estremecem e, na tentativa de
minimizarem o movimento de contestação, nomeiam Luiz Bernardo de Almeida
Presidente da Comissão Administrativa.
A sua passagem é efémera. Dura três curtos meses.
No entanto, a 11 de Dezembro de 1927 houve lugar a um plebiscito (veja-se o
Decreto n.º14173 de 11 de Agosto desse mesmo ano.
Intensifica-se a luta e pela freguesia é distribuído um comunicado de incentivo
à participação plebiscitária:
“Ao Povo do Antigo concelho de Macieira de Cambra,
Bem haja o Sr. Ministro do interior que, cerrando os ouvidos a insinuações
suspeitas e malévolas, permitiu, finalmente, que seja, como devia ser, o povo quem
decide a questão sobre o nome e sede do concelho, que o egoísmo desvairado e a
ambição desregrada e a atropeladora de uma pequena minoria em má hora
levantaram e atearam.
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Cumpre agora ao povo corresponder devidamente a tão liberal e justa medida
e para logo basta que serena e austeramente, fato é, absolutamente dentro da
ordem e da lei, exerça o alto e sagrado direito que foi outorgado.
A confusão e o distúrbio só podem aproveitar aos que não tem por si a razão
e o direito. Não é esse o vosso osso e, por isso, só deveis querer que o vosso
triunfo se patenteeis a toda a evidência para insofismavelmente se impor.
Vale de Cambra não queria o plebiscito. Porque, se tem a maioria que
apragoa?!...
Pretendia também que fosse cerceado o direito de voto aos analfabetos…
Plebiscito sem plebe?!... Ridícula e revoltante pretenção!! Quem mais do que o
vosso trabalhador rural que nunca teve tempo para ir á escola, mas que, como
ninguém, tem contribuído para o progresso da vossa terra, cavando-a, revolvendo-a,
melhorando-a, aformosando-a, engrandecendo-a, num trabalho exaustivo, de solo a
solo, pode ter o direito de se manifestar sobre um assunto que tão directa e
afectivamente o interessa?!...
Valem, por ventura, mais os letrados que nunca produziram qualquer trabalho
útil, passando a vida na ociosidade o que herdaram de pais ou parentes?!...
E quantos analfabetos não sobrepujam, em bom senso, em lucidez de
inteligência, em espírito de justiça, muitos bacharéis que voltam das escolas quase
tão broncos e ignorantes como para lá foram!
Diz Gandra (hoje Vale de Cambra) que é o lugar mais populoso do concelho.
Perfeitamente: apesar da tão restrita a sua ares, nenhum outro tem igual número de
casas e habitantes. Mas isso que vantagem representa, faltando-lhe as condições
de higiene pública exigidas nos aglomerados urbanos?
Diz também que é o lugar mais comercial. Não contestamos. Bastam-lhe para
isso as feiras que lá se realizam e que todo o concelho ajudou a criar e tem ajudado
a manter.
E diz ainda que é o lugar mais industrial. Sem dúvida, pois ainda há bem
pouco tempo a imprensa o exaltou como um grande centro de … falsificação de
manteiga.
E que tem que seja o mais comercial e industrial? A grande fonte de riqueza
do concelho é a agricultura, ou é o comércio e a indústria?
A grande maioria, e quase totalidade, da população e constituída por
lavradores ou por comerciantes e industriais?
Basta de ficções!
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Povo de Cambra! Está bem claro o caminho que tens a seguir.
Em Macieira estão os antigos paços do concelho, em que sempre visto
perfeitamente instaladas todas as repartições e a cadeia pública. Com eles
nenhuma despesa há a fazer, pois a própria reparação de que necessitam será
efectuada sem dispêndio para o município. Em Macieira nasceram e vivem os dois
grandes beneméritos do concelho, a que se devem já um magnífico edifício da
escola dos dois sexos e o grandioso hospital, que para ser inaugurado aguarda
apenas a restauração do concelho e do qual tantos e tão prestimosos serviços de
assistência e caridade há a esperar, e a quem, em breve, além de outros
melhoramentos, se deverá ainda o início dos trabalhos de conclusão da estrada 45,
que se pretende prossigam com toda a actividade a fim de poderem ficar
completamente concluídos até ao fim do ano económico de 1929-1930.
Quanto á estrada 42 vão utilizar a todo o concelho e principalmente ás
freguesias da serra – Cepelos, Junqueira e Arões – toda a gente o sabe e, melhor
do que ninguém, os povos daquelas freguesias, até hoje votadas ao mais completo
abandono. Pois não há ainda dentro dos seus vastos limites um único quilómetro de
estrada, mas só maus e intransitáveis caminhos.
Em Gandra está a câmara pagando aluguer duns prédios impróprios em que
foram mal e á pressa instaladas as repartições e não há quem levante á sua custa o
edifício municipal, que seria necessária para lá se poder conservar a sede, mais
excêntrica que a antiga.
Teria de ser o povo sacrificado com novas e pesadas contribuições para a
construção dos paços do concelho e Gandra depois diria ainda que eram só – dele,
como diz agora do mercado, apesar de construído em terreno e com dinheiro
exclusivamente do município.
Durante muitos anos esgotar se iam na construção do novo edifício todas as
receitas indefinidamente preterido ficaria, pois, qualquer melhoramento que fosse
necessário em outro lugar, como o conserto dum caminho, a construção de um
aqueduto ou pontão, etc.
Não falta em que aplicar mais utilmente o dinheiro e de modo a aproveitar a
todos os povos e não a um só.
E para que pagar alugueis de prédios particulares tendo o município um tão
bom edifício seu?
Povo de Cambra! O concelho não pode mais suportar a situação
anormalíssima em que se encontra.
49
Inclusivamente os lugares de administrador e membros da comissão
municipal continuam a ser desempenhados por pessoas nomeadas pelo último ex –
governador civil, principal promotor de mudanças do concelho, que para conseguir
os seus fins não hesitou em substituir todas as autoridades, que estavam em
exercício e tinham sido nomeadas já depois do 28 de Maio, por gente de Vale de
Cambra, exclusivamente, e seus adeptos.
O actual governador civil já podia ter modificado este cenário. Se o tivesse
feito, alguma razão ou pecado – razão teriam, pelo menos, os seus detractores para
o acusarem, como acusam, de parcialidade a favor de Macieira de Cambra. Mas
tudo são subterfúgios, intrigas, falsidades…
Povo de Cambra! O teu interesse está em que se volte à tradição, ao direito,
à boa razão.
Por isso vão no dia 11 de Dezembro próximo votar a tua vota por Macieira de
Cambra.
Tanto tem voto o capitalista, o proprietário, o comerciante, como o lavrador, o
pedreiro, o carpinteiro, o ferreiro, o artista de qualquer classe. Para ricos e pobres o
direito é igual.
Vão e volta a casa, pacifica ordeiramente, para que o teu triunfo sendo
numericamente grande, seja moralmente muito maior.
VIVA MACIEIRA DE CAMBRA!
UM VOSSO AMIGO.
(Visado pela comissão de censura).15
Relatos da época dão-nos conta de que o resultado teve o despacho
seguinte: “SINE DIE”.
Com grande mágoa dos “Macicambrenses” as consequências foram visíveis,
deixando marcas profundas que o tempo nunca apagou.
Ainda hoje, Macieira de Cambra orgulha-se do seu passado e reivindica para
si uma situação que nunca mais teve o regresso desejado!
O concelho continuou com a sua sede em Vale de Cambra!
O Comendador vai perdendo, progressivamente a influência que após a
morte de D. Ana Horvath, se acentua, sem nunca perder a vontade em engrandecer
a sua terra natal, terminando a obra em curso.
15 - extraído de documento do meu arquivo pessoal;
50
É já nos finais da década de 30 que se volta a falar do Comendador quando
se inicia a construção do Centro Recreativo, Musical e Literário.
A morte de D. Ana Horvath
Apesar dos esforços junto da embaixada de Portugal no Rio de Janeiro no
Brasil, não consegui descobrir a data de casamento com o Comendador Luiz
Bernardo.
A esse propósito, tudo o que sabemos resulta da certidão de óbito e da
certidão do casamento, em segundas núpcias, de Luiz Bernardo com Marinha da
Silva Santos.
Ana Horvath faleceu a 13 de Fevereiro de 1932.
Testemunho da época dá-nos conta da enorme tristeza que se apoderou de
toda a população.
D. Ana Horvath era conhecida por “A Mãe dos Pobres”. O Jornal de Cambra
relata-nos o trágico acontecimento.
51
Foto 18 - O Jornal de Cambra de Fevereiro de 1932
Na morte de D. Ana interpretando o sentir de todo este formosíssimo e
grande concelho, que nós vimos, largamente representado por todas as suas
classes, desde o mais distinto ao mais humilde Cambrense, desde os lugares lindos
do incomparavelmente lindo Vale de Cambra até aos confins do Município, em
serras altivas, onde a neve cerca as pobres casas nessa homenagem fúnebre do
dia 15 do corrente e que, pela sua originalidade, atestando a grandeza d’alma e
d’um povo grato para com os favores de Caridade d’essa existência peregrina, que
se finou, ficará a recordar para sempre, em todos os corações, “O Jornal de
Cambra” veste-se de luto pela morte da Ex.ma Sr.ª D. Ana Horvath de Almeida,
Esposa amantíssima do benemérito Cambrense Ex.mos Sr. Comendador Luiz
Bernardo de Almeida.
Tarde já para o ultimo n.º nós recebemos a tristíssima nova, que nos causou
comoção profunda.
Sabíamos a ilustre extinta melhorada da grave doença que há meses a
prostrara no leito da dor.
E agora, quando a julgávamos livre de perigo, a morte no-la arrebatou!
É verdadeiramente um sonho esta vida, de ilusões feita!
52
A morte da Ex.ma Sr.ª D. Ana Horvath d’Almeida enlutou e entristeceu todo
este Concelho.
Senhora de claras virtudes, em que se distinguia a da Caridade, espalhava
esmolas a mãos ergas pela pobreza deste Concelho e de toda a parte onde ela
soubesse que havia uma necessidade de prestar o seu auxílio.
D’esta é que se pode dizer com toda a verdade: “Passou a vida na prática do
bem”.
O que todo o povo deste concelho compreendeu, acorrendo em massa a
prestar a sua homenagem de saudade e gratidão, na manhã do dia 15 do corrente,
à “santinha” de Macieira-a-Velha.
Indescritível o que presenciamos de luto e sentir n’essa manifestação, à qual
os pobrezinhos deram a sua nota de reconhecimento.
Á beira das estradas por onde passou o grande acompanhamento, imponente
de solenidade, pelo numero e organização.
Numa extensão de um quilómetro, os pobres acumulavam-se, derramando
lágrimas e soltando gritos de dor que mudavam os mais duros corações.
A uma mulher ouvimos nós dizer:
“Lá se vai a que era para mim melhor do que a minha própria mãe!”.
“Que há de ser agora de nós, se morreu a mãe dos pobrezinhos?” –
exclamava outra.
Á subida de Macieira de Cambra, uma pobre mulher, tendo junto de si uma
criancinha, que brincava, derramando lágrimas de comoção n’um soluçar contínuo:
“Que há de ser agora de mim e do meu menino, se nos morreu a nossa mãe?”.
E assim, essa senhora de bondade e de virtudes sem senão, desceu ao
túmulo coberta de flores de gratidão, de bênçãos de aqueles que, em nome de
Deus, ela tanto beneficiou, e da admiração e da saudade d’um povo inteiro.
Verdadeiramente, a EXCELLENTISSIMA SENHORA DONA ANA HORVATH
DE ALMEIDA conquistou o Reino da Glória!
Resignem-se os que ela teve de deixar na terra, para ir receber o prémio da
sua vida de bem-fazer, de virtudes e de exemplos de bondade!
D. ANA HORVATH DE ALMEIDA
Está de luto Macieira de Cambra! Esta linda terra hospitaleira, a quem a
Natureza prodigalizou tantos encantos e tantas maravilhas e que se ufana de abrigar
em seu seio individualidades de superior relevo, que, pelos seus gestos de
53
admirável altruísmo, a dignificam e enaltecem, acaba de perder uma das suas
maiores relíquias, uma querida filha adoptiva, que, durante vinte anos, tanto a
engrandeceu pelas inúmeras acções de filantropia que praticou.
Morreu D. Ana Horvath d’Almeida, esposa dedicada do Sr. Comendador Luiz
Bernardo de Almeida!
Às 21 horas do dia 13, quando a frígida atmosfera começava a entornar sobre
o solo Cambrense pequeninos flocos de neve e a terra tomava o aspecto duma
enorme e alvíssima toalha de jaspe, ouvem-se soar estas sinistras palavras: “Morreu
a Senhora D. Aninhas”.
Esta lúgubre e inesperada notícia causou assombro, consternou até ao cimo,
a todos petrificou e emudeceu. Cruzaram-se os olhares, todos se interrogam
mudamente, mas ninguém responde, ninguém se atreve a interromper o sentimental
silêncio, que por momentos dominou todos os espíritos e enegreceu tantos
corações. Mas desperta-se, enfim, deste letargo, e a gélida notícia corre célere por
toda a vila e logo pela freguesia inteira.
Não há lenitivos possíveis para tão pungentes dores; e o povo, compungido,
fortemente impressionado e comovido com a fatal nova, ergue os olhos ao céu,
como que a suplicar a protecção divina para tão irreparável perda.
Morreu a D. Aninhas! Tombou para sempre um dos entes mais queridos e
prestimosos pelo amor aos seus semelhantes e que Macieira de Cambra idolatrava!
Há pouco mais de vinte anos, que a saudosa extinta veio fixar residência
nesta vila; e desde então tomada pela sua grande caridade, nunca deixou de a
exercer na mais ampla escala, sem a menor sombra de vaidade, antes envolta
prudentemente no seu denso manto de modéstia, dava com a mão direita, sem que
a esquerda suspeitasse. Detentora do talismã de todas as virtudes, das suas mãos
benéficas saía a jorros o bálsamo para as feridas, o lenitivo para as grandes dores
morais, o agasalho para a nudez e o conforto espiritual para os desprotegidos.
Socorria os infelizes, que imploravam o seu auxílio, com a certeza antecipada
de serem atendidos.
Saciava os famintos, protegia os fracos e cobria com o seu manto da mais
excelsa virtude, a pobreza envergonhada. E neste último gesto estava talvez o seu
maior título de glória! E senão que o digam, se quiserem, aqueles a quem ele
aproveitou. Assim se exaltava (ilegível)... À consideração geral não só dos
Cambrenses, como ainda dos estranhos. Tinha protegidos especiais, os
envergonhados, tinha os seus pensionistas e pupilos, a quem a prazos certos
54
socorria com vestuário, viveres e numerário. Mas tudo se foi, tudo finalizou e para
sempre! Por isso o povo verteu lágrima sobre o seu ataúde e lamenta com
recolhimento a sua perda irreparável. Mas é ainda cedo para revelar com segurança
todas as virtudes da malograda extinta. É necessário deixar de correr algumas
semanas, ou, quem sabe? Talvez alguns dias apenas, sobre a sua morte, para que
muitas das suas exuberantes virtudes, muitos dos seus gestos sejam conhecidos.
Não será necessário pesquisa-los, eles se revelarão espontaneamente.
E lá partiu para a mansão dos justos, contando apenas 65 anos de idade.
Devia viver mais, era necessária a sua presença na terra, para continuar por
inúmeros anos o exercício da sublime virtude – a caridade.
O seu funeral, que ontem, 15, se realizou e que revestiu desusada
imponência, foi uma eloquente demonstração espontânea dos sentimentos de
gratidão de um povo. Mais de 2500 pessoas se incorporaram ao triste préstito e se
curvaram reverentes sobre a riquíssima urna que encerra o cadáver da malograda
senhora.
Por todas as ruas, por onde passou o fúnebre cortejo, o povo se aglomerava
e então se observavam cenas tocantes, cenas verdadeiramente lancinantes. Os
choros, os lamentos e os ais a todos sensibilizavam. No acompanhamento viam-se
várias irmandades, como noutro lugar se dirá, três sociedades musicais, as de
Macieira de Cambra, Junqueira e Vale de Cambra, esta com o seu estandarte,
crianças das escolas de Macieira e Vale de Cambra e respectivos professores,
autoridades, etc. Foram-lhe oferecidas muitas e valiosas coroas, algumas com
sentimentais dedicatórias.
As criancinhas das escolas de Macieira também ofereceram uma linda coroa,
que foi conduzida pela aluna Alzira Ferreira. De todos os pontos do país vieram
pessoas de destaque tomar parte nos sumptuosos funerais e outras fizeram-se
representar. A família Amaral Coutinho, de Espinho, na impossibilidade de poder
assistir, fez-se representar por quem escreve estas linhas.
Que descanse eternamente em paz, a que em vida tanto bem derramou. Ao
Ex.mos Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida, esposo idolatrado da saudosa
finada, o nosso pêsame.
B.F.
Á QUERIDA D. ANA HORVATH DE ALMEIDA
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Com a minha pouca inteligência, e não menos conhecimento, traço estas
singelas e humildes linhas, em nome dos pobrezinhos de quem vós foste desvelada
protectora!!
Alma benfazeja, pronta sempre a minorar-lhes todos os seus males com o
bálsamo suave do vosso santo e bondoso coração!
Era comovente e desolador aquele último adeus!...
Esse adeus, daqueles a quem vós tantas vezes (ilegível) … fazendo brotar o
sorriso em seus lares, enegrecidos pela fome! O coração mais duro, não era capaz
de resistir sem lágrimas; mas não são só esses desventurados, que pranteiam a
vossa falta, são muitos a quem vós auxiliaste nos revezes da vida, e consolaste com
essa candura e meiguice, desse angélico rosto, e até os próprios desconhecidos,
aqueles que nunca vos conheceram nem sequer viram, e não falaram convosco,
lastimam a vossa falta!
Em toda essa grande massa de indivíduos que os acompanharam à última
jazida, em todos os olhos se viam lágrimas!
Eu, que não tive o prazer de vos conhecer, apenas por nome vos conhecia,
choro a vossa morte, e acompanho vosso amantíssimo esposo Ex.mo Comendador
Luiz Bernardo de Almeida, na sua grande dor. Pedirei a Deus, nas minhas pequenas
e rudes orações para que vossa alma descanse em paz, aos pés de Jesus e Maria.
Bem-aventurada sejas tu no céu como querida foste na terra!
- Teu nome santo e querido,
Ninguém o pode olvidar.
Voaste à mansão dos anjos,
Deus te quis aí colocar.
Relva (Vila Chã, 17-2-932)
M. ALBERGARIA
NA MORTE D’UMA SANTA – HOMENAGEM DE SAUDADE
A Mãe dos pobres
Faleceu, Quinta “Progresso”, de Macieira de Cambra, a Ex.ma Sr.ª Dona Ana
Horvath de Almeida, Esposa do Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida e
nora da Ex.ma Sr.ª Dona Josefa de Almeida, no dia 13 do mês corrente,
sobrevivendo poucas horas a um ataque, que lhe tolheu logo todos os sentidos.
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A saudosíssima senhora muita falta faz n’este mundo de misérias e de
egoísmos.
Foi um desastre para os pobres deste concelho, o seu desaparecimento!
Era uma santa que se alou ao Céu!
A ilustre extinta não atendia só aos pobres da terra, mas aos de fora, e a toda
a gente!
Socorria centenas de famílias pobres, com sustento e roupas.
Todos os dias tinha correspondência da pobreza, a pedir roupas, dinheiro e
comida; e a muitas casas todos os dias ela mandava os seus criados levar
subsistências.
Era um verdadeiro anjo da Caridade.
O seu funeral, realizado no dia 15, pelas 11 horas, teve uma extraordinária
assistência de todas as classes, em número superior a 2000 pessoas.
Incorporaram-se no imponente préstito as bandas de música de Macieira de
Cambra, Vale de Cambra e Junqueira, as Irmandades da Senhora do Desterro, de
Função, de Santa Ana, de Sandiães e de Rôge; viam-se centenas de pessoas de
fora do concelho, tais como de Oliveira de Azeméis e Porto, vindo de Estarreja,
representar os seus jornais, o nosso amigo Carlos Alberto da Costa.
Foi uma manifestação de pesar que jamais nos esquecerá, pois nunca n’este
concelho houve igual.
Sinto muito desgosto do Ex.mo Comendador, mas temos que nos resignar
ante estas eventualidades do Destino!
Os nossos sentidos pêsames a toda a Ex.ma Família enlutada.
Outeiro de Rei, 16-2-1932
ALBERTO TAVARES
D. ANNA HORVATH DE ALMEIDA
Foi sepultada no dia 15 a Sr.ª D. Ana Horvath de Almeida, carinhosa do Sr.
Comendador Luiz Bernardo de Almeida. A extinta era aqui o verdadeiro anjo da
caridade, e o seu belo solar de Macieira-a-Velha tinha sempre as portas abertas
para os necessitados. Os pobres eram sempre socorridos e muitos necessitados,
em ocasiões mais ou menos dolorosas, também encontravam a mão carinhosa que
ardentemente os amparava.
O seu funeral (ilegível) …extraordinária figurando nele tudo quanto a
população do concelho tem de selecto e distinto. Os pobres, sentindo a perda do
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ente querido, soltaram altos lamentos, e grande número de pessoas estranhas ao
município também figuravam no imponente cortejo.
A finada merecia todas estas homenagens. Da nossa parte, pedimos a Deus
que a receba na eterna mansão dos justos. Ao seu carinhoso esposo, o Ex.mo Sr.
Comendador Luiz Bernardo de Almeida apresentamos as nossas mais sinceras
condolências.
A…
GAZETILHA
O Anjo da Caridade
(Á memória de D. Ana de Almeida)
O dona in cui la mia esperanza vige (DANTE PARADISO)
Morreste, boa, partiste
D’esta mansão passageira,
Findaste, em fim, a carreira
De protectora função;
Eras amparo dos pobres,
Amiga das criancinhas,
Que estendiam as mãozinhas
A pedir vestido e pão.
A tua casa risonha,
Cheia d’encanto e beleza.
Era o tecto, onde a pobreza
Sempre encontrava um favor,
Mendigos e deserdados,
Cansados ou indigentes
De lá sabiam contentes,
Levando qualquer penhora!
Quantas famílias famintas,
Sem pão, sem lar, sem abrigo,
Não iam lá ter contigo
A mendigar um ceitil!
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A tua mão carinhosa,
Sempre aberta ao deserdado,
Dava logo de bom grado
Benefícios mais de mil!
Agora, morta, sem vida,
Circula sombra e tristeza,
E a orfandade na pobreza
Verte lágrimas sem par!
Mordente, zune o nordeste
Por sobre a cabeça humana;
Porém, a triste choupana
Para quem há de apelar?
Coração doce, plangente,
Que se escuta em toda a parte
Vai pedindo a Deus sem arte
Por teu repouso final;
Quem recebeu tantas graças
De tua mão bem feitora,
Ficou também devedora
D’uma prece divinal.
A tua alma eleita e bela,
Perante Deus recebida,
Goza os prémios que na vida
Espalhaste a aberta mão;
Agora na vida eterna,
D’essa eterna moradia,
Pede em cantos d’harmonia
Que Deus nos dê salvação!
AYRES
Uma proposta digna da Junta de freguesia de Castelõ es
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Na sessão no dia 13 realizada da comissão administrativa da Junta da
freguesia de Castelões, o seu presidente, o cidadão Tomás António da Costa
Coutinho apresentou a seguinte proposta que foi aprovada por unanimidade:
Tendo falecido hoje a Ex.ma Sr.ª D. Ana Horvath de Almeida, virtuosa e
caritativa Esposa do grande benemérito o ilustre Comendador Sr. Luiz Bernardo
d’Almeida, sendo a sua falta irreparável pelo bem que tem prestado aos indigentes e
inválidos d’esta freguesia, a quem sempre tem socorrido, sem ostentação nem
vaidade; proponho para que seja exarado na acta um voto de sentimento pelo
falecimento de tão caritativa e esmoler senhora, comunicando-se à família esta
resolução, e assistindo aos funerais, o vogal desta Junta, cidadão José Maria
Barbosa Abrantes, aprovando-se a acta, para execução imediata.
O Funeral de Ex.ma Senhora D. Ana Horvath de Almeid a
Impossível é nos dar um resumo sequer do que foi o funeral da Ex.ma Sr.ª D.
Ana Horvath de Almeida, que falecera no dia 13 do corrente, às 21 horas,
confortada com os sacramentos da Igreja.
Na “câmara ardente”, onde a “santinha de Macieira-a-Velha”, parecia dormir,
coberta de flores e beijos, sé se respirava tristeza e dor.
O funeral realizou – se no dia 15 às 10 horas, tomando parte no préstito mais
de 2.000 pessoas d’entre os quase bem quiséramos mencionar as de mais
representação; mas não nos foi possível consegui-lo, e para evitar lapsos limitamo-
nos a dar os nomes que ao Jornal, foram fornecidos.
O cadáver encerrado n’uma rica urna, foi conduzido aos ombros de criados
da casa até ao portão de entrada da Quinta Progresso, onde o coche, puxado a
duas parelhas e com todo o aparato dos grandes actos fúnebres, o esperava.
Organizado o cortejo, com as importantes irmandades da freguesia de Rôge à
frente, seguiu estrada de Macieira-a-Velha por Ramilos até à Matriz.
Era deveras majestoso esse cortejo em toda a sua extensão!
Pelo caminho, cenas de lágrimas; e todos os rostos tinham semblante de
tristeza.
Levou a chave do ataúde o Sr.. Francisco Tavares de Pinho e a toalha o
remo. Sr. Padre Bernardo Tavares de Pinho, primos da extinta.
Para as borlas organizaram-se os seguintes turnos:
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1.º - Luiz de Sousa Moreira, Manuel de Almeida Pinho, Hermenegildo Correia de Sá,
Ernesto Tavares de Almeida, Manuel Francisco da Silva e Dr. Luiz Correia de Sá;
2.º - Dr. Aníbal Pereira Peixoto Beleza, José Alves Neto, José Alves Sousa, Emiliano
Evangelista Pães Machado, David Adolfo e Norberto Teixeira Monteiro, 1º Tenente;
3.º - Dr. José Luciano Correia de Bastos Pina, Dr. António Crucho Dias, Dr. Abel
Gomes de Almeida, Dr. Luiz Hilário Barreiro Nunes, Manuel Barbosa, Capitão-
tenente, Manuel de Oliveira Campos;
4.º - António Correia Vaz de Aguiar, Basílio António Ferreira, Honório Tavares da
Costa, António Augusto Aguiar, Custodio dos Santos Emanuel Lourenço da Cunha,
Capitão-Chefe de Musica;
5.º - António Martins de Pinho, Manuel Tavares de Almeida, Mário António Ferreira
de Aguiar, Sebastião Fernandes de Almeida, Manuel Ferreira Gomes, Bernardo
Soares Coelho;
6.º - José Pinto, Manuel Soares, Manuel Martins de Pinho, Manuel António de
Almeida e Silva, António Miguel de Almeida e Manuel Fernandes Cubal;
7.º - Manuel Maria da Costa Negrais, Manuel de Almeida Vide, Manuel Soares
Pinheiro, Constantino Soares da Costa, Joaquim Teixeira Monteiro e António José
das Neves.
De varias representações:
Dr. Aníbal Pereira Peixoto Beleza, representando o Asilo da Infância Desvalida, de
Oliveira de Azeméis, e o “Correio de Azeméis”;
Armando de Oliveira Soares de Albergaria representando os jornais “Republica”,
“Diário de Noticias”, “Voz da Justiça” e o “Debate”;
Dr. António Crucho Dias, representando os jornais “Novidades”, “Comercio do Porto”
e “A Opinião”;
Dr. Artur Correia Barbosa, representando a Comissão de Melhoramentos do Parque
de La-Salette;
Joaquim Conde, Joaquim Leite de Pinho, Carlos Graça, António Maria Conde,
representando a Escola Livre de Oliveira de Azeméis;
Dr. Domingos Brandão, representando a Câmara Municipal de Vale de Cambra;
Empregados da Empresa “Progresso”.
Corporações:
Irmandade de Nossa Senhora do Desterro (Função);
Irmandade de Sandiães;
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Irmandade de Rôge;
Filarmónica de Macieira de Cambra;
Filarmónica de Vale de Cambra;
Filarmónica de Junqueira.
- Entre as dezenas de lindíssimas “grinaldas” e “gerbes”, podemos tomar nota das
seguintes dedicatórias:
“Eterna saudade de seu marido”;
“Sentidas lágrimas de sua sogra”;
“Muitas saudades de seus primos Maria e Filhos”;
“Saudade infinda de seus afilhados Beatriz e Ernesto”;
“Eterna recordação dos afilhados Rosalina e Luiz Moreira”;
“Infinda saudade de Manuel Francisco da Silva e Família”;
“À minha santa madrinha – João Luiz”;
“Saudades de seus primos Rodrigo, Luiz e José Correia de Sá”;
“A D. Ana H. de Almeida, sentida homenagem de Augusto Amaral”;
“Eterna saudade de sua afilhada Ana Horvath Neto”;
“À sua boa madrinha, saudade eterna do seu afilhado Bernardo António Teixeira da
Silva”;
“Eterna saudade de Monteiro e Filhos”;
“Última saudade à sua comadre Ana Horvath de Almeida, nunca esquecida pela
família Anacleto”;
“Profunda saudade de Adriano Martins”;
“Eterna saudade d’um seu muito amigo – José Grilo”;
“Último preito de homenagem de Maria Aleluia de Oliveira Campos”;
“Sentida homenagem de Armando Lopes e Esposa”;
“Último adeus de Maria J. Silva Bastos de Almeida e Sebastião Fernandes de
Almeida”;
“Último adeus de tua muito amiguinha Aurora dos Santos Pinho e marido, e um
saudoso beijo do nosso filhinho Manuel Honório”;
“Homenagem de Moreira da Silva & Filhos”;
“Última recordação de Mr. Mrs. Hubert W. Jennings”;
“Saudade eterna de José Ferreira da Silva”;
“Saudade de Teresa Maria de Jesus e Família”;
“Como preito de gratidão, Joana de Conceição Coelho Belfo”;
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“Como preito de gratidão – José Belfo”;
“Sentidas lágrimas de saudade dos pequeninos da sua Escola”;
“Homenagem de sentimento da Direcção Escola Livre de Oliveira de Azeméis”;
“Saudade e recordação da Filarmónica da Vila de Vale de Cambra”;
“Último adeus de suas criadas”;
“Eterna saudade dos empregados da garagem”;
“Eterna gratidão de seu criado Samuel”;
“Saudosa gratidão de sua recoveira Elisa e filhos”;
“Entre as deputações de todos os lugares e freguesias do concelho n’esse
preito de homenagem de respeito e de saudade pela Ex.ma Senhora D. Ana Horvath
d’Almeida, nós devemos frisar, por várias razões, a maneira como n’ele soube tomar
parte a gente de Vale de Cambra, fazendo-se representar em tudo o que essa vila
tem de melhor, em tudo o que representa a sua vitalidade.
- A missa do 7º dia, na vetusta Igreja de Macieira de Cambra, foi mais uma grande
manifestação de saudade pela sempre chorada senhora.
O templo estava repleto d’uma assistência selecta, com representação de
todo o concelho e de fora.
E aos pobres, que eram às centenas, muitas esmolas foram distribuídas”.
Da certidão de óbito de Ana Horvath16 consta o seguinte:
Às vinte e duas horas do dia treze do mês de Fevereiro do ano de mil
novecentos e trinta e dois, numa casa da Quinta Progresso de Macieira-a-Velha, da
freguesia de Macieira deste concelho, faleceu de Hemorragia cerebral um indivíduo
do sexo feminino de nome Dona Ana Horvath d’Almeida de sessenta e cinco anos
de idade, de profissão (proprietária) digo profissão doméstica, natural do Estado de
Hungria, domiciliada na mencionada Quinta Progresso, filha ilegítima de Tereza
Horvath, natural da Hungria, já falecida.
A falecida era casada com Luiz Bernardo d’Almeida de setenta e dois anos de
idade, natural e residente na referida freguesia de Macieira.
A falecida não deixou descendentes menores, deixou bens, não fez
testamento e o seu cadáver vai ser sepultado no cemitério de Macieira.
A declaração de óbito foi feita por José Soares Leite, casado, industrial,
morador nesta vila de Vale de Cambra.
16 - Registo n.º32 da Conservatória de Vale de Cambra;
63
Depois deste registo ser lido e conferido com o seu extracto vai ser assinado por
mim e pelo declarante.
Repartição do Registo Civil de concelho de Vale de Cambra aos catorze de
Fevereiro de mil novecentos e trinta e dois.
(Assinaturas)
José Soares Leite
A ajudante do Registo Civil
Suzana Neves de Pinho
Ora, a fazer fé no jornal O Povo de Cambra de 8 de Junho de 1913, existem
divergências quanto à idade de D. Ana Horvath. Quando faleceu ela teria 67 anos.
Completaria 68 no dia 3 de Junho próximo.
Refira-se que na certidão não consta o nome do pai.
Os casamentos de Marinha da Silva Santos e o seu “p rotegido” Francisco Lopes
Estava ainda o concelho enlutado com a morte da esposa do Comendador
Luiz Bernardo de Almeida, quando este casa com Marinha da Silva Santos, em
segundas núpcias.
Da certidão de casamento, lavrada na 2.ª Conservatória do Registo Civil do
Porto, sob o n.º 344, a folhas 344 do ano de 1932,consta que: Luiz Bernardo de
Almeida e Marinha Silva dos Santos casaram no dia 10 do mês de Dezembro do
ano de 1932, perante Américo da Silva Castro, Conservador do Registo Civil.
O noivo teria setenta e três anos de idade, era viúvo de Ana Horvath de
Almeida, falecida a 13 de Fevereiro de 1932, no concelho de Vale de Cambra.
Da certidão consta ainda que Luiz Bernardo era domiciliado na rua da
Travagem n.º344, freguesia de Ramalde do Porto (suponho que Luiz Bernardo deu
esta morada para esconder o seu casamento com a D. Marinha).
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Refere-se ainda que a sua mãe está viva
A noiva – Marinha Silva dos Santos, de quarenta e um anos de idade, de
profissão doméstica, no estado de solteira, nasceu a bordo do Vapor Ornoco em
viagem do Brasil para a Europa e foi baptizada na freguesia de Figueira, concelho
de Lamego e era residente na Praça da Corujeira n.º 350 da freguesia de
Campanhã, do Porto.
Era filha legítima de Francisco dos Santos Côco Júnior e de Josefa Cardoso,
naturais da dita freguesia de Figueira, já falecidos.
Casaram segundo o regime de separação de bens, nos termos e condições
da escritura lavrada nas notas do notário daquela cidade.
Foram testemunhas presentes a todo este acto, as quais consideraram querer
ser considerados padrinhos, Francisco Teixeira Monteiro, empregado bancário e sua
esposa Dona Maria Gertrudes Monteiro, dona de casa, residentes na rua da Paz, n.º
número 87-A,da cidade do Porto.
Foto 19 - Luiz Bernardo e D. Marinha Silva dos San tos (2ª esposa)
Depoimentos de pessoas que lidaram directamente com a D. Marinha e com
o próprio Comendador17, dizem-nos que este conheceu a segunda esposa no
cinema S. João no Porto pois possuía alguns dotes musicais e dedicava-se à
música interpretando alguns números, cantando e tocando viola, participando em
alguns espectáculos.
17 - António Bernardo de Almeida Moreira, afilhado de Luiz Bernardo, ainda vivo;
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Quando vem morar para a Quinta Progresso, trás consigo um rapaz de tenra
idade, oriundo de uma família pobre, muito humilde, de Lamego. Chamava-se
Francisco Lopes.
Foto 20 - Luiz Bernardo, D. Marinha, uma criança (F rancisco Lopes) e outros
Do registo de óbito18 consta que às sete horas do dia um de Dezembro
de1963, no lugar de Macieira-a-Velha, freguesia de Macieira, concelho de Vale de
Cambra, faleceu de cirrose do fígado um indivíduo do sexo masculino de nome
Francisco Lopes de 39 anos de idade, no estado de separado judicialmente natural
da freguesia de (ilegível), concelho de Guimarães e residente no lugar de Macieira-
a-Velha. Filho legítimo de José Matias Ferreira de Moura, casado, agricultor, natural
da freguesia de Santa Marinha concelho de Vila Nova de Gaia e de Emília Lopes no
estado de casada de profissão doméstica natural de freguesia de Serafão, concelho
de Fafe, residentes no largo treze de Fevereiro da cidade de Guimarães; com
registo de nascimento nº 2288 do ano de 1924, da conservatória de Guimarães. O
falecido, cujo cadáver vai ser sepultado no cemitério de Macieira, deixou herdeiros
sujeitos a jurisdição orfanológica, não deixou bens, não deixou testamento, e era
separado judicialmente de Antónia do Carmo Guedes, natural da freguesia de
Almacave, concelho de Lamego, com o assento de casamento lavrado nesta
conservatória, no ano de 1945.
Este assento, com base na declaração directa feita por Joaquim Tavares de
Pinho, casado, comerciante, residente no lugar e freguesia de Vila Chã, deste
concelho.
18 - Registo n.º 204, do ano de 1963, da Conservatória de Vale de Cambra;
66
Depois de lido em voz alta e conferido, vai ser assinado pelo declarante Artur
Almeida Barbosa, conservador do registo Civil.
Às dez horas e trinta minutos do dia dois de Dezembro de 1963 nesta
conservatória de Vale de Cambra.
Registado no “diário” sob o nº 5529 averbado sob o nº 2 ao assento de
casamento nº 34 do ano de 1945, boletins nºs 25 e 14, remetidos á conservatória de
Guimarães e Lamego.
Foto 21 – Certidão de Óbito de Francisco L opes.
Do passado da D. Marinha pouco se conhece. Pelo menos até à data do
casamento com o Comendador.
Segundo a mesma fonte, ela terá conhecido, ainda em solteira, Carlos
Figueiroa, mantendo com ele algum contacto, mesmo após o seu casamento com
Luiz Bernardo.
Depois do falecimento do Comendador, casa com Carlos Figueiroa no ano de
1950.
Consta da certidão de casamento com Carlos Figueiroa o seguinte:
Ás onze horas e quarenta e cinco minutos do dia 7 do mês de Setembro do ano
de 1950, na casa de residência da noiva na Quinta Progresso, onde vim
expressamente celebrar este acto perante mim, José Marques Mendes funcionário
do Registo Civil, compareceram: o noivo Carlos Teixeira Figueiroa de 54 anos de
67
idade, de profissão comerciante, no estado de viúvo de Eugénia Augusta Teixeira de
Figueiroa, natural da freguesia de Sé, falecida na freguesia de S. Nicolau, ambas da
cidade do Porto, em vinte e dois de Novembro, de 1949, natural da freguesia de
Paranhos-Porto, residente e domiciliado na rua Padre António Vieira, 102 1º direito,
da freguesia da Campanhã do Porto, filho legítimo de José Maria Galego de
Figueiroa, natural da freguesia de Santo Estêvão de Negros, concelho de
Redondela da Espanha e de Miquelina Rosa Teixeira, natural de freguesia de Borba
de Godim, concelho de Felgueiras ambos já falecidos e a noiva Marinha da Silva
Santos de Almeida de 59 anos de idade, de profissão proprietária no estado de
viúva de Luiz Bernardo de Almeida, natural da freguesia de Macieira, deste
concelho, onde faleceu em quatro de Junho de 1947, natural da freguesia da
Figueira, concelho de Lamego, residente e domiciliada nesta Quinta Progresso,
freguesia de Macieira filha legítima de Francisco dos Santos Côco, natural de
Figueira e de Josefa Cardoso natural da mesma freguesia, ambos já falecidos e
declararam, perante mim e as testemunhas adiante nomeadas, que de sua livre
vontade, desejavam celebrar, como por este acto celebram, o seu casamento
segundo regime de separação de bens, segundo escritura lavrada no dia 25 de
Agosto de 1950, nas notas do notário deste concelho, Dr. Álvaro Ferreira
Landureza, que fica junta ao processo. Os noivos são portadores dos bilhetes de
identidade nº 22671/H e 185902/A, passados respectivamente em 28 de Maio de
1947 e 30 de Setembro de 1941, pelo arquivo de identificação do Porto. Nos termos
do artigo 200 do código do registo civil se declara que as portas da casa onde se
realizou este acto estiveram abertas e franqueadas ao público. Tendo previamente
procedido em tudo conforme determina a lei, daí seguida cumprimento a todas as
formalidades do artigo 305 do código do Registo Civil, e, não havendo qualquer
impedimento, em nome da lei e da república portuguesa, declarei os contraentes
unidos pelo casamento.
Foram testemunhas presentes a todo este acto, as quais declaram querer ser
padrinhos Diogo de Brito Navarro, casado, comerciante, residente na rua do
Pinheiro Manso, nº 3 da cidade do Porto e D. Octávia de Brito Navarro, casada,
doméstica, residente na cidade do Porto, á rua António Cardoso, nº 452.
E para constar lavrei este registo definitivo que, depois de ser lido e conferido
com o seu extracto, perante todos, vai ser assinado por mim, pelas testemunhas,
pelos noivos e pelos presentes.
68
Entretanto, D. Marinha adquire a “Vila Áurea” e com a colaboração de Carlos
Figueirôa, instala uma pensão.
Este edifício, que foi do Comendador António Almeida Pinho e de D. Áurea de
Sousa Pinho, transforma-se no “Solar das Cerejeiras”.
Foto 22 - Solar das Cerejeiras
Carlos Figueirôa viveu com D. Marinha apenas 9 anos.
Do registo de óbito19 de Carlos Figueirôa consta que “às onze horas e trinta
minutos do dia quinze do mês de Março do ano de 1958 no lugar de Macieira-a-
Velha, da freguesia de Macieira deste concelho, faleceu de cancro de pulmão, um
indivíduo do sexo masculino de nome Carlos Teixeira Figueirôa de sessenta e dois
anos de idade, de profissão comerciante, natural da freguesia de Paranhos,
concelho do Porto, domiciliado no lugar de Macieira-a-Velha, filho legítimo de José
Maria Galego Figueirôa, natural de Santo Estêvão de Negros, concelho de
Redondela e de Miquelina Rosa Teixeira, natural de Borba de Godim, concelho de
Felgueiras já falecidos. O falecido era casado com Marinha Silva Santos de Almeida,
de sessenta e seis anos de idade, proprietária, natural da freguesia de Figueira de
Lamego, domiciliada no dito lugar. Foi declarante José Tavares no estado de
casado, de profissão comerciante, domiciliado no lugar da Varziela, freguesia de
Macieira”.
A D. Marinha viria a falecer a 9 de Setembro de 196820, deixando a sua
fortuna a uma filha de Francisco Lopes, não dando cumprimento à disposição
testamentária de Luiz Bernardo.
19 - Registo de óbito n.º 44, do ano de 1958, da Conservatória de Vale de Cambra; 20 - Registo de óbito n.º 145 da Conservatória de Vale de Cambra;
69
A ordem da Comenda e a formação maçónica
Mas afinal, quem foi Luiz Bernardo de Almeida?
De facto, Luiz Bernardo de Almeida era um homem cheio de virtudes.
De origem humilde, com princípios e valores maçónicos, teve alguma oposição
aos seus ideais de liberdade, igualdade, de fraternidade e democracia.
A sua perspectiva de desenvolvimento baseava-se na criação de infra-estruturas
básicas de educação, saúde e comunicação.
O comércio não foi esquecido e a sua beneficência não teve limites.
Teve forte oposição sobretudo a partir da implantação do Estado Novo.
Estávamos numa altura em que os ventos não sopravam a favor da população
de Macieira de Cambra que com a mudança da sede do concelho ficou
irremediavelmente esquecida, apesar dos movimentos de contestação que
entretanto surgiram.
Luiz Bernardo era açudado de liderar esse movimento.
Augusto Carlos Aguiar diz-nos que a indústria ganhou tal dimensão que Luiz
Bernardo de Almeida se vê na obrigação de viajar pelo mundo. Numa dessas
viagens à Áustria, conhece Ana Horvath de Almeida, com quem vem a casar em
primeiras núpcias.
O Comendador vai viajar sim, em prol da sua indústria, mas já consorciado com
D. Ana Horvath, a fazer fé na ligeira biografia traçada perante o homenageado na
inauguração da escola, em 1913, pelo Padre Bernardo Tavares de Pinho.
A sua indústria atinge nível mundial na sua área como atestam os galardões
obtidos nas exposições do Rio de Janeiro de 1901, medalha de prata e bronze, e de
1908, medalha de ouro, da Argentina de 1909, e de Viena de Áustria de 1910,
diplomas de mérito industrial.
Já antes do seu regresso definitivo a Portugal inicia um percurso filantrópico,
merecendo o diploma de sócio benfeitor de todas as sociedades de beneficência da
70
grande cidade do Rio de Janeiro, tais como Beneficência Portuguesa, Gabinete de
Leitura Portuguesa, Sociedade de 18 de Julho, Sociedade de D. Pedro V. 21.
Foto 23 –Ordem da Comenda atribuída a Luiz B. Almeida
A sua formação maçónica contribuiu decisivamente para a definição da sua
personalidade.
O que é a Maçonaria?
A Maçonaria é uma associação de carácter universal, cujos membros,
homens livres e de bons costumes, cultivam a justiça social, aclassismo,
humanidade, os princípios da liberdade, democracia e igualdade, aperfeiçoamento
intelectual e fraternidade.
Os Maçons estruturam-se em células autónomas, "todas iguais em direitos e
honras, e independentes entre si", e reúnem-se nas designadas oficinas ou lojas.
Trata-se de uma obediência iniciática, filosófica, filantrópica e educativa.
Cada Loja Maçónica é composta pelo venerável mestre ou presidente, que preside e
orienta as sessões; primeiro vigilante, que conduz os trabalhos e trata da
organização e disciplina em geral; segundo vigilante, que adestra os aprendizes;
orador, que sumariza os trabalhos e reúne as conclusões; secretário, que redige as
actas e trata da sua conservação e é responsável pelas relações administrativas
entre a loja e a obediência; mestre de cerimónias, que introduz na loja e conduz aos
21 - O Povo de Cambra de 8 de Junho de 1913;
71
seus lugares os visitantes, e ajuda o expert nas cerimónias de iniciação; tesoureiro,
que recebe as quotizações e outros fundos da loja e vela pela sua organização
financeira. Os cargos do venerável ao secretário são chamados “as luzes da
oficina”.
O nome "Maçonaria" provém do francês maçonnerie ou do inglês masonry
que significa "construção". Esta construção é feita pelo maçon em suas lojas
(Lodges). Defende-se também que a palavra é mais antiga e tem origem na
expressão copta Phree Messen, cujo significado é "filhos da luz".
Na Idade Média havia dois tipos de pedreiros; o rough mason (pedreiro bruto)
que trabalhava com a pedra sem lhe extrair forma ou polimento e o Freemason
(pedreiro livre) que detinha o segredo de polir a pedra bruta.
A Maçonaria Simbólica compreende três graus;
• Aprendiz
• Companheiro
• Mestre
A maçonaria, como a conhecemos hoje, segundo o Dicionário da Maçonaria, de
Joaquim Gervásio de Figueiredo, no verbete Francomaçonaria, "foi fundada em 24
de Junho de 1717, em Londres". O termo maçon, segundo o mesmo Dicionário,
provém do inglês mason e do francês maçon, que quer dizer 'pedreiro', e do alemão
metz, 'cortador de pedra'. A origem da maçonaria está ligada às lendas de Ísis e
Osíris, Egito; ao culto a Mitra, vindo até a Ordem dos Templários e a Fraternidade
Rosa Cruz. Em 1723, O Rev. Anglicano James Anderson publicou as Constituições
da Maçonaria, sendo até hoje documentos universalmente aceitos como base de
todas as lojas maçônicas.
Os ritos ou procedimentos ritualistas, são métodos utilizados para transmitir os
ensinamentos e organizar as cerimónias maçónicas. Entre os principais destacam-
se:
Rito Escocês Antigo e Aceito
Rito de York
Rito Schröder
Rito Moderno
Rito Brasileiro
Rito Adonhiramita
Rito Escocês Retificado
72
No mundo existem mais de 200 ritos praticados actualmente, porém os mais
utilizados são o de Rito de York e o Rito Escocês.
Outra classe de Ritos maçónicos menos comuns destacam-se pela abordagem mais
esotérica e espiritualista como são os Ritos denominados Misraim e Memphis.
A maçonaria é composta por Graus Simbólicos e Filosóficos, variando de rito
para rito.
A constituição dos três primeiros graus é obrigatória e está prevista nos
landmarks da Ordem.
O trabalho realizado nos graus ditos "superiores" ou filosóficos é optativo e de
carácter filosófico.
Existem diversos sistemas de graus superiores, como o de 33 graus do Rito
Escocês Antigo e Aceito, o de 13 graus do Rito de York, o de 97 graus do Misraim e
Memphis etc.
A Maçonaria Simbólica (aquela que reúne os três primeiros graus) se divide
em Obediências Maçónicas designadas Grande Loja ou Grande Oriente. São
unidades administrativas diferentes, que agrupam diversas Lojas, mas que
propagam os mesmos ideais.
Além da Maçonaria Simbólica, e conforme o rito praticado, existem os "Alto
Graus", que se subordinam a outras entidades. Assim, os Alto Graus do Rito
Escocês Antigo e Aceito estão ligados a "Supremo Conselho", geralmente um por
país.
É comum que Supremos Conselhos mantenham relações de reconhecimento
entre si, bem como celebrem tratados com os corpos da maçonaria simbólica. A
Maçonaria Universal, regular ou tradicional, é a que professa pela via sagrada,
independentemente do seu credo religioso, trabalha na sua Loja sob a invocação do
Grande Arquitecto do Universo, sobre os livros sagrados, o esquadro e o compasso.
A necessária presença de mais do que um livro sagrado no altar de juramento,
reflecte exactamente o espírito tolerante da maçonaria Universal e regular.
A simbologia representada pelo esquadro e no compasso representando no
seu interior o acrónimo "G" de Grande Arquitecto do Universo representa
exactamente a regularidade e a crença no Grande Arquitecto do Universo.
São os regulamentos consagrados na Constituição de Anderson,
considerados o fundamento e pilar da maçonaria moderna que obrigam á crença no
GADU. Consequentemente, o não cumprimento deste critério fica desde logo
designada a actividade maçónica como irregular.
73
Para se ser maçon não basta a auto proclamação. É necessário que "os seus
irmãos o reconheçam como tal", ou seja, é fundamental que tenha sido iniciado, por
outros maçons, cumprido com os seus juramentos e obrigações sejam elas
esotéricas ou simbólicas e esteja integrado numa Loja, regular, numa Grande Loja
ou num Grande Oriente, devidamente consagrados, consoante as terminologias
tradicionais, ditadas pelos Landmarks ou a Constituição de Anderson.
Em Portugal, por antiguidade histórica podemos considerar as seguintes:
Grande Oriente Lusitano;
Federação Portuguesa da Ordem Maçónica Mista Internacional "Le Droit Humain" -
O Direito Humano;
Grande Loja Regular de Portugal;
Grande Loja Legal de Portugal;
Casa Real dos Pedreiros Livres da Lusitânia;
Grande Loja Feminina de Portugal;
Grande Loja Tradicional de Portugal;
Grande Loja Nacional Portuguesa;
Grande Oriente Ibérico - Grande Oriente Misto de Portugal;
Existem Símbolos maçónico os quais possuem significado diverso, a saber:
- Estrela de cinco pontas: sendo a Estrela do Oriente ou a Estrela Iniciação, é
a que simbolizou o nascimento de JESUS. É o símbolo do Homem Perfeito, da
Humanidade plena entre Pai e Filho; o homem nos seus cinco aspectos: físico,
emocional, mental, intuitivo e espiritual. Totalmente realizado e uno com o Grande
Arquitecto do Universo. É o homem de braços abertos, mas sem virilidade, porque
dominou as paixões e emoções. As Estrelas representam as lágrimas da beleza da
Criação. Olhemos para cima, para o céu e encontraremos a nossa estrela guia. Na
Maçonaria e nos seus Templos, a abóbada celeste está adornada de estrelas. A
Estrela é o emblema do génio Flamejante que levam às grandes coisas com a sua
influência. É o emblema da paz, do bom acolhimento e da amizade fraternal.
- A Acácia: a planta símbolo por excelência da Maçonaria; representa a
segurança, a clareza, e também a inocência ou pureza. A Acácia foi tida na
antiguidade, entre os hebreus, como árvore sagrada e adoptada como símbolo
maçónico. Os antigos costumavam simbolizar a virtude e outras qualidades da alma
74
com diversas plantas. A Acácia é inicialmente um símbolo da verdadeira Iniciação
para uma nova vida, a ressurreição para uma vida futura.
- O Avental: símbolo do trabalho maçónico; branco, e de pele, para os
Aprendizes e Companheiros; branco orlado de vermelho, para os Mestres.
- As Colunas: símbolo dos limites do mundo criado, da vida e da morte, do
elemento masculino e do elemento feminino, do activo e do passivo.
- O Compasso: símbolo do espírito, do pensamento nas diversas formas de
raciocínio, e também do relativo (círculo) dependente do ponto inicial (absoluto). Os
círculos traçados com o compasso representam as lojas.
- O Nº 9: é o princípio da Luz Divina, Criadora, que ilumina todo pensamento,
todo desejo e toda obra, exprime externamente a Obra de Deus que mora em cada
homem, para descansar depois de concluir sua Obra. O número nove, no
simbolismo maçónico, desempenha um papel variado e importante com significados
aplicados na sua forma ritualista. O número 9, é o número dos Iniciados e dos
Profetas.
- Delta: triângulo luminoso, símbolo da força expandindo-se; distingue o Rito
Escocês.
- O Esquadro: resulta da união da linha vertical com a linha horizontal, é o
símbolo da retidão e também da acção do Homem sobre a matéria e da acção do
Homem sobre si mesmo. Significa que devemos regular a nossa conduta e as
nossas acções pela linha e pela régua maçónica, pelo temor de Deus, a quem
temos de prestar contas das nossas acções, palavras e pensamentos. Emite a ideia
inflexível da imparcialidade e precisão de carácter. Simboliza a moralidade.
- Pequeno martelo em madeira: é o emblema da vontade activa, do trabalho e
da força material; instrumento de direcção, poder e autoridade.
- O Pavimento em xadrez: de quadrados pretos e brancos, com que devem
ser revestidos os templos; símbolo da diversidade do globo e das raças, unidas pela
Maçonaria; símbolo também da oposição dos contrários, bem e mal, espírito e
corpo, luz e trevas.
- A Pedra bruta: símbolo das imperfeições do espírito que o maçon deve
procurar corrigir; e também, da liberdade total do Aprendiz e do maçon em geral.
- A Letra G: é a sétima letra do nosso alfabeto e se apresenta diversos
significados:
Gravitação - É a força primordial que rege o movimento e o equilíbrio da matéria;
75
Geometria ou a Quinta Ciência - É fundamento da ciência positiva, simbolizando a
ciência dos cálculos, aplicada à extensão, à divisão de terras, de onde surge a
noção da parte que nelas a nós compete, na grande partilha da humanidade e dos
direitos da terra cultivada;
Geração - É a vida perpetuando a série dos seres. Força Criadora que se acha no
centro de todo ser e de todas as coisas;
Génio - É a inteligência humana a brilhar com seu mais vivo fulgor;
Gnose - É o mais amplo conhecimento moral, o impulso que leva o homem a
aprender sempre mais e que é o principal factor do progresso;
Glória - a Deus;
Grandeza - O homem, a maior e mais perfeita Obra da Criação;
Gomel - Uma palavra hebraica, entende-se os deveres do homem para com Deus e
os seus semelhantes. Conclui-se assim que a letra G como um dos grandes
segredos maçónicos.
- O Templo: símbolo da construção maçónica por excelência, da paz
profunda para que tendem todos os maçons. Construindo o seu templo interior e
construindo, em conjunto com os irmãos, um templo universal;
-Três pontos; triângulo: símbolo com várias interpretações, aliás conciliáveis:
luz, trevas e tempo; passado, presente e futuro; sabedoria, força e beleza;
nascimento, vida e morte; liberdade, igualdade e fraternidade.
Toda a filosofia da Maçonaria é mostrada por alegorias e símbolos, que
segundo Jung, fazem os humanos fundamentalmente terem uma tendência para
sensibilizar-se com certas imagens ou símbolos que constelam sentimentos
profundos de apelo universal - os arquétipos, que ajudam o maçon a aprender os
conceitos gravando-os em sua mente, para futuras associações.
- A Pá de trolha: instrumento que os pedreiros usam para alisar a massa,
simboliza a Temperança que os irmãos devem usar para alisar as arestas que
atritam os irmãos entre si.
- O esquadro e o compasso: simbolizam a materialidade do homem e sua
espiritualidade.
Diversos são os símbolos que a maçonaria mostra aos maçons, e cabe à eles
interpretarem e apreenderem o significado dos mesmos para contributo do seu
conhecimento.
76
Assim, os símbolos e as alegorias fazem com que os maçons de todo o
mundo se entendam, mesmo que suas línguas sejam diferentes22.
A maçonaria tornou-se uma força crescente em toda a Europa e, em Portugal,
a inquisição tratou de persuadir o rei D. João V que os maçons eram, além de
hereges, inimigos do Estado. O movimento maçónico é fortemente reprimido e só
volta a aparecer no reinado de D. José. Com a chegada de D. Maria I ao poder, a
inquisição desencadeou mais uma grande perseguição, com degredo de muitos
maçons, para o que muito terá contribuído Pina Manique.
Com altos e baixos a maçonaria assumiu sempre uma posição de vanguarda
de todos os movimentos progressistas, visando também a supressão o regime
absoluto. Por detrás da revolução vitoriosa de 24 de Agosto de 1820 estavam
muitos e prestigiosos maçons.
Com a Vilafrancada e a Abrilada e o regresso do absolutismo, os maçons
voltaram a ser perseguidos e também fortemente reprimidos pelo Miguelismo.
“Quase todos os maçons alinharam, evidentemente, com D. Pedro IV, pedreiro-livre
ele próprio e Grão-Mestre da Maçonaria brasileira. Não admira, pois que a história
da maçonaria de então tivesse coincidido com a história da gesta liberal”.
(OLIVEIRA MARQUES, 1998, p. 35).
É neste contexto que no Brasil o movimento maçónico atinge maior pujança e
que vem mais tarde a instituir em Portugal alguns Supremos Conselhos, trazendo
alguma unidade ao movimento maçónico português em 1869, denominando-se
então, Grande Oriente Lusitano Unido, Supremo Conselho.
A partir daqui “foi o grande período da Maçonaria portuguesa. Ao seu
robustecimento interno aliaram-se uma constante posição de vanguarda ideológica
de tipo político-social e uma actividade prática notável em todos os campos da vida
da nação”. (OLIVEIRA MARQUES, 1998, p. 39).
O declínio da influência maçónica por volta de 1928 e a gradual consolidação
do Estado Novo foi em paralelo com o gradual enfraquecimento da maçonaria. (Cfr.
OLIVEIRA MARQUES, 1998, p. 51).
A biografia de Luiz Bernardo de Almeida, encontra, também ela um paralelo
com estes momentos da maçonaria da qual veio a fazer parte.
22 - www.wikipédia.com;
77
Iniciado na maçonaria, no Brasil, ainda muito novo vem a atingir um dos mais
altos graus da escala maçónica do Rito Escocês, antigo e aceite.
Em 29 de Agosto de 1898, com 38 anos, Luiz Bernardo de Almeida, é
condecorado como Grau 30, da Grande Ordem da Maçonaria do Brasil, Loja Cap.
18 de Julho.
Foto 24 - Diploma de "Maçon" atribuído a Luiz Bernardo
Graça Pinho Cruz, depois de descobrir esse diploma n.º 11, transcreve-o
nestes termos:
“N.º 11
Á Glória do S. A do U.
Nós o Vem., DDig E mais OOFF. Da Aug. E resp. Loj. Cap. Do rito escossez
antigo e aceite, com o título distinctivo Dezoito de Julho, regularmente constituída ao
Or. Do Rio de Janeiro, sob os auspícios do Gr. Or. Do Brazil, ao Val. Do Lavradio:
Fazemos saber a todas as Lloj. E MMaç. Regulares que o nosso Resp. Ir. Luiz
Bernardo Almeida natural de Portugal com 38 annos de idade, Obr. Act. Da Aug. E
Resp. Loj. Cap. 18 de Julho e condecorado com o Gr. 30 em virtude dos serviços
que prestou a esta Aug. E Resp. Loj. E á nossa Sub. Ord. Foi elevado á cathegoria
de Benemérito desta Resp. Loj.
78
Em firmeza do que, e para lhe servir de título, se traç. Grav. E poliu o
presente dipl. Que vai por nós assig. E sell. Com o selo da nossa archit.
Dado e passado ao Or. Do Brazil, aos 29 dias do Agosto mez do anno da V.L.
5899”. (PINHO DA CRUZ, 2000)
Luiz Bernardo de Almeida atinge o grau 30 – Grande Eleito Cavaleiro de
Kados ou Cavaleiro da Águia Branca e Nenegra, o último dos areópagos, dos 33
graus que a maçonaria do rito escocês concede, sendo ainda muito jovem.
A obra da maçonaria na sua pujança, confundia-se com as grandes
conquistas do tempo, abolição da pena de morte e da escravatura, criação de
escolas a nível do ensino primário e secundário, novos métodos de ensino, difusão
da instrução, instituição de asilos para crianças e inválidos, combate ao clericalismo
e pugna pela laicização das escolas, criação de associações e colectividades
capazes de organizarem a cultura, instrução e assistências dentro de novos
paradigmas.
O Comendador Luiz Bernardo de Almeida, com uma obstinação pela palavra
“Progresso”, que os cadetes maçons, na sua revolução, haviam inscrito na bandeira
do Brasil, como sejam a fábrica Progresso, Quinta Progresso, a Empresa de
Transportes Progresso, a Farmácia Progresso, o Curso Nocturno Progresso, Foto
Progresso e Cinema Pogresso, teve uma acção continuada e consequente que
reflecte os princípios dos “pedreiros livres”23
23 - Almeida, Adelino Augusto Moreira - trabalho de mestrado na área da Educação;
79
Foto 25 - Mercado Municipal vendo-se a entrada par a o "Cinema Progresso"
Crónica de uma digressão ao Solar das Laranjeiras Existe um pequeno livro, intitulado de “Por Terras de Santa Maria”, uma crónica de uma visita efectuada à Quinta Progresso, oferecido por Lucinda Soares Almeida, no ano de 1931, escrito por José Dias de Castro no ano de 1916, em dia do aniversário do Comendador.
Macieira a Velha 14/02/1931
Ex.mo. Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida muito estimámos Vossa
Ex.ª esteja graçando bem a sim a Senhora Dona Aninhas e mais que é o nosso
mais prazer.
Ex.mo Sr. Comendador por este meio venho agradecer a Vossa Ex.ª a boa
lembrança que me entregou a minha filha para me entregar, agradecemos todos os
benefícios que nos tem feito a Vossa Ex.ª Dona Aninhas, será do muito Obrigada
Deus Nosso Senhor.
Conserve que e o Pai da pobreza (?) criada de Vossa Ex.ª
Lucinda Soares de Almeida
Por Terras de Santa Maria
80
Ao Ex.mo Sr. Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, no dia do seu aniversário
natalício 15 de Novembro de 1916. Com as homenagens da mais subida
consideração, oferece e dedica:
- José Dias de Castro – Rua do Comércio do Porto 145 Belo Monte 77 – 2º e
3º.
“Às 7 horas o meu amigo Avelino do Nascimento acompanhado do sobrinho
António, também meu excelente amigo, trouxe o automóvel ao tabuleiro superior da
ponte Luiz 1º, e alegremente, abalamos para a outra banda, estrada fora.
A manhã prometedora de sol estava, entretanto, desagradável; uma neblina fria
agravada pela deslocação do ar que a marcha do veículo produzia obrigou a
agasalhos adequados.
O breve trecho principiou o “auto” a marcar unidades quilométricas, galgando
velozmente as distâncias através de povoações de nomes muito familiares ao meu
ouvido de velho “tripeiro” ribeirinho e minhas conhecidas, também, por leituras de
incorrigível amador de alfarrábios.
A passagem na Vila da Feira, o venerando castelo que lhe documenta e
enobrece a remota origem, esboçou no horizonte a mancha fugitiva dos seus
denegridos torreões góticos.
É uma poética reminiscência medieval a esmaltar de tradições as antigas terras
de Santa Maria.
Em menos de duas horas chegamos a Oliveira d’ Azeméis; no percurso da sua
rua principal que tem um nome de minha especial consideração – o nome de Bento
Carqueja, fixei curiosamente, à direita, um prédio que pertenceu ao progenitor
d’aquele distinto professor e publicista, onde na juventude iniciou a vida laboriosa,
auxiliando os trabalhos da casa paterna no balcão comercial. O prédio nada tem de
característico a recomendá-lo à observação; é uma construção de vulgar aspecto.
No entanto se qualquer merecimento arquitectónico o não recomenda a simpatias
de arte, no meu espírito produziu a graça de uma visão retrospectiva.
Afigurou-se-me, por 1872, o Bentinho, rosado e loiro, com os seus doze anos,
atarefado no aviamento da freguesia da casa de negócio de seu pai, então instalado
no rés-do-chão.
Evoquei o marçaninho d’aquele tempo e comparei o homem ilustre de hoje – a
alvorada d’uma juventude a desabrochar n’um recanto ignorado de província e o sol
alto de uma individualidade iminente.
81
O meu amigo Avelino arrepiou a carreira à máquina locomotora para que eu
visse de perto um “monumento” da terra – a ermida de Nossa Senhora de La Salette
que se ergue n’uma colina, no cimo da qual se descobre um panorama esplêndido,
tanto pela sua altitude como pelo horizonte que a cerca.
Lá no alto, descortina-se, em todos os pontos do quadrante, as linhas sinuosas e
luxuriantes de um sistema de montanhas de encantadora perspectiva.
Em baixo, no parque, artisticamente tratado em viçosos arrelvados e bem
desenhados arruamentos, um lago amplo e gracioso, atravessado por uma ponte
rústica e povoado de barcos recreativos.
Entrei na capela (provisória, pois que se projecta mais grandiosa construção) e
após a minha homenagem à Padroeira e aquisição de umas medalhas recordativas,
(ilegível.)
O tempo fugia, não permitindo delongas, (ilegível) pulmões n’aquele ar sadio da
montanha e a encher os olhos n’aquela orgia de luz, em um céu limpo de nuvens,
não seria suficiente.
Era preciso seguir, caminhar de novo, pois faltava visitar a fábrica de papel do
Caima nome hidrográfico que a cada momento estou a ver impresso em grandes
caracteres nas remessas enviadas para a empresa do Comércio do Porto.
Ia deixar de ser uma abstracção para mim aquela casa fabril e o seu local, tão
estreitamente ligados ao jornal que dá o nome à rua onde tenho o meu
estabelecimento.
O edifício da fábrica situado na margem direita do Caima é espaçoso e bem
provido de maquinismos. A queda d’água que lhe fornece a força motriz é d’um
efeito interessantíssimo: uma extensa toalha liquida, branca de neve no seu rendado
de espuma e cintilante de sol, despenhava-se no açude n’um marulhar ruidoso e
alegre, e ao fundo, uns lotes graciosos de terras cultivadas e de montanhas cheias
de vegetação completavam a risonha paisagem.
Visitamos, apressadamente, as dependências da fábrica silenciosas e desertas,
por ser domingo.
Um estabelecimento fabril é uma espécie de santuário; no seu recinto a faina dos
operários, o ruído das máquinas e o arfar das caldeiras traduzem o “cântico dos
cânticos” da vida activa.
A fábrica de papel do Caima por ocasião da nossa romagem repousava no
silêncio do seu recanto ribeirinho pela quietude dos braços que o descanso
dominical determinara; mas ao afastar-me do pitoresco lugar acompanhava-me a
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ideia de que no dia seguinte silvos estridentes despertariam, alegremente, os ecos
de muitas léguas em redor chamando ao trabalho os obreiros d’aquele templo, tal
qual o sino d’um presbitério convidando os crentes à oração.
Era preciso prosseguir na jornada, retrogradando a Oliveira para de novo
tomarmos a estrada ordinária.
D’esse modo procedeu o meu obsequioso e amável condutor dando ao carro a
direcção da vila, para que novamente seguisse o caminho de Macieira de Cambra.
Avançamos, portanto, no sentido indicado.
A região é alpestre; os montes sucedem-se, profusamente, cortados por uma
estrada em contínuas ondulações e orlada de extensos pinheirais.
A cada momento surgem curvas tão rápidas, e de tão susceptível perigo que só
mão hábil consegue prevenir e evitar.
O carro, no entanto, prosseguia n’um andamento acelerado, já bem distanciado
das históricas terras de Santa Maria tantas vezes referidas nas antigas crónicas.
A meu lado o Toninho (diminutivo familiar do filho mais velho do meu querido
amigo Nascimento Júnior) ia enumerando os nomes das povoações, das quintas e
das herdades que, de anteriores passagens por ali, ficara conhecendo.
O “auto” rodava avante no itinerário da sua objectiva; a certa altura, porém, o seu
proprietário e oficioso condutor que, não obstante o “chaufeur” que nos
acompanhava nunca abandonou o manipulador, sofreou a marcha para nos indicar
ao longe, lá muito no extremo, uma propriedade, apenas denunciada entre
arvoredos, pela vibrante cor vermelha de telhas novas.
Lá está a casa do Comendador! Anunciou o Avelino.
Efectivamente, alguns minutos depois, talvez três quilómetros percorridos, no
ângulo d’um muro sobranceiro à estrada, um cavalheiro acompanhado por uma
senhora nos aguardavam.
Eram o Comendador Almeida e sua esposa.
O automóvel transpôs o portão de ferro, encimado por um arco abatido, com a
legenda em letras douradas – Quita Progresso – 1915.
Vencida uma pequena rampa defrontava-se um vasto e desafogado parque em
cujo limite se elevava a casa de habitação, acessível por uma bem lançada
escadaria.
Depois dos cumprimentos da praxe e feita pelo Avelino a minha apresentação
aos donos da casa, subimos.
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Os amigos Nascimentos tinham-me prevenido do carácter franco e hospitaleiro
do Comendador Luiz Bernardo d’Almeida, mas se alguma dúvida pudesse ainda
sobressaltar-me, esse receio dissipar-se-ia ao contacto d’aquele ambiente acolhedor
e logo nos primeiros momentos experimentado.
Apesar de nunca me ter avistado com o benemérito “eremita” de Macieira de
Cambra a afabilidade e bonomia da sua recepção insuflaram-me inteira confiança.
Realmente, os Nascimentos não tinham exagerado; o Comendador bem poderá
ter inscrito também, como subtítulo à Quinta Progresso esta outra legenda, vazada
nos velhos moldes patriarcas:
“Casa Luiz Bernardo d’Almeida e de seus amigos”.
Bem cabida seria a divisa carinhosa pois que o interior da magnifica residência
fez-me arquitectar na imaginação, pela essência do seu plano, aqueles antigos
solares provincianos ou mosteiros d’outr’ora com seus bancos de pedra à portaria
para descanso de viandantes, e a clássica sineta de chamada, ao lado, para
solicitações de agasalho, quando por ventura necessários.
O Comendador Almeida tendo embarcado de tenra idade para o Brasil nunca
esqueceu, todavia, o torrão natal.
Lá, na lida absorvente da grande casa industrial que soube criar e desenvolver,
trazia sempre no coração a lembrança saudosa da linda aldeia da infância.
Passados muitos anos, já coroado pela fortuna, vitorioso, mas sempre modesto e
simples, veio suavizar nostalgias sob o céu da pátria estremecida, abalando com a
mãe e com a esposa para Macieira de Cambra.
Ali, encontrou pequenina e obscura a casa de seus maiores, e perto o mesmo
monte escaldado e agreste conhecido dos seus tempos de rapazinho n’um cenário
cuja visão mais alvoroçou o seu coração de regionalista apaixonado.
Impelido pelo prestígio do recanto natal e pela tradição do berço, reconstituiu o
primitivo lar, e salvaguardada a relíquia de origem, transformou aquele deserto n’um
oásis encantador, no mais confortável recanto da sua aldeia. Aquela charneca,
outr’ora, inóspita, desonrada e triste, vê-se actualmente, d’uma amenidade risonha
nas promessas dos seus vinhedos e na fluorescência das demais plantações; e
baldios, n’outro tempo, inabitáveis e ásperos, povoam-se, hoje de árvores frutíferas
reflectindo-se em cursos de água fertilizantes e aprazíveis.
O seu oiro útil, abençoado e fecundo conduziu ao ermo águas cristalinas e
salutares, fazendo brotar d’aquele solo, até então, aspérrimo e estéril, frutos e
legumes, searas e flores, emoldurando assim a mais bela casa da região; beleza de
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tal transcendência que na traça primária da sua construção se uniu a ideia artística
ao pensamento humanitário, revelador de uma grandeza d’alma invulgar.
Quando aquela casa deixar de abrigar o benemérito que sob os seus tectos goza
tranquilamente os proventos da sua longa vida laboriosa e justa, a vila de Macieira
de Cambra possuirá mais um eloquente padrão da filantropia do seu generoso filho.
O Comendador, tendo doado ao Estado um modelar edifício para escolas da sua
terra, pensa em legar ao município a sua terra (?) para futura transformação n’um
estabelecimento de beneficência.
Carácter hospitaleiro, enche-o de satisfação uma sortida afectuosa ao seu
“castelo”.
Há pouco ainda, no ano anterior, por ocasião do seu aniversário natalício,
ressôaram por aquelas salas as risadas da amizade que de longe foi prestar-lhe
homenagem e quebrar festivamente o silêncio habitual d’aquela mansão de paz;
alma devotada ao engrandecimento da sua terra, e por isso à honra do país,
consola-o a espiritual lembrança de perpetuar o seu nome com mais outro
monumento do seu acrisolado bem-fazer.
À escola, ontem edificada seguir-se-há um hospital!
Não podia receber glacialmente um forasteiro, embora desconhecido, quem nas
pugnas civilizadoras do trabalho se enobreceu e possui no seu apanágio moral o
mais belo florão da alma humana – a caridade, e por isso a delicadeza que é sua
derivante e quase sua irmã.
Transpus, portanto, afoitamente o último degrau da escadaria deparando-se-me
a seguir uma ampla galeria cheia de luz, coada através de profusas janelas de
vidros coloridos dando acesso aos compartimentos interiores da deliciosa vivenda.
A confortável galeria obedecendo a um plano bem delineado bifurca-se em dois
corredores prolongados na direcção do nascente e do poente. D’este modo, o sol
levante, pelas manhãs desanuviadas, incita e reanima o matinal senhorio, e ao
entardecer, ainda o astro amigo, na continuidade do outro lanço, o acalenta e como
que o abraça nas suas despedidas.
“Edifica a tua casa na montanha para que todos a vejam” diz o asserto bíblico, e
o bondoso Comendador parece ter, instintivamente, seguido o conselho da Escritura
pois que, sobre uma colina que se avista n’um extenso raio de circunferência avulta
como um diadema a sua franca moradia.
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Lá dentro, nas suas dependências respira-se uma agradável atmosfera de bem-
estar e conforto, e na disposição do mobiliário e decorações percebe-se a
simbolisação da mais bizarra hospitalidade.
A sala de jantar espaçosa como um refeitório conventual é rasgada em airosas
janelas olhando para montanhas distantes em cujas vertentes alvejam os casais e
os presbitérios a desenharem a nota ridente da vida no esplendor da paisagem.
A casa do Comendador é uma vivenda moderna nas linhas do seu continente e
no recheio do seu conteúdo, bem diferente certamente, da presumida comodidade
da habitação de um filósofo ou do cenóbio de um anacoreta, mas, positivamente,
construída e alfaiada para refúgio de uma alma contemplativa.
Luiz Bernardo d’Almeida dá-nos a ficção graciosa e subtil de uma espécie de
Nun’Álvares.
Armado cavaleiro na milícia industrial, conquistou as esporas de oiro,
combatendo, lutando e vencendo.
Vitorioso de cem batalhas no campo da actividade, o homem forte,
empreendedor e laborioso segredou, certo dia à mãe e à esposa qualquer coisa de
encantadora, correspondida em sorrisos de aquiescência que o seu ardente coração
de patriota traduziu e imediatamente praticou regressando aos velhos lares.
Tendo firmado a sua independência individual nas canseiras d’alem mar
regressou glorioso a Portugal; e aí, ainda como o legendário condestável, despojado
das armas combativas, delegando a direcção das suas vastas oficinas, vestiu a alma
no linho branco do alvenel: o pioneiro da hoste industrial fez-se pedreiro, e d’essa
nova campanha, d’essa galharda missão surge uma casa risonha, toda garrida e
gentil que é o edifício das escolas primárias da sua terra.
Pouco tempo depois no planalto fronteiro elevado padrão moral da sua patriótica
benemerência irrompe altaneira e dominadora a fábrica esplêndida do seu “mosteiro
carmelitano”, a terra (?) dos seus anos provectos cuja estrutura sistematicamente
obedeceu à ideia generosa d’um futuro hospital.
Por fim, o “mundano” do trabalho, o legionário da industria triunfante, recolheu ao
ideal convento, património dos necessitados vindouros, d’esses “carmelitas” da sua
devoção altruísta, não para a vida solitária da cela, por isso que os monges do
século XX e da sua “ordem” não vestem a estamenha d’um Frei Nuno de Santa
Maria, mas sim, para junto da mãe e da esposa e do convívio amigo gozar ainda por
longos anos a bem merecida feria de uma extensa semana de vida prestimosa e na
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contemplação do tranquilo recanto da sua aldeia ter perpetuamente nos olhos, nos
lábios e no coração a eterna e mais linda frase que existe na língua portuguesa:
“Esta é a ditosa pátria minha amada”
O Testamento
No ano anterior ao seu falecimento, Luiz Bernardo faz um testamento
cerrado, onde dispõe dos seus bens em Portugal:
Eu, adiante assinado, Luiz Bernardo de Almeida, Português, casado,
proprietário e industrial, residente na minha Quinta Progresso, em Macieira de
Cambra, comarca de Oliveira de Azeméis, faço este meu testamento pelo formato
seguinte:
- Tenho haveres em Portugal e haveres no Brasil.
- Resolvo dispor de uns e de outros em testamentos separados, para serem
independentemente cumpridos: Em Portugal o que diz respeito aos bens ou haveres
aqui existentes, no Brasil o que diz respeito aos bens ou haveres lá existentes, não
podendo mesmo considera-se que um testamento revoga ou altera o outro, pois
ambos serão integralmente cumpridos.
Quanto aos bens ou haveres da minha herança, ou, melhor, que constituam a minha
herança, existentes em Portugal, disponho, neste testamento, pela forma seguinte:
- Lego à minha esposa Dona Marinha Silva dos Santos Almeida, em plena
propriedade, o meu prédio denominado “Quinta Progresso”, em Macieira de
Cambra, e bem assim a minha casa situada na Cruz de São Domingos, em Macieira
de Cambra, denominada da Cruz, ocupada pela Farmácia Progresso, com todo o
seu recheio, e ainda as primeira, segunda e terceira leiras de terra pegadas à
mesma casa, que confinam do sul com o caminho de outro meu prédio, poente com
a estrada, norte com António de Almeida Pinho e nascente comigo testador. Declaro
que todos os valores móveis de qualquer espécie que sejam existentes na minha
Casa e Quinta em Macieira-a-Velha, de Macieira de Cambra, pertencerão à minha
esposa Dona Marinha Silva dos Santos Almeida, legando-lhe em plena propriedade
algum que por ventura me pertença, incluindo os de meu uso pessoal.
- Lego à minha afilhada, filha de Francisco Relvas a quantia de dois mil escudos.
- Lego a Manuel, filho de José Correia, já falecido, de Rossas, concelho de
Arouca, a quantia de três mil escudos.
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- Lego a Marinha, filha de Ernesto Tavares de Almeida e de Beatriz Soares
Abrantes, a quantia de dois mil escudos.
- Lego ao meu afilhado António Bernardo, filho de Luiz de Sousa Moreira, a
quantia de dois mil escudos.
- Lego a Luiz, filho de Manuel Anacleto, a quantia de dois mil escudos.
- Lego a Marinha, filha de António dos Santos, do Feirrel, de Santo, a quantia de
dois mil escudos.
- Lego a quantia de dois mil escudos a cada um dos criados de um e outro sexo
que, à data de meu falecimento, esteja aos serviços da minha casa de Macieira. Se
algum deles, estando a esses serviços há mais de um ano, tiverem algum débito
para comigo, ser-lhe-há ele perdoado, sem prejuízo do legado acima referido, que o
respectivo legatário receberá.
- Se qualquer outro legatário não provar que me tenha pago o débito com que
por ventura fique nos meus livros de escrita, ser-lhe-há deduzida a respectiva
importância ao legado que haja de receber.
- Lego a quantia de dois mil escudos a Manuel Joaquim de Matos, Oficial da
Administração do Concelho de Vale de Cambra.
- Lego a quantia de dois mil escudos a cada um dos seguintes indivíduos, que
actualmente desempenham serviços no meu casal, sem serem considerados como
criados: António de Almeida, de Macieira-a-Velha, Francisco Soares de Oliveira,
ferreiro de Lordelo, Manuel Joaquim de Almeida, chaufeur, de Macieira de Cambra.
Se, porem, forem por mim despedidos ou dispensados dos serviços que prestam, ou
eles se despedirem, e já não estiverem ao serviço à data do meu falecimento, ficará
sem efeito, em relação a cada um, o respectivo legado.
- Deixo à Misericórdia do Porto, Hospital de Santo António, a quantia de cinco mil
escudos; ao Asilo de São Pedro do Sul e à Misericórdia também de São Pedro do
Sul, a quantia de mil escudos; e ao Asilo da Infância desvalida, de Oliveira de
Azeméis dois mil escudos.
- A cada um dos jornais “O Comércio do Porto” da cidade do Porto, e “O Século”,
da cidade de Lisboa, será entregue a quantia de cem escudos para ser distribuída
por vinte dos seus pobres, no sétimo dia do meu falecimento.
- Lego àqueles dos herdeiros do falecido António de Almeida Pinho, que foi de
Cambra e morreu no Rio de Janeiro, a quem pela partilha da herança ficou
pertencendo a propriedade que o mesmo Pinho possuía no lugar de Padrastos, de
Macieira de Cambra, onde actualmente funciona um colégio, metade da água da
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mina principal da minha propriedade de Padrastos, conduzida por meio de
encaminhamento colocado nessa propriedade, cujo encaminhamento tem no ponto
onde é feita a divisão o diâmetro de duas polegadas, seguindo depois da divisão
num cano de uma polegada para esta propriedade onde funciona o colégio, a
metade que aqui lhe é legada e que nessa mesma propriedade já está sendo
aproveitada, e a outra metade é utilizada em terreno do prédio que me pertenceu.
Os legatários receberam a água que aqui lhes é legada no extremo da minha
propriedade pelo encaminhamento já referido, cuja conservação fica a cargo da
minha herança, ficando assim a minha propriedade isenta de qualquer ónus de
servidão.
- No oitavo dia do meu falecimento serão distribuídas cento e cinquenta esmolas
de cinco escudos por igual número de pobres da minha freguesia de Macieira de
Cambra.
- A cada um dos testamenteiros que as diante vou nomear, deixo a quantia de
cinco mil escudos, e ao que exercer a testamentaria deixo a quantia de dez mil
escudos, como retribuição dos seus serviços.
- De tudo o mais que constituir a minha herança em Portugal deixo o usufruto
vitalício à minha esposa Marinha Silva dos Santos Almeida, mas será previamente
retirada a quantia que for necessária para o pagamento do imposto, que for
liquidado sobre os legados (os que ao imposto estiverem sujeitos) contidos neste
testamento, pois os beneficiários os receberão livre do imposto, que sairá da minha
herança.
- Na propriedade do remanescente da minha herança, em Portugal, instituo único
herdeiro o Asilo de Inválidos Luís Bernardo de Almeida, asilo que por este
testamento fundo, se na ocasião da minha morte não estiver ainda fundado, e que
terá os estatutos que os meus testamenteiros elaborarem, caso não tenham sido
feitos em minha vida. Este Asilo será instalado na minha casa chamada de Posto,
situada em frente do Posto da Guarda Republicana, na freguesia de Macieira de
Cambra, o qual tem por fim alimentar, vestir e abrigar inválidos de um e outro sexo.
- Nomeio para meus testamenteiros minha esposa Dona Marinha Silva dos
Santos Almeida e os meus amigos Joaquim Ferreira Monteiro, do Porto, José Alves
de Sousa, também do Porto e Francisco Ferreira de Pinho, de Cambra,
dispensando-os de prestarem caução, pois os dou por abonados.
- Marco o prazo de dois anos para cumprimento deste meu testamento, pelo qual
revogo qualquer outro com data anterior feito.
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Foi escrito a meu rogo e vou rubricalo e assinalo depois de por mim ser lido.
Macieira de Cambra, doze de Agosto de mil novecentos e quarenta e seis.
(assinatura)
Este Testamento inclui um termo de aprovação que diz o seguinte: “No dia doze de Agosto de mil novecentos e quarenta e seis, neste lugar de Macieira-a-Velha, freguesia de Macieira de Cambra, concelho de Vale de Cambra e casas de residência do senhor Luiz Bernardo de Almeida, à Quinta Progresso, onde vim expressamente rogado para celebrar este auto de aprovação, perante mim Álvaro Ferreira Landureza, licenciado em direito e notário da comarca de Oliveira de Azeméis, como sede do Cartório ao Largo da Feira, da vila e referido concelho de Vale de Cambra, e perante as testemunhas adiante mencionados e no fim assinados, compareceu aquele senhor Luiz Bernardo de Almeida, casado industrial e proprietário, morador nestas casas da Quinta Progresso e pessoa cuja identidade reconheço por ser minha conhecida e dos testemunhos deste auto de aprovação, também de meu conhecimento pessoal pelo que verifiquei a sua idoneidade, de tudo o que dou fé. E por ele Luiz Bernardo de Almeida, na presença dos testemunhos me foi apresentado e entregue este testamento, declarando-me que ele é a disposição da sua última vontade. Eu notário, vendo o testamento sem o ler, achei que é escrito por punho diferente do testador, está assinado e rubricado pelo mesmo testador e contem quatro páginas escritas e parte da quinta página onde dei começo a este auto, logo em seguida à sua assinatura, esclarecendo também, que espontaneamente o tinha mandado escrever e depois de lido, achou conforme o que tinha ditado e que para sua realidade queria que lho aprovasse, fechasse e o lacrasse, lavrando o presente auto para os devidos efeitos. Foram testemunhas sempre presentes, Doutor Arnaldo Soares de Pinho, casado, médico, morador neste lugar e Bernardo Soares Coelho, viúvo, maior, proprietário, também morador neste lugar de Macieira-a-Velha, que vão assinar este auto, com o testador, depois de lido e explicado em voz alta na presença simultânea de todos por mim referido notário que também o vou assinar. Em seguida vai o testador apor a sua impressão digital do indicador direito. Luís Bernardo de Almeida
Arnaldo Soares de Pinho
Bernardo Soares Coelho
Álvaro Ferreira Landureza, notário.
A morte de Luiz Bernardo de Almeida
O Comendador faleceu a 4 de Junho de 1947. A imprensa local não dá grande relevo ao acontecimento. O Jornal de Cambra refere o seguinte:
“Com 88 anos (fazia 88 anos de idade a 15 de Novembro de 1947), e depois de
longo tempo de sofrimento, faleceu, na sua majestosa vivenda de Macieira a Velha,
o Sr. Comendador Luiz Bernardo de Almeida, que foi um grande propulsor do
progresso deste Concelho. Depois da Escola, o grandioso edifício que foi destinado
ao Hospital, que, por motivos particulares, não chegou a constituir-se, e que hoje é o
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Seminário Apostólico; a estrada para Viseu, que, se não fossem os seus arrojados
actos de empréstimo e empreiteiro, não se faria tão cedo; as suas construções para
o comércio e indústria desta vila e tantas outras obras que deixam a atestar a sua
extraordinária actividade. No Brasil fundou e fez prosperar uma das mais
importantes casas portuguesas.
Durante muitos anos dissemos da sua acção, e a sua história é bem
conhecida, para que não seja preciso vir descrevê-la de novo.
Apenas nos compete hoje, ao dar a notícia da morte do Comendador Luiz
Bernardo de Almeida, recordar, com saudade, esse grande espírito de progresso,
que foi um dos raros exemplos de persistência nas lutas da vida!
Descanse em paz.
Os nossos cordiais pêsames a sua Ex.ma Viúva e demais Família”.
Foto 26 - Jornal de Cambra de 15 de Junho de 1947
Na certidão de óbito consta:
Às dezoito horas do dia quatro do mês de Junho do ano de mil novecentos e
quarenta e sete, no lugar de Macieira-a-Velha da freguesia de Macieira deste
concelho, faleceu de miocardite crónica um indivíduo do sexo masculino de nome
Luiz Bernardo de Almeida de oitenta e sete anos de idade, de profissão capitalista,
natural da freguesia de Macieira, domiciliado no lugar de Macieira-a-Velha, filho
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legítimo de Bernardo Luiz de Almeida, natural da freguesia de Macieira, e de Josefa
da Conceição, natural da mesma freguesia, já falecidos.
O falecido era casado com Marinha Silva dos Santos de cinquenta e cinco anos
de idade, proprietária, natural da freguesia de Figueira, concelho de Lamego, e
residente no mesmo lugar de Macieira-a-Velha.
O falecido não deixou herdeiros sujeitos à jurisdição orfanológica, deixou bens,
fez testamento e o seu cadáver vai ser sepultado no cemitério de Macieira.
Foi declarante Manuel Joaquim de Matos, casado contínuo da Câmara, morador
na Praça, freguesia de Macieira.
Este registo, lavrado nesta Conservatória às onze horas e quarenta minutos,
depois de lido e conferido com o seu extracto vai ser assinado por mim Joaquim
António de Seixas, Conservador do Registo Civil e declarante.
A importância dos emolumentos é de dez escudos e a dos selos devidos pela
parte é de cinquenta centavos.
Vale de Cambra e Conservatória do Registo Civil aos cinco de Junho de mil
novecentos e quarenta e sete.
(Assinaturas)
Manuel Joaquim de Matos.
Joaquim António de Seixas.
Foto 27 - Registo de óbito de Luiz Bernardo de Almeida
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Luiz Bernardo de Almeida, encontra-se sepultado na sua capela lortuária, no
cemitério de Macieira de Cambra.
Foto 28 – Capela no cemitério de Macieira de Cambra
Alguns objectos pessoais de Luiz Bernardo Para além daqueles que se retiram deste trabalho,
descobri ainda um objecto tipo “mata-borrão”, oferecido em dia de
aniversário, o piano e o relógio de sala, um lápis e um cartão de apresentação
alusivos à sua metalúrgica no Brasil, oferecidos ao Museu Municipal.
Foto 29 - Lápis com a publicidade da m etalúrgica
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Foto 30 - Mata-borrão imagem 1 Foto 31 - Mata-borrão imagem 2
Foto 32 - Piano e relógio de sala
Foto 33 - Cartão de apresentação
A maior parte do património imobiliário ficou na posse da Fundação, embora
uma parte do que existia em Vale de Cambra tenha sido objecto de uma permuta
com a uma empresa de construção.
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A “Quinta Progresso” é actualmente uma estalagem. Nas mãos de terceiros.
A “Casa de Saúde” está em ruínas.
O edifício do “Centro Recreativo Literário e Musical”, porque ameaçava ruir,
foi cedido ao Grupo Etnográfico “Terras de Cambra” para poder ser objecto de
financiamento por parte do Estado.
Em funcionamento, mantêm-se a Escola Primária e a Fundação cujos
serviços e instalações não têm parado de crescer.
Sobre o seu relacionamento com a D. Marinha muitas perguntas se poderiam
fazer, no entanto, outras tantas respostas ficariam por dar.
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Capítulo II
A SUA OBRA PÓSTUMA – A FUNDAÇÃO LUIZ BERNARDO DE ALMEIDA
A génese da Instituição
Como ficou dito, no capítulo anterior, esta Instituição foi criada através da disposição testamentária do seu patrono que lhe dá o nome. O Comendador Luiz Bernardo de Almeida, falecido em 4 de Junho de 1947, deixou um testamento em cujo texto se lê: «Deixo a minha esposa D. Marinha: A Quinta Progresso e móveis; A casa na Cruz de S. Domingos (Farmácia Progresso) e três leiras anexas. De tudo o mais que constitui a minha primeira herança em Portugal, deixo o usufruto vitalício a minha esposa D. Marinha. Da propriedade do remanescente da minha herança em Portugal instituo o meu único herdeiro o Asilo de Inválidos Luiz Bernardo de Almeida, que por este testamento fundo, se na ocasião da minha morte não estiver ainda fundado, e que terá os estatutos que os meus testamenteiros elaborarem, caso não tenham sido feitos na minha vida. Este Asilo será instalado na minha casa, chamada do Posto, situada em frente do Posto da G.N.R., na freguesia de Macieira de Cambra, o qual tem por fim alimentar, vestir e abrigar os inválidos de ambos os sexos. Marco o prazo de dois anos para o cumprimento do meu testamento». Por motivos de morte, negligência e possível insuficiência os testamenteiros e a esposa nunca elaboraram os estatutos. Os seus testamenteiros terão sido abonados, mas nunca redigiram os mesmos. Para além da sua esposa, D. Marinha, foram encarregues de tal “os amigos” Joaquim Ferreira Monteiro do Porto, José Alves de Sousa também do Porto e Francisco Ferreira de Pinho de Cambra. Então o Presidente da Câmara, após acusações particulares de haverem sido feitas sonegações de bens, solicitou à Inspecção Geral da Assistência o envio de dois agentes escolhidos da P.S.P., a fim de colaborarem com o Presidente da Câmara no sentido de colher da parte da usufrutuária da herança constante, as provas necessárias e estabelecer a sua responsabilidade nos actos de defraudamento e sonegação, conhecidos do concurso público local. Em 26 de Abril de 1956, o Presidente da Câmara telefonou à Inspecção Geral da Assistência a informar que a diligência tinha corrido bem, como era de esperar, tendo ficado concluída a acção policial com a confissão dos factos que lhe eram atribuídos; que as provas assim colhidas seriam remetidas a Juízo para efeitos criminais; que iria ser intentado, com as mesmas provas, dentro dos próximos oito dias, uma acção contra a usufrutuária por não terem parecido vantajosos os termos de uma transacção por ela sugerida ao Presidente da Câmara. Independentemente do êxito desta acção entendeu-se na altura de ser da maior oportunidade a constituição imediata da Fundação pelo mais rápido estudo e aprovação dos respectivos estatutos. Assim, estudados e propostos pelo Presidente da Câmara, foram os Estatutos
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aprovados pelo Ex.mo. Subsecretário de Estado da Assistência e publicados no Diário do Governo de 23 de Março de 1957.
Foto 35 – Extracto da publicação dos p rimeiros Estatutos
A citada demanda com usufrutuária teve o seu desfecho em 24 de Novembro de 1958, por acordo entre as partes, após 4 sessões de julgamento, e com a seguinte sentença, aceite por sua Ex. ª Subsecretário de Estado de Assistência Social: A D. Marinha entrega ao autor a quantia de 325.000$00; 425.000$00 a satisfazer com a doação, com reserva do usufruto vitalício, dos prédios seguintes: - Prédio composto de casa e leiras e logradouro da Casa Club (Casa do Povo); - Prédio formado por casa e quintal, na Presa do Monte; - Prédio composto de casa e quintal e logradouro, chamado Escaleira e uma leira que lhe fica separada; - Prédio chamado Casa da Garagem, junto da Pensão Bastos. No mesmo despacho de 23 de Março de 1957 foi nomeada a primeira Comissão Administrativa ficando a presidir o Presidente da Câmara de então, Dr. António Henriques Tavares de Almeida, por ter mostrado interesse e intransigência na defesa dos bens do Asilo e ser pessoa de idoneidade comprovada. Quanto aos restantes membros, foram aceites por confiança na pessoa que os havia proposto.24 A Fundação “Asilo Luiz Bernardo de Almeida” foi gerida por uma Direcção Administrativa composta por três membros efectivos e três suplentes. A Direcção Administrativa foi constituída por Doutor António Henriques Tavares de Almeida, Arcanjo Martins de Pinho e Américo Tavares da Silva, como efectivo, e exerceram respectivamente os cargos de Presidente, Secretário e Tesoureiro.
24 - A Voz de Cambra de 15 de Fevereiro de 1972;
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Nas suas faltas ou impedimentos seriam substituídos pelos membros suplentes respectivamente Dr. Armindo Ferreira de Matos, Francisco António de Almeida e Acrísio da Costa Nogueira. Os segundos Estatutos foram modificados por despacho de 9 de Junho de 1971 e propostos pela primeira Comissão Administrativa. Entretanto foram nomeados como vogais da Direcção Administrativa os senhores Drs. Manuel de Amaral Aguiar e Abílio António dos Santos Araújo.
Foto 36 – Aprovação dos Estatutos de 1971
Com a publicação do Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social, através do Decreto-Lei 119/83 de 25 de Fevereiro, os Estatutos da Fundação, foram novamente reformulados. A sua principal novidade reside na criação de um órgão fiscalizador apresentando no entanto, algumas gralhas, erros e omissões e, quanto à forma de nomeação dos Corpos Sociais, uma solução geradora de conflitos político-partidários que em nada beneficia a estabilidade e o desenvolvimento desta. Consequentemente, as mudanças de Direcções são frequentes, alternando com a mudança do Governo do País. No entanto, num passado muito recente, conheceu alguma estabilidade e foi neste período, entre 1995/2003,que a Instituição conheceu o seu maior crescimento.
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Foto 37 - Diário da República, III série de 4 de Fevereiro de 1985
A Fundação Luiz Bernardo de Almeida é uma Instituição Particular de Solidariedade Social (I.P.S.S.), com sede na Cruz de S. Domingos, Freguesia de Macieira de Cambra, concelho de Vale de Cambra. Está registada na Direcção Geral de Segurança Social, no livro de registo das Fundações de Solidariedade Social sob a inscrição n.º 13/85de 20 de Maio.
A abertura da Instituição: os primeiros utentes e a Directora do Lar Tendo como património os bens que lhe ficaram afectos após o falecimento do Comendador e outros que vieram para a posse da Fundação por decisão judicial, cujo rendimento passou a receber após a morte da usufrutuária, o “Asilo” entrou em funcionamento em 3 de Janeiro de 1972 e foi instalado numa casa entre a Cruz de S. Domingos e Padrastos, em frente à casa que foi de Manuel de Oliveira Campos, também conhecida por “Quinta das Fragas”.
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Foto 38 – Pintura da fachada principal do Lar
É certo que a morte de D. Marinha, em 9 de Setembro de 1968, veio facilitar o cumprimento da vontade do Comendador. Estando rodeada de pessoas de má formação, nunca deu provas de, com sabedoria e inteligência, ser capaz de gerir os oportunismos de terceiros. Os primeiros utentes do Lar foram os seguintes: Maria da Piedade Gomes – Lourosa Adriano Tavares Rodrigues – Padrastos Rosa de Almeida – Valgalhardo Joaquina Rosa dos Santos – Figueiras Francisco da Costa – Macieira à Velha António Gomes de Almeida – Casal de Arão Filomena de Almeida Pinto – Pé da Cota Carolina Tavares – Cabril Manuel Tavares da Costa (Noia) – Videira João Soares de Barbosa – Padrastos Carolina de Bastos Mendes – Cavião Luís Alves de Oliveira – Cruz de S. Domingos (ex-utente da Casa de Saúde) António Soares – Mourio António de Almeida (Carloto) – Lourosa - Macieira A primeira Directora foi a D. Maria Augusta Alves de Lima que foi residente na Travessa do Freixo, nº 382 do Porto.
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Foto 39 – Utentes da Fundação e outros em dia de pa sseio no ano de 1972
Do Quadro de Pessoal faziam parte: Pessoal técnico: - Uma Directora - Uma enfermeira ajudante Pessoal menor: - Uma Cozinheira - Dois serventes Pessoal administrativo: - Um Administrador - Um encarregado de escrituração O Lar tinha uma capacidade para 20 utentes e assim se manteve durante uma dezena de anos. Só mais tarde, em 1981/2, o edifício sofre algumas adaptações e é alargada a sua capacidade. Atrofiada por anos sucessivos de Contas não aprovadas pela Segurança Social (de 1987 a 1994), muito por culpa desta, pouco se investiu nos serviços prestados à população residente e estes eram de má qualidade. A par de uma situação de alojamento que se poderia considerar de “satisfatória”, existiam utentes alojados em condições “deploráveis”, dormindo em pequenos cubículos, em camas de ferro ferrugentas onde, para além daquelas, mal cabia a mesa de cabeceira, divididos por paredes em estuque ou “platex” conforme se poderia verificar no rés do chão do edifício-mãe!
O desenvolvimento dos serviços e o aparecimento de uma nova perspectiva de intervenção
Como ficou dito, a Instituição começou a funcionar com Lar de Idosos no ano de 1972 e em 1985 implementou um Serviço de Apoio Domiciliário. Embora tivesse celebrado acordo com a Segurança Social mais tarde. Este serviço, na altura foi dos primeiros a serem criados a nível Distrital.
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Esta Fundação teve um passado muito atribulado que se reflectiu na sua própria criação, muito por culpa da usufrutuária, a que alude o próprio Testamento do fundador, que só uma decisão Judicial veio a pôr cobro. Num passado muito recente, entre 1987 - 1995 veio a ser alvo de inspecções por irregularidades diversas, fundamentalmente por existirem Contas não visadas pela Segurança Social! No ano de 1995, pela Direcção foram intensificadas negociações no sentido de se clarificarem as mesmas, uma vez que a Direcção, que tomou posse em Janeiro desse mesmo ano, não se sentia responsabilizada por tais irregularidades . Como tal, havia que resolver a questão das Contas da Fundação. Depois de muitas reuniões, com muita persistência e bom senso, a situação foi resolvida. A Segurança Social, com os valores apurados no ano de 1994, considerou, em termos contabilísticos, o ano de 1995 o ano "zero" da Instituição. É neste mandato que a Instituição conhece um novo ciclo. Neste período, assistimos a uma nova mentalidade e filosofia de actuação, baseada em princípios actuais e orientadores de toda a actividade da Fundação. Os objectivos iniciais da Fundação visavam prioritariamente o apoio à população idosa do concelho e limitava-se a sua intervenção a este grupo que, diga-se, correspondia a uma perspectiva condicionada por pressupostos que hoje em dia não mais se colocam, dada a natureza dos problemas. A pluridimensionalidade das questões sociais obrigam a que estas Instituições (IPSS) sejam cada vez mais Instituições ao serviço da Família em particular e da comunidade local em geral. A intervenção das IPSS deve basear-se em princípios como a transversalidade e pluridimensionalidade dos problemas sociais, independentemente do grupo etário, sexo ou situação social e cultural. Das Instituições deve-se exigir uma resposta cuidada, tecnicamente responsável, multidisciplinar, e fundamentalmente baseada num trabalho estratégico de alianças, acordos ou parcerias, de forma a rentabilizarmos os meios técnicos e financeiros disponíveis. Assim, nesta perspectiva, a Fundação investiu na criação de um Gabinete de Apoio à Família e Comunidade, que funcionava como um órgão de apoio imediato e de satisfação às necessidades mais elementares das próprias famílias. Desta forma a intervenção que se protagonizou, não seria mais uma intervenção dirigida à questão específica do idoso, mas a todas as famílias onde os problemas sociais se colocavam com maior acuidade. Pretendeu-se um acompanhamento mais continuado destas famílias por Técnicos da Instituição e, inclusivamente, colaborando com a Segurança Social, acompanhar todas as situações familiares beneficiárias do RMG 25, oriundas de Macieira de Cambra. Nessa altura, a Instituição celebrou acordos com a Segurança Social para 55 Idosos no Serviço de Apoio Domiciliário, 60 para o Internamento e 15 para Centro de Dia. No entanto a sua acção não se limitou a estas valências. Desenvolveu um conjunto de acções que visaram a promoção social das famílias e a integração dos seus membros, através da prestação de apoios e serviços directos que teve um enquadramento formal no Acordo celebrado com a Segurança Social no âmbito da Intervenção Comunitária – valência Família e Comunidade.
25 - Agora denominado de Rendimento Social de Inserção;
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No âmbito do Apoio às Famílias e das respostas-tipo institucionalmente não formalizadas a Fundação prestou outros serviços, apoiando financeiramente outras situações, baseadas sempre num trabalho estratégico de parceria e de rentabilização de recursos: O Acolhimento Temporário foi um serviço implementado numa perspectiva de apoio às próprias famílias que manifestassem a sua incapacidade temporária na prestação de apoios continuados a membro do agregado familiar que deles necessitassem, devidamente comprovados e apurada. Salvo situações de força maior este acolhimento não ultrapassaria os 180 dias; - Frequentemente esta Instituição era confrontada com situações de miséria absoluta, onde por vezes era a própria sobrevivência que estava em causa, tornando-se imperativa uma actuação rápida e imediata. Desde o pagamento de refeições e alojamento a pessoas "sem abrigo", o fornecimento de géneros alimentares, a prestação de cuidados médicos, aquisição de medicamentos, acompanhamento e disponibilização de transporte e pagamento de consultas de especialidade, idas aos hospitais, pagamento de fraldas e leite para lactentes, ajudas técnicas e próteses dentárias, até ao apoio financeiro para recuperação de habitações no âmbito do RSI, foi uma preocupação constante da Instituição. A promoção de emprego foi outra preocupação da Instituição, tendo em vista minimizar a situação de pobreza de inúmeras famílias. Para tal, a Fundação Luiz Bernardo de Almeida desenvolveu formação profissional, em colaboração com o IEFP e proporcionou estágios profissionais. Valorizou-se os Programas Ocupacionais para Carenciados e promoveram-se a criação de postos de trabalho, integrando beneficiários do RSI, inclusive, pessoas portadoras de deficiência; Paralelamente, baseado num trabalho estratégico de parceria, colaborou com meios técnicos, comparticipou financeiramente e colaborou num outro conjunto de iniciativas que se expressaram nas actividades e serviços do Grupo de Intervenção Social de Vale de Cambra, abreviadamente designado por GIS – designação actual do Grupo coordenador, a que se chamou também de Rede Social de Intervenção, logo após o termo do Projecto de Luta Contra a Pobreza26 no ano de 1998. Este Grupo, do qual a Fundação fez parte desde o seu início, foi constituído por outras IPSS e outras organizações, escolares e da saúde. Para além do mais, a Fundação colaborou com a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens local27, cedendo meios técnicos, que informavam os processos e faziam o respectivo acompanhamento. Integrou também a Comissão Local de Acompanhamento do Rendimento Mínimo Garantido, agora designado de Rendimento Social de Inserção, o que lhe trouxe responsabilidades acrescidas na integração dos beneficiários. Aliás, esta foi uma preocupação constante, na medida que se desenvolveram os serviços prestados pela Fundação. Integrou a Rede Social criada através da Resolução do Conselho de Ministros n.º197/97 de 18 de Novembro. Em colaboração com a Associação Valecambrense de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente, a Instituição cedeu gratuitamente, e a título de empréstimo, as instalações onde actualmente aquela Associação tem em funcionamento o Centro de Actividades Ocupacionais e a sua sede. Neste período, 1995/2003, a Instituição remodelou as instalações do edifício – mãe.
26 - Este Projecto de luta contra a pobreza foi denominado de “Um Novo Quotidiano”; 27 - Agora denominada de Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco;
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Foto 40 – Edifício – mãe renovado (festa de Natal)
ampliou as mesmas …
Foto 41 - Ampliação do Lar
Construiu dois novos equipamentos: O edifício Social, com instalações para diversas actividades e Salão Polivalente…
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Foto 42 – Fachada principal do edifício polivalente
Foto 43 – Pormenor do Parque e Edifício Polivalente
E a Creche.
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Foto 44 - Pormenor da Creche
Criou no espaço envolvente um Parque de Lazer.
Foto 45 -Churrasqueira/Parque de Lazer
A Aquisição do imóvel "Ex-Casa de Saúde Almeida Pinho era um dos propósitos da Direcção naquela altura. A partir de Janeiro de 2004, assistimos a um retrocesso na evolução da Fundação. Os princípios orientadores até então vigentes deram lugar a princípios mercantilistas de actuação onde só os “ricos” tinham lugar. Surgem as primeiras divergências entre os membros da Direcção. A maioria dos membros incompatibiliza-se com a Junta de Freguesia e com a Câmara Municipal. Em 14 de Janeiro de 2004, o Secretário, após nove anos de exercício do cargo, apresenta a sua demissão, denuncia a situação e em 4 de Novembro deste mesmo ano, os Corpos Sociais são substituídos, com grande polémica e graves acusações. Uma nova Direcção e Conselho Fiscal tomam posse. Algumas notas finais
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Chegados aqui, urge deixar algumas notas relativas ao que ficou depois da morte
dos seus familiares, dos seus amigos, da sua obra, enfim , das questões que se
levantam e das muitas perguntas que ficam sem resposta.
Ficam muitas pistas e fontes de informação para quem quiser aprofundar alguma
questão.
Do testamento feito no Brasil, nada se conhece.
Muitos dos seus amigos faleceram naquele País. É o caso do seu primo
António Almeida Pinho e sua esposa, os seus sobrinhos Aníbal Soares Abrantes e
Delfim Almeida Pinho, Manuel Oliveira Campos e seu irmão Agostinho e tantos
outros que se torna cansativo indicá-los.
Dos que por cá ficaram, depois do seu falecimento, alguns foram sepultados
no cemitério de Macieira de Cambra.
Na sua Capela estão depositados alguns dos familiares directos e na cave da
mesma, outros por quem Luiz Bernardo tinha porventura algum respeito.
As pessoas que o rodeavam nem sempre agiram com idoneidade. A
Fundação por ele instituída demorou a entrar em funcionamento. Os seus bens
foram escamoteados dos seus fins e os de uso pessoal, dignos de perpetuarem em
algum museu, encontram-se espalhados na posse de diferentes pessoas.
Porque é que Luiz Bernardo, quando casou com D. Marinha terá dado como sua
residência o n.º 344 da Rua da Travagem, da freguesia de Ramalde do concelho do
Porto?
E que estranha coincidência é esta do número de polícia ser igual ao número
de registo de casamento?
A primeira esposa do Comendador, D. Ana Horvath, faleceu em 13 de
Fevereiro de 1932. Nesse mesmo ano, a 10 de Dezembro, casa em segundas
núpcias com D. Marinha, trazendo com ela um rapaz chamado Francisco Lopes.
Quando é que o casal veio definitivamente residir para a Quinta Progresso?
Terá vindo imediatamente após o casamento ou só depois de algum tempo,
quando a mãe de Luiz Bernardo já se encontrava senil?
Qual o relacionamento de D. Marinha com Carlos Figueirôa? Este
envolvimento é anterior ou posterior à morte de Luiz Bernardo?
Que maldição esta que quer uns quer outros não tiveram
descendentes directos?
Ainda bem!
Do nada vieram, com nada ficaram, tudo cá deixaram.
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Resta-nos a memória do Comendador Luiz Bernardo de Almeida e as marcas
na paisagem que o tempo jamais apagará.…
Bibliografia
ALMEIDA, Adelino Augusto Moreira - Tese de Mestrado na área da Educação
Arquivo Distrital de Aveiro: Assentos de nascimento e de óbito;
Arquivo Distrital de Aveiro: Livro de Baptismo;
Arquivo histórico da Fundação
CRUZ, Maria da Graça Gaspar Mendes Pinho da Cruz, Vale de Cambra,
meio século de imagens, vol.III Macieira de Cambra, Fotografias da Família
Sousa, 2000
FERREIRA, António Martins, “Vale de Cambra e as suas belezas naturais”;
Jornal de Cambra, 8 de Junho de 1913
Jornal de Cambra, 9 de Junho de 191?
Jornal de Cambra, de Novembro de 1931
Jornal A Voz de Cambra, 15 de Fevereiro de 1972
PINHO, Ângelo Augusto da Silva Pinho, “Homenagem aos Músicos
Cambrenses”, edição Câmara Municipal de Vale de Cambra, 2002
Registos da Conservatória de Vale de Cambra
Revista do Arquivo do Distrito de Aveiro, 1941
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Ângelo Augusto da Silva Pinho28
28 - O autor deste trabalho é funcionário da C. M. de Vale de Cambra e desenvolve funções no âmbito da História Local. Foi concluído em 30 de Outubro de 2007. AVISO: este trabalho aguarda publicação, pelo que está sujeita ao estabelecido no Código dos Direitos de Autor, não sendo
permitida a sua reprodução.